O pastor Josué se levanta cedo, vai até à igreja preparar tudo para o sermão da manhã, gosta de orar quando ainda não há ninguém. Se assusta quando abre a porta e vê um vulto escuro sentado em um dos últimos bancos, se aproxima e percebe ser a garota com quem Vinícius estava a conversar, a garota que mais parece um garoto. Ela parece uma estátua, está paralisada, toca a sua mão e está gelada. Não precisa nem perguntar o que aconteceu, conhecendo os seus fiéis e a família de George muito bem, sabe o que houve com a garota.
Josué: — Moça? Alice o seu nome não é?! Vem comigo, vou levar-lhe a casa paroquial, lá pode tomar um café… Aqui está frio! Venha!
Alice está inerte, vai atrás dele como um animal que segue alguém que lhe oferece algo para comer. Josué a deixa sentada na sala da casa paroquial, ela não disse uma palavra, não tocou no café que colocou à sua frente. Josué a deixa sozinha e vai até a casa de Vinícius, ele ainda dorme, pede a Marcos para o chamar.
Vinícius já estava se levantado, fazia alguns exercícios costumeiros quando Marcos bate na sua porta.
Marcos: —Pastor Josué está na sala, diz que precisa urgentemente falar com você.
Vinícius: — Mais o que ele pode querer assim tão cedo?
Vinícius se veste, pega sua bengala guia e desce, ouve os passos de Josué de um lado à outro da sala.
Assim que vê Vinícius: — Me desculpe a hora, precisava informar-lhe do acontecido
Vinícius: — O quê houve? Parece nervoso.
Josué: — Fui a igreja mais cedo e adivinha quem encontro lá? A garota que morava com George e Mirtes sentada lá, no frio, acredito que ela passou a noite toda na igreja. - diz num fôlego só.
Vinícius: — Não estou entendendo o que está a dizer?
Josué: — A garota com quem conversava, Alice, suponho que a expulsaram de casa assim que a recepção acabou… por estar a conversar com o senhor…
Vinícius: — A expulsaram?! De casa!? Por minha causa!? A garota Alice!?
Josué: — Sim! A levei para casa paroquial... Ela está, está estranha, em estado de choque. Pensei que, talvez, pudesse e quisesse conversar com ela, descobrir o que aconteceu?! Achei que era minha obrigação te contar.
Vinícius: — Fez muito bem! Vou até lá conversar com ela.
Josué: — Está bem, vou voltar a igreja, já está quase na hora da celebração. Se for verdade o que fizeram George e Mirtes precisam ouvir um belo sermão. Onde já se viu colocar uma moça no meio da rua de madrugada. Uma parente, eles não tem coração, onde está o espírito cristão deles?
Assim que Josué sai, Vinícius pede a Marcos para o levar até a casa dele. Chegando lá já não encontra Alice. Ela, não querendo envolver mais ninguém em seus problemas, pega suas coisas e caminha até a rodoviária, ainda falta mais de uma hora para chegada do ônibus para capital, se senta num banco, o medo do que está por vir lhe toma o coração. O que fará na capital sem nenhum dinheiro, sem conhecer ninguém? Como passará os primeiros dias? O sentimento que estava preso em sua garganta aflora e lágrimas começam a descer por sua face, se sente mais abandonada e sozinha que nunca, insignificante e desprezada pelo mundo.
Não a encontrando na casa de Josué, Vinícius e Marcos vão direto a rodoviária, Marcos a vê e indica a Vinícius o lugar onde ela está sentada e ele vai até ela. Se senta ao seu lado, ela não diz nada, não consegue conter as lágrimas que teimam em rolar pelo seu rosto.
Vinícius: — Josué disse-me que passou a noite na igreja! O que houve.? Foi por minha causa não foi?
Alice respira fundo: — Estava esperando o ônibus para capital, só havia para agora de manhã...
Vinícius: — Me diz o que houve de verdade, sabe que não sou bobo. Te colocaram na rua por minha causa? Por ter-me livrado de ter caído numa cilada?
Alice: — Acredito que estraguei os planos de Clara e a sua família, quando fui atrás dela…
Vinícius: — O quê eu posso fazer para a ajudar? Conhece alguém na capital? Tem para aonde ir?
Alice: — Posso procurar um emprego lá.
Vinícius: — Eu tenho amigos que moram lá, posso pedir para a acolherem, se quiser.
Alice: — Não precisa se preocupar comigo. Não sou responsabilidade sua. Eu darei um jeito.
Alice fala sem muita convicção, quem acolherá uma desconhecida? O dinheiro que o tio deu só dá para passagem, nada mais. Não saberá o que fazer quando botar os pés lá. Quem daria emprego para uma pessoa como ela, uma maltrapilha, pequena, sem força? E como se alimentaria? A ansiedade pelo que possa acontecer toma conta do seu coração.
Vinícius fica em silêncio durante uns minutos, pensa no que fazer para resolver a situação. Uma ideia ocorre-lhe, se aproxima mais dela, vira o rosto em sua direção, parece que a olha de verdade, que a vê.
Vinícius: — Alice, case-se comigo!
Alice: — O quê? Já disse que não é responsável…
Vinícius: — Vamos fazer um acordo. Casamento é um tipo de negócio, um contrato, o nosso não será diferente de muitos por aí. Você ajuda-me, se eu tiver uma esposa minha família me deixará em paz, poderei viver a minha vida. Eu ajudo-te, prometo-lhe um sítio, um lugar como o que sonha onde possa viver sozinha e condições para ter uma vida sem preocupações.
Alice não acredita no que está ouvindo: — Você não me conhece, nem imagina como sou…
Vinícius: — E como é? Inteligente, esperta...
Alice: — Sou pequena, feia, dizem que pareço um garoto.
Vinícius: — Isso não me diz nada. Esqueceu que não vejo. Gosto da sua voz, de conversar com você. Não acredito que seja tão feia como diz. Pense bem, é a melhor solução para os dois, poderemos realizar nossos sonhos. Vamos estipular um ano, ou um pouco mais, depois cada um fica livre do acordo para fazer o que desejar, somos jovens ainda, um ano ou dois passam rápido.
Alice: — Eu não... não sei...
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 51
Comments