Capítulo 16_14
Naquela manhã, Arthur havia finalmente encontrado força suficiente para sair de casa. O sol ainda estava baixo, e a pracinha estava tranquila, com poucas pessoas. Ele vestiu um tênis velho, colocou uma camiseta desbotada e decidiu correr, algo que não fazia há anos. Enquanto corria, sentiu a leve brisa no rosto, mas algo parecia diferente, como se o mundo quisesse lhe mostrar algo.
Foi então que ele viu uma cena que o fez parar imediatamente. No banco à frente, estava uma garotinha sem cabelo, usando uma roupa azul clara e segurando um balão vermelho. Ao lado dela, uma médica, com o jaleco branco, parecia estar observando-a com carinho. A menina tinha um sorriso sereno, mas seus olhos brilhavam de uma forma que Arthur não pôde ignorar.
Arthur se aproximou lentamente, sentindo o coração acelerar sem entender o porquê. Ele olhou para a criança e disse, com a voz baixa, mas gentil: – Oi, pequena.
A garota levantou os olhos para ele, e, por um momento, o mundo parou. Ela sorriu, um sorriso cheio de inocência e luz, e respondeu: – Nossa... seus olhos são lindos. Azul como o céu, e brilhante como as estrelas.
Arthur sentiu o chão sumir sob seus pés. Aquelas palavras... elas eram exatamente as que Cecy costumava dizer para ele. As lágrimas começaram a escorrer sem que ele pudesse conter.
– Cecy costumava dizer isso... – murmurou ele, quase como um sussurro para si mesmo. – Como você sabe disso?
A garotinha inclinou a cabeça, sem entender por que ele chorava, mas seu sorriso não vacilou. A médica, percebendo a emoção de Arthur, colocou uma mão delicada no ombro dele. – Vamos, Raina – disse ela suavemente. – Seu passeio já acabou.
Enquanto a médica e a menina começavam a se afastar, Arthur sentiu um impulso. Ele levantou a voz, ainda rouca pela emoção. – Qual é o seu nome, garota linda?
A menina parou, olhou para ele por cima do ombro e respondeu, com um riso suave: – Meu nome é Raina Cailane!
Arthur ficou parado, vendo as duas se afastarem, até que desapareceram ao virar a esquina. Ele permaneceu ali por um longo tempo, com as lágrimas ainda escorrendo, mas agora havia algo novo misturado à tristeza: um propósito.
Caminhando lentamente de volta à pracinha, ele começou a pensar em tudo o que Cecy havia passado. A dor, a luta, a força que ela demonstrou, mesmo nos momentos mais sombrios. Ele se lembrou das palavras dela no vídeo: "Quero que você viva, Arthur. Quero que você encontre alegria novamente."
E foi ali, sob o sol da manhã, que Arthur decidiu seu novo objetivo de vida. Ele dedicaria o resto de seus dias a algo maior, algo que Cecy teria aprovado. Ele queria encontrar uma cura para todas as doenças incuráveis, para que ninguém precisasse passar pelo que Cecy ou aquele garotinho haviam enfrentado.
Arthur enxugou as lágrimas, respirou fundo e continuou sua caminhada. Cada passo agora tinha um significado. Ele sabia que a jornada seria longa, mas, pela primeira vez em muito tempo, ele sentiu que estava no caminho certo. Cecy podia ter partido, mas seu amor e sua luz continuariam guiando Arthur, ajudando-o a transformar sua dor em esperança para o mundo.
Enquanto Arthur encontrava um novo propósito para sua vida, Felm, uma das melhores amigas de Cecy, afundava cada vez mais na depressão. Desde a morte de Cecy, ela não era mais a mesma. A casa que antes compartilhavam estava vazia, e as risadas e brincadeiras que costumavam encher os cômodos haviam desaparecido. Felm sentia-se sozinha, mesmo quando estava cercada de pessoas.
Ela tentava seguir em frente, mas tudo parecia um esforço inútil. Cada objeto, cada canto da casa, era uma lembrança de Cecy. O travesseiro ainda tinha o perfume dela, as roupas que Cecy deixou no armário permaneciam intocadas, e as fotos espalhadas pelas paredes agora pareciam um peso insuportável.
Um dia, enquanto tentava organizar os pertences de Cecy, Felm encontrou a lista de coisas que Cecy queria realizar antes de morrer. Ao ler cada item, a dor se tornou insuportável. Lá estavam desejos simples, como "ver o mar ao pôr do sol" e "rir até chorar com as amigas", misturados a sonhos mais distantes, como "visitar Paris". Felm caiu no chão, segurando a lista contra o peito, enquanto soluços tomavam conta dela.
– Eu deveria ter feito mais – sussurrou, as lágrimas escorrendo pelo rosto. – Eu deveria ter ajudado mais, amado mais, feito ela feliz enquanto estava aqui.
Esse momento foi o ponto de ruptura para Felm. Ela se isolou completamente, afastando-se até mesmo de Jeny, que sempre tentava puxá-la para fora de casa. Felm parou de atender telefonemas, de responder mensagens, de sair de casa. Até as atividades mais simples, como comer ou tomar banho, se tornaram uma luta.
Certa manhã, Felm acordou e não conseguiu sair da cama. O peso no peito parecia maior do que nunca, e a escuridão que a cercava parecia sufocá-la. Ela olhou para o teto, as lágrimas escorrendo silenciosamente, e sussurrou para si mesma: – O que ainda estou fazendo aqui?
Mas, no fundo, uma parte dela ainda queria lutar, ainda queria se agarrar à memória de Cecy e ao amor que sentia por ela. Foi essa pequena faísca que a levou a buscar ajuda. Com as mãos trêmulas, ela pegou o telefone e ligou para Jeny.
– Eu preciso de ajuda – disse Felm, com a voz quebrada. – Eu não consigo mais sozinha.
Jeny apareceu na casa de Felm em menos de uma hora. Ao vê-la naquele estado, tão frágil, ela começou a chorar, mas sabia que precisava ser forte.
– Cecy nunca iria querer isso para você – disse Jeny, segurando a mão de Felm com força. – Ela te amava. Ela nos amava. E precisamos honrar isso vivendo, mesmo que doa.
Com a ajuda de Jeny, Felm começou a fazer terapia e, aos poucos, encontrou maneiras de lidar com sua dor. Ela começou a escrever cartas para Cecy, como uma forma de colocar para fora tudo o que sentia. Cada carta era um desabafo, uma conversa que nunca terminou.
Meses depois, Felm começou a se recuperar. Embora ainda tivesse dias difíceis, ela encontrou força na memória de Cecy e no amor de seus amigos. Ela decidiu que cumpriria cada item da lista de Cecy, vivendo por ela e por si mesma.
O primeiro item foi "ver o mar ao pôr do sol". Jeny e Arthur a acompanharam até a praia, onde ela segurou a lista com força enquanto o sol desaparecia no horizonte.
– Isso é por você, Cecy – sussurrou Felm, enquanto lágrimas escorriam pelo rosto. – E por mim. Eu prometo que vou continuar, mesmo que seja difícil.
Felm sabia que o caminho seria longo, mas estava determinada a honrar Cecy, vivendo a vida que ela nunca pôde. E, no fundo, ela sentia que Cecy estava lá com ela, sorrindo, como sempre fazia.
Enquanto Felm lutava contra a depressão e Arthur se dedicava a seu novo propósito, Jeny começou a trilhar um caminho inesperado para a superação. Depois de meses lidando com a ausência de Cecy, ela decidiu aceitar a bolsa de estudos fora do país, algo que sempre fora um sonho, mas que havia se tornado ainda mais significativo após a morte da amiga.
No novo país, Jeny se dedicou aos estudos e mergulhou em sua rotina, tentando se afastar da dor. Porém, mesmo com os compromissos e as novas experiências, a saudade de Cecy ainda a acompanhava. Foi em um desses dias, ao sair da biblioteca carregada de livros, que sua vida tomou um rumo diferente. Ela esbarrou em alguém, e os livros caíram no chão.
– Me desculpe! – disse uma voz masculina, com um sotaque estrangeiro, enquanto se abaixava para ajudá-la.
Jeny olhou para ele, um homem alto, de olhos calorosos e sorriso gentil. – Tudo bem – respondeu ela, sem saber que aquele encontro mudaria sua vida.
O homem era Thomas, um professor assistente na universidade onde Jeny estudava. O encontro casual evoluiu para conversas na cafeteria, trocas de mensagens e longas caminhadas noturnas. Thomas era paciente e compreensivo, e, embora Jeny hesitasse no início, ele conseguiu, aos poucos, derrubar as barreiras que ela havia erguido.
Uma noite, enquanto caminhavam juntos, Jeny finalmente falou sobre Cecy. – Ela era tudo para mim – disse, com lágrimas nos olhos. – Perder ela foi como perder uma parte de mim.
Thomas segurou sua mão e respondeu: – Eu não posso preencher o lugar dela, Jeny, mas posso estar ao seu lado enquanto você aprende a carregar essa saudade.
Aquelas palavras tocaram Jeny profundamente. Pela primeira vez em meses, ela sentiu que podia respirar novamente, que podia se permitir ser feliz sem culpa.
Depois de alguns anos juntos, Thomas pediu Jeny em casamento. O casamento foi simples, mas cheio de significado. Felm e Arthur estavam presentes, e ambos se emocionaram ao ver Jeny sorrindo genuinamente novamente. No altar, Jeny segurou um pequeno buquê de flores amarelas, em homenagem a Cecy, como se ela também estivesse ali.
Pouco tempo depois, Jeny e Thomas tiveram dois filhos: gêmeos. Quando segurou os bebês pela primeira vez, Jeny soube exatamente como os chamaria.
– Miguel – disse ela, olhando para o menino, com os olhos marejados. – E Cecy – completou, acariciando a pequena menina.
Os nomes foram uma homenagem aos dois que marcaram profundamente sua vida. Para Jeny, era como se ela estivesse dando continuidade ao legado de amor e esperança que Cecy e Miguel representavam.
Com o passar dos anos, Jeny encontrou um equilíbrio entre a saudade de Cecy e a nova vida que construíra. Ela contava histórias sobre Cecy para seus filhos, mostrando fotos e falando sobre a força e a alegria da amiga.
– Cecy foi a pessoa mais especial que já conheci – dizia ela para os gêmeos. – E, por causa dela, aprendi que o amor pode nos curar, mesmo nos momentos mais difíceis.
Arthur, agora envelhecendo, visitava Jeny regularmente, trazendo sempre flores amarelas para o pequeno jardim que ela mantinha em homenagem a Cecy. Felm, que ainda morava no interior, visitava de tempos em tempos, e os três amigos sempre reservavam um momento para lembrar de Cecy, rindo e chorando juntos.
Embora a ausência de Cecy ainda fosse sentida, Jeny finalmente encontrou paz. E, ao olhar para seus filhos brincando no quintal, sabia que, de alguma forma, Cecy sempre estaria com ela, nos sorrisos, nas lembranças e na luz que nunca desapareceria.
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