o herdeiro das tumbas perdidas

Capítulo 19: A Canção dos Mortos

O vento que atravessava o desfiladeiro era frio e cortante, trazendo consigo o som distante de gritos e cânticos. Kian segurava firme a lâmina que havia recuperado na tumba anterior, sentindo o peso crescente de cada passo em direção ao que deveria ser sua última missão naquele vale amaldiçoado. Ao seu lado, Elara mantinha os olhos atentos às sombras das rochas.

— Você sente isso? — perguntou ela, a voz baixa e cautelosa.

— Como se as pedras estivessem nos observando? — respondeu Kian, sem desviar os olhos da trilha. — Sim, sinto.

O desfiladeiro não era diferente de outros que ele já havia atravessado, mas algo nele parecia vivo. As rochas tinham rachaduras que formavam padrões estranhos, como se fossem inscrições feitas por mãos invisíveis. O chão de pedra ressoava sob seus pés, como se o eco de seus passos fosse um aviso para os que habitavam as profundezas.

— O que sabemos sobre esta tumba? — insistiu Elara, quebrando o silêncio tenso.

— Quase nada — admitiu Kian. — Apenas que foi construída para selar algo... ou alguém.

Elara estreitou os olhos. Desde que decidira seguir Kian em suas incursões às tumbas, ela havia aprendido que a história nunca era tão simples quanto parecia. Cada tumba que abriam revelava mais do que artefatos; revelava verdades que o mundo preferia manter enterradas.

— Então, qual é o plano? — perguntou ela, parando ao lado de uma rocha desgastada para observar o caminho à frente.

Kian soltou um suspiro, sabendo que a resposta não a agradaria.

— Entramos. Encontramos o artefato. E saímos antes que as coisas saiam do controle.

Elara arqueou uma sobrancelha.

— "Antes que as coisas saiam do controle"? Esse é o seu plano?

Ele abriu um sorriso cínico, mais para aliviar a tensão do que por genuína diversão.

— Você já viu isso acontecer de outro jeito?

Elara não respondeu. Ela sabia que ele tinha razão.

A entrada da tumba era uma estrutura imponente esculpida na face de um penhasco. As portas de pedra estavam adornadas com gravuras que pareciam ganhar vida sob a luz oscilante das tochas. Kian estendeu a mão para tocar uma das inscrições, sentindo uma leve vibração sob os dedos.

— Elas cantam — disse ele, surpreso.

— Cantam? — Elara deu um passo à frente, inclinando-se para ouvir.

No início, o som era apenas um sussurro, mas logo se transformou em algo mais definido: uma melodia suave e assombrosa que parecia vir de dentro das próprias rochas.

— É uma armadilha? — perguntou Elara, recuando instintivamente.

Kian franziu a testa.

— Não. Acho que é um aviso.

Ele colocou as duas mãos nas portas e as empurrou com força. Um som grave e profundo ecoou pelo desfiladeiro enquanto as portas se abriam, revelando um corredor escuro que parecia se estender infinitamente.

— Pronta? — perguntou ele, olhando para Elara.

— Não, mas isso nunca me impediu antes.

Kian sorriu, e juntos eles atravessaram o limiar.

O interior da tumba era diferente de tudo que haviam encontrado antes. As paredes brilhavam com uma luz pálida que parecia emanar de cristais embutidos na pedra. O ar era denso e pesado, como se carregasse o peso dos séculos.

— Isso não é normal — murmurou Elara, os olhos examinando cada canto do corredor.

— Nada aqui é normal — respondeu Kian, puxando sua lâmina enquanto avançava com cautela.

A melodia que ouviram do lado de fora agora era mais alta, reverberando pelas paredes como um coral de vozes etéreas. Kian sentiu um calafrio subir pela espinha. Ele conhecia aquele som.

— O que foi? — perguntou Elara, notando a rigidez em seu corpo.

— Já ouvi isso antes — respondeu ele, a voz baixa. — É a Canção dos Mortos.

Elara arregalou os olhos.

— Você está dizendo que...

Antes que ela pudesse terminar, as paredes começaram a vibrar. Os cristais embutidos nelas brilharam intensamente, e figuras começaram a emergir das sombras.

Eram espectros, suas formas translúcidas envoltas em uma luz fria e fantasmagórica. Eles flutuavam pelo corredor, suas vozes se unindo à melodia.

— Eles estão vindo para nós? — perguntou Elara, erguendo sua adaga.

Kian balançou a cabeça.

— Não. Eles estão guardando algo.

Ele deu um passo à frente, e os espectros se afastaram, criando um caminho por entre as sombras.

— Eles querem que entremos — disse ele, mais para si mesmo do que para Elara.

— E você acha que isso é uma boa ideia? — retrucou ela, relutante em seguir em frente.

— Não — admitiu ele. — Mas é a única ideia que temos.

O corredor terminou em uma vasta câmara circular. No centro, havia um pedestal de pedra, sobre o qual repousava um artefato que brilhava com uma luz dourada.

— O Coração do Imperador — murmurou Kian, aproximando-se com cautela.

Elara ficou para trás, os olhos fixos nas sombras que dançavam nas paredes. Algo ali não parecia certo.

— Kian, temos companhia.

Ele se virou rapidamente, a lâmina pronta em sua mão. Dos cantos da câmara, figuras começaram a emergir. Mas esses não eram espectros. Eram soldados, suas armaduras negras refletindo a luz dourada do artefato.

— Eles estão protegendo o artefato — disse Elara, recuando para ficar ao lado de Kian.

— Não por muito tempo.

Kian avançou, a lâmina em arco enquanto enfrentava o primeiro soldado. O metal ressoou ao encontro da armadura, mas ele logo percebeu que esses guerreiros não eram comuns. Eles não sangravam, e cada golpe que ele desferia parecia apenas retardá-los, nunca detê-los.

— Eles não podem ser mortos! — gritou Elara, esquivando-se de uma espada que passou a poucos centímetros de sua cabeça.

— Então precisamos ser mais rápidos!

Kian se lançou em direção ao pedestal, desviando de golpes e ataques enquanto avançava. Quando finalmente alcançou o artefato, sentiu uma energia pulsante emanando dele.

— Kian, cuidado! — gritou Elara, mas era tarde demais.

Assim que ele tocou o Coração do Imperador, a câmara inteira tremeu. Uma onda de energia percorreu o chão, derrubando os soldados e apagando os cristais nas paredes. Por um momento, tudo ficou em silêncio.

Então, uma voz ecoou pela câmara.

— Quem ousa perturbar meu sono?

Kian congelou, os olhos fixos no artefato em suas mãos. Ele sabia que a voz não era de nenhum dos soldados ou espectros. Era algo muito mais antigo, muito mais poderoso.

— Nós não estamos aqui para lutar — disse ele, tentando manter a calma. — Apenas precisamos do artefato.

A voz riu, um som profundo e ressonante que fez as paredes vibrarem.

— O artefato não pertence a vocês. E agora, tampouco suas vidas.

As sombras na câmara começaram a se reunir, formando uma figura imponente e aterrorizante no centro do salão. Seus olhos brilhavam com a mesma luz dourada do artefato, e sua presença fazia o ar parecer pesado e opressor.

— Kian, acho que é hora de sair — sussurrou Elara, puxando sua adaga.

Ele não respondeu. Em vez disso, segurou o Coração do Imperador com mais força, sentindo a energia pulsar através de seu corpo.

— Se vamos sair, vamos sair com isso.

Elara revirou os olhos.

— Claro. Porque tornar as coisas mais fáceis nunca é uma opção, não é?

Kian sorriu, mas seu sorriso desapareceu quando a figura deu o primeiro passo em sua direção.

— Corra! — gritou ele, enquanto a sombra avançava com uma força que fazia o chão tremer.

Eles correram pelo corredor, os espectros e soldados agora em seu encalço. A melodia que antes era suave agora era um grito ensurdecedor, como se o próprio desfiladeiro estivesse vivo e furioso.

Quando finalmente alcançaram a saída, Kian olhou para o artefato em suas mãos. Ele sabia que havia despertado algo que nunca deveria ter sido perturbado.

E sabia que o

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