A LUZ DO SOL INVADINDO A JANELA entreaberta dos aposentados de Dália foi a primeira coisa que ela notou quando saiu do anexo ao lado, onde uma das três criadas designadas para lhe servir preparava seu banho. Ela mal dormira a noite. Ficara remoendo seu momento de fraqueza, contando cada lágrima que havia rolado, cada soluço contido e, por fim, cada risada que saiu dos lábios de Penélope.
Não era um número muito animador.
Passou as mãos pelos cabelos, sentindo a maciez vinda dos fios, agora penteados, prontos para serem lavados assim que as outras servas viessem. A partir dali, teria apenas cinco dias até sua partida. Cinco dias até dar adeus a uma mansão gélida, onde sempre se sentiu uma boneca, uma prisioneira, nunca em um lar.
Após se espreguiçar por alguns segundos e curtir o calor do sol vindo da janela, Dália caminhou até a porta. Abriu uma pequena fresta, observando o corredor vazio. Não havia sinal algum das outras criadas. Poderia algo ter acontecido com elas? Não soube dizer, apenas mordeu os lábios e se manteve naquela posição meio constrangedora por mais alguns segundos.
Logo um pigarro atraiu sua atenção. Meio atrapalhada, ela voltou-se para a serviçal às suas costas, observando o quanto o sorrisinho dela indicava que, se pudesse, estaria rindo.
— A água está pronta para o banho, senhorita. — Dália corou. Não bastava ter chorado a noite, tinha que parecer tão infantil aos olhos de uma serva?
— Eu…
— Não se preocupe, eu não direi nada para a madame, se é isto que lhe preocupa.
Alívio atingiu o peito de Dália, e ela suspirou. Por ter origens humildes, ela tinha mais medo de que uma criada contasse qualquer um de seus deslizes para a duquesa, o pior membro da família do Duque, do que a humilhação de ser pega fazendo algo que qualquer garota, que não fosse ela, estaria acostumada a fazer.
Não tinha sangue nobre, era um fato, mas cultivara o orgulho de um, por isso, somente sorriu em agradecimento. A criada elaborou uma pequena mensura, e sumiu em direção ao anexo. Logo Dália percebeu que aquele fora seu primeiro sorriso verdadeiro desde a tarde anterior. Não pôde evitar ficar feliz por isso.
Antes que se passasse um minuto que Dália havia entrado na banheira do anexo, as outras duas servas surgiram com alguns produtos para lavar e cuidar do cabelo e pele da garota. Ficaram ali, tempo o suficiente para a água começar a esfriar. Um momento de cuidado, cercado por um silêncio acolhedor, era sempre bem-vindo.
Mas como tudo que é bom, uma hora chega ao fim, o som de passos apressados do lado de fora do anexo fez as criadas se apressarem em secar o corpo molhado de Dália. Foi inevitável para a garota não notar os olhares surpresos das serviçais quando algumas marcas de arranhões e chibatadas ficaram visíveis em sua pele quente e vermelha pelo banho.
Torceu para aquelas três, que foram as mais gentis até então, não ousassem contar a ninguém sobre aquelas marcas. Se falassem, uma demissão seria o menor de seus problemas.
— Dália? Está aí? — A voz elegante, mas quase sem emoção, da duquesa Iluneia ecoou pelo quarto. Dália tremeu. Se ela estava ali, quais a chance de Penélope ter contado sobre seu choro de ontem a ela?
— Já estou indo, madame Iluneia — disse, tentando manter-se neutra diante do formigamento que começava a surgir em sua barriga.
Infelizmente, em seus olhos era notável o medo e a ansiedade. Até as serviçais perceberam, o que só garantia que uma mulher astuta e observadora como a duquesa também veria assim que Dália erguesse a cabeça. E isso só a deixava ainda mais nervosa.
Após vestir um roupão de algodão, sem mangas e amarrado apenas por uma fina tira de tecido, Dália pediu para uma das servas abrir a porta do anexo, permitindo que ela visse a impiedosa madame Iluneia parada, olhando a janela.
A duquesa vestia um lindo e elegante vestido de cetim, cor de pêssego, cheio de camadas — embora pouco rodado. Em suas mãos, várias pulseiras e anéis adornavam seus braços, agregando ainda mais sofisticação de uma família rica e nobre a ela.
Seus olhos verdes, um pouco mais claros do que o de Dália, reluziam ao toque da luz do sol, trazendo uma beleza angelical a duquesa. Seus cabelos castanhos, da mesma cor dos de Penélope, estavam amarrados em um coque bagunçado, permitindo que algumas mechas caíssem delicadamente sobre o rosto dela.
Quem a olhasse ali, com todo aquele ar jovial e gentil, jamais imaginaria que tipo de mulher se escondia sob a máscara de boa dama.
— Ao que dou a honra de sua visita em meus aposentos, madame Iluneia? — disse Dália, tentando soar o mais cordial e tranquila possível.
— Oh, querida. Vim apenas fazer uma visita. — Iluneia sorriu. Com um movimento de mãos, dispensou as três servas, que saíram a passos rápidos, deixando as duas mulheres sozinhas. — Ou é isso que essas inúteis terão que acreditar por enquanto — acrescentou, assim que ouviu a porta bater e o som de passos sumirem do corredor.
— Penélope disse algo, não disse?
— Penélope? Desde quando uma infeliz como você tem o direito de dizer o nome da minha filha dessa forma tão… íntima? — Iluneia esbravejou, dando passos rápidos em direção à Dália para conseguir agarrar o braço dela.
A garota gemeu com o aperto forte que sentiu ali.
— Desculpe, madame. Eu só… — Iluneia enfiou as unhas, grandes e pontudas, na pele de Dália, fazendo pequenos pontos vermelhos surgirem da região. — Ai!
— O que foi? Vai reclamar?
— N-Não, senhora… — Dália soltou um suspiro, baixo, aflito. Fechou os olhos e os manteve assim, tentando, de alguma forma, expulsar a tremedeira que começava a consumir seu corpo enquanto a dor em seu pulso, devagar, aumentava.
— Você é uma inútil e incompetente! Como ousa sujar a roupa que veste com suas lágrimas imundas?
— Foi… foi um acidente! A senhorita disse algo e, bem, eu não…
— Está tentando culpar minha filha por seu erro? É isso? — a interrompeu, aprofundando as unhas na pele de Dália com ainda mais força.
— Eu jamais… faria algo assim! É que Penélope… Ela…
Um som de tapa ecoou no ambiente, fazendo o rosto de Dália virar-se para o outro lado. A ardência veio depois, ameaçando ser acompanhada por grossas lágrimas que se detinham nos cantos de seus olhos. Ela piscou, movimentando os olhos de forma lenta, temerosa, até ter uma visão completa do rosto vermelho e franzido de Iluneia.
— Como uma substituta miserável como você ousa desobedecer uma ordem minha!? — A voz de Iluneia era como um lampejo, igual aos trovões que Dália ouvira na tarde anterior. A tremedeira em seu corpo aumentou, e ela temeu acabar como uma árvore durante uma tempestade: destruída. — Eu lhe disse, não disse? NÃO PRONUNCIE O NOME DA MINHA FILHA COM ESSA BOCA SUJA!
— Sinto muito! Sinto muito! — Dália encolheu o corpo, fechando seus olhos com mais força do que da primeira vez.
— Não, não, não, querida. — Iluneia levou sua outra mão até o rosto vermelho de Dália, começando a ceder ao inchaço provocado pelo tapa, e a obrigou a abrir os olhos e a encarar. — Você vai pagar por cada lágrima que derramou ontem. Pela ofensa que cometeu diante de mim. Por existir e sujar a honra desta família.
Com essas palavras, um soluço irrompeu a garganta de Dália, e sem perceber ela começou a chorar, silenciosa, da forma como havia sido ensinada.
— Perdão. Por favor, perdão — implorou, trêmula. A voz falha, o coração acelerado. Mas isso só aumentou a fúria da duquesa.
— Quem sabe após você dar uma volta no inferno e voltar? Seria muito interessante. — Iluneia sorriu, perversa, cruel.
Nesse momento, Dália soube, ela sairia ainda mais quebrada dali.
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Atualizado até capítulo 73
Comments
Brennda Germany's
não consegui imaginar essa cena 😅
2025-01-15
3
Vicki Hungria
Misericórdia ficou pasma com essas pessoas maltratando a Dália🥲
2025-01-15
1
S.Kalks
Dália acho que vc tá reclamando de barriga cheia 🥱🫣
2025-01-14
1