Um silêncio estranho pairou no ar. Antes que qualquer palavra fosse dita, Marcelo agarrou Lucas pelo colarinho. Seu aperto era pesado, como se fosse quebrar seu pescoço ali mesmo. Seu olhar profundo, como se quiser criar um buraco na testa do outro homem. Ele olhou para os olhos levemente vermelhos e olheiras profundas de Lucas, e o arrastou bruscamente para longe do quarto. Lucas não disse uma palavra.
Marcelo puxava seu braço como se estivesse carregando um fardo. Seus passos eram longos e apressados, mas não era uma visão incomum. Pela primeira vez, Lucas não se sentiu interiormente nervoso por essa cena recorrente. Na verdade, ele se sentiu patético, como se observasse seu próprio eu de longe, como um transeunte, vendo um macaco dançando desesperado por atenção na frente de uma plateia com olhos fechados.
Dentro do carro, apenas o motor rígido era audível. Ainda era manhã, mas as ruas estavam inesperadamente pacíficas, como se a única tensão existente no mundo tivesse sido sugada para dentro daquele carro. Olhando para o perfil lateral de Marcelo, ele não era capaz de discernir sua tristeza ou alegria, mas olhando para a firmeza que ele usava para segurar o volante, ele poderia imaginar o turbilhão de emoções que borbulhavam no estômago do homem.
Rompendo o silêncio no carro, ele perguntou.
— você está com raiva?
Marcelo virou o rosto, seu olhar duro.
— Eu deveria estar com raiva?
Lucas observou os olhos do homem antes que o outro virasse o rosto com uma expressão complicada. Ele não conseguia entender, normalmente, Marcelo se voltaria contra ele, não importa quem ou quantas pessoas estivessem presentes, o humilhando das piores formas que conseguisse pensar.
Mas não demorou muito para que caísse em si. Lucas riu interiormente, ele segurou a testa dolorida. É claro, Adriana estava em um estado delicado, a aquiescência recente de Marcelo não tinha outro motivo se não se assegurar que Adriana não correria nenhum risco de permanecer com seus atuais privilégios. Apesar de seu vigor ao declarar tantas palavras hoje, seu estado era delicado, havia uma situação tanto promissora quanto regressiva, e ninguém sabia o quanto ela ainda iria durar.
Quando chegaram em casa, Marcelo o levou até o quarto. Lucas não estava com pressa, ele se sentou na cama e observou o outro homem, esperando qualquer que fosse a reação da outra parte. Apesar de tudo, ainda havia uma centelha queimando fervorosamente em algum lugar dentro de seu peito. Tentando suprimir rapidamente essa sensação, ele notou que era inútil. Ele amava Marcelo, isso era fato, ele amava Marcelo há tanto tempo que sequer se lembrava quando começara a ter sentimentos pelo homem que poderia chamar de irmão, mesmo que não tivessem relações de sangue.
Ele se lembrava claramente de Marcelo, há cinco anos, enquanto pescavam no dique. Eles se sentaram naquela ponte antiquada de madeira, enquanto mergulhavam os pés na água fria, e conversavam livremente. A expressão de Marcelo era suave, carregava uma intimidade intrínseca que apenas relações íntimas poderiam ter, eles compartilhavam uma atmosfera invejável, e qualquer um ficaria admirado com o quão próximos eram aqueles irmãos.
Olhando para Marcelo agora, como se tivesse preso por um fio, a leve centelha persistente se apagou.
— Diga para Bernardo repensar.
Lucas levantou a sobrancelha, ele não sabia do que Marcelo estava falando. Dessa vez, ele não estava fingindo.
— Não acha que eu deveria saber sobre o que ele deve repensar?
Marcelo piscou, sua expressão enrijeceu por um segundo antes de levantar os lábios em auto depreciação.
Ele respirou fundo e se obrigou a falar em um tom suave.
— Esse emprego... Não o tire de mim também.
Lucas percebeu... Para manter Marcelo em suas mãos, e como forma de humilhá-lo, ele o fez perder o emprego algumas vezes. Não era difícil, com sua influência e alguns contatos, Marcelo sequer era aceito em uma loja de conveniência se Lucas não permitisse, sua obsessão era nítida, tanto que ele próprio já havia percebido.
Mas dessa vez, ele não tinha feito nada. Mas tinha um palpite. Ele não falou para Marcelo, mas ergueu levemente os cantos dos lábios, como se debochace do outro homem.
Marcelo observou a cena sentindo um fogo crepitante crescendo dentro de seu peito. Havia uma sensação indescritível acumulada por dentro. Seja ódio, frustração ou qualquer outro sentimento sufocante, estava entrando em erupção.
Lucas observou o homem se aproximar rapidamente, ele segurou seu pescoço sem nenhuma força, mas havia uma influência invisível que o fazia se arrepiar dos pés à cabeça. Ele estava desconfortável.
— E se eu tiver feito, e então? Você já tem o dinheiro que eu deposito na sua conta, é mais que suficiente para se divertir por aí como um vagabundo como você fa-
Um barulho ecoou dentro do quarto.
Lucas segurou o rosto com a palma. Ele arregalou os olhos levemente surpresos, mas por seu rosto ter sido virado com o impacto, não foi capturado por Marcelo, que viu apenas a risada de desdém que saiu dos lábios do homem.
Quando criança, Marcelo era um menino intrigante. Ele não era extrovertido, não era curioso, e muito menos trabalhoso de se conviver. Se os adultos ao seu redor lhe dessem um sinônimo, com certeza seria "comportado". Ele usava a maior parte do seu tempo livre para estudar, a outra parte usava para cuidar de sua mãe drogada, fugir de seu pai alcoólatra e conviver pacificamente com Lucas, tentando manter o que restava de sua casa em ordem.
Quando era adolescente, após a morte de Gregório e as pendências do homem no casarão, ele teve que trabalhar arduamente para conseguir quitar as dívidas, que foram pagas apenas quando Lucas resolveu se envolver de volta com aquela família. Foi quando o pesadelo de ambos começou.
Marcelo nunca foi um vagabundo, como ele sugeriu. Na verdade, ele sempre foi trabalhador. Se houvesse uma figura que ele invejava e aspirava quando criança, com certeza ele pensaria nessa pessoa. Seja isso ou qualquer outra coisa que viesse de Marcelo, ele veria com um halo celestial, como se o homem carregasse algum tipo de chama cintilante, e ele, como uma mariposa, inevitavelmente seria atraído em direção às chamas, queimando-se até às cinzas.
Sentindo o aperto em seu pescoço, Lucas abriu os lábios levemente e disse uma frase que Marcelo com certeza recusaria com ardor.
— eu falarei com ele, contando que você tire suas roupas agora...
Marcelo o soltou, seus olhos lançando facas em direção a Lucas. Inesperadamente, ele começou a desabotoar a camisa.
Notando a atitude de Marcelo, Lucas arregalou os olhos. Marcelo não via uma expressão tão vivida no rosto do homem há anos, o fogo no seu peito se acalmou rapidamente. Ele largou os botões e soltou um som zombeteiro.
Prostituto
Ele sussurrou.
Lucas travou, observando o homem sair pela porta e deixá-lo sozinho no quarto.
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Atualizado até capítulo 31
Comments
Pajar
Que história incrível, autora! Não consegui parar de ler até o final.
2023-10-19
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