Só Uma Bebida

Bianca

Em primeiro lugar, eu sei que sair para beber com o marido da amante do Dante não é a melhor forma de diluir a traição e eu deveria ter vergonha de sair de novo com os olhos vermelhos de tanto chorar, mas em minha defesa, poucas pessoas teriam coragem de dizer não para esse homem na minha frente.

Samuel tem uma energia que suga toda a atenção para si, como um vórtice de músculos perfeitos e rosto sério e eu só estou aqui, bebericando meu Hi-fi toda vez que acho que vai me perguntar alguma coisa.

Nunca tomei Hi-fi, nem sabia o que era, sempre que eu saía com Dante ele pedia por mim, um vinho tinto suave, foi assim por uma década. Então quando Samuel me ofereceu o cardápio eu surtei e pedi a primeira coisa que meus olhos leram.

- O drink está tão bom que nem vai conversar comigo?

- Desculpe – sussurro\, seco a boca com o guardanapo e volto meu olhar para ele – o que estava dizendo?

- Está casada a quanto tempo? – sua pergunta não é invasiva\, estamos ali por nossos casamentos fracassados.

- Dez anos\, mais dois de namoro e algum tempo antes disso.

Ele olha desconfiado e não entendo por quê.

- E você? – devolvo a pergunta porque é o que parece certo.

- Seis\, sete anos.

- Tiveram o Yuri logo depois? – me sinto uma idiota\, como se não soubesse fazer uma conta simples.

- Meses depois. Era o plano – Samuel da um gole em seu negroni\, o cheiro da bebida inunda o espaço entre nós\, é forte e muito chique.

Preciso me concentrar no que ele diz, basta olhar em volta e ver os olhares das outras pessoas, confusas, como se fossemos a dupla mais improvável do mundo e de fato éramos.

Ok. Choque de realidade absorvido com sucesso. Agora posso agir como uma pessoa normal.

- O plano?

- É\, quando nos conhecemos traçamos um plano\, namorar por dois anos\, casar\, ter um filho cerca de um ano depois e o segundo quando o primeiro tivesse cinco.

- Então estão tentando engravidar? – engasgo com as palavras - Estavam. Desculpe.

Ele sorri, dá outro gole em sua bebida antes de responder.

- Não posso dizer que estávamos.

- Mas não estavam prevenindo.

Outro longo gole.

- Não tem o que prevenir.

Suas palavras secas enchem meus ouvidos e estou levando tempo demais para entender, até que um estalo atinge a parte mais funda do meu cérebro.

- Ah – respondo como uma ameba.

- E você? Não quiseram filhos?

- Não aconteceu.

Eu queria sim um bebê e não tem uma explicação para não ter a não ser “não aconteceu”.

- Parece boa com as crianças\, acho que seria uma boa mãe.

Samuel levanta uma sobrancelha e leva o copo á boca em um último gole, de repente fico tímida outra vez e me lembro do Hi-fi, é leve e gostoso, aproximo a boca do canudo e sugo de uma vez até o som irritante informar que havia acabado.

Ele não demora e levanta a mão para o garçom pedindo mais, quero dizer que não, mas quando tento meu telefone toca.

Pego de cima da mesa e olho a tela, o nome “amor” salta na minha cara. Meu coração está apertando mais a cada segundo enquanto encaro a luminosidade baixa.

- Vai atender?

Tem um toque de desafio na pergunta de Samuel, como se ele quisesse que eu atendesse.

- É melhor eu ir.

- Ou pode beber mais um drink – o garçom apoia os copos sobre a mesa e se retira – eles trocam nudes.  Ele envia fotos do pau para ela enquanto você está dormindo e ela nem espera que eu durma.

Ele está mais sério, sinto o peso de suas palavras e isso dói. Eu não sei o teor da traição e preferia que continuasse assim, mas agora tudo que estou fazendo é lembrar das vezes que ele sorria para o celular e logo depois apertava a pélvis.

Respiro fundo e pego minha bolsa no chão, onde enfio o celular que volta a tocar.

- Desculpa\, Bianca. Não sei onde estava com a cabeça – ele estende a mão\, mesmo sem intenção de me tocar.

- Tudo bem – tento segurar minhas lagrimas\, mas elas estão muito insistentes agora – é melhor eu ir.

Me atrapalho com minha carteira e ele me detém colocando a mão sobre a minha.

- Deixa\, eu pago. Você faz a próxima.

Seus olhos penetram tão fundo a minha alma que me sinto nua. Protejo meu busto com o livro, ele olha, antes que eu possa virar.

Claro que viu o homem sem camisa na capa.

- Boa sorte\, Samuel.

Me levanto rápido, mas morrendo de vontade de dar mais alguns goles naquela bebida perfeita. Hi-fi é minha nova bebida preferida.

Ando rápido em meu salto baixo, estou em dúvida se a saída é para a direita ou a esquerda e decido que é na direita.

- Bianca\, espere.

Me viro e aí está esse homem escultural, chamando meu nome e correndo atrás de mim. Minhas bochechas queimam enquanto ele se aproxima.

- Olha\, sei que parece estranho\, mas – ele abre a carteira e tira um cartão – me ligue se precisar de alguma coisa.

Pego o cartão de sua mão e leio. “Samuel Ferraz – Corporação Hitech” e um número de celular embaixo, é limpo, sofisticado e escuro.

- Você também – respondo e com um aceno vou deixando o bar pela esquerda\, até ganhar a rua\, aí percebo que não deixei meu número com ele.

Quero ir da minha burrice, mas o celular volta a tocar, pego e vejo o nome “amor” então, mais uma vez, estou voltando para o meu apartamento com lágrimas nos olhos.

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Atualizado até capítulo 66

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