CAPÍTULO 2
Isabel
Ali estava eu, acenando para uma multidão de súditos, com meu pai ao meu lado, radiante ao apresentar sua herdeira a todos os nobres do reino. Era como se eu portasse uma placa ao pescoço, num leilão de gado, pronta para ser arrematada ao maior lance. Não passava de uma bezerra premiada, mal sabiam os ofertantes que, além de meu título, nada mais possuía. Exausta estava eu; o vestido apertava, o espartilho roubava-me o fôlego, e uma fome voraz me consumia. Após uma eternidade, consegui enfim retirar-me daquela exibição.
"Maria, prepare meu banho", ordenei, enquanto caminhava, entregando-lhe minhas luvas. Ela, seguindo-me às pressas, assentiu.
"Alguma outra instrução, senhorita?" Neguei com a cabeça e desci as escadas, passando por meu pai sem proferir palavra. Por onde andava, os criados inclinavam-se e murmuravam elogios.
Adentrei a cozinha e, sem cerimônia, abocanhei um pedaço de bolo. O cozinheiro, testemunhando meu ato, não pôde conter um sorriso.
"Bom dia, Isabel!" saudou-me, estendendo-me um lenço para limpar a boca.
"Ah, Fábio , este bolo está divinal", exclamei com a boca ainda cheia, provocando seu riso.
"Se seu pai descobre que está aqui, é minha cabeça que ele corta!"
Mal ele terminou de falar, a voz de meu pai ecoou, furiosa, pela cozinha. Eu prontamente me agachei atrás do balcão, em completo silêncio.
"Onde ela está? Isabel!"
"Não a vi por aqui, senhor. Já procurou no jardim?" Joe tentava distraí-lo, manuseando panelas, enquanto meu pai vasculhava o lugar.
Aproveitei para me esgueirar até uma passagem secreta e escapar dali. Era revigorante ter esse espírito rebelde, embora soubesse que tal ímpeto ainda me custaria caro.
"Passei longos minutos contemplando as rosas do jardim; era reconfortante estar ali, longe do tumulto do castelo e das damas de honra, além das obrigações para cada refeição. Estava cansada daquela vida e pensava em um pó mágico que me fizesse sumir, ou ao menos me transformasse em uma camponesa. Não queria ser tão rica a ponto de lidar com o alvoroço do noivado.
"Ah, achei você!" Maria me olhou com os olhos semicerrados enquanto eu suspirava profundamente. "Sim, me encontrou! Que alegria!" Gesticulei com as mãos, fazendo-a rir.
"Seu pai está furioso, Isabel!" Revirei os olhos e me joguei no banco de forma dramática. "Queria que o fogo o consumisse de uma vez."
"ISABEL!" Ela me repreendeu. Meu pai, mais do que um rei, era alguém a quem obedecíamos cegamente. O papel de pai estava longe dele.
"Ande logo, Isabel!" Ela me puxou, embora soubesse que receberia bronca de qualquer jeito. "Vou inventar uma desculpa para o rei. Pelo amor de Deus."
Ela parou quando ouvimos gritos na sala do trono. Meu pai estava furioso com meu atraso de talvez 20 minutos? Não era minha culpa se ele organizou um encontro com os solteiros ricos dos reinos.
"Vossa alteza." Maria abriu a porta e meu pai sorriu ao me ver, embora ainda estivesse furioso. Homens se curvaram à minha passagem, alguns parecendo confundir a sala com uma creche real.
"Que bom que a princesa se juntou a nós." O padre apareceu, e eu me curvei a ele. "Sua benção, padre." Meu pai sentou-se em sua poltrona, e a formalidade começou.
Todos os pretendentes se apresentaram com seus títulos e terras. "Até quando esse castigo, pai?" Sussurrei, recebendo um olhar gélido em resposta. Voltei a sorrir, embora minhas bochechas doessem de tanto forçar o sorriso.
Foram horas intermináveis tendo que presenciar aquela tortura. Não importava o quanto eu desejasse escapar, meu pai insistia em me manter ali, submetida a todos aqueles pretendentes intermináveis com suas piadas e poemas tão medíocres que muitas vezes me faziam rir de vergonha.
"Pessoal, a princesa precisa se retirar agora para sua aula de francês", eu olho para Maria com um olhar extremamente grato. "Muito obrigada pela presença de todos."
Ao me levantar, todos se curvam. Meu pai permanece na sala, avaliando seus candidatos, pois até agora nenhum deles despertou qualquer interesse em mim. Houve um ou outro que conseguiu arrancar um sorriso, mas eu preferiria casar com um cabrito do que com qualquer um deles. Fico imaginando como seria ser uma pessoa comum, sem obrigações reais, reinos para governar ou títulos para carregar. Como posso ter tanto poder ao meu dispor e, ao mesmo tempo, não ter nenhum poder sobre minha própria vida e escolhas? Nem sequer posso escolher casar com alguém minimamente decente, pois isso poderia desencadear uma guerra entre a igreja e os povos de todo o mundo.
Por um momento, suspiro profundamente, talvez alto demais, pois meu professor me olha por cima das armações dos óculos e se senta ao meu lado.
"Algum problema?", ele pergunta com seu belo sotaque francês. "Sim, senhor", respondo com um sorriso, mas é pura mentira, já que minha mente só pensa em ser livre.
"A lição de hoje é sobre h...", ele começa, mas o interrompo olhando-o nos olhos. "Podemos apenas revisar a matéria da última aula?" Ele me encara surpreso.
Em um dia normal, eu estaria fazendo piadas e o provocando, como faço com todos os meus outros professores ou escritores.
"Essa ideia de noivado está realmente te incomodando, não é, princesa?" Eu assinto com a cabeça. Apesar de os cervos não poderem se intrometer na vida de seus senhores, eu não dou importância, pois logo após a morte de minha mãe, meus cuidados foram atribuídos a tutores e babás.
"Fábio, vamos lá, Isabel precisa copiar a matéria", ele me olha e revira os olhos. "Eu odeio francês", eu digo, e ele ri.
"Sua mãe costumava dizer a mesma coisa, acredita?" Ele começa a falar sobre minha mãe, mas logo pigarreia e para. "Ah, vamos lá, Fábio, continue! Não sei quase nada sobre minha mãe, todos sempre fogem dessa história."
Tudo o que sei sobre minha mãe é que ela morreu no meu parto, o que deixou meu pai incrivelmente triste, pois além de perder sua esposa, ele não obteve um herdeiro ao trono, apenas uma princesa. Assim, minha única salvação é me casar com um príncipe, um rei ou alguém quase tão poderoso quanto um dos dois.
"Seu pai proibiu qualquer menção sobre sua mãe, e você sabe disso, Isabel", ele sorri.
Fábio era bonito, com cabelos negros, olhos cor de mel e cachos, seus braços eram fortes e sempre se vestia impecavelmente, o que destacava sua beleza. Ele tinha cerca de um metro e oitenta, muito mais alto do que eu. Fábio era casado e tinha duas filhas, quatro anos mais novas que eu; as gêmeas davam a ele bastante trabalho.
"Só queria saber algo sobre ela", murmuro, apoiando minha cabeça na mesa de estudos. Ele não diz uma palavra, nem mesmo sobre a aula. Acho que ele percebeu que eu estava cansada e apenas queria dormir, então foi o que fiz, cochilei e só acordei quando a doce voz de Maria me chamou.
"Senhorita?", ela me avisa. Eu me ajeito na cadeira, ainda sonolenta. "Está quase na hora do jantar", ela diz enquanto olho pela janela e vejo que já está escuro.
"MARIA!" Eu me levanto abruptamente, "Hoje jantarei com as princesas de Rosalina". Saio quase correndo, e Maria ri do meu desespero.
"Calma, senhorita. Seu pai cancelou o jantar com as jovens e marcou um chá da tarde para amanhã", ela me informa. Eu paro no meio da escada, perplexa. "O que meu pai está planejando?"
Ele nunca desmarcava nada; geralmente, o rei determinava tudo. Então, mudar de ideia tão bruscamente indicava algo sinistro, algo que me deixava completamente assustada e desconfiada nessa competição para ver quem leva minha mão em casamento.
"Você está bem, princesa?" Maria me traz de volta à realidade. Concordo, embora sem entusiasmo. "O rei mandou sua costureira trazer esses dois vestidos para você." Ela me mostra um vestido azul com pedras, mangas abertas e detalhes delicados, e outro vermelho que me atraiu ainda mais, com seu tom vibrante.
Depois de ser apertada até a alma pelo espartilho, que limitava meus movimentos devido aos ossos de baleia, Maria termina meu cabelo. Batidas na porta a distraem, e ela volta com uma caixa de joias. Ao abri-la, revela um colar de rubis e dois pequenos brincos em forma de flores, ornamentados com rubis também.
"Seu pai quer que você use isso hoje à noite, aparentemente", Maria comenta. Olho para ela com desconfiança, não dela, mas do meu pai. O que ele está planejando?
Ela coloca as joias em mim, e percebo que combinam perfeitamente com o vestido e o penteado.
"Quer algo nas bochechas esta noite, princesa?" Recuso. Não costumo usar muita maquiagem em jantares informais em nosso castelo. Além disso, não me importo muito com a opinião de quem meu pai esteja tentando impressionar.
Meu pai sempre foi ambicioso, fazendo de tudo para se elevar acima dos outros, mas as condições do reino não estavam boas. Foi assim que surgiu a ideia de me tornar noiva. Embora eu tenha dezenove anos, considerada adulta pela igreja, meu pai não se importava comigo enquanto a escassez de dinheiro não o afetasse diretamente.
Semana passada, ele decidiu anunciar minha mão em casamento, afinal, quem não deseja casar com uma princesa? E assim começou meu pesadelo.
Desço as escadas pronta, e na sala de jantar ouço risadas altas, indicando que alguém importante está presente. Tudo que consigo pensar é: "Que não seja outro pretendente!"
Ao adentrar a sala de jantar, percebo a prataria impecavelmente posta. Na mesa estavam o padre Marcelo, o filósofo Antonio, o ministro e seu conselheiro, além de alguém desconhecido para mim. Ao notar minha presença, todos à mesa se levantam e se curvam, exceto meu pai.
"Querida, está impecável," ele me elogia e vem em minha direção, beijando minhas mãos. O toque de sua barba áspera me causa formigamento, mas mesmo assim o olho com delicadeza. "Venha, sente-se. Quero que conheça o Duque Estaburk, ele é dono de quase toda Elfazema."
Olho para o homem e percebo que pela idade, se meu pai não estivesse louco, não faria o que eu estava pensando. O duque logo se levanta e anda em minha direção.
"É um enorme prazer, Vossa Alteza," ele beija minha mão e se curva, e ao sorrir percebo que lhe faltam dentes, além de cabelo e beleza. "É ainda mais bela pessoalmente, os artistas não acertam seu nariz."
Olho para meu pai incrédula. Este homem realmente estava dizendo aquilo? Tento manter meu sorriso educado, mas seus comentários são cada vez mais desnecessários.
"A princesa tem quadris largos, pode ter muitos filhos, não é mesmo, Rei?" Meu pai concorda, e me limito a sorrir, já que não poderia fazer qualquer comentário com a presença da corte ali. "Mas pela idade..."
"Estou faminta, meu pai," o corto, fazendo meu pai me olhar com certa reprovação. "Perdão pela falta de modéstia, mas estive estudando a tarde toda e estou prestes a desmaiar."
Finalmente aquele homem cala a boca e nos sentamos para jantar. Ele tenta puxar conversa comigo durante todo o jantar, mas sempre desvio de suas perguntas.
"Princesa Isabel, já pensou em se tornar freira?" Olho surpresa para o padre Marcelo, que me viu crescer e odiava esta ideia de casamento arranjado para mim. Concordo lentamente com a cabeça, mas meu pai pigarreia na mesa, fazendo todos o olharem.
"Bem, não os convoquei aqui apenas para um jantar, quero lhes dar um aviso importante," meu coração acelera por um momento. "A vinda do Duque Estaburk aqui não é apenas para falar de suas terras, e sim para uma futura aliança com Isabel."
Minha mente começa a rodar. Aliança com aquele velho? Minha reação não é controlada.
"NÃO!" Grito, olhando para meu pai. Na hora, o sorriso do velho sem cabelos some e meu pai caminha em minha direção com ódio. "Isabel, calada!" Ele segura meu braço com certa força.
"Eu não me casarei com este homem careca, nem mesmo amarrada!" O conselheiro do meu pai solta uma risada com a bebida ainda em sua boca, o fazendo sujar sua roupa de vinho.
"PARA SEU QUARTO!" Meu pai araste-me escada acima.
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Atualizado até capítulo 20
Comments
Gabi Fernandes
/Smirk/
2024-09-27
1
thalia sousa
Opa to passando so para revisar e n ta tao ruim n kkk /Smile//Smile/
2024-05-30
1