Chances

Agora tudo começava a fazer sentido. A percepção de que não havia sido um acaso ter me deparado com Miguel, de que ele já estava à minha espera, me atingiu como um soco no estômago. As suspeitas de que ele me seguia, que estava sempre por perto, foram confirmadas. As peças do quebra-cabeça se encaixavam, revelando um quadro que eu não podia ignorar. Era uma mistura complexa de sentimentos que preenchia meu coração. A raiva, a frustração e a tristeza se entrelaçavam em uma teia de emoções difíceis de desembaraçar. Eu não conseguia negar que Miguel havia se esforçado para proteger-me, mas ao mesmo tempo, o fato de ter sido mantida no escuro sobre tantas coisas me deixava magoada. Sair da empresa naquele momento era como carregar um fardo pesado. Cada lembrança, cada momento compartilhado com Miguel, agora tinha uma sombra de desconfiança pairando sobre ele. Cada sorriso, cada palavra bonita, cada gesto de afeto, tudo ganhava um novo matiz, e eu me sentia perdida em um emaranhado de emoções conflitantes.

Nos últimos dias, mergulhei de cabeça no trabalho. Era uma forma de me refugiar das turbulências emocionais que a revelação sobre Miguel trouxe à minha vida. Minha dedicação era redobrada, focando em colocar nossa empresa de volta ao topo. Estudei estratégias, desenvolvi novas diretrizes e reorganizei a estrutura da empresa. Muitos notaram a minha mudança, comentando que eu estava novamente sendo a "Ellen fria", sem muitas palavras e completamente focada no trabalho.

Naquela reunião, a atmosfera estava tensa. Todos os olhos estavam sobre mim, esperando minha avaliação sobre a apresentação que tinha sido feita. Um dos diretores concluiu a sua fala, e eu não consegui conter minha indignação.

-Este é o tipo de apresentação que você tem orgulho de me mostrar? - Minha voz ecoou na sala. - Está horrível. Refaça tudo de novo.

O choque tomou conta da mesa, e percebi que a minha reação tinha sido intensa. A frustração que estava acumulada em mim transbordou naquele momento, e eu não conseguia mais disfarçar a minha insatisfação com mediocridade. A urgência do tempo não me importava; eu estava determinada a fazer as coisas certas.

Um dos presentes tentou argumentar: "Mas senhora, não temos tempo..."

Minha paciência estava no limite. Levantei da minha mesa, minha expressão refletindo a determinação de fazer o melhor.

-Se virem! - declarei, enquanto saía da sala de reuniões.

Conforme me afastava, pude ouvir sussurros e murmúrios entre os presentes. Alguém comentou: "O que aconteceu com ela?" E outro respondeu em tom conspiratório: "Acho que tem a ver com o senhor Lewis."

Minha mente estava repleta de pensamentos e conflitos. Enquanto eu mergulhava nas minhas responsabilidades como CEO, o dilema pessoal com Miguel continuava a me atormentar. Eu sabia que precisava encontrar um equilíbrio entre as duas facetas da minha vida, mas no momento, o foco estava em resgatar a nossa empresa e reconquistar o meu senso de controle.

Andei pelos corredores da empresa, com Roger me informando que minha irmã estava me esperando em sua sala. Entrei e a vi lá, concentrada na leitura de uma revista.

-Você por aqui. - Cumprimentei-a com um abraço afetuoso.

-Vim verificar se minha irmã fria e calculista finalmente voltou à ativa. - Ela respondeu com um sorriso travesso.

-Parece que estou sendo o centro das atenções, então. - Comentei, com um toque de ironia.

-Bem, agora pelo menos eles têm um motivo real para especular sobre a sua mudança de comportamento. - Ela riu, deixando a revista de lado.

Nossa descontração rapidamente cedeu espaço a uma conversa mais séria. Sentamos, e eu não pude evitar compartilhar meus sentimentos com ela.

-Sabe, eu me arrependo de ter me envolvido com um funcionário. - Suspirei, sentindo o peso das minhas próprias decisões.

-Não se culpe tanto, Ellen. As coisas nem sempre são tão simples como parecem. - Ela me tranquilizou, focando em mim com atenção.

Minha irmã sempre soube me confortar e me dar perspectiva. Em meio à turbulência emocional que eu estava enfrentando, suas palavras eram um alívio. Apesar dos obstáculos que estavam diante de mim, eu sabia que não estava sozinha.

-Eu só queria que as coisas fossem mais claras. - Confessei, soltando um suspiro.

-A vida raramente é assim, Ellen. Você tem a força para lidar com o que vier pela frente. E lembre-se, estou aqui para apoiar você, não importa o quê.

Eu olhei para minha irmã, sentindo uma onda de gratidão e emoção. Ela era minha rocha, alguém em quem eu podia confiar plenamente. Enquanto eu navegava pelas consequências das minhas escolhas, sabia que minha irmã estaria ao meu lado, guiando-me através das tempestades e me lembrando de que sempre haveria uma luz de esperança no fim do túnel.

-A propósito, Ellen. - Ela falou, desviando a conversa de forma sutil. - Acho que você deveria conversar com o Miguel.

-Conversar com aquele cretino? - Fui rápida em retrucar.

-Você pode chamá-lo do que quiser, mas eu sei que você o ama.

-Ele me enganou! - Exclamei com frustração.

-Ele fez o que fez por um motivo, Ellen. Enquanto o Vicenzo, bem, ele parece ter suas próprias razões obscuras para suas ações. - Beatriz respondeu, escolhendo suas palavras com cuidado.

-Eu não quero mais discutir esse assunto, Beatriz. Eu não quero ouvir mais sobre Miguel. - Fui firme em minha decisão.

Beatriz olhou para mim, seu olhar cheio de compreensão e preocupação.

-Minha irmã, você deveria escutar o seu coração. Talvez seja hora de dar uma chance para a conversa com ele, para entender tudo o que aconteceu. Às vezes, a verdade é mais complexa do que imaginamos.

Suspirei, sentindo-me dividida. Ouvir minha irmã fazia todo o sentido, mas as emoções tumultuadas e as cicatrizes do passado ainda me atormentavam.

-Eu sei que você quer o melhor para mim, Beatriz. Mas, neste momento, tudo é tão confuso. Eu só preciso de um tempo para clarear minha mente antes de tomar qualquer decisão.

Minha irmã assentiu, respeitando meu desejo. Era reconfortante saber que ela estava ali para me apoiar, independentemente do caminho que eu escolhesse seguir. Enquanto o dilema com Miguel persistia, eu sabia que podia contar com Beatriz para me ajudar a encontrar a clareza que eu tanto necessitava.

Fiquei remoendo as palavras de minha irmã, apesar de relutante em aceitar, era difícil negar que o amor ainda estava presente. Enquanto eu ponderava, a chuva começou a cair lá fora, primeiro timidamente e depois em uma forte tempestade. Pessoas começaram a correr para se abrigar, e eu me vi observando as gotas de chuva escorrendo pelas janelas.

O trânsito rapidamente se tornou caótico com a chuva intensa. Enquanto eu olhava para a confusão lá fora, algo chamou minha atenção. Era Miguel, correndo com seu filho nos braços, procurando abrigo da chuva. Um conflito interno se formou dentro de mim. Parte de mim queria ignorá-los, continuar minha jornada como se nada estivesse acontecendo. No entanto, uma voz interna insistia para que eu fizesse algo.

Roger, o motorista, percebeu minha hesitação e olhou para mim pelo retrovisor. Eu fiz um sinal para ele seguir na direção de Miguel e seu filho. O carro parou ao lado deles, e abaixei o vidro.

-Entre no carro. - Eu disse, minha voz carregada de preocupação.

-Não precisa. - Miguel respondeu, hesitante.

-Seu filho pode ficar doente nessa chuva. Entre, por favor.

Os olhos de Miguel encontraram os meus, e eu podia ver a hesitação e a gratidão em seu olhar. Ele então assentiu e, com cuidado, entrou no carro com seu filho nos braços. O pequeno estava encolhido, tremendo um pouco do frio e da chuva.

Eu observei Miguel e seu filho por um momento, percebendo o quanto as coisas haviam mudado desde a última vez que nos vimos. Uma parte de mim ainda estava cheia de ressentimento e dúvidas, mas outra parte estava aberta à possibilidade de uma conversa. Enquanto o carro se movia, eu me perguntava se o destino estava nos dando uma segunda chance para esclarecer as coisas, para entender o que realmente aconteceu e se o amor ainda tinha um lugar entre nós.

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Comments

Silvaneide de lima barbosa Silvinha

Silvaneide de lima barbosa Silvinha

Não acredito que ela vai o perdoar tão facilmente

2023-10-21

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