Parte 6

• Momento presente •

— Os exames mostram que você é uma mulher perfeitamente normal, não há nada de errado com seu cérebro, o que nos leva a crer que é uma amnésia dissociativa. Você perdeu apenas parte da memória e não há como saber quando ela vai voltar, se vai voltar — explicou o médico em meio a sala cheia de rostos preocupados.

Caitlyn continuava com o olhar perdido, reflexiva sobre o quanto aquilo tudo soava estranho. Por mais que tivesse indícios de sua perda de memória, era difícil aceitar que estava casada, com Jinx ainda mais.

— Olha, eu sei que isso parece estranho, mas a Jinx mudou — sussurrou Jayce para a amiga, ainda preocupado, aproveitando um momento em que a garota de Zaun havia se afastado.

A xerife o respondeu apenas com um olhar desconfiado, de quem duvidava muito do que ouvia com os olhos estreitos em direção ao homem.

— Tá, não em sua essência, ou personalidade, mas ela tem trabalhado do lado do bem agora. Até fez parte das guardiãs estelares.

— Parte do quê?

— E você desmascarou Adam e continua sendo a melhor detetive de toda a Runeterra.

Apenas a última frase arrancou um sorriso da morena, que passou a pensar em sua paixão pelo que fazia, talvez isso aliviasse sua realidade dificil.

Jayce estava mais sério, além de ter alguns fios prateados enfeitando seu penteado estiloso. Até Jinx era mais séria do que costumava se lembrar e isso era assustador para Caitlyn.

— Então era o Adam?

A conversa correu bem, acalmando um pouco da ansiedade que dominava a policial, além da terrível sensação de estar em um lugar completamente desconhecido, que diziam ser sua própria casa, mas assim que seu amigo foi embora, se sentiu perdida mais uma vez, em pé e sozinha no meio da sala.

Alguns sons indecifráveis vieram do quarto, indicando que era lá que Jinx estava, então a morena se aproximou devagar e sem fazer barulho para observar pela pequena abertura da porta.

Deitada no meio da cama, a mais nova encarava o teto e falava como se alguém estivesse ali ouvindo, vez que outra fechando os olhos e segurando a própria cabeça entre os braços, gestos descontrolados e claramente vindos do seu distúrbio psicológico.

—Você disse que não iria me deixar, como todos os outros, você disse isso... — Jinx sussurrava com um olhar macabro na direção do teto — Você me fez acreditar que não era como eles — uma risada nervosa escapou dos lábios da jovem, fazendo algo doer no peito da policial, que não sabia exatamente o que era aquilo — E agora diz que não se lembra de nada, nem da nossa própria filha, mesmo com todos os vídeos, fotos, cartas... Grrr...

Caitlyn engoliu a seco, por mais que parece inviável que se casasse com uma completa maluca e criminosa, sentiu pena da mulher que estava sobre a cama pelo que seu estado. Se aproximou devagar e sentou ao seu lado na cama com ambas as mãos no colo, enquanto procurava pelas palavras certas, mas ainda sem encarar a mais nova.

— Sabe, estamos casadas e eu ODEIO esse fato, não consigo imaginar como isso pode ter acontecido, já que perdi a memória dos últimos nove anos, mas foi fácil perceber que essa nova Caitlyn, que eu ainda não conheço, ama você mais do que já amou alguém — o olhar da policial buscou encarar Jinx, mas não sabia ao certo se ela entendia — Isso é... Assustador, mas eu reconheço que você tem total habilidade pra tirar as pessoas de suas zonas de conforto.

A garota de Zaum cerrou os olhos um pouco, mas continuou encarando a xerife em silêncio por um tempo, como se estivesse pensando em tudo o que ouvia.

— Você deve ter batido a cabeça com força mesmo, chapeleira. Esqueceu mesmo de tudo? Tudinho — questionou, sentando também e lançando sua atenção totalmente para a mais velha — Até de como você se apaixonou por mim? Eu poderia te contar, mas você não acreditaria.

— Ah, claro que você vai se aproveitar disso pra mentir e enganar de alguma forma! Eu já imagino isso!

Jinx sorriu, mas seu olhar ainda estava um pouco triste.

— Não, por mais incrível que pareça, sua criatura insuportável, não seria capaz de imaginar um jeito melhor do que realmente foi! Eu sou realmente orgulhosa do que fizemos juntas no passado — respondeu com sinceridade.

Não foi difícil para Caitlyn ver que a jovem falava a verdade, além de seu treinamento militar, Jinx tinha uma forma particular de ficar sem jeito ao ser sincera, algo que passou a constatar logo que começaram a conversar.

— Então me conta. O que fizemos de tão extraordinário assim, que mudou todos os meus ideais de uma vida inteira?

A xerife estava um pouco cética e sua fala tinha um pouco de sarcasmo.

— Não foram seus ideias que mudaram, fui eu — Jinx admitiu com uma careta, deixando claro que não gostava desse fato, ou de sua própria confissão, deixando Kiramman sem palavras.

• Nove anos antes •

— O que esses caras querem atrás de você, afinal? Eu cheguei a pensar que estavam atrás de mim, mas queriam realmente te machucar pra valer — Jinx tinha seu olhar na caçadora, que cuidava de seus ferimentos.

— Eu não sei.

Estavam em um pequeno hotel de beira de estrada, o mais distante que podiam de Zaun. A aparência do lugar não era das melhores, mas pelo menos tinha uma cama de verdade e estariam seguras naquela noite.

— Por que você me ajudou — perguntou Caitlyn, colocando um olhar firme sobre a garota.

— Eu? Ajudar você? Não, não! Não confunda as coisas! Eram da polícia, é o meu trabalho surrar policiais imundos como você! Só que agora você tá mais pra criminosa fugitiva, né?

Segurando o queixo de Jinx, a xerife se aproximou devagar, fazendo com que a jovem se inclinasse um pouco pra trás mantendo distância. O olhar da morena ainda era sério, junto com o seu semblante indignado, quando sussurrou baixo para a outra.

— Eu ainda sou da polícia e ainda sou xerife. Aquele filho da puta que tentou me bater em quem eu dei a maior surra quando escapei não faz parte da lei, não faz as coisas do jeito certo e não é assim que funciona.

A mais nova arqueou uma das sobrancelhas, baixando o olhar para os lábios da atidora mesmo contra a própria vontade, algo que não passou despercebido por Caitlyn, por mais que estivesse brava. Jinx sentiu um arrepio estranho percorrer seu corpo com aquela aproximação tão sutil, sem um combate, sem uma provocação explícita, mas ela odiava aquelas sensações.

— Então eu devia espancar você também?

O questionamento de Jinx serviu bem para que ela esquecesse os efeitos da aproximação da mais velha, focar no ódio que tinha pela mulher sempre funcionava.

— Você pode tentar.

Era óbvio para Caitlyn que a garota na sua frente não era como outras pessoas em Zaun e ainda era bastante atraente com sua maquiagem escura em volta dos olhos, as unhas bem feitas e um estilo adolescente imprudente com armas na cintura que poderia facilmente tirar sua versão mais jovem do sério, mas ela era a xerife agora, estava prestes a completar trinta anos e tinha uma reputação, ao menos antes de ser uma fugitiva.

Seus devaneios a levaram para esse cenário com facilidade naquela noite, deitada na cama de hotel ao lado de Jinx. Sua versão adolescente teria gostado das coisas que poderia aprender com a delinquente juvenil que perseguia. Talvez tivesse até aprendido a beijar melhor com uma professora tão insana e sem pudores.

— No que você está pensando, eu posso saber?

Jinx a flagrou passando o indicador pelos próprios lábios, deixando a xerife ruborizada por um momento, como se pudesse ler seus pensamentos.

— Não é da sua conta!

— Talvez não seja, mas fiquei curiosa com a forma que encara o teto e toca os próprios lábios assim. Tá pensando na minha irmãzinha e suas mãos grandes, é?

Vi havia se tornado um problema. Era sua namorada, mas não tinha notícias dela e agora estava fugindo para longe com Jinx e mais do que isso, tendo pensamentos impróprios com ela.

— Qual a sua idade — quis saber a caçadora depois de algum tempo em silêncio.

— Estamos nisso agora? Minha idade? Você não faz ideia? Vi não te contou?

— Não é como se a gente falasse sobre você.

— Que decepção! Eu sou realmente um ótimo assunto — a de cabelos claros riu.

— Já sei, você não vai me dizer.

— Dezenove. Não é como se eu comemorasse também, não gosto do meu aniversário — a jovem parecia reflexiva ao meio a sua resposta.

— Por quê?

— Outros faziam questão de comemorar meu aniversário, mas eu não — os olhos violeta encararam a policial tomados pelo tédio — Vamos entrar nesse tipo de conversa profunda agora, ou o quê?

— Você não tem mesmo nenhuma curiosidade a meu respeito que queira perguntar?

— Hummmmm, isso parece divertido... Deixa eu pensar... Acho que depois de ver até a sua depilação, não tem nada que queira saber.

Isso bastou para que Caitlyn fechasse a cara de novo, afinal Jinx a havia deixado nua em uma situação em que estava ferida e vulnerável com o único objetivo de rir disso. A xerife se lançou por cima do corpo da menina, sentando em suas coxas para que não escapasse e puxou com força a pequena peça que cobria seus seios, levando-a a gritar e se debater soltando alguns rosnados, mas também risadas descontroladas que fizeram a própria morena rir.

— NÃO, PARA COM ISSOOOO... EU TAVA BRINCANDO SUA LOUCA!!! GRRR... ME SOLTA!!!

Deixando a jovem com os seios nus, que ela com facilidade cobriu, a mais velha partiu para o cinto e as calças, fazendo menção de tirá-los também.

— Não tem o que me impeça de deixar você nua também agora!

— Claro que tem! Cadê sua moral? Onde estão os seus princípios, xerife?

Caitlyn se jogou de volta em seu lado da cama, olhando pra cima, também rindo do escândalo feito pela garota.

— Se bem que eles são bonitos, você pode olhar — Jinx olhava para os próprios seios, que agora não cobria mais — Vaaaaaamos, eu sei que você quer olhar — uma de suas mãos pegou o queixo da policial e o sacudiu de leve, mas ela não desviou o olhar do teto — Eu sei que você tá se segurando pra não olhar os peitinhos perfeitos da sua cunhadinha, eu seeeeei... Ei, Cait... Quer saber até onde vão essas nuvenzinhas no meu corpo, hum?

A garota prosseguiu com suas provocações porque sabia que isso tirava a concentração inabalável da xerife e era inusitado vê-la perder o foco, mesmo que fosse em uma respiração acelerada, quase imperceptível.

A mais velha bufou, fechando os olhos com uma expressão de tédio e não disse mais nada. Aquelas conversas não deveriam ir tão longe, afinal sua namorada a esperava em algum lugar em Piltover, provavelmente muito preocupada com o seu sumiço depois da fuga.

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