Quando Henry acordou no quarto de hotel de Lily, precisou de alguns segundos para reconhecer o ambiente ao seu redor. Era um lugar pequeno, com móveis antigos e cortinas escuras, que deixavam o ambiente um tanto sombrio e carregado. Não parecia um lugar ideal para uma adolescente. A cama era simples, o papel de parede desbotado, e o silêncio no ambiente dava a impressão de isolamento, como se estivessem distantes de tudo e de todos. Ainda assim, havia algo no quarto que fazia com que parecesse o esconderijo perfeito para alguém que precisava "desaparecer".
Eles haviam passado horas discutindo. Lily contara sua história, revelando detalhes obscuros e tecendo argumentos sobre como acabou se envolvendo de tal forma que a vida de Henry estava, de certa forma, nas mãos dela. Ela explicou sobre criaturas que viviam às margens da sociedade, sobre as lendas que muitos consideravam apenas histórias assustadoras, mas que, segundo ela, eram a mais pura realidade. Vampiros e caçadores. No início, ele tentava absorver tudo, mas ao final, a exaustão mental tomou conta. Ele não queria mais ouvir sobre aquele mundo de sombras.
A madrugada avançava, e Henry precisava voltar para casa. Enquanto ela falava, ele só conseguia pensar em Wendy e em como não tivera a chance de vê-la. A ausência deixava uma sensação de angústia, e ele sabia que sua família devia estar preocupada com sua demora.
— Ok. Então faça as malas — disse ele, com um tom impaciente, depois de tanta história maluca. Por mais que Henry tentasse não acreditar em nada do que Lily contava, ele sabia que, no fundo, havia algo sinistro. Tudo parecia desafiar sua sanidade, e as coisas que Lily lhe mostrara davam a entender que, por mais inacreditável que fosse, nada daquilo era uma mentira.
Lily o olhou, surpresa, não esperando aquela reação de Henry. Seus olhos traziam um misto de surpresa e cansaço, mas também um alívio que ela tentava disfarçar.
— Você quer e precisa de alguém para te proteger. Não sei se sou a melhor pessoa para fazer isso, mas acho que será melhor do que te abandonar sozinha. Além disso, acho praticamente impossível alguém invadir a casa dos Clarke. Aquilo é uma verdadeira fortaleza. Lá estaremos seguros.
Lily baixou a cabeça e, pela primeira vez em muito tempo, esboçou um sorriso aliviado. Uma expressão que parecia ter sido perdida em meio a tantos medos e segredos que guardava.
— E como eu devo entender... Se eu te abandonar, você morre. E se você morrer, eu morro também, não é? Até que a morte nos separe… — Ele soltou um riso irônico, enquanto Lily permanecia calada, sem querer confirmar nem negar. — Previsível e irônico. Mais um motivo para não te deixar aqui. Arrume o que precisa. Não posso ficar até amanhã; tenho meus compromissos — Henry revirou os olhos, tentando controlar a inquietação que sentia diante de tudo aquilo.
Ele saiu do quarto, oferecendo-lhe privacidade para arrumar suas coisas, e sentiu-se tomado por uma confusão de emoções. Lily era, sem dúvida, bonita, com seu cabelo longo e liso caindo até os ombros, uma pele clara que parecia quase translúcida sob a pouca luz do quarto, e um perfume suave, com cheiro de flores, que ficava no ar. Mas, apesar de toda a beleza dela, seu coração pertencia a Wendy, e ele sabia que isso jamais mudaria.
Ainda assim, seu senso ético e seu instinto de sobrevivência falavam mais alto. Henry nunca tivera a confirmação dos sentimentos de Wendy, e talvez nunca a tivesse. Então, por enquanto, precisava focar no que estava diante de seus olhos. A preocupação com seu amor teria que esperar.
Quando Lily abriu a porta para sair, estava arrumada com cuidado. Vestia um vestido vermelho moderno e ajustado ao corpo, que realçava sua figura sem ser vulgar. Havia um toque de timidez em seu sorriso, como se ela realmente nunca tivesse tido muito contato com outro garoto antes, e isso a deixava vulnerável e um pouco deslocada.
Henry a observou por um instante, tentando entender como aquele mundo novo, feito de mistérios e segredos, o arrastara para longe de tudo que ele conhecia. Ao mesmo tempo, sabia que estava assumindo uma responsabilidade da qual não poderia mais escapar.
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Ele pegou a sua, agora esposa, pelas mãos, fazendo-a recuar ligeiramente ao sentir o toque.
— Agora eu sou seu esposo, até esse pacto acabar — ele disse, mantendo o olhar fixo nos olhos de Lily. Seu tom de voz era baixo e determinado, carregado de uma intensidade que a fez prender a respiração por um momento. — Enquanto isso, não podemos levantar suspeitas... você será uma garota refugiada que veio para a Inglaterra em busca de um novo começo. Nós nos encontramos por acaso no parque, há um mês. Nos apaixonamos, fizemos uma loucura, nos casamos, e agora você vai morar comigo. — Ele fez uma breve pausa, pensando em cada detalhe. — Você é órfã e usou todo o restante do dinheiro que tinha para vir para cá. Vai morar comigo na casa da família Clarke para não ficar na rua. E essa é a nossa história. Se alguém perguntar, você confirma mil vezes, e eu outras mil, até que nós mesmos acreditaremos nessa mentira. Combinado?
Os olhos da vampira brilharam com a história bem-intencionada de Henry White. Ela reconhecia as falhas no plano, mas, dadas as circunstâncias, era o melhor que podiam fazer. Além disso, Lily não conseguia se concentrar muito nos detalhes da história; estava hipnotizada pela seriedade dele e pela maneira como demonstrava uma determinação inquebrável para resolver aquela situação. Seu coração, algo que raramente acelerava, agora palpitava com cada palavra que ele pronunciava. Aquilo era só um acordo, ela repetia para si mesma, tentando controlar as emoções.
— Obrigada. — Lily falou em um sussurro, envolvendo-o em um abraço forte. — Mesmo que você esteja fazendo isso por obrigação, está respeitando meu espaço e meus sentimentos. Sempre serei grata por isso, humano. — Ela fez uma pausa, procurando as palavras certas. — Mesmo que esse pacto algum dia deixe de existir, você sempre terá minha lealdade. E não existe nada mais eterno que a lealdade de uma vampira. — Ao terminar de falar, seus olhos vermelhos brilharam com uma determinação feroz, e Henry sentiu o corpo arrepiar em uma estranha mistura de medo e admiração.
Eles caminharam juntos do hotel até a casa dos Clarke em plena madrugada, mantendo um silêncio pesado. Henry sabia que o clima em casa estaria tenso, mas não imaginava o que o aguardava. Ele já podia imaginar sua mãe e irmãs procurando por ele desesperadamente. Cada passo aumentava a ansiedade, e Lily, ao perceber a inquietação dele, segurou sua mão, num gesto de apoio.
Quando finalmente viraram a esquina que levava à casa, o cenário diante deles era muito pior do que Henry havia antecipado. Sua mãe estava sentada na soleira da porta, envolta num roupão, com o rosto molhado de lágrimas, soluçando incontrolavelmente. Wendy, a abraçava, tentando consolar a mãe de Henry, embora também tivesse o rosto marcado pelo cansaço e preocupação. Caroline, a irmã do meio, andava de um lado para o outro, gesticulando com o telefone em mãos e xingando algum policial ao telefone, claramente irritada com a falta de notícias. Sarah, a caçula, chorava copiosamente ao lado da mãe, olhando ao redor como se esperasse que Henry aparecesse a qualquer momento.
Enquanto isso, os funcionários da casa pareciam participar da busca, vasculhando o quintal e os arredores da propriedade em vão. A cena caótica fez o estômago de Henry revirar, e ele percebeu o quanto sua ausência havia abalado todos.
— HENRY! — Sua mãe foi a primeira a vê-lo, levantando-se de repente e correndo em sua direção, o rosto ainda banhado em lágrimas. Ela o abraçou com toda a força, os braços trêmulos de alívio e desespero.
Ele sentiu o peso da responsabilidade recair sobre ele ao ver o rosto de sua mãe. Sabia que sua vida nunca mais seria a mesma desde aquele pacto e que estava arrastando sua família para uma situação que eles jamais poderiam compreender.
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Atualizado até capítulo 21
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