_ Que livro horroroso!
Exclamou Marina jogando o livro velho surrado contra a parede do quarto.
_ Ainda está perdendo tempo com esse livro mórbido?
Perguntou Francisca fazendo uma careta de desgosto olhando para o pequeno livro de capa azul de veludo surrado.
_ Em minha defesa digo que fui obrigada a ler essa porcaria pelo professor de direito penal.
A jovem fez uma careta ao lembrar do homem de óculos de tartaruga arrogante.
_É isso que você tem a dizer?
Falou Francisca sentando na frente da amiga abraçando o seu próprio livro da mesma aula sorrindo.
_ Eu não tenho culpa, disse a ele que gostava de drama, mas ele me entregou a essa porcaria de livro que narra a história dessa desgraça de Teresa, a cantora da corte portuguesa.
_ Você está sendo cruel com a pobre.
Sorriu Francisca ao lembrar da trágica história da garota que morreu antes de completar os 20 anos de vida.
_ Ela era uma paspalha, deixava todas abusarem dela. A madrasta a surrava, torturava com a ponta de deixar a pobre passar fome, o perceptor abusava dela com pretexto de lhe ensinar lições sobre o sexo, o pai transferiu para ela a raiva de ter perdido a esposa em seu nascimento. E para piorar a situação ela foi obrigada a se casar com o bobo do Joaquim e morreu em suas mãos por ciúmes. Ela devia ter lutado por sua liberdade por sua vida.
Marina indignada com a situação já que em sua ótica jamais permitiria sofrer tamanhos abusos pelos quais Teresa passou.
Francisca bateu palmas e sorrindo falou para amiga:
_ Pronto, amiga, conseguiu chegar no ponto que o professor queria. Defenda esse seu ponto de vista no debate hoje na aula na universidade. Vamos, ver o que ele vai lhe dizer sobre seus argumentos.
Ambas se arrumaram correndo e seguiram para a universidade no centro de Lisboa, Marina estava irritada, pois havia perdido quase uma semana na leitura daquele livro horroroso que narrava a saga da pobre Teresa. Subiram as escadas correndo entre risos e brincadeiras, chegando atrasadas no grande salão de debates, Marina e Francisca sentaram no fundo da sala ouvindo as primeiras enfrentamentos nos quais as pessoas debatiam seus argumentos sobre o livro lido anteriormente.
Francisca conseguiu vencer o seu debate defendendo o ponto de vista dos direitos humanos dos escravos e do mal gerado pelo período de escravidão no Brasil.
_Marina é a sua vez.
Falou o professor de maneira autoritária, a jovem marchou para o púlpito com o olhar de desgosto já que teria que defender Teresa das acusações de egoísta e de não ter sentimentos.
A jovem Patrícia, sua oponente, sorriu, pois seria fácil defender sua tese de que Teresa não passava de uma alpinista social que usou do casamento com Joaquim para ter acesso a corte e se tornar a nova amante do príncipe real.
Marina ouviu os argumentos da jovem que vinham de encontro com o seu modo de pensar. Para o seu desespero concordava com toda a fala da garota.
_ Marina tendo a dizer a respeito de Teresa?
Perguntou o professor cruzando as mãos sentado à frente de ambas, anotando tudo que lhe era importante naquele debate.
_ Teresa foi uma vítima da sociedade patriarcal do período colonial, a jovem foi criada em um regime de tortura e privações de toda sorte como sono, alimentação e afeto. Seu pai a usou como um meio para ter acesso à classe emergente dos comerciantes, estabelecendo assim pactos comerciais a custa da vida de sua filha. Já seu casamento com Joaquim foi um erro, já que o rapaz não passava de um garoto imaturo e mimado a ponto de misturar os sentimentos de amor e paixão. Quebrando seus votos com a cabocla Jacira dando fim a esposa por puro ciúmes.
_Você está errada, ele não matou Teresa por ciúmes, mas por vê-la nos braços do Príncipe em pleno ato de adultério. Sendo um crime de honra.
Falou Patrícia de maneira arrogante.
_Como vai rebater os argumentos de Patrícia?
Perguntou o professor extasiado com discussão que se fazia no meio do palco.
_ Joaquim foi um covarde, alegou o crime de honra, mas, na verdade, queria se ver livre de Teresa para poder viver com sua cabocla. No dia do crime o seu pai o havia ameaçado e aprendido sua amante no galpão no porto. A morte de Teresa não passou de um meio para ele encontrar a liberdade e viver sua paixão longe das consequências de ter casado no impulso de uma paixão.
O professor bateu em palmas, pois pela primeira vez alguém havia defendido Teresa de forma exemplar.
No findar da aula, um a um dos estudantes deixavam a sala escura, somente Marina e Francisca recolheram os seus pertences quando o professor fitou Marina a chamando:
_ Parabéns pelos argumentos utilizados, você foi a primeira a ver a inocência em Teresa.
Disse o homem feliz, o rosto de Marina se encheu de raiva e sem se aguentar ela contou um segredo:
_ Teresa era fraca e dissimulada, tudo o que aconteceu com ela foram consequências de seus atos. Concordei com cada um dos argumentos de Patrícia, somente defendi Teresa como a boa advogada que serei.
O professor fitou o rosto da moça com tristeza chacoalhou a cabeça falando em seguida:
_ Se você estivesse no lugar dela, o que faria?
Perguntou o homem curioso.
A jovem fitou com o olhar duro e falou:
_ Faria tudo diferente.
_ Tem certeza do que diz?
Perguntou ele com brilho estranho no olhar.
_Claro.
_ Com licença professor, mas eu e eu e Marina temos uns compromissos inadiáveis, agora estamos atrasadas.
Disse a jovem sorrindo.
_ Vão, minhas meninas não as prenderei mais nessa conversa tola.
As jovens saíram a correr porta fora.
_ Não entendi porque ele perguntou aquilo para você.
Disse Francisca correndo ao lado da amiga para não perder a carona que as levariam ao trabalho no restaurante no porto. Já que o carro havia sido levado para manutenção.
Eu não sei, mas achei estranho.
_Agora trocando de pato para ganso, adorei a defesa que fez de Teresa, calou a boca de todos que justificavam a sua morte.
_ Sinto lhe dizer, mas concordo com todos os argumentos utilizados por Patrícia.
Francisca parou e fitou amiga.
_ Um dia vai se arrepender do modo que pensa, falou a garota angustiada.
_ Aí que você se engana, essa história já está morta e enterrada e nada pode mudar o passado, não é!
Disse Marina de maneira debochada correndo para a porta que dá acesso à rua, levantando os braços desesperada sinalizando para o carona que as esperava.
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Atualizado até capítulo 80
Comments
Souza França
poxa! é tão óbvio!🧐🤓
2024-06-03
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Souza França
mais tem um porém: neste período de época, as mulheres ñ tem voz, direito de escolha, liberdade de expressão, são vistas apenas como assessórios e máquina de gerar filhos e de prazer!!
2024-06-03
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