Capítulo 11

Felipe

        Acordei no sábado perto das oito horas da manhã, fui até tarde arrumando minhas coisas, terminei por volta de umas onze horas, aproveitei e também tomei um banho. Agradeci que tinha um banheiro somente para mim, diferente do quarto, ele permanecia do jeito que vi pela última vez.

        Eu dormi aquela noite bem, no entanto, ao acordar e perceber que não estava mais em Araranguá me sentia um tanto aliviado, contudo sentia saudade dos meus pais me acordando, ou ouvindo os gêmeos gritando sobre quem ia primeiro para o banho, mas apenas acordei sem perturbação. Não escutava nada além da minha respiração calma, olhei em volta e vendo aquele quarto inteiramente preto, de alguma forma dava a estranheza, mas uma estranheza boa.

        Sentei-me na cama, peguei meu celular sobre o criado mudo, vi algumas mensagens de meus amigos, Pedro chegaria hoje, Luan somente amanhã. Pedro ficaria em uma república e Luan moraria com um primo que já mora aqui há algum tempo. Respondi os dois, informando que tinha dormido bem e que nem mesmo escutei os movimentos de meu colega de casa.

        Levantei e aproveitei para ir até o banheiro fazer minha higiene, também coletei as roupas que havia deixada atirada no chão e levei para um pequeno cesto de roupas que tinha ali. Precisava ver com o Isaac algumas coisas, como onde ficava a área de serviço, dia de limpeza e também o meu acesso ao apartamento, pois ainda não estava cadastrado no sistema deles.

        Ao sair do quarto, percebi que tinha um cheiro gostoso de café no ar, fui em direção à cozinha e lá estava Isaac mexendo em um tablet com uma mesa de café da manhã completa em cima da mesa. O garoto parecia concentrado no que lia, sua careta mostrava que não gostava muito do que via.

        – Bom dia – falei chamando sua atenção.

        – Bom dia.

        – Você fez tudo isso? – perguntei apontando para a mesa e recebi um aceno com a cabeça.

        – Não que fosse muito difícil fazer – falou ele colocando o tablet na mesa. – Só peguei as coisas que comprei e coloquei na mesa e o café a cafeteira já tinha feito quando acordei.

        – Tinha feito? – Olhei confuso.

        – Sim, eu a programo pela noite para fazer o café no horário que eu quero – disse dando de ombros, como se aquilo fosse a coisa mais óbvia de se fazer.

        – Nossa, não sabia que tinha cafeteria assim – falei sincero e me sentei na mesa. – Preciso ver umas coisas com você.

        – Aconteceu algo? Precisa de algo? – Perguntou-me um pouco preocupado comigo.

        – Não, não – digo rindo de sua cara. – Apenas para saber algumas coisas, tipo onde fica a área de serviço, pois não me mostrou a última vez que estive aqui – seus olhos não desviavam do meu e o preto era tão profundo que sentia que ele via minha alma. – Preciso também ver sobre a questão do meu acesso ao apartamento, já que não tenho meu rosto ou a digital memorizada. Por fim, quero saber os dias de faxina, limpeza da casa para poder pôr em minha agenda.

        – Bem, a lavanderia fica naquela porta do lado daquele balcão – me mostrou então uma parede de madeira sem maçaneta, olhei confuso. – Vem aqui, vou te mostrar como abrir ela.

        Isaac deixou seu café sobre a mesa, levantou e percebi que hoje usava um pijama azul, diferente do que vi antes. Caminhou até a parede comigo ao seu lado e então deu uma leve apertada na parede que se abriu para fora, revelando um pequeno corredor. Olhei para dentro, era como se soubesse um esconderijo, quando entramos tinha mais um quarto, um banheiro e também tinha uma área que tinha uma lavadora de roupa, assim como uma secadora, um pequeno varal suspenso num canto.

        Tinha uma estante encostada na parede lateral direita, onde tinha produtos de limpeza, como também ao seu lado pendurado vassoura, uma pá e pelo que percebi tinha em torno de três tipos diferentes de mop. Era um pouco escuro comparada às partes do apartamento, por isso ele ligou a luz, me mostrou cada coisa explicando como se mexia na máquina tanto de lavar quanto a de secar.

        – Sobre a limpeza, minha mãe contratou uma senhora que virá todas às segundas e quintas para limpar a casa – falou quando saímos da área de serviços. – Provavelmente vai conhecer ela nesta segunda.

        – Achei que nós íamos ter que limpar, não sei se é justo ter alguém para isso – olhei com um certo desconforto.

        – Não se preocupe com isso, é mais um emprego que minha mãe dá – deu um sorriso para mim e apenas concordei com a cabeça. – Sobre seu acesso, meu pai já falou com o síndico e também mandou uma autorização para a empresa que faz a segurança do prédio, então vamos ter que descer na portaria para eles conseguirem coletar as coisas para você – ele pegou um chaveiro sobre o balcão e me entregou, era uma tag de acesso. – Esse daqui é para entrar na porta, só encostar na fechadura que ela abre, como se fosse um hotel, sabe?

        Concordei e logo olhei o chaveiro, era uma miniatura da ponte Hercílio Luz de ferro, além do embaixo escrito “Eu amo Florianópolis”. Sorri com o chaveiro e coloquei do lado ao lado da minha xícara com o café que servi.

        – Aí a hora que você quiser, podemos descer lá embaixo para cadastrar as suas credenciais – disse tomando um pouco do seu café.

        – Pode ser daqui a pouco.

        – Claro – seus olhos permaneciam em mim. – Já viu sua grade horária?

        – Olhei ontem e me assustei com tanta aula – meu rosto se contorceu só de lembrar a quantidade de aulas que precisava fazer. – Tem dias que terei aula a manhã toda e um pouco tarde.

        – Eu também – Isaac então virou seu tablet me mostrando sua grade horária, era parecida com a minha, apenas mudava algumas disciplinas. – Confesso que estou com medo de não conseguir passar em todas.

        – Eu também – já pensava isso desde que fiz a matrícula, alguns veteranos fizeram um grupo deles com todos nós calouros e também aproveitamos para fazer um só nosso. Quando os veteranos disseram que o primeiro semestre era um dos mais pesados, achei que era mentira deles. – Meu maior medo é cálculo, tenho medo de não passar.

        – Te entendo – um suspiro de frustração saiu de seus lábios. – Podemos nos ajudar, provavelmente vamos ter uma prova na mesma semana.

        – Sim, até recebi algumas coisas dos veteranos – digo sorrindo para ele. – Posso te encaminhar, falando nisso, preciso do seu telefone caso precise entrar em contato com você urgentemente.

        – Claro, anota aí.

        Seu número era até que fácil de memorizar, salvei nos meus contatos com um “Isaac colega de casa”, logo mandei um oi pelo WhatsApp e vi ele conferindo a mensagem. Logo abriu e salvou meu número também no seu celular. Pelo resto do café permanecemos de certa forma quietos, sem muita conversa.

        Perto das dez horas descemos até o hall de entrada do prédio, Isaac então liga pelo interfone para a central da portaria eletrônica. Demoramos quase uma hora para fazer tudo, pois tiveram que ligar para o pai de Isaac confirmando a autorização, assim como o síndico, logo depois tive que mandar uma cópia dos meus documentos para um número e por fim consegui fazer tudo que foi pedido.

        No almoço, Isaac e eu cozinhamos, me surpreendi ao saber que ele sabia fazer comida, achei que pessoas de sua situação financeira não precisassem cozinhar. Não lhe questionei, apenas mostrei meu dom em fazer o melhor arroz solto que aprendi com minha mãe.

        – Você tem alguma alergia? – Neguei com a cabeça.

        – Você tem?

        – Sim, sou alérgico a frutos-do-mar, normalmente a camarão – disse, logo fiz uma anotação mental de não comprar camarão.

        Fizemos arroz com carne de panela, comemos em silêncio, por fim colocamos a louça na lavadora de louça que nem tinha visto ter na cozinha. Fui para meu quarto, aproveitei e liguei para minha mãe e meu pai informando que estava bem e também que tinha almoçado, também tinha cadastrado o meu acesso e por fim contei que passaria o dia todo jogando ou talvez saísse pela tarde com Pedro, já que ele chegou pela manhã, aproveitei também para pesquisar alguma coisa que tem pela região antes de realmente ir jogar.

        No final passei o sábado em casa, na janta comemos o que sobrou do meio-dia e da pizza do dia anterior, mais uma refeição em silêncio, dessa vez a televisão da sala estava ligada e passava uma série que não conhecia. Dormi até cedo e no domingo decidi ficar em casa e descansar para no próximo dia, já que seria o primeiro e já sabia que seria pesado.

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