..."Segredos a parte todos temos, mas traições devem ser reconsideradas antes de serem omitidas, pois traição não é um segredo a ser revelado mas uma falta de confiança a ser desobstruída."...
Quando cheguei no restaurante, Edgar já estava lá. Me aproximei, sentando-me de frente para ele, encarando-o nos olhos. Eu e meu pai, meu pai e eu. Ele chama o garçom e faz os pedidos, cruzo os braços e me rescosto na cadeira, aguardando. Ele parece enrolar no que quer dizer e isso já está me deixando sem paciência, não gosto de enrolação. O garçom um tempo depois trouxe a comida e começamos a comer em um silêncio tenso, mas me certo momento não suporto a ansiedade e resolvo tocar no assunto para dar ao menos uma alfinetada para abrir a boca a falar.
— E então pai — falo enquanto observava ele colocar os talheres ao lado do prato — o que queria falar comigo de tão importante?
— Eu tenho algo para te contar Giulia e sim, é importante, porque envolve eu, você, toda nossa família. E pode ser que você não aceite o que vou contar…
— Família? — o interrompo confusa. — Pai, nós somos dois apenas.
— Isso é o que você pensa, mas não vai mais pensar por muito tempo— ele alega, baixo, baixo demais.
— Eu não estou entendendo o que você quer dizer com isso — uma calma letal toma conta de mim.
Edgar engole em seco, uma, duas vezes.
— Você tem uma irmã Giulia!
Imediatamente fico rígida. U-uma irmã? Pisco várias vezes, só posso estar num maldito sonho. Belisco minha perna sob a mesa só para ter certeza. De fato não é um sonho. Pørra!
— Irmã? — forço-me a dizer. — Minha mãe teve outra filha além de mim? — aperto o tecido da calça, minhas mãos estão trêmulas demais.
— Não — ele murmura, desespero nos olhos.
— Você traiu ela? — disparo, tentando conter o tom de voz. Aproximo o meu rosto do dele, os dentes trincados. — Você traiu minha mãe, pai? — Edgar abaixa a cabeça. — Eu não posso acreditar nisso! — sibilo. — Como você pode ser capaz disso? Como? — pisco para afastar a ardência dos olhos.
— Você não entenderia Giulia… — ele passa a mão pelos cabelos, bagunçando-os.
— Então me explique! — falo levemente alteradas tentando não chamar atenção e me rescosto na cadeira outra vez. — Porque eu estou muito, muito interessada em saber qual é o motivo paspalho que você vai me dar.
— Irei, até porque já passou da hora de você saber… — ele faz uma pausa, respirando fundo, engolindo em seco, tanto faz. Agora isso não importa. — Quando sua mãe estava grávida de você, tivemos uma briga, a pior de todas. Você sabe muito bem que nosso casamento não foi algo que nós dois escolhemos, fomos obrigados a nos casar para unir duas famílias e evitar desavenças. Eu não tinha sentimentos por sua mãe ainda ou talvez não os tivesse descoberto e então depois da discussão, sai de cabeça quente pela cidade em rumo ignorado. Não sabia para onde ir. Bebi em bares de esquina até não saber nem mesmo meu nome e com amigos, fui para uma boate qualquer. Lá conheci uma garota, que estava somente curtindo sua noite e sem querer se envolver com ninguém, apenas se distraindo com as amigas. Mas eu quis ela de uma forma que nunca quis tanto outra pessoa e quanto mais ela me negava no decorrer da noite, mais eu ficava obcecado, até que ela enfim cedeu e passamos a noite juntos. Dessa noite veio sua irmã mais nova, que até pouco tempo atrás eu não fazia ideia que existia. No outro dia, cheguei em casa por volta da hora do almoço, cansado e de ressaca por conta da noite anterior. Perguntei por Helena a uma serva que estava por ali, pois não a havia visto e ela disse que um pouco depois de eu ter saído de casa, encontraram ela no chão desacordada. Ela havia passado mal sozinha e não tinha pedido por ajuda. Helena acordou um tempo depois, mas estava com muita contração e teve de ser levada para o hospital, quase perdendo você e a vida dela por culpa minha, mas que graças aos médicos e a serva que a encontrou, vocês duas estavam sãs e salvas. Eu me senti culpado por tudo o que fiz, não só pelo que havia dito a sua mãe, mas também pelo que havia feito naquela noite. Sua mãe nunca soube disso, jurei a mim mesmo que não a deixaria sofrer por conta de um erro tão fatal meu. Um pecado. Então mandei dinheiro para a mulher com quem havia me deitado, para que nunca me procurasse e seguisse sua vida.
Pressiono a língua contra o céu da boca, engolindo o choro. Não posso chorar aqui, não agora. Em outro lugar, sozinha. Fico um tempo em silêncio tentando me recompor.
— Minha mãe morreu sem saber da verdade? Você a enganou até o último dia de vida dela? — sussurro tentando conter a voz embargada ou talvez apenas cheia de ódio.
Ódio. Respiro fundo tentando afastar a expressão de desprezo provavelmente estampada em meu rosto substituindo-a pela máscara de calma letal.
Ele apenas abaixa a cabeça e fica em silêncio por um tempo.
— Recentemente procurei saber da mulher — ele sussurra hesitante — na tentativa de reparar meu erro, porque com certeza se Helena estivesse viva, ela faria com que eu assumisse a garota. Hoje as duas estão naquela cidade em que morávamos. Elas virão para cá Giulia, eu irei assumi-las na tentativa de reparar meu erro.
— Esse erro nunca será reparado por completo Edgar e você sabe disso, você mentiu para minha mãe durante toda a mísera vida dela, ela tinha todo o direito de saber, tinha o direito de escolher se iria querer permanecer do seu lado depois de tudo, mesmo que não pudessem se separar de fato, poderiam se afastar. Talvez você mereça ir para o infernø por causa disso — digo inexpressiva.
— Filha… — uma súplica.
— Eu não me importo com o que irá fazer pai, mas me sinto traída por ter enganado minha mãe até seu último dia de vida. Neste mundo, ela era a pessoa quem mais deveria saber disso, não eu.
— Eu pedi perdão a ela — ele murmura tão baixo que mal posso ouvir — , só não sei se ela pôde me perdoar…
— Quando ela estava no caixão, não é mesmo? — uma lágrima escorre pelo meu rosto, que não consigo conter, enxugo-a com as costas da mão. — Então é por isso que você pedia perdão continuamente no dia do funeral, agora eu posso entender — sorrio amargamente — , tudo está legível agora, faz sentido.
Edgar levanta a cabeça, encarando-me com os olhos marejados.
— Eu também quero te pedir perdão filha — ele diz baixinho, congelo.
— Eu te perdoo pai, mas nunca, por um minuto sequer irei esquecer isso e nem mesmo me perdoar por perdoar você depois de algo tão fatal — digo com a voz rouca, entrecortada.
— Eu só irei permitir que elas venham agora se você aceitar… — Edgar sussurra.
— Pai apesar disso, você tem todo o direito de ser feliz novamente, se é isso que você quer, o faça, para mim acredito que não fará muita diferença mesmo. Só não espere que eu seja simpatizante com elas de cara, não estou preparada.
— Ok Giulia, então o farei. Dê a si o tempo necessário. Elas chegarão mais tarde, se tiver algum tempo sobrando chegue mais cedo em casa.
— Tá, já vou indo, tenho uma reunião com um acionista daqui vinte minutos — falo me levantando e pegando minha bolsa.
— Desculpe — ele cogita.
— Somente faça o necessário Edgar — digo com certa frieza e saio, voltando para a empresa de cabeça cheia, tentando reorganizar os pensamentos.
[ … ]
Quando chego na empresa, não me dou o trabalho de ir para meu escritório. Está tudo confuso demais, doloroso demais, partido demais. Então subo para o terraço, observando a cidade enquanto deixo que as lágrimas e o vazio tomem conta de mim. Porque tanta traição, tanto segredo? Não há nada que possa me reconfortar.
A sobriedade tem gosto de cinzas e aroma de traição.
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Atualizado até capítulo 27
Comments
Cleidiane Oliveira
cara tô achando que essa meia irmã e ela a namorada dela que deixou pra tras. meu coraçãozinho esta dizendo.
2022-12-15
7
Raffa Almeida
a sofy só falta elas serem irmãs,aí fudeu tudo
2023-02-21
1
Silvia Galdino
só falta a irma ser a Sofi
2023-02-15
1