Parte 13

• Momento Presente •

Desde o beijo iniciado por Caitlyn, ela e Jinx não trocaram uma só palavra. A xerife teve tempo de sobra para focar em seu trabalho e nas coisas que fazia e passava quase todo o tempo livre com Diana, a parte que julgava boa e nada confusa. A menina trazia várias boas sensações, independente do que os levou a ficarem juntas como uma família e era também bastante inteligente e uma ótima companhia.

Na delegacia as coisas melhoravam com o passar das semanas, fazendo com que a morena ficasse mais habituada com sua rotina no novo sistema com tecnologias que ainda não compreendia, mas que Tai explicava muito bem.

— Hoje teremos uma reunião com os irmãos que vieram de Demacia, Garen e Lux — a inteligência artificial que cuidava de suas tarefas no lugar de sua antiga secretária agora não fazia perguntas mesmo com sua memória afetada.

— Quem são eles — Caitlyn quis saber, sem muito interesse.

Para a sua surpresa, sua eu com todas as lembranças tinha uma boa relação com os visitantes e os conhecia há um bom tempo, o que dificultava o tal encontro.

A zona de fuga da policial foi uma forte dor de cabeça, que permitiu com que fosse apenas gentil e de poucas palavras, tratando de assuntos urgentes sem entrar em detalhes mais pessoais, ou que fugissem do tema da visita.

Tudo correu bem, ao menos até o momento em que descobriu que Lux tinha sido convidada por Jinx para um café em sua casa. Não teria mais como inventar alguma desculpa para a pouca interação que teriam. Talvez Jinx até já tivesse contado seu segredo, se eram mesmo amigas a ponto de convidar para um café em casa.

Mentalmente exausta e sem nenhuma paciência para sustentar suas encenações, Kiramman atravessou o hall de entrada, se livrando de suas luvas, acessórios, chaves e até suas armas. Não anunciou sua chegada, mas fazia barulho o suficiente pra que fosse notada, inclusive com o salto das botas no piso, enquanto tentava fazer um certo malabarismo com todos os documentos que segurava, a fim de não deixá-los cair e se embaralharem no chão.

— Você não vai acreditar na papelada que eu tive que... — a fala de Caitlyn cessou completamente com o que via.

Jinx e Lux estavam no sofá da sala e trocavam um beijo com um ar de brincadeira, entre risos, mas chegou no momento exato para ver a loira aproximar seus lábios dos da atiradora, mesmo que de forma tímida.

Por um momento, a xerife fechou os olhos, se sentindo tonta, como se seus sentidos falhassem, mas continuou de pé. De repente, uma cena de seu passado invadiu sua mente, como se estivesse em um sonho lúcido.

Era Vi na cabine de um luxuoso navio. Tinha a aparência diferente, mais tatuagens, o cabelo preso em um trança de lado e uma roupa de couro que a todo momento a xerife evitava olhar. Sara adentrou a sala e a primeira coisa que fez foi trocar um beijo ardente com Vi, não se importando com a presença de sua ex namorada bem ali. A cena não era agradável para a Caitlyn sem memórias, que ainda tinha Vi em seu coração de alguma forma, mesmo sem saber o que tinha acontecido com ela, mas se vendo na cena que suas lembranças trouxeram de volta, não conseguia sentir nada, como se a Caitlyn parada ali naquela cabine não sentisse absolutamente nada e isso era o mais estranho.

Ela olhava fixamente para Lux e Jinx, que acabavam de se beijar de forma brincalhona, algo em seu coração começou a se agitar. Dessa vez era diferente, a imagem dos lábios de Jinx sendo beijados provocou imediatamente um arrepio estranho na morena, como se estivesse em queda livre, como se fosse abruptamente encontrada pelo medo. Não eram suas lembranças, mas seus sentidos prevendo algo ruim.

Um lampejo de ciúmes e possessividade tomou conta da xerife, uma emoção que ela não conseguia explicar, considerando que não se recordava dos bons momentos que antes existia entre Jinx e ela. Caitlyn segurou inconscientemente com mais força os documentos que tinha trazido, suas unhas pressionando a papelada com uma tensão não intencional.

Jinx notou a expressão no rosto de sua esposa, os olhos da mais velha ligeiramente estreitados, e percebeu que algo estava errado. Se afastou de Lux e se aproximou da morena buscando entender o que estava acontecendo.

— Cait, está tudo bem — perguntou com preocupação em sua voz, tentando ler os olhos de sua esposa.

Caitlyn piscou algumas vezes, como se tentasse dissipar o sentimento que brotava dentro dela. Finalmente, ela soltou uma respiração profunda e forçou um sorriso.

— Sim, está tudo bem. Apenas surpresa com a comemoração, só isso.

Lux, que estava observando a cena com cautela, suspeitou que algo mais profundo estava acontecendo. Ela manteve sua distância e permitiu que Jinx e Caitlyn resolvessem qualquer conflito que pudessem ter.

Com os braços da jovem em volta de sua cintura, a policial ainda tentava lidar com todas as estranhas emoções que se manifestavam em seu corpo, como se ele tivesse as memórias que perdeu. O conflito incessante gritava apenas dentro dela:

"Eu não quero essa nova vida que não escolhi, mas nessa nova vida ela ainda pertence a mim, é minha esposa, é literalmente minha!"

Era óbvio para a investigadora que a responsável pelo beijo era Jinx, ainda que tivesse sido iniciado por Lux, não precisava conhecer a jovem maga pra saber que comportamentos assim não partiriam dela inicialmente, mas no fundo, Caitlyn a conhecia muito bem, já que fazia parte do Conselho de Demacia e da vida de Jinx pela forte amizade que tinham depois de terem trabalhado juntas.

Ainda que não tivesse culpa, a loira parecia reluzir literalmente com sua magia, força, habilidade, juventude e beleza, o que para a xerife era mais do que assustador, combinando com sua personalidade forte, mas gentil e doce. Até Caitlyn facilmente se apaixonaria por ela e isso foi algo difícil de admitir ao tê-la literalmente beijando Jinx no seu sofá e em sua presença.

O quanto isso representava o fim de um casamento já fracassado, que apesar de Caitlyn não desejar, também tinha em seu íntimo o desejo de que não acabasse?

— Boa noite, Lux. Eu soube que é seu aniversário e mesmo assim, está em Piltover cuidando de assuntos diplomáticos em reuniões intermináveis. Sua empenho para ajudar outros é impressionante — a voz de Caitlyn cortou as interações entre Jinx e sua amiga com os passos decididos da xerife em direção a elas — Eu espero que não fique incomodada, se não a cumprimentar da mesma forma com um beijo na boca, mas quero que saiba que desejo o melhor pra você! Feliz aniversário!

Lux, um pouco surpresa com a abordagem de Caitlyn, respondeu com um sorriso sincero.

— Obrigada, Caitlyn. Não precisa se preocupar com isso. A sua presença já é um ótimo presente.

Jinx, por sua vez, observava atentamente a interação entre sua esposa e sua amiga. Ela sentiu o clima pesar no ambiente e estava determinada a conseguir o que queria.

— Chapeleira, você é tão patética, caindo nas minhas mentiras. A verdade é que eu nunca te amei de verdade. Lux sempre foi a minha verdadeira paixão e agora que você perdeu a memória, é a oportunidade perfeita para ficarmos juntas de uma vez por todas. Você não significa nada para mim!

A xerife ficou atônita com a virada repentina de Jinx. Ela não conseguia acreditar no que estava ouvindo.

— Jinx, como você pode dizer isso? Nós construímos uma vida juntas, uma família!

— Uma família? Você realmente achou que eu me importaria com isso — A garota de cabelos azuis riu de forma sinistra — Você é tão fraca, Cait. Agora é hora de você desaparecer da minha vida.

Foi então que Jinx sacou sua arma e apontou para Caitlyn, seu sorriso se transformando em um olhar de pura maldade, brilhando ainda mais em tom de rosa.

— Jinx, não faça isso. Você não é assim. Isso não é você. Pense no que estamos passando juntas.

A garota sorriu de forma ainda mais sinistra, mostrando sua total falta de empatia. Ela pressionou o gatilho, mas, para surpresa de Caitlyn, a arma não disparou. Era apenas um blefe, uma demonstração do quão cruel ela poderia ser.

— Você realmente achou que eu iria te matar, Cait? Eu não sou tão previsível assim. Talvez eu apenas queira que você sofra, que você sinta o que é perder tudo. E com a sua memória perdida, isso será ainda mais divertido.

Kiramman, agora percebendo o verdadeiro perigo que estava enfrentando, sabia que precisava encontrar uma maneira de lidar com essa versão distorcida de Jinx, assim como a de seu passado. Ela sabia que não podia confiar mais na pessoa com quem aparentemente compartilhou sua vida.

— JÁ CHEGA — a voz firme de Lux, ainda que aguda ecoou por todo o lugar e ela parecia realmente furiosa ao estender uma de suas mãos de onde saiu um brilho ofuscante e com sua magia paralisar Jinx onde estava, deixando a garota sem conseguir se mover minimamente — Eu não sei o que está acontecendo, mas já vi seu lado sombrio muitas vezes e estarei aqui para impedir você o quanto for necessário! Somos amigas, não somos?

Em um ato instintivo, Caitlyn havia recuado com a luz que veio em sua direção até encostar na parede e se encontrava ofegante, observando a interrupção agressiva de Lux.

— Somos apenas amigas e eu não vou participar desse jogo em que quer me colocar. Acho que deveriam conversar e se entender — a maga falava de forma bem mais serena, até acalmando os conturbados sentimentos da atiradora em seu momento de insanidade — Eu devo ir embora, mas foi ótimo te ver.

Correndo na direção de Jinx, a loira deixou que seu corpo batesse nas costas de sua amiga, a surpreendendo com um abraço sincero e apertado por trás, fazendo com que ela relaxasse seus ombros e fechasse os olhos por um momento. Não se moveu, mesmo estando livre de sua magia, apenas colocou a mão sobre o braço em volta de seu corpo e ficou ali.

A jovem guerreira conseguia acalmar os conflitos internos que Jinx sentia e fazia isso muito bem, sendo seu freio em várias situações ao compreender pela convivência as nuances de sua insanidade, mas era Caitlyn a responsável por tirá-la da linha em um ato desesperado.

Teria sua antiga vida de volta, nem que tivesse que tomá-la a força. Teria Caitlyn de volta, mesmo que suas memórias tivessem desaparecido.

Assim que Lux partiu, Jinx colocou mais uma vez seu olhar ameaçador sobre Caitlyn.

— Eu não sou sua — disse ofegante e determinada, encarando os olhos azuis da xerife — Você tem escolhas e eu também tenho. Se não quer ficar comigo porque não sabe quem sou, saiba que tenho o mesmo direito e eu também não quero essa sua versão certinha — Jinx se aproximou ainda mais com seu olhar ameaçador e insano — A sua parte confusa que me quer é só um resquício de uma mulher que cresceu com um monte de regras impostas de como deveria ser e agir e que depois de perceber estar envelhecendo rápido demais, quis se aventurar em coisas perigosas pra sentir que era dona da própria vida, mas você ainda não passa de uma covarde podre de rica e que não faz ideia do que é viver de verdade! Eu não vou mais te dar esse gostinho do proibido e politicamente incorreto pra que sua rotina se torne interessante! Não sou mais o seu brinquedinho! E quer saber? Deve ser horrível estar ainda presa nesses padrões estúpidos de ser uma cidadã modelo de Piltover e mesmo assim ter acordado com dez anos de vida a menos, afinal são dez anos — ao final, a garota soltou uma risada travessa e deixou a sala.

O peito de Jinx também doía com tudo o que acabava de dizer, como se aquelas palavras pudessem fazer ela esquecer o que sentia e ajudarem na tarefa de fingir que não se importava, mas era Caitlyn quem mais havia sentido.

A xerife deixou seu corpo deslizar pela parede em que estava encostada e ficou imóvel, como se estivesse paralisada, encarando o vazio sentada no chão. Sentia que devia chorar, mas não conseguia, como se seu corpo fosse um recipiente vazio. Caitlyn apenas se perguntava como era possível que Jinx fosse a pessoa que mais a conhecia no mundo, talvez mais do que ela própria.

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