Descontrolado

   Os meses se passaram desde que Julia entrou na minha vida, e a verdade é que eu não consegui esquecer aquele brilho nos olhos dela, a maneira como seu sorriso iluminava até os dias mais sombrios. Toda vez que eu a via, um turbilhão de emoções invadia meu peito. A ideia de perdê-la, de vê-la sofrer novamente, era algo que me deixava em um estado constante de alerta. Não era apenas proteção; era um instinto primitivo de salvá-la de qualquer dor.

  Reconheço que tenho me descontrolado, mas sinto como se precisasse guardar seus medos, a proteger do mundo e do que ela sente, e a única forma que achei foi lutar e a proteger, estar ao seu lado e matar quem se por no meu caminho, Enrico já tinha dito que me aguardava no escritório, mas eu explodiria com ele, ele vai me pedir que me afaste dela, como vou trair a confiança dela e contar para ele, mas como vou trair a confiança do meu Don e não o contar:

__ Achei que viria até o escritório — falou Enrico atrás de mim.

__ Não, eu estou bem — respondi com Thor ao meu lado.

__ Me fala cara, o que está acontecendo? — perguntou, e a informalidade me fez saber que ali era Enrico meu primo e não meu Don.

__ Eu não sei, não sei o que te dizer, não sei o que sinto — falei baixo e ele me questionou diretamente:

Giovanni, você gosta da Julia?

Quando ela veio para cá ano passado tão indefesa, tão vulnerável eu fiz de tudo para ser a imagem de primo perfeito, amigo, leal, minha mãe tinha me dito para mostrar a casa da árvore, mostrar o lago, sabe, ser amigo para que ela se sentisse família e nunca, nunca se sentisse diferente, um dia ficamos sentados na beira do lago e ela perguntou se podia tomar banho, eu não sabia que ela não tinha segurança em entrar na água e mesmo assim a louca entrou, ela se afogou, ela só tinha 16 anos, agora com 17 ela é quase uma mulher, mas não consigo esquecer aquela cena — falei olhando para o nada.

__ O que aconteceu? — questionou.

__ Ela entrou na água, mas entrou em pânico, quando fui tentar ajudar e tirar ela dali ela enlouqueceu, ela falou que eu era um abusador, que não deveria tocar em seu corpo, eu só queria tirar ela dali, mas ela parecia não me enxergar — falar sobre isso já era quebrar a confiança dela, me sentia mal por isso, mas devia continuar e ir até o final.

__ Você a tocou de maneira imprópria? — quando me perguntou isso parecia uma faca que me cortava, custei a acreditar que ele de fato estava me perguntando isso.

__ Sabe que eu nunca faria isso Enrico, finalmente consegui tirar ela dali e como ela gritava muito vieram os soldados, eles sabiam que ela era adotada e queriam afastar ela de mim, fora da água parecia que ela me via e me pediu socorro, mandei que eles se afastassem e ela me abraçou forte, ai me contou a história do seu abuso, que ele a jogou na piscina uma vez para cometer o abuso e disse que estava salvando ela de um afogamento, ela tem trauma de água e disse que achou que não passaria por isso mais, a forma como ela me fez protegê-la foi intensa e ali eu jurei que não deixaria que a tocassem, eu sinto que devo proteger ela, percebi que dois soldados a encaravam e quando ela passou riram, esses malditos querem abusar dela, ela tinha 16 anos — só de lembrar dos dois malditos a minha vontade era de matar novamente.

__ Porque não nos disse nada, você proteger ela é um instinto corajoso, e seu dever, não sei se estou errado, mas sinto que nutri sentimentos por ela e não condenarei isso, mas perigo elas correm sempre, não deve deixar que a paranoia domine sua mente — falou parecendo culpado por nunca ter notado.

__ Você não entende, ela está sempre em perigo, eles não a respeitam como uma de nós, e isso me faz querer proteger ela sozinho, em uma situação de risco eles irão cuidar a Serena, mesmo que o tio tenha a feito sua filha, você não entende a raiva que sinto quando menosprezam ela, até a empregada, aquela desgraçada, ouvi ela falando que Julia engravidou porque queria, e que o soldado morreu porque ela era uma vadia, ela tinha 15 anos cara — ficava com raiva de relembrar isso, chutando as coisas me levantei deixando Thor em alerta.

__ Giovanni, mantenha a calma, não pensa desse jeito, respira fundo e se acalma, Julia precisa da sua versão tranquila e hoje resolveremos tudo isso, quero essa empregada no meu escritório amanhã na primeira hora da manha — falei sério.

__ Eu gosto muito dela, não suporto quando vejo algo acontecer, teve um dia que vim mais cedo e ela estava lavando louça, um dos dias que a família tinha ido ao orfanato, ela ainda estava traumatizada com ir lá e pediu para ficar, a desgraçada disse que ela tinha obrigação de ajudar, foi nesse momento que a peguei pelo pescoço, Julia me implorou para parar, mas aquele ali é o Giovanni, eu sou esse monstro, como vou defender uma princesa se sou um monstro — falei triste sabendo que não era merecedor dela.

__ Giovanni, você não é um monstro, você é perfeito, somos sim homens da máfia, mas nunca machucamos alguém assim, ela mereceu muito isso e se você tivesse me contado eu teria matado ela, Julia é minha irmã e merece ser tratada como tal — falou ele e assenti.

__ Sempre que a vejo sinto paz, quando estou ao seu lado e ela me acalma, consigo abaixar a guarda quando ela está ao meu lado, porque sei que vou conseguir a proteger, no dia do hospital ela disse que sabia que viríamos, perguntou se poderia me abraçar e assenti, quando ela pôs a cabeça em meu peito e respirou fundo eu senti que ela se acalmava comigo, sempre que estou com ela me acalmo, sempre me tranquilizo porque eu acho que a amo — finalmente admiti me sentindo bem com isso.

__ Você tem certeza do que sente? Falaremos com meu pai, assuma um compromisso com ela se for do seu interesse e dela também, como sua noiva e futura esposa não existe possibilidade de não ser respeitada, mas cuidaremos disso pessoalmente, sei que ela ficara bem em suas mãos — completou ele.

__ Sim, você acha que ela casaria comigo? — perguntei imaginando a hipótese.

__ Sim, eu acho que sim, mas vamos ao orfanato agora e a noite conversamos com vocês dois juntos e com ela sozinha, vamos lá primo cuidar dessa família que Deus nos deu — quando ele disse isso toda raiva tinha saído, aqui ele fez diferente de mim, ele me acolheu quando em seu lugar eu queria matá-lo.

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