Já está chegando dia de Ação de Graças e ainda não tive coragem de ligar para minha mãe e avisá-la que não vou passar o feriado com eles. Se eu fizer isso agora eles vão acabar dando um jeito de aparecer por aqui e não quero passar este feriado com ninguém. Até pedi para Jess ir ficar com sua família. Quero ficar sozinho. Preciso muito disso.
As gravações acabaram e as divulgações também. Estou com algum tempo para descansar agora, mas estou até receoso disso. Trabalhar ocupa meu tempo e na maioria das vezes eu caia na cama e dormia profundamente. Agora tenho tempo de sobra.
Chego ao aeroporto e pego um táxi. Estou cansado e preciso dormir.
Pago o motorista e pego minha bagagem na porta malas, entro no prédio. Vou para o elevador e cumprimento de longe o porteiro. Subo até meu andar encostado no fundo e com os olhos fechados. A porta se abre e faço menção de sair, percebo que não é meu andar e dou de cara com Beatriz.
- Oi Beatriz tudo bem?
- Tudo e você?
- Estou bem, vai descer?
- Vou sim, mas eu espero...
- Entra, não demora muito subir e voltar a descer.
A mãe da Angel entra e fica próxima a porta me encarando.
- Você está com uma cara péssima. O que aconteceu?
- Acabei de chegar de uma série de viagens de divulgação do meu último filme. Estou esgotado.
- Cadê a namorada para te ajudar a relaxar?
- Vim na frente. Não quis ficar esperando ela terminar as entrevistas que tinha que dar ainda.
- Entendo. Não está tão bem quanto você gostaria?
- Não sei. Eu fico bem quando estamos juntos, me distraio, mas ela não me faz falta. Não sinto saudades dela como sentia da... Angel. - passo a mão pelos cabelos e não consigo evitar de perguntar - Ela deu notícias?
- Falei com ela recentemente.
- Ela... está bem? Comentou se volta? Perguntou... esquece. Melhor não saber.
- Ryan, ela não falou em voltar, apenas me pediu conselhos e não perguntou de ninguém apenas se eu estava bem. Ela está sobrecarregada e acho que não volta mais. Estou pensando em ir para lá ficar com ela. – ela fala isso olhando para o chão.
- Entendo.
O elevador para no meu andar e vou em direção à porta. Beatriz segura a porta:
- Eu posso te perguntar uma coisa?
- Pode claro.
- Você acha que minha filha iria te aceitar como você está agora? Bebendo direto e muitas vezes fazendo coisas erradas? Você pensa nisso ou apenas faz por fazer?
- Eu não penso. Faço para anestesiar meus dias. Vivo do remorso de não ter lutado pela Angel. De não ter ficado sabendo que ela estava grávida e por perder meu filho daquele jeito.
- Se ela voltar não te aceitará assim. Você precisa sair disso. Agora!
Solta a porta e fico olhando em seus olhos até que vejo meu reflexo embaçado na porta de metal. Vou para meu apartamento. Encontro tudo arrumado. Jogo minha mala no quarto e pego um travesseiro e uma coberta no armário.
Ligo a televisão e coloco num dos canais de esporte, mas não estou assistindo nada. Fico deitado no sofá até o sono me dominar e não tenho sonhos.
Acordo e nem amanheceu ainda vou até a cozinha. Estou com sede. Pego uma garrafa de vodca e bebo no gargalo mesmo. Acabo carregando-a comigo para a sala e fico sentado olhando a televisão.
Quando me dou conta já tomei mais da metade da garrafa e a conversa que tive com a mãe dela volta a minha mente. Jogo a garrafa longe e ela acerta a parede, se estilhaça toda. Ponho minha cabeça entre as mãos e me sinto impotente por não saber o que fazer. Como passar por isso limpo?
Meu celular começa a tocar e ao pegá-lo vejo que é a Jess, não quero falar com ela, mas sou obrigado.
- Alô?
- Ryan onde você está?
- No meu apartamento.
- Eu vou chegar amanhã à tarde e vou ficar com você, ok?
- Não precisa. Eu já te falei que pode ir para sua casa e passar o feriado com sua família. Quero ficar um pouco sozinho.
- Esse vai ser nosso primeiro feriado juntos e não quero ficar longe de você.
- Olha Jess eu realmente preciso ficar sozinho. Faz isso por mim?
A linha fica muda por alguns minutos. Posso ouvir sua respiração do outro lado e após um suspiro.
- Certo, então vou para casa e nos falamos depois. Beijos.
Desligo e coloco o celular na mesa de centro, passo a mão pelos cabelos e vou limpar a sujeira que fiz, ao terminar pego o travesseiro e vou para o quarto, tiro minha roupa e vou dormir. Estendo minha mão e acaricio o lado da cama em que ela amava ficar.
Estou há alguns dias com uma dor de cabeça horrível e logo cedo saio para tomar um café. Estou a uns cinquenta metros da cafeteria quando tenho a impressão de ver um flash de cabelos ruivos na minha frente, tento localizar, mas foi apenas impressão.
Entro na cafeteria e peço um café puro e forte. Acabo pedindo um sanduiche e vou me sentar, mas a única mesa vazia está com um jornal e fico na dúvida se tem alguém ou não.
Uma senhora me olha e sorrindo me fala que a moça que estava ali tinha acabado de sair e que deixou o jornal para trás. Agradeço e me sento. Pego o jornal e fico olhando a manchete sem acreditar.
É uma foto minha e da Jessica numa das divulgações na Europa e eu não fico irritado ou bravo, surpreso seria a forma correta de descrever. Na foto estou com o braço na cintura da Jess e ela está com a mão no meu peito, só que nossos rostos estão transformados.
Estou com chifres e cavanhaque, sobrancelhas horríveis que me deixam com cara de mau e dentes pintados como se estivem podres. A Jessica tem rabo, chifres e está com a mão riscada, isso mesmo! Quase furando a página do jornal.
Tomo meu café olhando aquela imagem e só depois consigo perceber que onde está riscado tem algumas palavras, mas não consigo ler.
Percebo que alguém se aproximou da minha mesa e quando olho para o lado a mesma senhora está próxima.
- Ela deve ter muita raiva desse casal.
- A senhora a viu fazendo isso?
- Sim, ela estava com lágrimas nos olhos e pude observar que ela deve ter gostado muito desse rapaz, ela passou os dedos lentamente pela foto antes de começar a riscá-la. Existe muita mágoa naquele coração.
- A senhora viu como ela era?
- Claro! Ela é um pouco mais baixa do que eu, cabelos ruivos, olhos azuis e estava toda vestida de preto. Uma mulher linda em seus vinte e poucos anos.
Sinto um frio na minha espinha. Não pode ser! A descrição bate perfeitamente com a da Angel, mas ela não está aqui. Ela não voltou.
- A senhora tem certeza?
- Claro meu jovem. Bem preciso ir. Até logo e boa sorte.
Ela sai e fico ali olhando aquele jornal sem acreditar. Pego meu celular e ligo para a Beth. Se a Angel voltou ela sabe.
O telefone toca algumas vezes e ela acaba atendendo quase no último toque.
- Alô?
- Beth é o Ryan. Não me esconda e pode ir falando, a Angel voltou?
- Angel aqui? Não ela está na Inglaterra trabalhando numa escola de dança até final desse mês, depois disso talvez ela volte. Por quê?
Não sei se posso confiar nela a ponto de contar o que acabou de acontecer sem parecer um idiota completo. Melhor não! A mãe dela não ia mentir para mim.
- Eu achei que tinha visto ela próximo ao Central Park.
- E você acha que se ela estivesse aqui não teria vindo me visitar ou falado comigo?
- Desculpe, Beth acho que foi impressão mesmo. Vou desligar agora. Desculpe-me.
- Ryan? Tudo bem. O que acha de vir jantar qualquer dia desses aqui em casa? Eu e o Carl estamos com saudades.
- Pode deixar ligo para marcarmos algo. Beijo.
- Beijo
Desligo e fico olhando por alguns momentos o jornal, acabo jogando tudo fora e sigo em direção ao Central Park para dar uma caminhada.
Apesar das lembranças despertadas continuo caminhando tranquilamente e fico algum tempo na ponte do lago observando o fluxo do rio. Volto para o apartamento e pego outra garrafa de vodca na geladeira.
Fico assistindo as notícias e bebendo, dessa vez esvazio a garrafa e depois de jogá-la no lixo pego outra e vou para o quarto. Acabo esquecendo-me de desligar a televisão.
Estou cada dia mais acabado de cansaço. Estou tendo o mesmo pesadelo todas as noites e acordo sempre suando, gritando e com o rosto molhado de lágrimas. Me sinto um fraco por estar assim e estou bebendo cada vez mais para anestesiar os sentidos.
Preciso conversar com alguém. Vou até o apartamento em que ela morava e toco a campainha.
Após alguns minutos Beatriz atende a porta e me olha com pena. Engulo em seco.
- Eu poderia conversar com você?
- Claro! Entre.
Ao entrar as lembranças me invadem completamente. Lembro do dia em que pedi para usar o telefone e acabei ficando no sofá, das diversas vezes que dormimos juntos e das muitas vezes em que ela dormia e eu ficava observando.
- Quer algo para beber?
- Não, obrigado. Acho que bebi o suficiente ontem.
- Vou trazer um chá e pode ir se sentando.
Ela vai para a cozinha e volta com duas xícaras, ela me traz a que a Angel sempre usava para tomar seu leite ou suco. Ela entende meu olhar e sorri.
- Ela não vai se incomodar.
Damos risada e aceito a xícara que ela me estende.
- Bem, o que você gostaria de conversar comigo?
- Eu... tive a impressão de ver a Angel umas duas semanas atrás e para piorar quando entrei num café sentei numa mesa que tinha um jornal esquecido com uma foto minha com a Jess toda riscada. Eu estava com chifres! - ela ri um pouco - Uma senhora que estava no local me descreveu a mulher que fez aquilo e a descrição bate com a da Angel.
Respiro fundo e olho em seus olhos.
- Não sei como explicar, mas desde que ela foi embora tenho um pesadelo. Todas as noites a algum tempo. Ele me atormenta constantemente e só bebendo consigo passar por uma noite de descanso e agora nem isso está aliviando minha mente.
- Que sonho é esse?
Descrevo a cena do corredor, dela caminhando para longe, da minha impossibilidade de alcançá-la e do sangue e acusações que ela me faz.
- Ryan eu não posso te dizer que ela voltou porque não sei. Talvez tenha sido uma coincidência. O sonho só te mostra que você sente pelo que aconteceu, mas não é sua culpa e você sabe disso.
- Não sei se isso seria verdade. Eu devia ter ficado do lado dela. Deveria ter lutado contra você e entrado naquele quarto de hospital. O que eu fiz? Voltei para o set de filmagens e acabei de gravar o que precisava e quando voltei ela estava magoada e me colocou para fora da sua vida.
- Ela vai voltar e quando isso acontecer vocês conversarão como adultos e irão se acertar. Porque não chama a Jessica para ficar alguns dias com você? Talvez te ajude.
- Vou pensar nisso. Obrigado Beatriz você sempre me ajuda quando preciso.
- Queria apenas que você diminuísse com a bebida, mas sei que logo isso vai acontecer. - se levanta, pega a xícara e vai para a cozinha com um sorriso nos lábios.
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Atualizado até capítulo 45
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