capítulo 16_18
Cecy abaixou o olhar, como se o vazio ao seu redor pudesse esconder as lembranças que vinham como uma tempestade. A voz dela soava quase como um eco, carregada de dor e humilhação.
– A escola... – começou, a voz tremendo levemente. – Era o pior lugar para mim. Você pensaria que, sendo uma criança sem pais, as pessoas seriam mais gentis. Mas não. Era como se isso fosse um convite para que me tornassem alvo.
Ela respirou fundo, tentando manter a calma.
– Sempre começava com coisas pequenas. Comentários que pareciam inocentes, mas que doíam mais do que qualquer coisa. "Ah, ninguém foi te buscar de novo?" ou "Você deve ter feito algo muito ruim para seus pais terem te deixado."
Cecy fechou os olhos, as palavras ecoando em sua mente como se ainda fossem ditas naquele momento.
– No começo, eu tentava ignorar. Sorria, fingia que não doía. Mas as risadas vinham. Sempre vinham. E, com elas, os apelidos. "Órfã Cecy", "a menina que nem os pais quiseram". Eles diziam isso rindo, como se fosse engraçado.
Ela fez uma pausa, respirando fundo antes de continuar.
– Um dia, no recreio, uma menina puxou minha mochila e começou a jogá-la de um lado para o outro com os outros. Eles riam enquanto eu corria tentando pegá-la de volta. Quando finalmente consegui, ela gritou: "Por que está chorando? Vai chamar sua mãe? Ah, espera, você não tem uma!"
Cecy riu amargamente, mas as lágrimas começaram a escorrer.
– Eu queria gritar, queria dizer algo, mas a verdade é que eles estavam certos. Eu não tinha ninguém. E era isso que doía mais. Não ter ninguém para correr, ninguém para me defender. Eu era só eu. Sempre só eu.
Ela passou as mãos pelo rosto, enxugando as lágrimas que caíam sem controle.
– Eu lembro do professor dizendo que era só brincadeira, que eu devia ser mais forte. "Crianças são cruéis", ele dizia. Mas eu me perguntava: por que só comigo? Por que eu parecia carregar um alvo nas costas? Só porque era uma órfã?
Cecy apertou os punhos, a dor transformando-se em uma mistura de raiva e tristeza.
– Eu parei de querer ir à escola. Inventava desculpas para faltar, ficava do
Cecy respirou fundo, sentindo a onda de memórias a arrastar para um tempo que ela gostaria de esquecer. Sua voz, ainda carregada de tristeza, ecoava no vazio que a cercava.
– O bullying não parou no ensino fundamental. Acho que, para eles, eu era uma espécie de entretenimento. Uma órfã com nenhuma defesa, fácil de humilhar. E no colegial... ficou ainda pior.
Ela fez uma pausa, encarando o horizonte como se pudesse ver a si mesma anos atrás.
– No ensino médio, as coisas mudaram. Não eram só piadinhas ou apelidos cruéis. Eles começaram a me isolar de verdade. Ninguém queria se sentar ao meu lado. Eu almoçava sozinha todos os dias, enquanto eles riam em grupo, inventando histórias sobre como meus pais provavelmente me abandonaram porque eu era um peso.
A dor em sua voz se intensificou.
– Uma vez, durante a aula de ciências, colocaram um bilhete no meu caderno. Quando abri, estava escrito: "Você devia desaparecer de vez. Ninguém notaria."
Cecy suspirou, apertando as mãos como se ainda pudesse sentir o papel entre os dedos.
– Eu fingia que não me importava, mas aquilo me consumia. Comecei a acreditar que, talvez, eles estivessem certos. Que eu era um erro. Alguém que nem deveria existir.
Ela fechou os olhos, mas continuou.
– Mas foi no meio desse caos que conheci Jeny. Não sei por que ela se aproximou de mim. Talvez tenha visto algo que ninguém mais via. Ou talvez ela só fosse teimosa o suficiente para não se importar com o que os outros pensavam.
Um pequeno sorriso surgiu em seus lábios, apesar das lágrimas que ainda escorriam.
– Eu lembro do dia em que ela se sentou ao meu lado no refeitório. Os outros começaram a cochichar, a rir, mas Jeny apenas olhou para mim e disse: "Se você não quer almoçar sozinha, eu também não quero."
Cecy riu baixinho, a lembrança trazendo um calor inesperado ao seu peito.
– No início, achei que ela fosse só sentir pena de mim. Mas Jeny... ela era diferente. Quando alguém tentava me provocar, ela enfrentava sem medo. "Mexeu com a Cecy, mexeu comigo", ela dizia. E, pela primeira vez, eu não me sentia tão sozinha.
Ela fez uma pausa, sentindo a onda de gratidão que sempre vinha quando pensava em Jeny.
– Foi por causa dela que eu percebi que nem todo mundo era cruel. Que, às vezes, alguém pode ver valor em você, mesmo quando você mesma não vê.
Cecy enxugou as lágrimas, olhando para o vazio com determinação.
– Jeny me mostrou que eu podia resistir. Que eu não precisava acreditar nas coisas horríveis que eles diziam. Ela foi minha primeira amiga de verdade. E, mesmo depois de tudo, eu ainda agradeço por ela ter me encontrado naquele refeitório.
Ela ficou em silêncio por um momento, as memórias ainda dançando em sua mente, antes de murmurar:
– Talvez, no fim, não seja sobre quem te abandona, mas sobre quem escolhe ficar. E Jeny... ela escolheu.
– Lembra do nosso último ano no colegial? – Cecy disse, com um tom melancólico, mas um leve sorriso tocava seus lábios. – Foi quando conhecemos Felm.
Ela riu baixinho, sua voz ecoando pelo vazio ao seu redor. Era uma memória que ela guardava com carinho, apesar de tudo.
– Naquele tempo, eu e Jeny já éramos inseparáveis. Jeny sempre foi a forte, a que enfrentava o mundo de cabeça erguida. E eu... bem, eu era um trabalho em progresso. Estávamos acostumadas a andar juntas, só nós duas. Mas, então, ela apareceu.
Cecy fechou os olhos, como se pudesse visualizar o momento.
– Era o primeiro dia do último ano. A sala estava cheia, e todos pareciam já ter seus grupos formados. Foi quando uma garota baixinha, com cabelos castanhos presos em um laço amarelo, entrou carregando mais livros do que parecia capaz de carregar.
Ela sorriu, lembrando-se da cena.
– Ela tropeçou antes mesmo de chegar à mesa dela, e os livros caíram com um estrondo. Jeny e eu estávamos no fundo, observando. Enquanto os outros riam ou simplesmente ignoravam, Jeny deu aquele olhar de "não acredito" e foi até lá para ajudar.
Cecy fez uma pausa, rindo suavemente.
– Eu fui atrás porque, bem, não podia deixar Jeny se meter sozinha em alguma confusão. Quando nos abaixamos para ajudar, a garota levantou o olhar e sorriu. Um sorriso tão genuíno, tão doce, que parecia iluminar a sala inteira. "Obrigada", ela disse, quase num sussurro. "Eu sou Felm. Desculpem a bagunça."
Cecy suspirou, como se o momento ainda estivesse fresco em sua memória.
– Jeny, sendo Jeny, soltou um "Você deveria carregar menos livros ou usar uma mochila decente." Mas Felm apenas sorriu novamente e respondeu: "Eu gosto de ter meus livros por perto. Eles são meus amigos."
Ela fez uma pausa, como se aquele detalhe ainda a tocasse.
– Felm era diferente. Enquanto Jeny era destemida e eu estava aprendendo a sobreviver, Felm era pura bondade. Ela tinha uma maneira de ver o mundo que nos fazia questionar por que éramos tão cínicas. E, de alguma forma, ela conseguiu se juntar a nós, como se sempre tivesse feito parte.
Cecy riu, lembrando-se de como Felm frequentemente trazia paz ao grupo.
– Ela era fofa, sim, mas também surpreendentemente firme quando precisava. Lembro de um dia em que um grupo começou a rir dela por causa de seus livros. Jeny já estava pronta para brigar, mas Felm apenas olhou para eles e disse: "Sabe, vocês deviam tentar ler. Pode ajudar a expandir suas mentes." O jeito calmo e gentil como ela disse aquilo deixou todo mundo sem palavras.
Ela balançou a cabeça, ainda sorrindo.
– Felm nos ensinou que ser gentil não é ser fraco. Que você pode enfrentar o mundo com um sorriso e, ainda assim, ser mais forte do que imagina. Ela foi o equilíbrio perfeito para nós.
Cecy suspirou, o sorriso em seus lábios agora tingido de tristeza.
– No final, foi ela quem nos manteve unidas. Eu não sei o que teria sido daquele último ano sem ela. Jeny era meu escudo, mas Felm... Felm era minha cura.
Ela olhou para o vazio, a voz mais baixa agora.
– Nós éramos tão diferentes, mas juntas... juntas éramos invencíveis.
Cecy fechou os olhos, deixando o silêncio tomar conta novamente. Desta vez, porém, as memórias não a esmagavam. Em vez disso, eram um lembrete de que, mesmo na dor, ela havia encontrado algo precioso: amizade verdadeira.
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