Levanto cedo e vou para a padaria, passo no ponto onde pego Daniel e Luíza, essa é a minha última carona da madrugada.
Daniel parece chateado e ao mesmo tempo preocupado, ele tem falado pouco e parece me esconder alguma coisa:
__ Você está calado, Daniel? Aconteceu alguma coisa?
__ Não, nada para se preocupar.
Do jeito que ele fala eu já estou preocupada.
No trabalho foi tudo bem, me despedi dos colegas que fiz e do meu patrão que é um amor de pessoa e disse que às portas estarão sempre abertas caso eu queira voltar.
Chego em casa correndo para me arrumar e Daniel foi até sua casa, tomar um banho para poder cuidar das crianças para mim. Carol vai ao hospital ver a mãe e saber o dia da sua alta.
Me arrumo com a melhor roupa que eu tenho, não é "aquela roupa ", mas dá para disfarçar a pobreza.
Daniel chega e fica encantado comigo:
__ Você está linda! Nem parece que era funcionária de uma padaria.
__ Obrigada! Agora você pode me falar o que está acontecendo?
__ Eu não sei do que você está falando?
__ Dessa cara, de missa de sétimo dia.
__ Tudo bem!... Eu quero que você tome muito cuidado. Você vai trabalhar com pessoas horríveis: Henrique é arrogante e frio, sempre foi. Ele é meu primo!
Estou em choque.
__ Porque não me disse antes?
__ Eu sou o primo pobre da família, Bianca é nossa prima, a loira que eu te falei. Ela era mais próxima de mim na juventude, mas, depois que ela foi trabalhar com Henrique nos afastamos.
Sinto que Daniel sabe muita coisa e está me escondendo. Estou atrasada, mas, depois quero saber todos os detalhes dessa novela.
__ Daniel, eu tenho certeza que debaixo desse angu, tem muito caroço, eu agora estou atrasada, mas quando eu chegar você vai me contar tudo.
Ele me olha tristonho e sabe que não vai fugir desse confronto.
Chego na empresa e vou direto para a diretoria, a secretária já me aguardava e me leva até a sala do CEO. Estou muito nervosa, tento manter meu corpo reto e meu olhar altivo. Ela abre a porta e eu entro como para um desafio.
Meu corpo reage de uma forma apavorante, é tudo novo para mim, eu me formei e nunca trabalhei na minha área, sou dona de casa e mãe a vida inteira e agora diante desse desafio. Na minha cabeça só vem a imagem dos meus filhos e é por eles que eu estou aqui.
__ Vejo que você é pontual, dona Paula?
__ Eu tento, doutor Henrique!
Leio sua insígnia em cima da mesa. Ele me olha com frieza e seu olhar percorre meu corpo do alto da minha cabeça até meus pés.
Ele fica de pé e deferente da outra vez, ele não oferece para me sentar. Ele me circula observando meus trajes, estou gelada por dentro mas não me intimido.
__ Você está muito bonita, bem diferente da mulher que vi ontem lavando a varanda e a calçada, mas, tenho certeza que trabalhando conosco, suas roupas e sua aparência mudará muito.
__ Era o senhor espionando a minha casa a tarde toda, ontem?
__ Eu não estava espionando, eu estava observando o movimento. E por falar nisso, qual a sua relação com Daniel?
Fecho meus olhos desacreditada no que estou ouvindo.
"__ É melhor ouvir do que ser surda. "
__ O que você disse?
__ Desculpa! Eu tenho a mania de pensar alto.
__ Você não me respondeu?
__ Ele é meu amigo e tem me ajudado com as crianças.
__ Só com, as crianças?
Sinto seu corpo próximo ao meu, e sua respiração quente perto do meu ouvido, tenho vontade de sair correndo mas sou uma mulher que posso resolver isso:
__ Doutor Henrique, eu estou aqui pela vaga de trabalho, minha vida pessoal não diz respeito ao senhor, nem a ninguém além de mim e dos meus filhos e se o senhor me chamou até aqui para me constranger eu saio pela porta que entrei.
Ele sai de perto de mim e dá um sorriso sarcástico:
__ Pois bem, dona Paula! A senhora passou no primeiro teste, do assédio. Eu não tenho corretoras mulheres na minha empresa por causa disso. Elas caem no primeiro sorrisinho bonito que lhes dão. Eu precisava saber se a senhora manteria sua postura. A senhora vai lidar com todo tipo de gente, das mais educadas a mais tosca. Esse trabalho é para pessoas que driblam seus adversários com sabedoria e força.
Ele fala e aponta a cadeira a minha frente.
__ Seus colegas de trabalho vão querer te passarem a perna há todo momento, você não pode confiar em ninguém.
Eu o olho assustada, ele está falando em outras palavras a mesma coisa que Daniel já havia falado.
__ Doutor Laerte, era meu melhor corretor, ele não falava dos filhos e da esposa para ninguém, não porque não os amava, mas para protegê-los. Aqui dentro, ninguém sabe da vida particular de ninguém, é uma regra. Nem mesmo onde moram ou o telefone particular. Ninguém precisa saber o quanto você ganha ou suas conquistas. Vivemos numa sociedade capitalista que só vale o que você têm. Para o seu cliente você tem que ser a pessoa de sucesso, Doutor em alguma coisa, mas, para os seus afetos seja o mais humilde possível para não atrair oportunistas.
__ Então, foi por essa ideologia que Laerte privou sua família do conforto e dos prazeres que o dinheiro pode dar?
__ Eu não sei, ninguém aqui é induzido a essa ideologia é só uma maneira de nos proteger.
__ Eu tenho um Porsche, última geração importado. Eu quase não o tiro da garagem. Ele é meu e está lá. Às vezes eu ando com ele no condomínio de luxo onde moro numa área nobre aqui da capital. Só para aquecer o motor. Sei dos perigos que corro se estampo meus luxos, porque às pessoas não querem trabalhar, mas querem ter o que eu tenho.
__ Eu estou entendendo, mas não almejo riquezas, eu só preciso do suficiente para dar aos meus filhos uma condição melhor de vida.
__ Nessa vida, você tem que ter ambição, dona Paula, uma coisa sobe medida, é isso que faz a roda capitalista girar. Você tem um carro, mas, quer trocá-lo por um mais novo. Tem uma casa, mas, quer uma maior em outro bairro. Isso nos faz termos sucesso diferente do concorrente.
Vendeu um apartamento hoje, então não vou trabalhar o resto do mês. Não, pelo contrário. Vou vender um apartamento por dia durante cinco anos e vou me aposentar.
Eu o olho admirada, penso se é assim que Laerte pensava e nunca me disse nada.
__ Ouvir o senhor falando é até interessante, mas, não adianta você ganhar seu sustento e não poder desfrutar com quem amamos. E se Laerte pensou desse jeito, do que valeu tudo que juntou? Quem está desfrutando das riquezas que ele adquiriu?
No seu caixão ele foi com a roupa que eu escolhi para ele, nem isso ele pode fazer. Raramente tiramos férias com as crianças ou fizemos uma viagem. Nunca tínhamos dinheiro sobrando para gastar com supérfluo. Do que lhe serviu, morreu com quarenta anos, deixou uma viúva de trinta e cinco e dois filhos lindos.
Eu sei onde o senhor quis chegar com com seu discurso teórico: VENDAS!
O senhor quer números, estatísticas e metas. Mas eu te digo uma coisa: Trabalho de nove às dezessete horas, duas hora de almoço, não trabalho nos finais de semana e feriados e darei o meu melhor pela empresa e se o senhor ainda quiser me contratar eu te garanto que não vai se arrepender.
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Atualizado até capítulo 77
Comments
Patrícia Barbosa Ferrari
Eita Lasqueira,a Paula falou pouco mas falou bonito,Temos que trabalhar para prover o sustento da nossa casa e dar uma vida 🧬 confortável para nossos filhos, Agora ser escrava do trabalho aí não mesmo
2024-12-12
4
Claudia Silva
de baixo de angu do Laerte tem caroso
2025-02-11
0
Dilma Melachos
arrebentou é isso mesmo!não adianta ter tanto dinheiro e não poder desfrutar com quem se ama. agora quanto ao falecido acho que ele não passou de um mau caráter diante da família.
2024-12-12
1