Voltando para o trabalho

"Gina"

Tenho uma semana ainda antes de voltar a trabalhar, limpei meu apartamento, tirei Anderson da minha vida quase totalmente, porque continuo indo à academia, tendo minhas aulas de tango.

Tento ir sempre nos horários que sei que ele não vai estar lá, mas hoje ia saindo e trombei em alguém. Quando ergui a cabeça, lá está Anderson me segurando para eu não cair. Me afastei rapidamente.

— Me desculpa Anderson! Estava distraída.

— Tudo bem, Gina, sem problemas. Como você está?

— Estou ótima, vivendo um dia de cada vez.

— Que bom, você continua linda. Já aprendeu a dançar Tango?

— o meu professor é maravilhoso, mas sou igual a uma porta de tão dura.

— Você vai chegar lá, tenho certeza.

— O papo está bom, mas estou atrasada, tchau, bom treino.

— Tchau, minha gata selvagem. Ela me lançou um olhar triste e foi embora. Que saudades, só de sentir o corpo dela encostado no meu já sinto meu coração doer, mas me aguarde, não desisti de você, meu amor.

"Anderson"

Vinha saindo do meu treino e vi Gina entrando, com certeza indo ter aulas de tango com aquele professor saradão.

Ela vem tão distraída que, se eu ficar parado aqui, ela vai trombar em mim, é exatamente o que eu faço.

Deixei-a trombar em mim e segurei Gina em meus braços. Que saudade de sentir esse perfume, minha mulher, estou morrendo sem seu carinho.

“Gina”

Entrei no hospital, passei o cartão e subi para o andar. Minha gestora me chama:

— Gina, bom dia! antes de você começar a trabalhar, precisamos conversar. Pensei:

Quando minha gestora me chama assim, é que vem rojão.

— Pois não pode falar, aconteceu alguma coisa? Fiz algo de errado?

— Não, Gina, é que enquanto você estava fora, houve umas modificações no quadro de funcionários e você, como é excelente enfermeira, foi transferida para a área particular do hospital.

— Ok, onde vou trabalhar, então?

— Na área vip Gina, são dois quartos por enfermeira, são pacientes que demandam atenção constante.

— Sei, os ricos e chatos, vou fazer o meu melhor para não estrangular nenhum deles, tá?

— Suba no sétimo andar e assume seu posto. A enfermeira da noite vai estar lá te esperando para te passar o plantão. Gina, boa sorte.

— Muito obrigado.

Achei o jeito da gestora estranho, mas de repente a estranha sou eu. Subi no elevador e fui, era só o que me faltava, ter que ser babá de um bando de ricos que nem estão doentes, a maioria se interna até por stress, daí me paciência, senhor. Cheguei no andar e fui recebida pela Suellen, a enfermeira da noite.

— Bom dia! Gina, fiquei muito feliz de você ter vindo para cá, vou adorar trabalhar com você.

— Bom dia! Suellen, e como vão os pacientes?

— Tudo tranquilo, temos dois internados, uma apendicite e uma pneumonia.

— Certo, como estão os pacientes com alguma intercorrência?

— Não, tudo tranquilo até agora, Gina. Suellen me levou no quarto onde conheci um senhorzinho de uns 79 anos super simpático e conversador, me passou os detalhes da medicação dele e fomos para o outro quarto.

— Esse aqui é mais implicante, reclamou até da água que não dei para ele, está voltando da anestesia e dorme no momento, mas é tão bonito que dá para esquecer que é tão chato. Vejo ela dar um suspiro sonhador. Suellen vai embora, vou ler as prescrições para ver a hora da medicação, não pode ser, li de novo, realmente o nome na prescrição é Anderson Venturelli, será que tem dois? Não pode ser ele, o destino está brincando comigo? Vou ter que cuidar da apendicite dele? 

Nisso, a campainha toca me chamando, é do quarto dele, pode ser que seja só o nome igual. Fui lá, entrei devagar e lá está Anderson, se eu pudesse sair correndo e não voltasse mais, mas é meu trabalho.

Lembrei do que Suellen falou e realmente é muito bonito, mas é safado e traidor, e continuo magoada.

Liguei o modo de trabalho e fui beirando a cama. Falei com o paciente:

— O senhor está sentindo dor? Precisa de alguma coisa? 

“Anderson”

Lá está Gina, vi nos olhos dela a vontade de fugir, mas ela valoriza demais a sua profissão. Então entrou no quarto, muito profissional e séria, me perguntou o que quero, se tenho dor, da vontade de dizer (Quero você) mas me contive e disse:

— Um pouco de água, por favor, estou com a boca seca, parece que vai rachar.

— O senhor está voltando da anestesia, é normal sentir a boca seca, mas não pode beber água ainda.

— O que posso fazer? Sinto como se a minha boca fosse rachar, me ajuda, enfermeira.

— Vou trazer um copo e um algodão para molhar os lábios, é o que pode ser feito por enquanto.

 “Anderson”

Ela vai molhar os meus lábios com um algodão, eu vou adorar. Gina voltou e disse:

— Aqui está, molhe de vez enquando os seus lábios e assim que o médico liberar para beber água, eu te aviso.

— Você poderia fazer para mim, enfermeira? Estou com as mãos tremendo, tenho medo de me molhar.

Vi Gina estreitar os olhos, mas não me questionou, falou.

— Claro, senhor Anderson.

Voltei, peguei a água e o algodão e molhei os lábios dele. Ele ficou me olhando com aqueles olhos verdes que conheço tão bem. Comecei a ter palpitação e só não corri para fora do quarto para Anderson não perceber o tanto que me afeta. Falei.

— Pronto, volte a dormir, daqui a pouco é hora do banho, venho te auxiliar.

— Vou esperar com ansiedade, à sua volta, enfermeira Gina.

— Sou uma profissional aqui, não tenha nenhuma ideia torta, ouviu?

— Claro! Lembre-se de que estou operado. E você tem obrigação de cuidar de mim, minha enfermeira.

Chegou a hora da medicação e do banho, fui auxiliar o outro paciente e cheguei ao quarto do Anderson, respirei fundo, me acalmei e entrei.

— Senhor Anderson, vou te dar o remédio para dor e o senhor pode ir tomar banho, o médico já liberou a dieta e a água

Continuei falando sem olhar para ele.

— Enquanto o senhor toma seu banho, eu troco as roupas de cama e depois vou fazer seu curativo.

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