O apartamento era ainda mais sem graça que a loja, todos os
móveis eram velhos, não de um jeito vintage e legal, a casa tinha cheiro de
naftalina e mofo, ao reparar nas janelas entendi o motivo, todas estavam
bloqueadas por madeira.
- Acho que ele tinha medo de alguma coisa.
- Isso é bem comum aqui – Tyler entrou com o cachorro nos
braços, mesmo o carregando escada acima e o cachorro pesar uns trinta quilos, ele
nem estava ofegante.
- Barreiras nas janelas?
- Sim. Pode forrar aqui?
Tirei a manta do sofá a dobrei em dois e coloquei no chão,
no canto mais escuro da sala.
- Por que as pessoas fazem isso?
- Tem muitos avistamentos de ursos na região.
Me aproximei da janela e olhei para baixo, a parede era reta
e lisa.
- Não faz sentido\, um urso não teria como entrar aqui –
voltei e me esparramei na poltrona ao lado do cachorro, me sentia exausta.
- Bem\, talvez o velho Collins estivesse ficando senil. Sabe
do que ele morreu?
- Não. Você sabe?
Tyler sorriu, um sorriso aberto que me deu uma visão
perfeita de seus dentes brancos, com caninos bem salientes.
- Era o sua avó\, não meu.
- Eu sim\, mas você o conhecia.
- Um infarto\, na poltrona. É o que dizem.
Me levantei rapidamente, com um salto.
- Deus. Por que não disse antes?
- É só uma poltrona. Bem\, eu preciso ir agora.\, Venho
examinar o cachorro mais tarde.
- Mais uma vez obrigada\, foi uma sorte encontrar um
veterinário tão rápido.
- Eu não sou veterinário\, tenho uma pecuária. Salvar o cão é
o contrário do que fazemos.
Suas palavras me deixaram em choque, completamente
incrédula.
- Mas você operou ele.
- Se aprende muita coisa morando em uma fazenda.
Ele se abaixou para dar uma última olhada no animal. Eu
tinha muitas perguntas, uma delas era porque tinha um consultório equipado ao
lado da sua sala de estar?
Mas eu sabia que não devia questionar muito um homem daquele
tamanho, estando em desvantagem e em um lugar que eu não conhecia.
- Você vai voltar andando?
- Vou\, eu corto pela floresta.
Abri a porta e o deixei descer na frente.
- Mas com tantos avistamentos de ursos\, não pode pegar um Uber?
- Nada de Uber por aqui\, nem Ifood. Sinto muito.
- Bem\, por sorte tem comida o bastante aqui.
Ele fez uma cara de nojo engraçada que me fez rir.
- Faz dias que o velho Collins morreu\, acho que nada aqui
presta.
- Tem razão. Você vem amanhã? – odiei como minha voz pareceu
ansiosa.
- Talvez\, ´para ver os pontos. Mas me manda uma mensagem se
ele piorar.
Peguei o celular no bolso da calça jeans e estendi para ele.
Tyler o pegou e levantou a sobrancelha.
- Férias na praia? – ele sorriu.
Eu podia ter colocado na agenda antes de dar o celular a
ele, mas gostava da foto de biquini de papel de parede e queria ver a reação
dele. Tyler colocou o número dele e mandou um ‘Oi’ para si mesmo.
- Assim posso salvar seu número também.
- Nada de Instagram?
- Eu não uso redes sociais\, gosto da vida simples e isolada.
- Isso é fofo.
- Eu sou um cara fofo – Tyler piscou\, sorri tímida e assim que
ele saiu, fechei a porta á chave.
Eu não tive tempo de olhar a rotisseria muito bem, mas achei
tudo cafona e antiquado, subi correndo e entrei no apartamento, fechei a porta
e passei a chave, só então notei a quantidade de trincos acima e abaixo da
maçaneta, eram oito no total.
- Caramba\, ele queria mesmo impedir que alguém entrasse.
Aquilo me deu arrepios.
O cão resmungou e me aproximei, acaricie sua cabeça para que
se mantivesse calmo.
- Tá tudo bem\, um não veterinário cuidou de você.
Ele rosnou baixinho, com a cabeça caída, olhando fixamente
para a entrada do corredor, olhei por cima do ombro, não havia nada ali além de
escuridão.
Me levantei devagar e sem parar de olhar para o corredor,
chamei.
- Olá?
Me senti ainda mais idiota por fazer isso, o cão não estava
vendo nada, ele estava dopado. Só isso. Mesmo assim, eu que não ia até lá.
Peguei a manta no outro sofá e me sentei com o cachorro.
- Posso dormir aqui com você? – o acariciei e ele lambeu
meus dedos devagar – acho que vou te dar um nome, já que vai se hospedar aqui,
preciso te chamar de alguma coisa.
Reparei no seu pelo escuro como bréu, os olhos castanhos
claros, as orelhas pontudas. Então me
lembrei de Tyler e decidi o nome perfeito.
- O que acha de Angus?
O cão piscou e para mim isso foi um sim.
Peguei o celular e abri a agenda, troquei o nome Tyler
Montgomery por Ty.
- Estou sendo muito emocionada? – mais uma vez ele piscou\,
mas dessa vez decidi que era um não – ele foi bem legal com a gente. Mas
parecia um pouco nervoso, não acha?
Repassei os acontecimentos do dia, me lembrando das alucinações
que tive após o acidente. Abri o Google e pesquisei “alucinações depois de
bater com a cabeça”. Dezenas de resultado para concussão.
- Acho melhor não dormir\, vou ao médico de manhã.
Liguei a tv, nada passando nos canais abertos e para ajudar,
não era Smart, o corredor escuro continuava me assombrando. O celular vibrou com
uma mensagem de Tyler me dando o maior susto.
“Desculpe, esqueci de dizer para dar analgésicos ao cão a
cada seis horas.”
“O nome dele é Angus, agora. Vou fazer isso.”
Era algo para me ocupar, abri a bolsa e tirei um comprimido
para dor de cabeça, esperando que fosse forte o suficiente. Tyler não respondeu
mais, me concentrei na tv, um episodio antigo de Os Simpsons. Acabei dormindo.
Quando acordei, Angus se contorcia e chorava copiosamente.
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Atualizado até capítulo 80
Comments
Sueli Parajara Bento
estou gostando
2024-01-17
0
Maria Izabel
espero que ela encontre a resposta dos avós e da família dela antes que maltratem ela principalmente que ela tbm é uma loba
2023-09-21
5
Dalva Ferreira Rocha
bom acho que entendi o porquê do velho lobo ser observado por a família Collins e em especial a Martha ela carrega o poder de destruir a raça do Tyler e coitada dela nem sabe nada tomara que ela descubra logo toda verdade da origem dela só assim ela poderá se defender.👀👀👀👀👀😱😱😱
2023-04-13
0