Não me chame de "Carmono"

Entrei devagar para ouvir um pouco mais da conversa.

— Você perdeu o juízo? Ela é sua esposa, você deveria cuidar dela! Se acontecer algo com Fernanda será sua culpa, se prepare para as consequências, Benjamin! — Nunca vi Roberto tão alterado como naquele momento.

— Por que se importa tanto com ela? — Benjamin rangeu os dentes de raiva.

— Eu não entendo como você consegue ser tão insensível a esse ponto, ela não tem culpa de ser filha daquele homem, e muito menos entrou nessa família porque quis! Se não a ama, pelo menos seja mais amigável! Ela foi separada de sua família, a mãe dela está em perigo constante.

— Tsk, por que eu deveria me importar? Diferente da dela, a minha mãe já está morta! Quer que eu sinta pena? Quem está mais na lama do que ela sou eu!

Aquele era o momento perfeito para que eu agisse.

— Ele matou… — Apareci em frente a eles de repente.

— Fernanda, por que você está assim? — Noah me olhou preocupado.

— Lucius… e-ele matou a meus pais na minha frente… — Eu caí de joelhos chorando.

Eu não estava realmente atuando, já que realmente estava sentindo tanta dor. A diferença é que nunca fui do tipo de pessoa que demonstra o que sentia, mas naquele momento foi necessário. Roberto e Noah correram até mim, enquanto Benjamin ficou boquiaberto sem reação.

(Sim, isso é culpa sua, então pode se atormentar pelo resto da sua vida! Lembre bem do meu estado agora, pois foi você quem causou isso!)

Meus pais… Mesmo que Benjamin não tivesse intenção, ele acabou colaborando para essa situação. Eu também tenho culpa por ter tido esperanças de que seria tão fácil salvar a minha mãe, mas ainda sim…

— O que fizeram com você? Está toda machucada! — Noah tinha um olhar de pena evidente.

Odeio esse tipo de coisa, mas agora mais do que nunca eu precisava dessa pena.

— Quero ficar sozinha… -Não era particularmente mentira, afinal eu precisava de um tempo.

— Mas você está machucada!

— Noah, deixe ela ir! — Benjamin me olhou sério.

A mãe dele morreu também, certo? Provavelmente ele sabe como é a sensação de querer estar sozinha agora, mas ainda sim isso não me faz ter pena dele.

Eu me levantei e segui até o meu quarto. Queria apenas me jogar na cama, mas eu estava muito suja. Tomei um banho e tentei dormir. Meus sonhos foram mais como um tormento para mim, diversas vezes precisando aquela cena em que Lucius tirava a vida dos meus pais.

Eu estava completamente acabada de verdade, e isso me deixou indisposta. No dia seguinte, havia um uniforme novo aos pés da minha cama. Pensei na minha privacidade, e comecei a deixar a porta sempre trancada. Por uma semana, não saí do meu quarto, as empregadas batiam na porta e deixavam algo na bandeja para mim em frente a porta. Às vezes eu pegava algo leve, e outras vezes nem mesmo me alimentava. Noah e Roberto apareciam todos os dias tentando me fazer sair.

Eu estava desanimada, mas ainda determinada a me vingar. Esperei o momento exato para continuar, que seria quando Benjamin finalmente me procurasse. Uma semana foi o tempo que ele precisou para aparecer. Ele bateu na minha porta levemente, e sua voz estava baixa e hesitante.

— Podemos conversar? Se não quiser abrir a porta, tudo bem, posso falar daqui…

Esperei mais ou menos dois minutos até abrir a porta.

Ao me olhar, Benjamin ficou surpreso. Claro, eu estava com olheiras, despenteada e com pijama. Ele olhou para o meu quarto, que estava propositalmente bagunçado.

Espalhei roupas pelo chão e pela cama.

— Posso… entrar?

Acenei com a cabeça. Benjamin entrou, fechando a porta atrás dele.

— Você… precisa de alguma coisa? — Ele quase caiu com as roupas presas no pé.

(Valeu a pena jogar até as roupas que nunca usei no chão.)

— Não… — Minha resposta foi curta, e eu evitei olhar para ele.

— Você poderia comer alguma coisa? Está mais magra, pode acabar ficando doente.

— Não precisa fingir que se preocupa comigo, está tudo bem…

— Eu não estou fingindo… Quero me desculpar por deixar você sozinha naquele dia…

— Quem mandou você aqui? Seu pai? Não preciso de desculpas irreais, não é sincero, então não posso aceitar.

— Fernanda, eu estou sendo sincero. Realmente me arrependo daquilo, eu tratarei você melhor!

“Tratar melhor”, aquilo não mudaria nada. Ele tentou pegar minha mão, mas eu a puxei.

— Vai embora, por favor! — Olhei para baixo, e ele não relutou e saiu.

Esperei mais três dias, e finalmente saí do quarto. Vesti meu uniforme e fui tomar café, esperando que os três estivessem lá. Quando cheguei, todos me olharam surpresos. Benjamin se levantou e puxou a cadeira para mim. As atitudes de Benjamin demonstraram que ele claramente estava fazendo isso por culpa e pena, já que ele também perdeu a mãe.

Eu não agradeci, apenas fiquei em silêncio. Os três tentaram puxar assunto comigo, mas minhas respostas foram bastante curtas. Comi bem pouco, já que não estava com fome. Provavelmente me acostumei a comer menos do que antes. Sendo a primeira a terminar, pedi licença para me retirar, mas…

— Espera, eu levo você para a escola! — Benjamin levantou com tudo e correu até o meu lado.

— Ah, sim. Acho que não tenho mais nenhum familiar para perder se eu ir com você.

Ao ouvir minhas palavras, ele ficou constrangido e envergonhado.

— Vamos… — Ele puxou meu braço me levando devagar até o carro.

Eu ia entrar atrás, mas Benjamin abriu a porta da frente para mim.

— Você não vai buscá-la hoje? Não quero me intrometer na sua relação…

— Conversei com ela antecipadamente, Dayse pode esperar um pouco.

Eu me sentei e olhei para fora o caminho todo. Pude sentir que ele estava me observando. A turma inteira pareceu surpresa ao ver Benjamin e eu entrando juntos. Dayse apenas revirou os olhos.

— Ei, Carmono, onde esteve? Fiquei preocupado com você… — Dylan correu até mim, e me levou até o nosso lugar.

Benjamin ficou nos observando, mas eu apenas o ignorei.

— Poderia não me chamar por esse nome, por favor? — Não sei que expressão eu tinha, mas Dylan realmente pareceu entender que tinha algo errado.

— Ah… ele veio realmente com você hoje, hein… Talvez esteja criando sentimen-… — Eu o interrompi.

— Não, ele não tem sentimentos por mim, somente pena e mais nada. Dylan, eu não estou me sentindo bem, então tomarei um ar.

Assim que me levantei para sair, Benjamin pareceu querer me seguir, mas Dayse o puxou de volta.

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