A tatuagem

-Acho melhor você tatuar alguma coisa que você vai gostar de olhar porque você vai vê-la todo dia para o resto de sua vida.

-Você fala por conhecimento próprio ou é só conversa?

-Minhas amigas que tinham tatú quase sempre estavam fazendo uma por cima da outra porque enjoaram da figura tatuada.

-Como assim por cima?

-Por exemplo, o Flamengo ganha, elas vão lá na empolgação e tatuam o símbolo do time. Daí passa um tempo e o Flamengo volta a ser derrotado, elas vão lá, escolhem outro desenho que se encaixa no símbolo que foi tatuado e mandam fazer, uma tatu encobre a outra.

-Entendi.

Rodrigo resolveu se meter na conversa.

-Você poderia ter usado outro exemplo, como assim alguém vai desistir do time do coração?

-Você ainda é Flamenguista?

-Claro que sou, não consegui assistir ao jogo, mas sei que ele ganhou a Copa do Brasil, acho que me deu vontade de tatuar o símbolo do Flamengo, onde você me indicaria.

-Se ainda me lembro bem, você morre de medo de agulha, acho melhor esquecer essa ideia, dói muito.

-Filha, você tem uma tatuagem?

-Quando você foi embora, passei uma fase rebelde e achei que fazer uma tatuagem era um símbolo de rebeldia, quase saí da mesa no meio de tanto que dói.

-E onde você fez? Deixa eu ver?

Olhei para os dois e, como vou dizer que minha tatuagem é perto da minha virilha, eu estava rebelde, mas não queria que todos vissem, vou mudar a conversa.

-Esqueçam isso, vamos voltar falar de música?

-Rodrigo, se ela não quer nos mostrar, é porque deve ser em um lugar secreto.

-Ou arrependeu do que tatuou e agora tem vergonha.

-Parem ambos, eu não tenho vergonha, só não quero falar disso.

-Deixa o Max fora disso, só conta para mim, se você não quer falar o lugar, diz pelo menos o que você tatuou.

-Tudo bem, fui até o ouvido do meu pai e falei.

Rodrigo arregalou os olhos e colocou a mão na boca, deixando Max ainda mais curioso. Eu tatuei uma rosa na lateral da virilha esquerda não é nada de mais, mas Rodrigo fez parecer que é uma obscenidade.

-Quer dizer que agora vocês vão guardar um segredo de mim! Eu não tenho o direito de saber em que lugar está a sua tatuagem, mas ele tem!

-Ele é meu pai, e pode saber o local e, se quiser ver, eu deixo, mas você não.

Quando olhei para Rodrigo, estava me encarando e com um sorriso bobo.

-O que foi? Por que está com essa cara como se tivesse ganho na loteria?

-Porque foi assim que me senti agora, você me chamou de pai!

-Não chamei, eu só disse que você é meu pai, é bem diferente.

-Então, fala de novo que quero ouvir você dizendo que sou seu pai, meus ouvidos ainda não entenderam.

-Você é meu pai.

-Continuo aqui e continuo indignado pela falta de confiança.

-Max, um dia você conquista a confiança dela e vai ver a tatuagem, eu tenho certeza.

-Pai!

Rodrigo deu um pulo da cadeira.

-Você ouviu Max? Agora ela me chamou de pai. Fala, meu amor, minha filha querida.

-Você deveria me defender dos garanhões e não me jogar no colo do primeiro que aparecer.

-Você tem toda razão, Max, depois você vai ao meu escritório que quero ter uma conversa de homem para homem com você.

-Não foi isso que eu disse, você deveria pegar sua espingarda e afastar os homens de mim.

-Se eu fizer uma coisa dessas, nunca terei netos, não importa se é menino ou menina, vou levar cavalgar, mostrarei os animais e ensinarei a respeitar a todos. Só não vou apresentar o Zulu porque ele sabe ser agressivo e, se machucar meu neto, vou ter que colocá-lo de castigo.

-Acho melhor eu voltar ao trabalho, vocês não têm jeito.

-Espera, Lola, faltam dois viveiros para te mostrar.

-Podemos deixar para amanhã? Quero dar uma boa olhada nas Harpias e depois vou ver se a Susi precisa de ajuda.

-Podemos! Então, vou te acompanhar até o viveiro das Harpias.

-Não precisa, sei ir até o viveiro sozinha.

Fiquei olhando Lola se afastando e Rodrigo me disse:

-A música é do Roupa Nova “Volta pra mim”

-Como ela pode ser tão bonita?

-É minha filha! Você esperava o quê? Sou um Deus grego.

-Só se for depois de uma guerra, ela deve parecer com a mãe dela, você é feio, barbudo e está ficando gordo.

-Veja como fala comigo, vou ser seu sogro, isso se você tiver competência para conquistar minha filha, senão acho que vai ser o Maycon.

-Arranco os olhos para não dizer outra coisa do idiota que se atrever a tocar em um fio de cabelo dela.

-Vou te dizer uma coisa e agora é sem brincadeira, se você não conquistar minha filha e ela escolher outro homem você vai ter que aceitar e ainda tratar bem o caboclo, porque você vai passar a ser só o meio-irmão dela.

-Vou conquistá-la, não precisa se preocupar.

-Eu não estou preocupado, quem tem que se preocupar é você, que pode perder a mulher mais linda das redondezas e vê se usa a música a seu favor.

-Como você me aconselha usar isso a meu favor?

-Faz uma roda de viola e canta a música para ela ou convida Lola para cantar com você, será que vou ter que te ensinar a paquerar uma mulher? Nunca te vi com esse tipo de problema, elas sempre correm atrás de você.

-Lola, é diferente, como você fez para conquistar a mãe dela?

-Foi ela quem me conquistou, ela fazia faxina no meu apartamento e um dia ela me pediu em namoro.

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