Semanas se passaram desde o ocorrido e Mike ainda estava inconsciente, mas Ametista estava confiante que ele acordaria uma hora ou outra. Ela ia para casa trocar as roupas, voltava e fazia uma fisioterapia a seu modo com ele. Movia as suas pernas e braços, e as vezes brincava com a cama.
Mike estava ali, ouvindo a moça cujo a voz ele já havia se habituado, lutando sem conseguir abrir os olhos para ver quem foi a alma simples e bondosa que salvou a sua vida, e sem obrigação alguma ainda estava lá para ele diariamente e até chorava por ele.
Ele só podia ouvi-la e retribuir com alguns reflexos, os quais eram suas tentativas frustradas de se mover. Ele queria acordar, sair daquele pesadelo que voltava sempre a sua mente... A mulher que ele pensou ser seu amor, num sexo violento e doentio com o homem que ele julgava ser quase um irmão. Sendo agredido por dois dos seus homens.
A vergonha, o ódio, a mágoa e humilhação ainda estavam corroendo o corpo dele. Ele não queria confiar em mais ninguém. Natasha também parecia doce e confiável, e olha o que fez, tramou com o amigo para lhe trair e roubar. Ele ouvia ela cantando e queria sorrir, mas não podia.
A voz de Ametista o encantou e o acalmava desde que a ouviu pela primeira vez. Era como o seu farol, mas ele ainda temia que fosse algum truque. As lembranças ainda eram vívidas na sua mente e acabaram bloqueando o que estava recebendo de bom.
Ele queria acordar e se vingar de todos. Ele precisava dar o troco em todos que o traíram para seguir em paz, e mesmo sem poder se mexer ou falar, ou sequer abrir os olhos e se alimentar, ele jurou que iria voltar para ver a sua vingança finalizada.
Ametista ficou olhando para Mike que fazia algumas expressões de desconforto e foi até ele.
— Mik, deixe esses pensamentos para lá. Tenho quase certeza que você está remoendo aquele dia. Eu estaria. Mas pense em você agora, em se recuperar. Acredito que deve ser um cara durão de coração mole, ou um filho da puta "cold heart" porque aquilo foi horrível de se ver. Eu sei que está com ódio, eu estaria. Mas... olha, deve haver alguém que se importa contigo, sentindo sua falta. Não sei se, depois de tudo o que passou, 'cê poderia confiar em mim e não lhe julgo, mas... eu me importo contigo, viu?! Promete que vai melhorar?
Mike apertou a mão dela com mais força e ela o beijou suavemente no rosto. Uma lágrima dela caiu no rosto dele e ele se mexeu um pouco, mas não conseguia abrir os olhos. Ele queria agradecê-la e conforta-la, mas seu corpo não obedecia. Olhando para ele se esforçando, ela teve uma ideia que lhe ajudaria na renda e facilitaria as visitas a Mike. Como recebera sua rescisão, guardaria metade e com a outra decidiu empreender.
— Mik, eu preciso trabalhar. Os médicos foram legais comigo me deixando ficar aqui com você esse mês, mas não posso ficar todos os dias aqui, por mais que eu queira. Prometo que venho te ver sempre. Semana que vem te trago uma calda de morango, já que você não vai poder comer os doces. Segredo nosso. Mas só se estiver melhor, combinado?! — Ela deu um beijo em Mike e saiu do quarto.
...***
...
Ametista chegou a um mercado popular e comprou tudo o que precisava para a produção de seus primeiros bolos de pote. Ela havia comprado um curso online e gostou muito das receitas que viu. Era só o início, mas ela estava ansiosa para começar. Alguns itens ela teve que pedir pela Internet, mas nada que fosse demorado. Com a agitação do dia ela até esqueceu da gravação que fez de Antônio a assediando.
Assim que chegou em casa foi testar algumas combinações e preparar alguns bolos para vender pela favela mesmo, se desse certo, ela iria começar a vender em outros lugares. Ela dançava e cantava enquanto fazia as coisas e isso dava a ela um charme inocente as vezes. Ela continuou a dançar e esqueceu o bolo no forno... o primeiro queimou.
— Merda, merda, merda! — ela gritou para si mesma rindo da ‘cagada’ que fez. — Desastre 7x0 para Ametista!
Por que fazer bolos para comer em casa é diferente de fazer bolos para vender? Ela limpou a testa com as costas das mãos e bufou. A calda de morango queimou duas vezes, a massa amanteigada se "amanteigou" demais... O brownie foi o único que ficou bom de primeira.
Com o laptop do lado, ela olhava as receitas e reproduzia. Depois de alguns bolos queimados e algumas coberturas "gororobentas", ela conseguiu pegar o jeito e conseguiu fazer alguns bolos. Ela se divertiu no processo e começou a pensar na marca dela... ela não era boa com nomes mas acharia um.
Ela fez uma lista com possíveis nomes e ficou analisando enquanto mais bolos eram assados. Uma batida no portão a assustou e ela foi ver quem era.
— Tô sentindo esse cheirinho de bolo da esquina, Linn. Eu quero! — Marcinha nem esperou ser convidada para entrar.
— Oi para você também! Entra, fica à vontade, quer um pedaço de bolo e chocolate quente? — Ametista resmungou em ironia e fechou o portão.
— Ai amiga, isso tá dando vontade de comer!
— Pode tirar a mão daí! Essas são as que deram certo, vão pra geladeira!
— Isso é maldade... tem alguma que não deu certo por aí?
— Tem... — Ametista pegou um pote de bolo meio bagunçado e entregou a amiga. — Toma.
— Porra, isso aqui não dá vontade de comer! — Marcinha olhou torto para o bolo, mas comeu. — Mas tá uma bagunça muito boa! Alegrou o meu dia, mesmo sendo bolo de segunda!
— Ah, ainda está reclamando?
— Isso não muda nada! Mas vai, me conta, já resolveu o b.o lá do restaurante? Eu posso te ajudar a voltar pra lanchonete se quiser.
— Tá vindo agora do trabalho?
— Sim, tava movimentado hoje. Mas não foge do assunto, para com essa mania de querer ser forte o tempo todo. Tu não me contou o que aconteceu direito lá. Tu gostava do trabalho...
— E tu aparece depois de um mês pra saber da situação. Se eu precisasse da sua presença para sobreviver... estaria morta e “esturricada” como dizia a minha avó.
— E o que significa “esturricada”? Não seria estarrecida?
— Não faço ideia. Ela tinha um vocabulário bastante peculiar.
— Ainda dando voltas... fala logo, Ametista!
— Antônio estava bêbado e me assediou. Veio com papo de promoção e que eu teria que agradá-lo para conseguir a vaga, mas ele tava doido de uísque. Deixa para lá.
— Claro! Para ele sair por aí fazendo isso com outras?! Ele parecia tão respeitador... precisa de um corretivo!
— Respeitador é uma ova! Ele tentou me humilhar e ainda queria ser agradecido por isso. — Ametista cruzou os braços fazendo beicinho. — Mas ele vai ter o que merece mais cedo ou mais tarde.
— Por quê? O que ‘cê fez?
— Gravei tudo! — Ametista deu de ombros.
— Como assim, doida?
— Antes de entrar na sala dele, eu coloquei o celular para gravar e escondi na calça. Ele me agarrou, eu chutei o saco dele e corri de lá. Ele praguejou e me demitiu.
— Amiga... vamos denunciar ele, você tem provas!
— Eu esqueci de fazer isso no momento certo. Inventei de vender bolos, fiquei estudando essas semanas e estou desde cedo aqui. Se eu fosse prestar queixa agora, ele inverteria a história a favor dele e alegaria que estou ressentida por ter sido rejeitada e quero prejudicá-lo com uma montagem fonográfica, o típico “porque não foi antes?” sabe como os homens são! Decidi trabalhar e deixar isso para lá, de qualquer forma, qual a probabilidade de eu voltar naquele restaurante? Meus bolos merecem mais atenção!
— Aliás, continua que até essa bagunça aqui tá deliciosa. Se começou hoje e está assim, imagina daqui a um mês.
— Ah! Que bom que gostou! Tenho que montar esses aqui ainda.
— Eu te ajudo!
Ametista e Marcinha ficaram montando bolos e brownies até tarde rindo e contando as novidades, mas Ametista não parava de pensar em Mike no hospital.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 207
Comments
Ivanete Oliveira
estou gostando da história
2023-05-10
1