XVII- Prazer, Aaron!

Bônus: P.O.V Aaron

Tem dias que a gente acorda como se vivesse dentro de uma canção, no meu caso é uma música tão diferente que não poderia ter sido escrita por outro se não pelo próprio Deus. O que a medicina chamou de impossível eu digo que é milagre. Eu sou um milagre.

Então eu tenho vivido essa música e ela ainda não parou de tocar. Quando uma irmã chegou perto de mim, chorando e dizendo que Deus estaria comigo até o fim, que eu iria chorar mas que ele cuidaria de tudo, eu não fazia ideia do que estava por vir.

Era uma linda noite, as estrelas brilhavam como eu nunca, eu me lembro porque meu pai tinha prometido me ensinar a dirigir, minha mãe havia deixado eu ir sentado no banco do passageiro na frente, enquanto ela foi no banco de trás, tinha paz dentro mim, mesmo ainda sendo um jovem adolecente naquela noite era quase um idoso, sentado em uma cadeira de balança no jardim e tomando chá enquanto observava o pôr do sol , não me pergunte o porque eu associei a isso, talvez a cadeira fosse o banco em que eu estava o balanço do movimento do carro, o chá era a paz que eu senti e o pôr do sol a luz do farol da carreta desgovernada vindo em nossa direção, atravessando o canteiro central da avenida, atingindo primeiro dois carros à nossa frente e antes do impacto eu adormeci.

Me lembro de não sentir dor, me lembro da luz branca nos meus olhos, me lembro de uma sala cheia de médicos vestindo uniforme azul, me lembro de acordar com o barulho da máquina da sala de cirurgia apitando e algumas pessoas correndo para me segurar e imobilizar minha cabeça, me lembro de sonhar, ouvir vozes conhecidas mas não saber o que estavam dizendo, até que eu finalmente acordei no quarto de um hospital.

É poético quando a gente observa a dor de fora. Eu contei essa história tantas vezes que sempre vem um detalhe a mais ou a menos...

Devia ser ainda madrugada porque um rapaz dormia sentado em uma cadeira e com outra apoiava os pés, me surpreendi ao perceber a familiaridade do jovem, Alex estava diferente, muito magro, provavelmente alguns centimetos maior e seu cabelo estava cumprido, o que mais me fez estranhar era que ele já tinha uma barba rala no rosto. Ele ainda era um adolescente mas por quanto tempo eu fiquei desacordado?

Me lembro de tentar me mover, como se ao invés de panos sobre mim houvesse um monte de pedras. Primeiro minhas mãos reagiram e eu senti paz, tentei erguer os braços mas consegui apenas um movimento tímido. Insisti, insisti, insisti, por alguma razão só minha cabeça se movia, ainda assim com muita dor no pescoço e ombro. Tentava sem sucesso me mover, queria me sentar, queria rolar na cama, levantar mas algo ainda estava me prendendo, eu tentava sem sucesso me soltar. Comecei a chamar o Alex mas minha boca estava seca e minha voz fraca, até que ele acordou.

Alex acordou e viu meu desespero, ele não sabia o que falar, não sabia o que fazer. Apenas me pediu para esperar, ele saiu, ouvia que ele estava correndo pelo corredor e não demorou para voltar acompanhado de um médico e duas enfermeiras, rapidamente o médico se aproximou.

"-A quanto tempo ele acordou?"- O médico perguntou ao Alex.

"-Eu não sei, eu estava dormindo quando ele me chamou"- Alex respondeu apreensivo, a sua voz estava alguns tons mais grave, o pomo já estava bem visível sobre o pescoço fino.

"Tudo bem, então meu rapaz, como se sente?"- O médico me perguntou com calma.

"Eu não consigo me mecher!"

O que eu falei não o deixou surpreso, mas seu olhar me quebrou em mil pedaços.

Acho que foi nessa hora que eu entendi, eu não precisava de respostas para saber o que estava acontecendo. Ele tirou um aparelho do bolso e se aproximou, lançando uma luz sobre meus olhos, fazendo eu me recordar do principal.

"O que aconteceu? Cadê meus pais?- A imagem da carreta veio nitidamente em minha mente.- Eu quero ver eles!"

Nessa noite eu chorei, as enfermeiras choraram e até o médico chorou. Entretanto, o Alex não chorou, apenas saiu e eu não o vi de novo por uma semana.

Os peritos disseram que meu pai agiu de forma totalmente racional, ao invés de fazer como é o natural de tentar desviar da carreta pela esquerda, ele virou o carro para a direita, o terceiro carro que a carreta atingiu. Ele fez isso para me salvar, sofrendo todo o impacto, ele e minha mãe morreram na hora, o carro ficou completamente destruído.

Eu não sentia que precisava me despedir, meus pais estavam entregues ao Pai celestial, as palavras que Deus havia me dado um tempo antes ecoavam em minha mente, ele estava comigo, me sustentou, quando eu achava que não poderia viver com essa dor, sem me movimentar, sem meus pais, sem minha liberdade eu entendi que já não era o mesmo e não podia viver com a mesma mente, o processo foi longo, mas Deus foi quem projetou, o maior milagre que ele realizou foi dentro de mim, não era algo físico.

Quando eu voltei para a igreja, assim mesmo, em uma cadeira de rodas, eu pude falar sobre o amor que me cercava e enxugava minhas lágrimas, das vezes que eu quis desistir e ele reafirmava que eu ainda tinha muito o que viver, do jeito dele, não era o meu, não era o que eu queria, mas era o que ele tinha para mim.

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