O telefone está chamando, estou ansiosa para que atendam logo. Estou quase desligando quando ouço sua voz.
- Alô?
Engulo em seco.
- Oi mãe, tudo bem?
- Angel é você?
- Sim. Queria conversar com você sobre uma coisa?
- Claro, filha. Estava com saudades.
- Eu também. Sabe, fui indicada para um prêmio aí em Nova York e além da premiação, me pediram para fazer uma apresentação com a música do filme. Estou em dúvida se devo aceitar. Luke veio me visitar e me contou que o Ryan foi indicado junto com a namorada. Não sei se devo ir.
- Filha, você deve vir, independente do Ryan estar lá ou não. Será sua vez de brilhar. Venha por você e seu trabalho.
- Estou com medo. Medo de encontrá-lo e perceber que não o esqueci.
- Venha para casa e vamos resolvendo os problemas conforme eles apareçam.
- Certo. Vou pensar nisso. E te ligo quando me decidir.
Desembarco no aeroporto e depois de pegar minhas malas vou para o ponto de táxi, sigo para a região do Central Park. Reconheço muitos lugares por onde estou passando e aquela velha pontada vem para me lembrar de saudade.
Passo pelo flat onde minha mãe mora e vou para uma rua a cinco quadras dali. É um local calmo e tranquilo, o prédio é pequeno tem apenas dois apartamentos. Um no térreo e outro na parte de cima. Permaneço no táxi observando o prédio. Estou começando uma nova fase da minha vida. Dou um suspiro e desço.
O motorista me ajuda a retirar as malas e levá-las até a porta. Pago a corrida e pego a chave que minha mãe me mandou na bolsa. Fico em pé na porta por alguns minutos e entro.
Carrego as malas escada acima. O local não é tão grande, mas tem seu charme.
O apartamento tem um quarto, sala aconchegante, cozinha americana, banheiro, área de serviço e um escritório. Vai servir pelo tempo que vou ficar. Se acontecer de ficar por mais tempo vou transformar o escritório em uma sala de ensaios.
Preciso de um banho! Desfaço rapidamente as malas, separo uma roupa e vou para o banheiro, lavo o suor da viagem do meu corpo e cabelos. Coloco uma calça jeans, camiseta de manga comprida preta, tênis nos pés e um casaco. Está frio. Prendo meu cabelo num coque alto e desço para a rua.
Caminho para o Central Park e fico sentada embaixo de uma árvore enorme. Fico de olhos fechados ouvindo os sons dos pássaros e o silêncio que domina o local. Não sei quanto tempo passa e realmente não me importo, estou apenas curtindo um momento que há tempos não tinha.
Observo as pessoas indo e vindo e recordo das vezes em que vim para cá com meus amigos. Nos divertíamos sempre.
Levanto e vou caminhando lentamente em direção à saída, observando os arredores, mas não procuro nada nem ninguém, apenas quero me lembrar das coisas. Senti tanta falta daqui.
Chego ao flat da minha mãe e aceno para o porteiro, ele me cumprimenta com um sorriso. Vou até onde morava antigamente. Ao sair do elevador olho em direção à porta de acesso as escadas e sinto a raiva me consumir. Foi ali que perdi tudo que tinha. Tudo por culpa dela e da sua ganância de ser a única mulher na vida dele. Dou as costas e vou até a porta do apartamento, toco a campainha e minha mãe me atende quase que imediatamente.
- Oi Angel entre. Como você está linda! Virou uma mulher maravilhosa.
- Para mãe, estou como sempre fui.
- Você sabe que está mais madura. E ai gostou do apartamento? Foi fácil de achar?
- Foi sim e está muito bom para alguém que pretende ficar por pouco tempo.
Ela me olha com tristeza.
- Eu espero que não, mas você sabe o que faz. Bem me conte como foi esse tempo fora.
Conto sobre o término da faculdade, sobre a companhia de balé e sobre o centro comunitário em que dava aulas. Ela sempre está sorrindo e percebo que em seus olhos existem pequenas rugas, quase minúsculas que demonstra o quanto ela envelheceu nesse tempo que fiquei longe.
Sinto um aperto no coração, mas não tenho como voltar atrás. Pego em sua mão.
- Mãe, queria me desculpar por ter me afastado de você por todo esse tempo. Sei que você ficou sozinha e não existe desculpa pela forma que a tratei quando tentou conversar comigo.
- Está tudo bem. Eu entendo por que você tomou essa decisão e lamento pelo fato de não ter podido ir ficar com você. Eu precisava do meu emprego.
- Eu sei.
- Filha, preciso te contar uma coisa importante. Não fique brava comigo. Converso com o Ryan normalmente. Ele vem me ver sempre que está por aqui e você sabe que a Charlotte...
- Não fale dela para mim. Eu não quero saber deles. Se você conversa com ele ou não é problema seu, só não quero encontrar com ele por enquanto. Preciso me acostumar a estar aqui.
Ela me olha com pesar.
- Um dia vamos conversar sobre isso, talvez agora não seja o momento. Bem, vamos comer? Fiz seu prato favorito: bife com purê de batata.
Ela me abraça e vamos para a cozinha, ajudo a arrumar a mesa e comemos juntas como nos velhos tempos.
No meu apartamento, fico lendo um livro até tarde. Nos últimos anos ela não me visitou, mas agora que não tenho nada para fazer, a insônia vem me fazer companhia.
Sento próximo a uma janela e observo o movimento na rua, o céu mudando de cores e a noite sendo substituída pelo dia. Em meu coração só existe um pensamento: o que ele estará fazendo?
Me permito depois de tantos anos pensar em como ele está, em deixá-lo entrar nos meus pensamentos e dominá-los.
Lembro-me dos seus olhos, sorriso e da forma como me olhava quando estávamos juntos. Recordo de muitos momentos bons que passamos juntos, mas a mágoa retorna com força e me esforço para tirá-lo da minha cabeça.
Não posso permitir que minha vida seja regida pela mágoa. Ele seguiu em frente e tenho que fazer o mesmo. Me levanto e vou tomar um banho, coloco uma roupa quente e vou até uma cafeteria próxima. Fico lá por algum tempo.
Pego meu celular e resolvo aparecer para alguém. Tenho que conversar e ele é minha única opção.
O telefone toca e uma voz sonolenta me atende.
- Alô?
- Bom dia dorminhoco tudo bem?
- Quem fala?
- Certo. Eu te acordei, mas não se lembrar de mim é a pior sensação do mundo. Deixa para outra hora.
- NÃO DESLIGUE ANGEL.
- Volte a dormir Luke, depois nos falamos. Esqueci que você está quase casado agora.
- Estou sozinho. Pode parar e comece a falar logo. Onde você está?
- Nova York.
- O QUE? Quando você chegou? Onde você está? No flat? Quero te ver agora.
- Estou numa cafeteria na Central Park West com a W89th St.
- Em trinta minutos estou ai.
Ele desliga e fico olhando o aparelho em minhas mãos. Esqueci-me de pedir para não comentar nada com ninguém.
Converso com o atendente e peço mais um cappuccino e fico esperando.
Nem se passam os trinta minutos quando ouço o sino da porta tocar e Luke entra como um furacão e fica me olhando, depois se aproxima e me abraça muito forte.
- Caramba pensei que você estava brincando comigo.
- Você não acreditou quando te contei que estava aqui?
- Eu achei que você só viria uma semana antes do evento. Você está ótima!
- Gente estão todos falando isso! Como vocês queriam que eu estivesse com os olhos inchados, descabelada e maltrapilha?
- Bem isso é impossível, descabelada poderia e com os olhos inchados você está. Um pouco, mas está.
Começo a rir, ele sempre foi honesto.
- Vou pedir algo e já venho para conversarmos.
- Ok pede outro desses, por favor.
Luke faz o pedido, vem se sentar e ficamos conversando. Acabo contando que fiquei em dúvida sobre voltar para a Inglaterra e acabei decidindo voltar para cá logo de uma vez. Estava com saudades da minha mãe e não podia adiar minha volta.
Ele me pergunta sobre meus planos e falo que recebi um convite para lecionar na Julliard por um ano e trabalhar num musical da Broadway. Ele fica me olhando com cara de espanto.
- Já decidiu?
- Já e aceitei os dois. O Sr. Wilson me falou que assim que forem divulgadas as indicações vai chover propostas de trabalho.
- Isso é verdade. Você vai ser procurada por muitas pessoas. De diretores de filmes e videoclipes a escolas e faculdades.
- Bem, estou presa a esses dois e depois vejo o que faço.
- Você será famosa amiga.
- Que nada! Isso dura um tempo e depois todos esquecem.
- Acho que com você não será assim. Leu o jornal hoje? Alguém acha que te reconheceu.
- Cadê? Droga! Eu não quero aparecer na mídia ainda.
- Calma não tem como te reconhecer na foto. E no mínimo eles acham que você está no flat, tem uma nota sobre isso.
- Claro que não. Estou morando próximo daqui num apartamento que minha mãe alugou e não tenho muitos vizinhos. É discreto.
Ele solta o ar e me dá um sorriso.
- Isto será de grande ajuda, mesmo assim tome cuidado e tente andar o mais discreta possível. Evite as baladas óbvias e ficará tudo bem. Um mês passa rápido.
- Quando serão divulgadas as indicações?
- Se não estiver errado na próxima semana.
- Bem, vamos esperar. Preciso ir, pois estou sem meu disfarce de super-herói e para piorar estou em sua companhia.
Ele começa a rir e nos despedimos. Prometo manter contato e pego um táxi. Tenho que ir à faculdade resolver algumas coisas.
A faculdade está do mesmo jeito e ao caminhar por suas dependências sinto os olhos de alguns alunos me seguirem. Tenho certeza que muitos me reconhecem.
Dirijo-me ao teatro e encontro uma Srta. Smith muito brava dando berros. Me aproximo do palco e sento na primeira fileira. Ela nota minha presença e se aproxima sorrindo.
- Não acredito! Você voltou!
Levanto e caminho em sua direção. Ela me abraça e deposita em meu rosto um beijo estalado.
- Claro! Recebi um convite que não poderia recusar e agora a senhorita terá que me ver todos os dias.
- Será um prazer! E de agora em diante me chame de Chloe estaremos trabalhando juntas.
- Bem assim será muito mais fácil.
- Hoje você pode resolver as burocracias e semana que vem começamos. Te coloco a par das aulas.
- Tudo bem. Vou até a direção assinar alguns papéis. Com licença.
- Antes queria apresentá-la.
Ela sobe ao palco e pede a atenção de todos.
- Sras. e Srs. esta será nossa nova professora de balé e dança moderna: Angélica Rodriguez. Primeira bailarina da companhia Bolshoi, primeira bailarina destaque no musical de final do ano desta instituição e não menos importante professora e coreógrafa renomada de várias peças nos últimos anos.
Todos os alunos me encaram e me inclino ligeiramente como forma de cumprimento e eles batem palmas. Alguns se aproximam, me dão abraços de boas-vindas e acabo ouvindo vários nomes de uma só vez.
- Bem vá lá querida e segunda estaremos juntas.
Despeço-me de todos. Sr. Wilson está me aguardando.
- Bem, fico muito feliz de poder contar com você no próximo ano letivo Srta. Rodriguez.
- Angel apenas.
- Aqui estão os papéis de que te falei e se ocorrer de precisar de alguma licença. Converse comigo.
- Chloe me pediu para começar segunda, existe algum problema?
- Não. Vou acertar tudo para que você já comece a receber a partir do início de seu trabalho.
Agradeço e após assinar vou em direção à biblioteca. Passo pelo hall de alunos da Julliard. Fico olhando as fotos e estamos todos lá em nossos melhores momentos.
Beth no seu solo de violino, junto com o maestro agradecendo os aplausos.
Carl, Luke e Ryan no agradecimento final. Sorrindo muito e abraçados numa fileira de atores e atrizes.
Luiza e eu, juntas num momento da peça. Um destaque no meu solo e que me nomeou primeira bailarina desta instituição. Estou com lágrimas no rosto e minha expressão é de dor e desespero.
Olho por mais alguns minutos e vou para a biblioteca.
Converso com a responsável, me cadastro e pego um livro sobre expressões na dança.
Sigo para o apartamento e estou abrindo a porta quando um arrepio faz os cabelos da minha nuca se arrepiarem. Olho em volta, mas não vejo nada de diferente. Entro rapidamente.
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Atualizado até capítulo 45
Comments
virginia Alecrim
Eles precisam se acertar
2023-09-06
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