ISABEL
Lá estava eu, jogada no meu quarto. Não conseguia imaginar que teria que me casar com um ser desprezível como aquele velho. Lágrimas escorriam dos meus olhos e eu só conseguia chorar. Deveria ter jogado uma faca em sua direção, isso sim!
"ISABEL!!" meu pai começa a bater na porta agressivamente. "Volte para aquele jantar agora!!"
Ignoro suas batidas e seus gritos, só conseguia ouvir os sussurros do padre e, acredito, de outros convidados.
"Ela está rebelde deste jeito graças a vocês," ele grita e logo sai.
Não ouço mais nada, então podia chorar em silêncio agora. Olho para as estrelas e vejo que até elas aquela noite não brilhavam como antes. O aroma das rosas abaixo de minha janela não tinha os mesmos cheiros e nem o vilarejo tinha a mesma alegria. Parecia que tudo para mim tinha perdido o brilho e o interesse, só de pensar em ter que dizer sim àquele monstro meu corpo tremia e minha mente balançava de medo.
Mas algo naquela noite trouxe um pouco de brilho de volta: uma bola de pelo completamente preta, com olhos azuis que ronronava e miava.
"Olá, você," olho para ele e o mesmo se aproxima sem medo algum. "Por que tenho que me casar?" Lágrimas ainda desciam dos meus olhos. Fico fazendo carinho em seu pelo até me acalmar um pouco; ele me lambe e dá leves mordidas.
"Ai!" Ele me olha e eu dou um leve sorriso. "Isso dói, sabia?" Recebo como resposta um miado e uma lambida.
"Preciso fugir deste reino ou orar para que alguém me salve deste casamento," o coitado do gatinho apenas me olhou como quem não estivesse entendendo nada. "Estou sendo obrigada a me casar com um velho que nem a meretriz mais feia de um bordel aceitaria," rio do meu próprio comentário.
"Preciso de um salvador, de beleza razoável, para que eu me livre disso e precisa ter muito dinheiro para meu pai o aceitar," logo percebo que estou falando com um gato. "Ora, por que estou falando isso para você?"
Lá estava eu, ainda em prantos, quando um som suave de música começou a se elevar das ruas abaixo. A curiosidade venceu o desânimo, e me arrastei até a varanda para ver de onde vinha essa melodia. Para minha surpresa, era um pequeno grupo de músicos ambulantes que pareciam ter escolhido aquela noite para alegrar as ruas do nosso vilarejo. O som do violino misturava-se com o de uma flauta, criando uma harmonia tão envolvente que, por um momento, esqueci de minhas tristezas.
A música trouxe alguns moradores para suas janelas, e até mesmo algumas pessoas da rua começaram a dançar sob a luz fraca dos lampiões. Observando-os, senti uma pontada de inveja pela liberdade que tinham, algo que parecia tão distante para mim naquele momento. Entrei de novo no quarto e me sentei ao lado do gato, que parecia observar a cena lá fora com tanto interesse quanto eu.
"Pelo menos você é livre, pequeno amigo," murmurei para o gato, que ronronou em resposta. "Livre para ir onde desejar, sem deveres ou obrigações forçadas." O gato parecia compreender minhas palavras, ou talvez apenas gostasse do tom da minha voz, pois se aninhou mais perto, buscando conforto em meu colo.
Essa pequena criatura, um ser tão insignificante aos olhos de muitos, tinha me trazido um alívio momentâneo das minhas preocupações. "Se ao menos eu pudesse encontrar uma saída como você encontra seu caminho nas sombras," continuei, acariciando sua cabeça suavemente. "Não quero passar minha vida ao lado de alguém que não respeito nem amo. Quero escolher meu próprio destino, mesmo que isso signifique desafiar todas as expectativas."
Foi então que uma ideia começou a se formar em minha mente. Se eu pudesse escapar, fugir para algum lugar onde ninguém me conhecesse ou esperasse que eu seguisse suas regras arcaicas, talvez pudesse encontrar a felicidade em meus próprios termos. Mas onde eu iria? Como uma jovem de família nobre poderia sobreviver sozinha lá fora?
Os pensamentos giravam em minha cabeça quando, de repente, ouvi um leve arranhar na porta do meu quarto. Levantei-me cautelosamente e abri a porta, encontrando meu irmão mais novo, Ricardo, com uma expressão preocupada.
"Isabel, você está bem? Eu ouvi o pai gritando mais cedo," ele sussurrou, olhando para trás para garantir que não fôssemos ouvidos.
"Estou tentando ficar, Ricardo," respondi, tentando forçar um sorriso. "Mas eu não posso me casar com aquele homem. Eu simplesmente não posso."
Ricardo entrou e fechou a porta atrás de si, sentando-se ao meu lado. "Eu sei, irmã, e eu também acho que você não deveria. Tem que haver outra maneira."
"Eu estava pensando... talvez eu pudesse fugir. Encontrar um novo lugar, uma nova vida onde ninguém saiba quem eu sou."
Ricardo me olhou com surpresa, mas depois de um momento, sua expressão mudou para uma de determinação. "Se é isso que você quer, eu vou ajudá-la. Mas precisamos de um plano."
Assim, passamos a noite em claro, traçando planos e considerando todas as possibilidades. Ricardo sugeriu contatar um amigo dele que trabalhava nos navios mercantes. Talvez pudesse nos ajudar a conseguir passagem para um lugar distante. Era um plano arriscado, com muitos "se", mas dentro de meu coração, eu sabia que era a única chance de encontrar minha própria liberdade e felicidade.
Ricardo não era um filho real, já que foi fruto de um romance entre meu pai e uma serva; ele nunca foi reconhecido como filho, mas meu pai também não o deixava passar necessidades. Assim, ele morava conosco, mas não podia participar de absolutamente nada que envolvesse o reino.
Para a tristeza de meu pai, não havia como trocar o filho. Queria eu ser a bastarda e não Ricardo.
Ele era o príncipe perfeito, mais jovem do que eu por apenas dois anos, e tentava me proteger de todo o mal do mundo, mesmo não podendo. Às vezes penso que meu pai casaria com a mãe de Ricardo apenas para colocá-lo no governo, mas a igreja nunca aceitaria.
Todos os planos que criávamos tinham algum contratempo, sem falar que era quase impossível invadir o castelo; sair dele era ainda mais difícil. Eu tinha seguranças noite e dia, sempre rodeada por uma dúzia de damas, e agora com esse "noivado", minha segurança seria reforçada para garantir minha pureza até o casamento.
"Se aquele velho encostar em você, uso ele como alvo", Ricardo disse, me fazendo sorrir com seu comentário enquanto ele andava de um lado para o outro. "Posso por veneno na bebida dele!"
"Está louco?" levantei rapidamente. "Se alguém ouvir isso, podem até cortar sua cabeça na guilhotina."
"Melhor que ver minha irmã ter que casar com uma múmia ambulante", ele retorquiu, e eu comecei a rir. "Não ria, é sério. Aquele homem está apenas andando, porque morrer ele já morreu há décadas."
Até o gatinho que ainda estava em meu quarto parece ter gostado dos comentários de meu irmão.
"Vejo que está melhor", saltamos ao ouvir a voz de meu pai. "Ricardo, saia."
"Mas p..."
"SAIA!" Ricardo fez uma reverência e saiu, mas percebi seu soco na parede quando ele virou o corredor. "Temos que conversar!", disse meu pai em seguida.
O ignoro e tento sair até que ele segura meu braço com força.
"Você é uma princesa, e eu sou o rei", ele fala em tom sério, apertando meu braço.
"Então é sobre isso? Sobre um rei? O rei louco também era rei, mas era louco", retruco, enquanto ele aperta ainda mais meu braço.
"Sua fedelha", ele me acerta com um tapa no rosto. "Vai se casar com o Lord Comerd, caso contrário mandarei executá-la", ele me joga no chão e meu ódio era tanto, mas eu apenas permaneci chorando, com a mão no local do tapa que eu havia recebido.
"Espero que ele não desista do noivado, caso contrário, Isabel, mostrarei a você onde fica o calabouço", ele diz e sai, enquanto as portas do meu quarto são fechadas. "Não a deixem sair deste quarto e ninguém entrar."
Vejo a bola de pelo saindo pela janela e percebo que agora estava sozinha; nem mesmo o gatinho queria ver aquela triste realidade. Casar-me com um homem que nunca vou amar, era esse mesmo o meu destino?
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Atualizado até capítulo 20
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