Capítulo 17

Sim, eu fui embora. Fui embora sem olhar para trás, estava muito cansada e só precisava de um canto isolado para descansar.

Se foi fácil? Não foi! Fiquei por tantos anos cultivando esperanças, repetindo movimentos que minha nova vida era muito estranha para mim, parecia errado, parecia que a qualquer momento tudo iria acabar.

No início eu lutei muito para não correr para o hospital onde Henry estava e ajudá-lo a se vestir e apresentar a ele esse novo mundo e como tudo mudou tanto desde a última vez que ele enxergou.

Mas não… eu não queria mais me sentir a muleta de Henry, não queria ouvir dele que agora que ele não enxergava, eu não lhe servia mais.

Eu não estou a altura dele, sou apenas uma garçonete que anda com roupas surradas. Ele é lindo, inteligente, um CEO e provavelmente se sentiria vergonha em me ter ao lado.

Eu me adiantei e dei logo a ele o que ele tanto queria, a sua visão e a sua liberdade. Tenho certeza que após enxergar ele irá alguém melhor do que eu, alguém a sua altura.

Era assim como eu me sentia, acho que estava em abstinência de Henry.

Mas o sr Kramer foi mudando o que eu pensava. Eu me sentia pequena, apenas uma empregada e o Sr Kramer me levou para a Europa e me colocou para trabalhar como sua assistente.

Eu me sentia mal ao lado dele e das pessoas que nos rodeavam, mas o Sr Kramer me tratava como se eu tivesse no mesmo nível daquelas pessoas bem vestidas e descoladas que trabalhavam conosco.

Entenda, aquele era um ambiente totalmente hostil para mim, eu tinha uma auto estima baixa, mas o Sr Kramer era dono da maior editora de moda do mundo, um lugar onde alto estima era super valorizada.

Mal chegamos e o Sr Kramer me levava a desfiles de estilistas famosos e me apresentava a pessoas importantes do mundo da moda, ele me apresentava como sua nova aprendiz e eu ficava aterrorizada.

Mas, foi o que eu pedi, não é? Pedi uma oportunidade de trabalho. Não especifiquei a oportunidade e ele me deu logo um cargo que eu deveria sempre acompanhá-lo em todo lugar.

Em um dia, eu o questionei:

— Sr Kramer, porque o senhor fica me apresentando como sua aprendiz. Sabe, eu sei que tem filhos e eles sim deveriam aprender com o senhor.

— Não é o que está pensando Camille. Você é minha aprendiz porque tem muito potencial, eu quero que aprenda tudo desse mundo, como funciona e como lidar com as pessoas.

— Sr Kramer, eu fico feliz com um trabalho pequeno. Eu posso só trabalhar com as correspondências, como recepcionista ou até na limpeza. Eu não tenho a intenção de me aproveitar da sua boa vontade.

Nesse momento, o Sr Kramer se levantou, ele me puxou pela mão e me colocou de frente para o espelho. Ele tirou meus cabelos da frente do meu rosto, me fazendo encarar meu reflexo.

— Camille, você não é só bonita por dentro, você é uma mulher estonteante, muito bonita por fora. Esse é o melhor mundo para você aproveitar o que tem por fora, não percebeu que ninguém ainda me questionou porque escolhi você? Acho que você é a única pessoa no mundo que não consegue ver sua beleza.

Fiquei me olhando no espelho por um bom tempo, acho que era a primeira vez que eu me permitia me olhar tanto. A minha rotina era tão corrida que me olhar no espelho era algo que não costumava fazer.

— O que o Sr pretende, Sr Kramer?

— Pretendo te transformar em uma estrela. Uma revelação do mundo da moda.

— Sr Kramer… — abaixo minha cabeça, um pouco constrangida — É que… talvez o senhor esteja esperando demais de mim. Eu só preciso de um trabalho para pagar uma casa de aluguel e plano de saúde.

— Você está pensando pequeno, Camille! Olhe ao seu redor! Olhe quantas oportunidades!

— É que… eu não sei como te contar. Sr Kramer, eu não posso superar suas espectativas, já que… eu… eu estou grávida.

Sim, recentemente descobri que não fui embora sozinha. Na verdade, eu já sabia antes da comprovação, só não queria admitir.

Eu estava tão cansada que por várias vezes esqueci de tomar meu anticoncepcional e agora, descobri que minha vida continua sendo uma vida para cuidar de outro.

— Tudo bem… — Sr Kramer diz com menos empolgação, mas pensativo — Essas coisas acontecem, Camille. Mas leve isso como uma motivação para continuar. Acho que não foi por acaso que te conheci, foi realmente para te ajudar, eu não vou desistir de você, só vamos esperar mais um pouco para fazer sua estrela brilhar.

Eu me sentia um pouco desconfortável com ajuda do Sr Kramer, mas com o tempo percebi que era porque eu não estava acostumada a ser cuidada.

Ele era muito bom para mim, mais do que deveria. Me ensinou tudo que sabia e aos poucos fui ficando confiante.

A gravidez não foi um empecilho, mesmo carregando meus bebês em meu ventre eu continuava a estudar e trabalhar.

Cheguei a voltar para Washington algumas vezes para visitar a minha mãe e para ela acompanhar um pouco a minha gestação.

— Filha, e o Henry? Você não vai contar? — era algo que ela sempre perguntava.

— Não, mãe. Estou melhor sem ele e ele nunca iria querer ser pai dessas crianças, Henry sempre me dizia que se eu engravidasse, a responsabilidade seria toda minha, ele não queria de jeito nenhum ser pai.

— Humpf! Não queria ser pai mas brincar de fazer filho, não recusava!

— A culpa foi minha também, eu o deixei me usar. Mas eu vou ter meus filhos e vou fazer de tudo para cuidar deles e não vou deixar Henry nunca se aproximar deles. Eu sei como dói a rejeição e meus filhos nunca irão passar por isso na vida!

— Eu te entendo, filha… Mas, uma coisa é um homem saber de seu filho e o rejeitar, outra é ele não saber de nada. Isso não é rejeição.

— Eu não vou pagar para ver.

Sim, eu não iria pagar para ver. Quanto mais o tempo passava, quanto mais eu conhecia o mundo, me dava conta que o meu relacionamento com Henry não era bom para mim, continuar com ele não me levaria a nada.

Meus filhos nasceram, um menino e uma menina, Bento e Martina.

Martina nasceu forte, com muitos cabelos, era loira de olhos claros, simplesmente a cara do pai.

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