Compras na Farmácia

Bianca

Ver um homem com o porte e a importância de Samuel chorar, está fazendo meu útero vibrar. Ele se desculpa e seca os olhos com o dorso da mão.

- Tenho certeza de que\, o que quer que tenha acontecido\, não foi proposital – falo com a voz que uso para tratar joelhos ralados dos meus alunos.

Samuel nega com a cabeça e respira fundo.

- Eu jamais machucaria meu filho de proposito\, mas eu não sei o que fazer – ele está desabafando muito fácil então sei o quanto está incomodado – ele é um anjo com a Melissa\, mas comigo...

- Eu não queria dizer isso\, realmente não é da minha conta\, mas – mordo o lábio enquanto escolho que palavras usar\, quando as encontro\, os olhos injetados de Samuel estão em mim\, como se eu fosse um sábio pronto para dar um ensinamento de vida – não costumo ver você na escola\, teremos uma apresentação de dia dos pais e ainda não recebemos a sua confirmação.

- Nossa\, eu esqueci totalmente. É na sexta?

- Sim\, na próxima.

- Eu tenho que ver se tenho algo na agenda – ele resmunga pegando o celular e apoio minha mão sobre a sua\, tampando a tela.

- Isso devia ser mais importante.

Ele bloqueia a tela e afasta o celular, nosso toque é interrompido e ele assente, vira os lábios para dentro da poca prendendo-os com os dentes. Está assimilando o que acabei de dizer, quando volta a falar seus lábios estão molhados e brilhando contra a luz branca de uma forma chamativa.

- Bianca? Está ouvindo?

- Sim\, é claro – minto.

- Confirma minha presença\, vou fazer o depósito ainda hoje.

- Que depósito? Pergunto confusa.

Ele franze as sobrancelhas e novamente pega o celular, procura o grupo da escola e abre. Não faço parte do grupo geral, sou responsável apenas pelo grupo da sala, o convite que vejo na tela é o mesmo, mas a legenda é diferente e pede um deposito de 179,90.

Isso estava errado, eu fiz as cotações dos presentes e nenhum passava de cem reais, também não fui informada que isso sairia do bolso de pais que pagam quase oito mil reais de mensalidade.

- Tenho que ver isso com o Dante.

Ele engole em seco ao ouvir o nome e de repente se cria uma película invisível entre nós, nos separando entre a dor do divórcio e a vergonha do perdão.

- Bem\, acho que devia comprar o Bye Bye Fever\, abaixa a febre sem precisar medicar e uma bolsa de gel se tiver um freezer ou congelador disponível.

- Obrigado\, vou tentar esses.

- E seja gentil com ele. Deixe ele voltar a ser um bebezinho por um tempo.

Ele sorri e assente.

Quero correr dali o mais rápido que posso então me afasto sem acenas, apertando os pacotes de absorvente na mão com força, odeio essa nova fase, sem os anticoncepcionais, meu ciclo está desregulado. Odeio ser a mulher que usa absorventes noturno o tempo todo, não porque o sangramento é intenso, mas porque os comuns entram nas dobras e grudam onde não devem.

Pego um pacote de Fini na fila do caixa e coloco por cima dos absorventes, apenas para disfarçar minha vergonha.

Há um velhinho no caixa demorando muito tempo para passar seus medicamentos e precisa chamar o farmacêutico, normalmente eu sou muito paciente, mas não hoje. Minha visão periférica observa Samuel vindo até a fila com os produtos que indiquei e dou graças a Deus por ter um estranho entre eu e ele.

- Ah\, não – o estranho resmunga – esqueci a camisinha.

Então o odeio por transar com proteção. Ele sai da fila e agora Dante estava nas minhas costas, sorrio por cima do ombro e ele devolve o gesto.

- Se tivesse me esperado não tinha dado certo – ele parece tão constrangido quanto eu e acho que no fundo\, nenhum de nós sabe o porquê.

Dante tem uma energia contagiante e consigo sentir sua presença em minhas costas de forma tão intensa que sinto meu interior se contrair, tenho certeza de que o que está escorrendo da minha vagina é mais do que sangue menstrual.

- Eu não sei se é apropriado\, mas gostaria de pegar seu número outra vez\, eu tinha salvo no aparelho\, mas...

- Ah\, eu não sabia que tinha trocado.

- Estava tentando falar comigo?

- Não – minto outra vez\, eu mandei uma mensagem para ele alguns dias depois da briga dele com Dante\, mas como nem chegou a receber imaginei que tinha me bloqueado – você pode anotar se quiser.

Ele me entrega o celular pronto para que eu coloque meu número, de alguma forma, isso parece secreto e emocionante.

- Meu número é o mesmo\, então...

- Eu ainda tenho.

Então ficamos ali, incomodados, como se fossemos dois estranhos. Outro caixa abre e a fila anda mais rápido, estou agradecida.

Me despeço e passo minhas compras, quando estou abrindo o carro, no entanto, Samuel passa por mim e seu braço toca meu vestido na altura do quadril, não sei se ele teria tocado em mim se a saia fosse mais justa, mas pelo sorriso em seu rosto, imagino que sim e sinto minhas bochechas aquecerem.

- Vamos tomar outra bebida juntos\, você gostou daquela.

- Claro\, a gente marca.

- Domingo a noite?

Não sei o que responder, achei que era um “a gente marca, mas nunca marcamos de verdade”.

- Eu te mando mensagem – ele acena antes de entrar no carro.

De repente estou sentada no banco, ainda sentindo seu esbarrão no meu quadril e sorrindo. Sinto falta de quando o anticoncepcional controlava minha libido e mais ainda de quando Dante me comia no chuveiro quando eu estava menstruada.

Mas o pensamento mais insistente era: “Será que Samuel gosta de sexo no banho?”

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