Capítulo 16_3
A manhã estava fria e úmida, o tipo de clima que Cecy geralmente gostava. Ela havia decidido sair de casa mais cedo para evitar a correria usual, mas o destino parecia ter outros planos para ela. Enquanto atravessava a pequena praça perto do trabalho, algo chamou sua atenção.
Lá estava ele. Jhon, seu ex, de pé sob uma árvore, com o sorriso fácil que ela conhecia tão bem. Só que, desta vez, ele não estava sozinho. Ele segurava uma garota pela cintura, inclinando-se para beijá-la com tanta naturalidade que parecia uma cena de filme romântico. A mão dele acariciava suavemente a cabeça da garota, exatamente como fazia com Cecy nos momentos em que ela acreditava que ele a amava.
O coração de Cecy apertou, e uma onda avassaladora de tristeza e humilhação a atingiu. Ela ficou ali, parada, incapaz de se mover ou desviar o olhar. Era como se o tempo tivesse parado, e ela estivesse presa naquela visão que parecia arrancar dela qualquer vestígio de força.
Seus joelhos começaram a fraquejar, e ela cambaleou ligeiramente. De repente, uma mão firme e delicada segurou seu braço, impedindo-a de cair. Ela se virou, surpresa, e encontrou Arthur ao seu lado. Ele estava vestido com roupas de academia, um contraste gritante com o homem elegante que ela havia conhecido na noite anterior.
– Senta-se – disse ele, com a voz firme mas gentil, conduzindo-a até um banco próximo. Ele puxou uma garrafa de água da mochila e a entregou a ela. – Beba um pouco. Você está pálida. O que aconteceu? Parece que viu um fantasma.
Cecy aceitou a garrafa, mas suas mãos tremiam enquanto a segurava. Ela olhou para Arthur, ainda tentando processar sua presença ali. – O que você está fazendo aqui? – perguntou, desconfiada. – Por acaso está me seguindo?
Arthur ergueu uma sobrancelha, cruzando os braços enquanto a observava com uma expressão que misturava preocupação e irritação. – Seguindo você? – Ele balançou a cabeça, soltando um suspiro. – Eu corro por aqui todas as manhãs. Parece que o destino insiste em nos colocar no mesmo caminho.
Cecy desviou o olhar, ainda segurando a garrafa. Seus olhos voltaram para o local onde Jhon estava, mas ele já havia desaparecido. Apenas a garota permanecia ali, sorrindo enquanto mexia no celular. Aquilo a fez apertar a garrafa com mais força, tentando esconder a lágrima solitária que ameaçava escapar.
Arthur percebeu a direção do olhar dela e franziu a testa. – É isso, não é? – disse ele, mais como uma afirmação do que uma pergunta. – Você viu alguém que não queria ver.
Cecy mordeu o lábio, tentando recuperar o controle. – Não é da sua conta, Arthur.
– Talvez não seja – respondeu ele, seu tom ficando mais firme. – Mas, a julgar pelo seu estado, alguém precisa cuidar de você, porque claramente você não está fazendo um bom trabalho nisso.
Ela o encarou, dividida entre a irritação e o alívio de não estar completamente sozinha naquele momento. Arthur suspirou e se sentou ao lado dela no banco, mais relaxado agora. – Escuta, Cecy. Eu não sei o que você viu ou quem está te machucando, mas posso te garantir uma coisa: ninguém, absolutamente ninguém, merece destruir você dessa forma.
Cecy olhou para ele, os olhos brilhando de emoção reprimida. Apesar do jeito arrogante e direto, havia algo na voz dele que parecia genuíno. Pela primeira vez, ela sentiu que talvez não precisasse carregar tudo sozinha. Mas isso não significava que estava pronta para deixar Arthur entrar.
– Você não entende nada sobre mim – respondeu, finalmente bebendo um gole de água. – E eu não pedi a sua ajuda.
Arthur deu de ombros, um pequeno sorriso surgindo no canto dos lábios. – Talvez eu não entenda agora. Mas isso não significa que vou parar de tentar.
Cecy desviou os olhos de Arthur, ainda sentindo a mistura de raiva e confusão que ele sempre parecia despertar nela. Ela sabia que ele era direto, mas estar ali, naquela manhã, parecendo tão preocupado, a deixava desconfortável. Depois de um momento de silêncio tenso, ela decidiu confrontá-lo.
– Arthur – começou, a voz ainda um pouco trêmula. – Por que você está tão interessado em mim? Se você está aqui por acaso ou não, o que realmente quer?
Ele inclinou-se para frente, apoiando os cotovelos nos joelhos, o olhar fixo no chão à sua frente. Por um momento, parecia que ele estava pensando cuidadosamente na resposta, o que a surpreendeu. Afinal, ele sempre parecia saber exatamente o que dizer.
– Eu quero fazer um acordo – disse ele, finalmente, sua voz firme e sem hesitação.
Cecy piscou, confusa. – Um acordo? Que tipo de acordo?
Arthur a olhou nos olhos, a intensidade de seu olhar a deixando desconcertada. – Um acordo que vai nos beneficiar. Você precisa de algo, e eu também. Podemos ser úteis um ao outro.
Ela franziu a testa, cruzando os braços como se estivesse se protegendo. – Não estou entendendo. Seja mais claro, Arthur.
Ele respirou fundo, o tom sério. – Minha família quer que eu me case. Eles acham que é a única forma de eu me tornar o que eles consideram um homem completo. Mas eu não acredito no amor, e, sinceramente, não quero perder meu tempo tentando provar algo que não faz sentido para mim.
Cecy continuou olhando para ele, ainda mais confusa. – E o que isso tem a ver comigo?
– Simples – respondeu ele. – Quero que você finja ser minha namorada. Apenas isso. Vai me ajudar a manter minha família fora do meu caminho. E, em troca, eu cuido de você. Financeiramente, emocionalmente, o que você precisar.
Ela piscou, completamente atordoada com a proposta. – Isso... Isso é insano, Arthur. Você mal me conhece. Por que eu?
Ele deu de ombros, o tom prático voltando à sua voz. – Porque você é perfeita para isso. Você não está interessada em se envolver emocionalmente agora, e eu também não. Nós dois temos nossos motivos para querer evitar complicações.
Cecy soltou uma risada incrédula. – E você acha que é tão simples assim? E se um de nós quebrar essa regra? Se alguém se apaixonar?
Arthur sorriu de lado, mas não havia humor em sua expressão. – Essa é a parte mais importante do acordo, Cecy. Se algum de nós se apaixonar, o acordo termina imediatamente. E quem quebrar a regra deve desaparecer completamente da vida do outro. Sem perguntas, sem ressentimentos.
Ela ficou em silêncio, as palavras ecoando em sua mente. Era absurdo, mas, ao mesmo tempo, havia algo tentador na ideia de fugir de sua própria realidade por um tempo. Ainda assim, ela não conseguia entender por que ele achava que isso poderia funcionar.
– Você está falando sério? – perguntou, finalmente.
Arthur assentiu. – Nunca falei tão sério. Pense nisso, Cecy. Você não tem nada a perder.
Ela mordeu o lábio, o coração acelerado. Por mais que soubesse que aceitar um acordo como aquele era insano, uma pequena parte dela não conseguia ignorar a proposta. Afinal, o que mais poderia dar errado?
Enquanto Cecy ainda estava processando tudo o que Arthur havia acabado de dizer, uma voz familiar e cruel surgiu atrás dela.
– Cecy, é você? – Era Jhon, vindo na direção dela com um sorriso presunçoso e a garota que ela vira antes caminhando logo atrás.
Ela congelou no lugar, o peito apertando de raiva e humilhação. Arthur virou-se para encarar o homem, mas manteve-se em silêncio, apenas observando. Jhon parou a poucos passos de distância, com as mãos nos bolsos, o sorriso se ampliando.
– Não esperava te encontrar aqui. – Ele olhou para Cecy com um olhar provocativo. – A propósito, você já conheceu minha namorada? Estamos juntos há quase seis meses agora.
O impacto das palavras atingiu Cecy como um soco. Ela sentiu o ar escapar dos pulmões e as lágrimas ameaçarem cair novamente. – Seis meses? – Sua voz saiu fraca, quase um sussurro. – Mas... nós terminamos há poucos dias. Isso significa que você estava me traindo?
A garota ao lado de Jhon riu, um som irritante e desdenhoso que fez o estômago de Cecy revirar. – Ele não te contou? Que descuido, amor – disse ela, lançando um olhar falso para Jhon.
Cecy sentiu as pernas fraquejarem novamente, mas, antes que pudesse vacilar, Arthur deu um passo à frente. Seu rosto estava impassível, mas havia um brilho frio em seus olhos.
– Vamos, amor – disse ele, estendendo a mão para Cecy. – O carro já está esperando. Não temos tempo para isso.
Cecy olhou para ele, surpresa, mas, antes que pudesse protestar, Arthur pegou sua mão e a guiou para longe, ignorando completamente Jhon e sua namorada. Ela sentiu as lágrimas começarem a cair enquanto andava ao lado dele, como se todo o controle que ainda tinha estivesse se desmanchando.
Arthur parou quando chegaram a um ponto mais afastado, longe dos olhares de Jhon e sua provocação. Ele se virou para ela, segurando delicadamente seu rosto com uma das mãos, passando o polegar sobre sua bochecha para enxugar as lágrimas.
– Não chore por ele, Cecy – disse, a voz surpreendentemente suave. – Ele não merece nem uma única lágrima sua.
Cecy soluçou, tentando recuperar o fôlego. – Eu... eu não sei como isso aconteceu. Ele me destruiu e, ainda assim, continua a me machucar.
Arthur segurou seu olhar, seus dedos ainda acariciando seu rosto com delicadeza. – Ele não vai mais te machucar. Eu não vou deixar isso acontecer.
Cecy, ainda confusa e fragilizada, finalmente conseguiu murmurar: – Arthur... Sobre o acordo... Eu preciso de um tempo. Uns dias para pensar.
Ele assentiu, sem tirar os olhos dela. – Tome o tempo que precisar, Cecy. Só não se torture por causa de alguém que não vale nada. Você é melhor que isso.
Ela apenas balançou a cabeça, sentindo o calor reconfortante da mão dele no rosto.
Cecy respirou fundo, tentando se recompor antes de se despedir de Arthur. Apesar de tudo, a firmeza dele a tinha ajudado a superar aquele encontro humilhante com Jhon. Ela agradeceu brevemente, sem encontrar as palavras certas, e seguiu para o trabalho. Mas, enquanto caminhava, uma dor de cabeça começou a latejar em sua têmpora, como se os eventos da manhã estivessem pesando fisicamente sobre ela.
Ao chegar à K.E.M., Cecy se sentia ainda pior, mas tentou ignorar. Entrou rapidamente, ajustando a postura para parecer mais forte do que realmente estava. Assim que se sentou em sua mesa, o chefe apareceu, a expressão dura como sempre.
– Forrm! – ele chamou, a voz cortando o ar como uma lâmina. – Você entregou aquele relatório ontem, mas, como sempre, estava cheio de erros. Francamente, não sei por que ainda te mantemos aqui.
Cecy cerrou os dentes, apertando as mãos sobre o teclado. A dor de cabeça parecia piorar a cada palavra.
– Você é completamente inútil – continuou ele, sem piedade. – Um peso morto para esta equipe. Talvez se você parasse de viver no mundo da lua e focasse no trabalho, não seria tão desastrosa.
Ela tentou se defender, mas a dor em sua cabeça era tão intensa que mal conseguiu formular uma resposta. As palavras ficaram presas na garganta, e tudo o que ela conseguiu fazer foi abaixar a cabeça e murmurar um "sim, senhor".
Ele bufou, claramente irritado com a falta de reação, e virou-se para sair, deixando Cecy ali, sozinha com suas emoções e a dor latejante que agora dominava todo o seu corpo. Sentindo-se à beira do colapso, ela se levantou da mesa, tentando caminhar em direção ao banheiro para se recompor.
Assim que entrou no banheiro, o mundo começou a girar. A dor na cabeça tornou-se insuportável, e o ar parecia ficar pesado. Cecy tentou segurar na pia, mas seus joelhos fraquejaram, e tudo ficou escuro.
Quando finalmente desmaiou, o som de seu corpo caindo ecoou pelo banheiro vazio. Ali, no chão frio, Cecy estava sozinha, enquanto o mundo ao seu redor continuava indiferente.
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