Infelizmente, cheguei tarde demais.
Os miolos de Torien enfeitavam o chão da nova Sala de Jantar com maestria.
Seu marido, Chaid, falava exasperado com minha mãe sobre como somos horríveis, instáveis e perigosos. Kris rebatia-o com fervor, mantendo a postura de Lady. Corinta bebia vinho direto do gargalo da garrafa, apenas observando todo o caos sentada em uma poltrona florida. O restante dos convidados, porém, sumiram.
— Onde está o restante das Elites? — questionei alto, chamando a atenção para mim como queria.
— Fugiram. — minha querida mãe respondeu simplesmente, os olhos fundos — Se assustaram quando explodi a cabeça de Torien, pensaram que eu faria o mesmo com eles.
— Os miolos chegaram ao teto? — olhei para cima, o teto daqui é alto demais para ser alcançado, sem contar que a líder de Quez devia ter um cérebro bem pequeno — Uma pena. — murmurei frustrado ao ver que não.
— Uma pena? Você viu o estado dela? — Chaid falou exaltado — Como agem como se isso fosse normal? Minha esposa está sem a cabeça! Os ministros e guardas filhos de meretrizes fugiram! Me abandonaram aqui no meio de vocês!
— Sim, isto é bem horrível. — murmurou Corinta — Vamos resolver isto? De preferência em um quarto...
— Eu apenas explodi a cabeça de Torien, porque ela usou magia em mim primeiro. — minha mãe ficou de pé — Ela foi burra!
— Sempre foi. — concordou Kris.
— Não quero saber! Sem ela não existe mais negociação!
— Certo, vamos manter a calma. — me intervi na confusão — Você vai negociar no lugar dela, Chaid. Está na Elite de Quez a pouco tempo, mas deve ter percebido como sua esposa é péssima no jogo político. Não cometa o mesmo erro de ser fazer de imbecil, boicotando os acordos. — seus olhos escuros semicerraram, continuei satisfeito — É o seguinte: ou você compra os sobreviventes restantes pelo preço dos quinze e estabeleça um acordo conosco ou Lafesen invadirá o que um dia foi Chrowe. Uma terra pequena, sem graça, só que aquele pedacinho impede que Quez seja rebaixada como Pequena Casa. Você escolhe.
— Seu preço não é justo.
— Apenas sente-se, vamos negociar isto do modo certo. Será que pode compartilhar o vinho conosco, Corinta?
Ela parou uma golada, com a garrafa praticamente vazia.
— Não quero me sentar, nem beber, Lohan. Apenas resolver isto.
— Tudo bem. Mãe, pode explicar a Chaid sobre o ‘preço injusto’?
Ela suspirou, se sentando com os ombros curvados de cansaço. Era preocupante vê-la assim, a ponto de explodir a si própria. O que me atormentava era não poder fazer nada para acalmar seus nervos aflitos, cada dia que se passava seu estado era pior.
Meus pais estavam velhos e morrendo.
Eu teria que carregar uma Grande Casa nas costas.
— O reino Sazonal está passando por alguns conflitos há algum tempo, Chaid. — ela começou — Os Lordes estão se juntando com as Casas por sua magia. Porém, os ataques das Feras têm aumentado e consumido o que todos possuímos. Lafesen ajuda os que são afetados por aquelas bestas famintas. Abrimos espaço para os que necessitam, os meus filhos se arriscam quase todos os dias para auxiliar estas pessoas e caçar as Feras. — ela fez uma pausa — Depois de tantos ataques, começamos a suspeitar que eles estão sendo orquestrados por alguém que possui magia. Talvez mais de uma. Quem é e o motivo ainda não está claro.
— Isso é loucura. — Chaid murmurou — Quem seria burro de dar magia para feras?
— Torien. — admiti — Mas Chrowe foi atacada, ela não iria ganhar nada acabando com seus próprios habitantes.
— Mas Gran-CaL não é inimiga das Casas, por mais que sejam Feras nos auxiliam nos negócios de paz.
— Estamos falando de mercenários. — minha mãe argumentou — E de alguma criatura mágica disposta a acabar com a magia das outras.
— Ainda assim, por que querem a fidelidade de Quez em troca dos mortais? Isto nem é um preço contável. E mais, o produto são apenas humanos. Nascem e morrem em uma velocidade surpreendente.
— Cada vida Mortal é importante. Eles celebram os espíritos mágicos a cada Estação. A canção que entoam faz o poder dos Lordes aumentarem, trazendo abundância e prosperidade para a Casa que pertencem.
— Isto é mentira. — Chaid disse — Quez celebra com felicidade os espíritos mágicos e continua sendo uma miséria.
— Vocês com certeza celebram errado. — falei.
— Então, Sr. Dono de toda sensatez e inteligência, pode me ensinar a fazer o certo?
— O foco aqui, não são as festividades. — minha mãe chamou a atenção para si — E sim o possível problema que estamos enfrentando.
— Ela está certa. Chaid, Quez nunca foi bem vista e se nossas suspeitas ganharem força, o final de tudo será uma guerra. Lafesen não vai hesitar em se pôr à frente da batalha e é necessário termos a confiança das Casas para termos certeza que não são traidores.
— Traidores? Vocês com certeza suspeitam de alguém. Quem é?
— É só uma suposição. — murmurei — Não vou causar fofocas entre as Elites para correr o risco de morrer.
— Então se eu não aceitar, vão transformar Quez em uma piada. Se eu aceitar, vão obrigar Quez a ser aliada em uma possível guerra. Qual o lado bom nisso?
— Ter uma aliança com Lafesen fará Quez ser menos mal vista. Somos inteligentes e vão pensar que negociamos com pessoas inteligentes. E mais, se houver mesmo uma guerra, sues Mortais estarão protegidos.
Olhou para o corpo de Torien no chão, talvez pensando que sua esposa tomaria a opção mais idiota e ele tinha que evita-la.
— Quantos Mortais sobraram?
— Crescida. — minha mãe chamou. O espírito mágico entrou segurando a prancheta, com os Mortais a seguindo do mesmo modo de antes. Haviam apenas nove agora.
— A fidelidade de Quez custará nove Mortais? Isto é muita idiotice.
— É um preço baixo considerando que Lafesen está disposta a lutar por uma Casa inferior.
Ele coçou a garganta, pensativo.
— Se estamos falando de uma traição, quero estar a par de tudo o que descobrirem. Não precisa me passar nomes, mas quero saber os seus passos.
— Tudo bem, mas por temos apenas suspeitas, quero que me prometa sigilo.
— Prometo. — ele olhou para seu produto — Todas as Feras foram mortas?
— A maior parte delas. Negócio fechado?
— Negócio fechado.
— Crescida, o documento. — minha mãe pediu. Ela colocou em cima da mesa, oferecendo uma caneta. O restante da negociação era simples, tanto os principais quanto as testemunhas assinavam e o contrato seria validado. O contrato era revestido de magia que não podia ser anulada, ou seja, o acordo era definitivo até que uma das partes pereça. Tentei não sorrir enquanto assinava Erik Lohan Conghansed na folha. Foi uma das minhas primeiras negociações como quase cabeça de Lafesen, acredito que fiz um bom papel.
— Quanto tempo vai levar para Torien voltar ao normal?
— Um mês, no mínimo. — minha mãe deu de ombros.
— Você tem uma boa chance de fazer a diferença em Quez, enquanto o sua esposa idiota se cura. Faça o certo. Também pode descansar aqui esta noite.
— Quero ir embora o quanto antes. — olhou para os Mortais sem saber bem o que fazer — Seu irmão irá nos levar?
— Claro. Eu vou falar com ele, pode esperar aqui enquanto isso.
— Que esta reunião nunca chegue aos ouvidos das outras Casas. — Chaid murmurou — Eu vou ir atrás das Elites, espero encontrar seu irmão no Salão Principal em uma hora, Lohan.
— Eu te faço companhia, Chaid. — Corinta falou.
— Lamento mesmo por este infortúnio.
— Está perdoada, Marisca.
— Não estou me desculpando com você. — minha mãe suspirou — Crescida, por favor, mande embalar o corpo de Torien e prepare todos os Mortais.
— Sim, senhora. Me sigam.
Chaid apenas fez uma carranca e saiu me lançando um duro olhar.
— Deu tudo certo, eu acho. — sorri.
— Tudo certo? — Kris finalmente se pronunciou — Foi horrível até mesmo para mim. Negociar com uma Casa Média é quase uma humilhação.
— Não quero mais saber deste assunto, nem quero que ninguém o cite pelo restante da semana. — o pedido de minha mãe era uma ordem — Sinto que vou enlouquecer se continuar aqui. Lohan, cuide de todo o restante que sobrar deste fiasco. Vou descansar agora.
— Eu também vou.
— Kris, na verdade, Anton pediu para te...
— A resposta é não.
— Pensei que você e meu irmão estavam se resolvendo.
— Ainda não o perdoei, Lohan. Os últimos dias têm sido apenas farsa seguida de farsa. Me sinto exausta agora. Tudo o que fiz esta noite foi fazer um bom papel de noiva apaixonada, sorrindo e chamando-o de ‘meu amor’. Diga a ele para não misturar as coisas.
— Sabe, eu odeio me intrometer nas coisas de Anton, mas ele gosta de você, Kris. Muito. Aproveite isso.
— Não estou preparada para o amor que ele oferece.
— Como quiser, Lady Paty.
Ela semicerrou aqueles olhos cinzas, senti o frio correr pela minha espinha. Ela odiava esse apelido dado pelos cozinheiros, mas havia algo de engraçado em vê-la tão nervosa.
— Tenha uma boa noite, Lohan. — praticamente cuspiu meu nome e saiu sem sequer olhar para trás.
Cocei os cabelos pensando no que fazer agora.
Falar com Anton, pedi-lo para levar Chaid e os babacas de Quez embora, ver qual foi o desenvolvimento das Feras na Sala de Recuperação, então interrogá-las e decidir o que fazer com elas. Sem contar todos os planos feitos para os próximos dias, jantares, treinos, caçadas, bailes idiotas, reuniões diplomáticas.
Certo, agora entendo porque minha mãe está enlouquecendo.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 59
Comments