Isaac
Já estava irritado o suficiente nos últimos dias com Carla. Ela havia decidido que não deveríamos ir para a capital, ficando nessa cidade que não mudava nada. Tivemos duas brigas esta semana e isso estava me frustrando. Maldita hora em que me envolvi com essa garota. Nem sei por que continuo com ela. Na verdade, deveria tê-la terminado há muito tempo.
Desci as escadas da minha casa e fui em direção à cozinha. Nos últimos dias, sentia-me um completo idiota por continuar com esse relacionamento que nunca deveria ter começado. Principalmente após estragar minha relação com Dona Juçara, que era a nossa empregada e uma espécie de mãe para mim. Não que minha mãe não desse atenção a mim, mas Dona Juçara era diferente. Ela me escutava e sempre me orientava.
Maldita hora em que a magoei, mas eu não sabia que Felipe descobriria daquela forma. Senti-me tão mal por ele, tão mal por machucar seus sentimentos. Vi a luta que Dona Juçara enfrentou nos meses seguintes quando descobriu a traição. Minha mãe também ajudou muito, pagando um psicólogo e um psiquiatra para o pobre garoto.
Claro que implorei para minha mãe ajudar, sentia-me culpado pela forma como ele estava lidando com toda a traição. Eu sei que deveria ter terminado com Carla, mas confesso que não fui inocente na história. Só continuei com Carla sabendo do seu romance com aquele garoto. Confesso que não queria que tudo ficasse pior para ele e até hoje me sinto culpado. A situação piorou muito no vestibular, quando ele emprestou a caneta e mesmo assim não exigiu nada de mim, deixando-me com a caneta.
Confesso que, após o vestibular, meu relacionamento com Carla mudou muito, principalmente com a gentileza e falta de ressentimentos com que ele me ajudou. Penso que, se não fosse por ele, eu não teria conseguido passar em Engenharia Mecânica e continuaria aqui, talvez fazendo faculdade em Criciúma ou tentando o Enem.
– É uma pena, Marcelo – disse Dona Juçara com voz triste. – Meu menino está tão triste, mas não podemos pagar para ele fazer faculdade na capital. Sem contar que só a moradia consumiria metade do meu salário, e imagine com comida e outras despesas – suspirou a mulher. – Sem contar que, infelizmente, eu e meu marido financiamos um carro novo no ano passado e as parcelas do financiamento da casa aumentaram.
– Você tentou falar com a patroa sobre ele ficar no apartamento com o senhor Isaac? – perguntou o encarregado da casa. – Talvez eles possam ajudar.
– Acho que não daria certo, até porque a senhora Luana é muito rigorosa e o apartamento na capital é extremamente luxuoso para o meu filho – disse com a voz baixa. – Sem contar que o Isaac não aceitaria meu filho morando com ele. Os dois nunca se deram bem, lembra da vez que tive que separá-los porque brigaram fisicamente? Até hoje não sei o que aconteceu.
– Mas o senhor Isaac cresceu. Aquele menino brigava com todos os garotos que chegavam perto dele e do senhor Luan – disse Marcelo rindo. – Mas tenta ver com a patroa.
– Não, deixa assim, meu menino vai ter que esperar até o ano que vem, quando estivermos melhores – concluiu ela.
Segui para meu quarto pensando sobre isso. De certa forma, não me importaria de Felipe morar comigo. Não que fosse algo bom, entretanto, poderia ajudar o garoto como ele me ajudou sem se importar. Me deitei pensando nisso e falaria com minha mãe sobre o assunto, sabendo que ela ia ajudar, principalmente por gostar muito da dona Juçara e sua família.
O dia passou rápido, fui até a sala, minha mãe já estava em casa, estava no sofá conversando no telefone com uma de suas amigas, pela voz no viva-voz parecia ser a Gabriela, uma das amigas de infância dela. Lá estava minha mãe, sentada em um dos sofás do canto, rindo de algo. Sua pele retinta, igual à minha, brilhava com a luz do abajur ao seu lado.
Minha mãe era uma das mulheres mais elegantes e lindas da cidade. Ela não nasceu aqui; na verdade, veio de Porto Alegre para dar aula no curso de moda no instituto federal que a cidade tem e então conheceu meu pai em uma festa e logo se apaixonaram. Eles estão juntos desde então, ele é um dos advogados mais bem conhecidos da cidade, e ela é professora universitária.
– Mãe, poderia falar com a senhora? – perguntei, sentando-me no sofá em frente a ela.
– Gabi, vou desligar aqui, amanhã conversamos sobre a coleção dos meus alunos – minha mãe olhou e sorriu para mim. – O que foi, meu filho?
– Bem, não sei como dizer isso, na verdade, sei que fui errado em fazer isso.
– O que fez agora? – Ela me cortou antes mesmo de eu concluir meu raciocínio.
– Pera, não fiz nada grave. É que escutei uma conversa da Juçara com o Marcelo – seu olhar desconfiado indicava que eu podia continuar. – Ela disse que não poderia mandar seu filho para Floripa devido ao dinheiro e meio que pensei sobre ele morar comigo.
– Depois que você traiu ele?
– Quem traiu foi a namorada e não eu – lembrei a ela.
– Isso ainda o incomoda? – Ela questionou, se ajeitando no sofá para ficar melhor posicionada para me encarar.
– Não e sim – estava incerto sobre o que falar. – Na verdade, eu queria ajudar, pois ele me ajudou no vestibular, como te contei, e aí seria uma gratidão.
– Entendi, mas você sabe que a Juçara vai recusar isso de graça – eu concordei com a cabeça. – Então, qual solução você encontra?
– Bem, diz a ela que você vai tirar dez por cento do salário dela todo mês – dei de ombros.
– Vou falar com ela amanhã, mas quero que esteja junto e peça desculpas por escutar a conversa das pessoas – disse, repreendendo-me, e eu concordei e dei um beijo em sua bochecha antes de subir para meu quarto.
Aquela noite dormi tão bem, sentia que estava fazendo a coisa certa e, de certo modo, estava orgulhoso.
Na manhã seguinte, minha mãe me chamou para descer e tomar um café enquanto conversávamos com a dona Juçara. Desci ainda de pijama, a mesa já estava pronta, então me sentei na lateral, minha mãe na outra e meu pai no meio. Provavelmente minha mãe contou a ele sobre minha decisão, pois ele sorriu quando me viu, de certo modo nervoso.
– Juçara – chamou minha mãe, e pela porta que dava para a cozinha veio aquela mulher baixinha, limpando as mãos e com um olhar preocupado.
– Precisa de algo, dona Luana? – perguntou, parando em frente a minha mãe.
– Você trabalha aqui há quantos anos?
– Desde que a senhora se mudou para cá – disse a mulher, ainda confusa.
– Então pare de me chamar de dona, não sou tão velha assim – minha mãe arrancou um sorriso de Juçara. – Sente-se à mesa, precisamos falar com você.
– Fiz algo errado?
– Não, claro que não, sente-se aqui – disse minha mãe, e a mulher fez isso, sentando-se ao seu lado, e minha mãe segurou sua mão. – O senhor Isaac ouviu a conversa de você com o Marcelo ontem sobre seu filho e me contou que você não tem condições de mandá-lo para Florianópolis – Juçara concordou com a cabeça. – Então, Isaac mencionou a ideia de oferecer o quarto extra do nosso apartamento para seu filho.
– Não posso aceitar, dona Luana – falou rapidamente a mulher.
– Calma, nós sabíamos que você ia falar isso, então oferecemos o apartamento para seu filho e retiramos dez por cento do seu salário como se fosse um aluguel – falou minha mãe, e a mulher então pensou um pouco.
– Mas isso daria apenas 210 reais, não vale a pena para a senhora – disse a empregada.
– Você sabe que dinheiro não é um problema para nós, querida – disse minha mãe, e a senhora concordou com a cabeça. – Vamos fazer assim, vamos cobrar vinte por cento do seu salário, sem mais nem menos.
– Temos um acordo? – A voz do meu pai se fez ouvir pela primeira vez. – Não aceitamos um não como resposta.
– Eu vou aceitar, pois meu menino quer muito ir estudar na capital. Vou até falar com ele, e sei que Felipe ficará muito agradecido – disse de forma emocionada. – Muito obrigado mesmo pela ajuda e pela força que vocês sempre me dão.
– Somos amigas, e amigas estão aqui para se ajudar, Juçara. Qualquer problema, pode contar comigo e com minha família – indagou minha mãe. – Isaac não tinha nada para falar.
Concordei com a cabeça. Até agora, não havia dito nada, apenas me virei para Juçara e lancei um sorriso.
– Queria pedir desculpas por escutar a sua conversa com o Marcelo.
– Capaz, meu garoto, você está me ajudando – disse, me dando um sorriso.
Fiquei realmente feliz em ter ajudado ela. Juçara levantou-se e foi até a cozinha, visivelmente animada. Todos nós rimos, e, se minha irmã estivesse aqui, já teria feito uma festa. Só de pensar em minha irmã, senti saudades. Maldita hora em que ela se casou com um francês e se mudou para Paris.
Pela parte permaneci em casa. Carla até me convidou para ir até a praia, mas não queria sair e também queria ficar um pouco afastado daquela menina, pelo menos durante essa semana. Só de pensar nela, ficava irritado. Eu precisava terminar com ela, antes das aulas começarem em março, e assim evitaria mais estresse vindo dela e daqueles amigos insuportáveis que vivem sugando meu dinheiro.
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Atualizado até capítulo 40
Comments
yaoimaniac
Mais você ajudou... tirar o corpo fora agora é senvergonhice.
2024-08-16
1
Davi._Lcs
Ainda vou fazer a mesma coisa que ela
2024-05-18
2
Davi._Lcs
Deveriam ter maus patrões como os pais do Isaac
2024-05-18
0