Vinícius se deixa ser levado pela irmã que vai tagarelando até o deixar na porta do quarto.
Vanessa: — Já deixei a roupa que você deve usar sobre a sua cama. Te esperamos na sala. Não demore!
Vinícius para em frente a porta, ouve as conversas na sala, além da sua família há vozes de um senhor, uma senhora e com certeza uma jovem. As mulheres riam, falavam sem parar, ouve Vanessa chegando e o que ela diz o deixa irritado.
Vanessa: — Mirella, minha querida! Em poucos minutos Vinícius nos fará companhia. Você verá como ele é um homem bonito e que a cegueira não fará tanta diferença.
Dona Dalva: — Não é porque ele é meu filho, Vinícius é muito gentil, honesto e é dono de tudo que viu por aqui.
Mirella: - Vanessa me falou tanto dele que resolvi o conhecer!
Vinícius compreende na hora o que a sua família quer. Será que pensam que ele não é capaz de escolher uma garota para namorar ou até se casar um dia? O quê pensam que ele é? O que se tornou?
Caminha até a sua cama, se senta, passa as mãos nas roupas arrumadas pela irmã as joga no chão. Respira fundo, tenta se controlar, não quer outra crise, uma no dia já basta, vai até o banheiro, liga o chuveiro, entra nele, a água quente relaxa o seu corpo e a sua mente. Água, sempre o acalma. Não pode fazer o que desejou no primeiro momento. Não quer magoar a sua mãe, nem agir como um doido diante das visitas. O seu senso de dever como filho, como único homem da família, ou até mesmo a covardia o impedem de fazer o que tem vontade. Sai do banho, se seca com toda calma do mundo, sem pressa. Coloca as roupas que escolhe, e tem certeza que ficou muito bem, penteia os cabelos que estão precisando de um corte, passa uma loção, respira fundo e com ajuda da sua bengala guia caminha para sala.
As vozes cessam assim que bota o pé no local. Sente o clima pesado. Sua mãe quebra o silêncio.
Dona Dalva: — Filho, até que apareceu enfim . Estávamos preocupados…
Vinícius: — Mãe, sabe como é difícil para mim. Colocar uma roupa, leva um tempo bem maior do que gostaria... — mente.
Vanessa o agarra pelo braço: — Vem aqui Vini, quero apresentar-te a minha amiga Mirella, o seu pai Vítor e a sua mãe Mara…
Vanessa o encaminha até cada um deles quelhes apertam as mãos, a sua irmã o coloca sentado ao lado de Mirella.
Vinícius: — E do que conversavam?
Vitor picareia: — Eu... queria saber...Como um jovem assim...
Vinícius: — Como é ser cego? É como fica quando a energia acaba durante a noite. Porém, não há velas, isqueiros ou lanternas que resolva. Nem mesmo o amanhecer do dia seguinte…
Vitor: — E como se vira com tudo?
Vinícius: — Tenho a minha mãe, as minhas irmãs para me guiarem e fazer tudo por mim. — diz com ironia.
Dona Dalva chama Mara e Vitor a cozinha, inventa de mostrar algo a eles. Vanessa diz que vai ver se os seus filhos já estão a chegar da escola e deixa Vinícius a sós com Mirella. Ela parece não estar muito confortável no sofá ao seu lado, se mexe muito, ele percebe que ela o está analisando.
Mirella: — Bem... Vinícius... A sua irmã falou-me muito de você.
Vinícius vira a sua cabeça na direção dela, o seu perfume é forte, a sua voz tem um tom que não lhe agrada: — E o que ela disse?
Mirella: — Só elogios. Você não parece ser cego. Vou dizer-te uma coisa, estava com medo de te ver, mais…
Vinícius: —Mais? Não sou tão feio ou deformado? Sou?!
Mirella: — Quero que saiba Vinícius, que entendo como é e não me importo, vim te conhecer porque quis. — Coloca a sua mão sobre a perna de Vinícius. — A sua casa é muito bonita! Luxuosa… Não imaginei que era assim. Vanessa disse-me que recebe do exército?!
Vinícius entende no que ela está interessada: — Quando vim para está casa já era cego, então não sei se é "luxuosa", e sim recebo do exército.
Vinícius torce para voltarem logo a sala, retira a mão de Mirella da sua perna e se levanta, indo em direção da cozinha.
Mirella o olha espantada: — Você não parece ser cego. Anda direitinho.
Vinícius para e se vira para ela: — E como imaginou que eu andasse? De quatro? Sou cego, não burro ou outro animal qualquer.
Mirella: — Me desculpe não é o que quis dizer! — Diz com arrependimento — Quer que eu o leve a cozinha? — Se levanta e agarra o seu braço.
Vinícius ia responder quando a sua mãe vem com todos da cozinha, Mirella o leva de volta ao sofá. Uma chuva começa a cair, e as chuvas nessa época são intensas e duradouras.
Vanessa: — Mirella, querida, vocês não se importam de passar a noite aqui não é?! Essa chuva não vai passar tão logo não! E amanhã é domingo!
Vitor: — Com certeza podemos ficar. Gostaria muito de conhecer o resto da propriedade e amanhã teremos mais tempo.
Mirella: — Será um prazer! — aperta o braço de Vinícius — Se não for atrapalhar!
Vinícius não tem opinião, não lhe perguntam se quer hospedes em sua casa. Sua própria casa.
Dona Dalva coloca o bolo na mesa do centro, serve um café a todos. "E disse que o bolo era para ele" pensa Vinícius. "O bolo e a armadilha."
A conversa entre eles discorre sempre ao redor da casa, do que possuem, e de como Vinícius não dá trabalho. Como se ele fosse um animalzinho de estimação, dócil e obediente com a necessidade de se acasalar. Vinícius raramente participa das conversas respondendo com monossilabas ou concordando com a cabeça. De vez em quando sente a mão de Mirella em sua perna a apertando disfarçadamente.
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Atualizado até capítulo 51
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