O culto encerra um pouco mais tarde que o normal, culto de ceia era quase sempre assim. Estávamos todos felizes porque algumas almas se entregaram a Cristo, e eu fiquei responsável por acompanhar duas delas, era uma tradição da nossa igreja para que os membros se sentissem acolhidos e também tivessem com quem contar em momentos de fraqueza.
Eu me senti renovada nesse culto, é maravilhoso quando você sente a presença do espírito Santo, quando cheguei minha cabeça estava no mundo, no que eu passei, mas agora o meu foco está onde nunca deveria ter saído.
Enquanto me despedia dos irmãos minha mente cantarolava: Muita calma nessa alma, vai ficar tudo bem... muita calma nessa alma, lembre-se de quem você tem!- Uma música que havia escutado há algum tempo mas não sabia onde.
E como já esperava meu pai não saia do meu lado, nem quando o pastor o chamou para conversar, ele me fez ir com ele.
Pedro não se aproximou, ele olhava para mim com um misto de pena, arrependimento e por incrível que pareça Raiva, pelo tempo que passamos deu para o conhecer bem. Meu coração se apertava mas logo me vinha uma paz que eu até sabia da onde.
Não teve como fugir da perspicácia da dona Ana, ela se aproximou por trás, comprimentou meu pai, mas olhando direto nos meus olhos.
-Minha filha, o que aconteceu que tentei falar com você e o Pedro o dia todo e nenhum dos dois me atendeu?- Ela fala me repreendendo como uma mãe faz com os filhos.- E que história é essa que o casamento, o chá e tudo o mais foi cancelado? A Clarinha já até comprou um conjunto de panelas para o chá que é a coisa mais linda!
- Infelizmente a Clara jogou dinheiro fora.- Meu Pai fala debochado. Eu dou uma leve cotovelada nele que se cala.
Dona Ana olha para meu pai sem entender e eu intervenho.
- É que eu acho que é muito precipitado um casamento agora, estou confusa e preciso de um tempo.
Ela junta as sobrancelhas em expressão de Pena ou compaixão não sei. Logo me puxa para um abraço.
-Ô minha querida, vocês estão juntos a tanto tempo que eu nunca imaginei que você estivesse tão assustada com a ideia de se casar.- Ouço meu pai resmungando ao fundo mas ignoro. - Bem, se vocês quiseram assim, eu não concordo, mas a escolha não é minha.
Ela se despede e saí parecendo muito magoada.
Antes de ir para casa o pastor me entrega a ficha das pessoas que irei acompanhar junto com o número de telefone deles.
-Porque não veio hoje na escola bíblica?
Ele pergunta depois que salvei os números no meu celular.
- Então pastor, me desculpa mas perdi o horário e estava muito cansada.
- Não tem que se desculpar comigo, filha. Mas alguém com suas responsabilidades na igreja tem que dar o exemplo.- Ele fala com carinho.- Mas como sei que você não é de faltar, ainda mais perder o horário, o que realmente aconteceu? Tem a ver com uma mensagem que recebi hoje a tarde?
Esperto. Mas para meu pastor não posso ocultar os fatos.
- Ontem vi o Pedro me traindo.
O pastor Balança a cabeça nada surpreso. Que raiva. Só eu que não vi esses anos todos que Pedro não prestava?!
- Bem, vou orar por vocês.
Agora eu estava nervosa, eu conto o que passei é ele responde só isso? Orar por nós?!
-E é só isso?- Não aguentei segurar minha língua.
-Para você sim. Conhece a Palavra e não precisa de mais conselhos tolos.
Entendi o que ele quis dizer. Não me desviarei dos caminhos de Deus por causa disso e nem causa nenhuma, conheço a palavra. E tenho certeza que ele ia procurar o Pedro para conversar também, afinal, ele é quem aconselhava durante nosso namoro e noivado.
Voltamos para casa, eu entro e subo direto para meu quarto, troco de roupa e desço novamente para jantar. Meu irmão chega um pouco depois, já que foi no seu próprio carro com a namorada que jantaria conosco essa noite.
Eles entram e ela vem direto me abraçar.
- Amiga, eu sinto muito. Deus tem o melhor para você.
Fuzilo meu irmão com o olhar. O linguarudo já abriu a boca, pronto, agora não faltava ninguém para saber da minha humilhação.
- Obrigada Camilla.
O resto da noite foi bem agradável, meu irmão levou a namorada de volta para casa e eu fui deitar, antes orei, orei muito para que Deus me desse o consolo e voltei a chorar, mas ao menos chorei no colo de Deus.
Segunda-feira.
Acordo com o celular despertando e os olhos remelados pela noite de choro. Eu queria estar em um filme que as pessoas quando são traidas falta no trabalho e passam o dia em casa comendo sorvete. Na vida real não é assim.
Espero mais cinco minutos e o despertador volta a tocar e eu sei que se demorasse mais iria me atrasar.
Foi com muito custo que montei meu próprio negócio, mas o fato de ser a dona não me livre de todas as obrigações, ainda mais que tenho planos de crescimento e não de comodismo. Tomo banho e me arrumo de um jeito simples, não tenho ânimo para mais do que isso, um jeans, sandália baixa e a primeira blusa passada que encontrei pela frente, o cabelo preso em um rabo de cavalo baixo. Sem maquiagem, apenas um lápis preto em volta dos olhos para disfarçar o inchaço do choro e um gloss com cor, outra onda de emoções começou a me invadir, fechei os olhos e respirei fundo.
Tomei um rápido café da manhã e saí quase que correndo.
Havia uma reunião marcada com um fornecedor as 8 horas. Meu celular conectado ao GPS toca e no primeiro toque eu atendo sem nem olhar quem é, o celular já fica no auto falante.
-Alô, bom dia!
...
Por um tempo a ligação fica muda, e o semáforo fica verde. Escuto uma leve respiração ao fundo.
- Taís, podemos conversar?
Meu peito dói.
- Estou dirigindo. -Me limito a responder.
olhando agora para o celular, a rota que estou fazendo e logo em cima, uma faixa verde de ligação em andamento com o nome "Pedro <3", nunca fui romântica, sentimental talvez, mas nunca consegui chamar ele de paixão ou apelidos bobos que os namorados se dão por aí, no máximo eu o chamava de amor, então só salvei um coração junto ao nome. Ele sempre inventava um novo apelido para mim mas inventar apelidos é algo que eu realmente não conseguia fazer.
- Não podemos deixar tudo assim, uma hora a gente vai ter que resolver esse assunto...
-Que assunto?!- O interrompo com raiva.- O de que peguei você na "NOSSA" cama com uma moça que pagava de Santa?- Sorrio debochada.- Aliás, quase tudo dentro daquela casa é tão seu quanto meu, Mas pode ficar com a cama, não ligo para quem comprou.
- Eu não quero discutir com você! Só conversar, podemos nos encontrar a noite?
- Meu pai me mata se eu ficar um segundo a mais com você, aliás, ele mata você!- falei a última parte com deboche.
Pedro sempre teve medo do meu pai, embora negasse com todas as suas forças.
Desde quando ele se formou na academia de Polícia e foi mandando para a jurisdição do meu pai. Não levou mais que alguns meses para pedir uma transferência, eu até entendo.
- Por favor, podemos nos encontrar na igreja então?
- Eu não sei...
As cenas da noite da traição me apertava o peito, os meus olhos começaram a embaçar eu enxugo uma lágrima solitária com uma das mãos e a outra mantenho no volante.
- Taís por favor... Me escuta, eu te amo!
Eu queria dizer "Eu também", porque eu ainda o amava. Mas meu orgulho ferido jamais permitiria.
- Tchau, Pedro.
Encerrei a ligação com a voz embargada. Meu peito dói, minha respiração estava fora do normal e a vontade de chorar me sufocada. Uma agonia que não pode ser descrita, algumas pessoas até dizem "Eu te entendo" mas não podem entender até passar por algo parecido. Eu me sentia um lixo.
Dirigindo no modo automático do cérebro, eu me arrependia de não ter aproveitado a ligação da maneira que devia, ter gritado tudo o que queria, ter o humilhado como ele fez comigo, ter o repreendido, ter simplesmente falado 1/3 dos palavrões mais feios que existe. "Depois eu pedia perdão a Deus."
Só com esses pensamentos absurdos minha vontade de chorar aumentou ainda mais, até que não contive um soluço e nem um arranque na embreagem do carro que encostou em outro que estava na minha frente.
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Atualizado até capítulo 20
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