És Meu
Não consigo exprimir em palavras o ódio que eu tenho a ele. Juro que se não tivéssemos de viver na mesma casa por causa dos nossos pais eu já teria ido embora para bem longe daqui.
Todos os dias temos de conviver, trabalhar juntos e por azar até temos de dormir no mesmo quarto. Já somos mais do que adultos, mas por andarmos sempre a discutir, a nossa mãe adotiva decidiu que para fortalecermos os nossos laços que o melhor era mesmo ficarmos no mesmo quarto.
Não há privacidade, tenho de o ver a toda a hora. Enjoei dele: o cheiro dele, o perfume dele. Não quero nada disso na minha vida, preciso sair desta casa rapidamente.
Abri os olhos e senti o calor do sol a bater-me na cara, era um dia quente e eu adorava o sol. Já o meu irmão Xiang preferia dias de chuva, sei lá, tinha gostos muito estranhos, nos dias de chuva costumava ficar sentado perto da janela só mesmo para ver a chuva cair. Ele era um estranho.
- Não sejas assim com o teu irmão...- pediu-me a minha mãe adotiva.
- Todos os dias me pergunto, por que é que nos adotaste aos dois. Só eu chegava muito bem, agora tenho de o aturar diariamente.
- O teu pai se te ouve dizer isso vai castigar-te. - avisou-me ela enquanto escolhia a sua roupa para aquele dia. A minha mãe era a mãe modelo para muitas mães: ela tinha adotado duas crianças que tinham sido deixadas para trás pelos pais; tinha um marido envolvido na política, que em breve ia candidatar-se á prefeitura da nossa cidade, pessoa também que era um pai maravilhoso; os filhos, bem, nós éramos os irmãos mais carinhosos que ela alguma vez tinham visto (em público). O que ninguém sabia era que a nossa vida era apenas baseada em aparências.
A minha mãe na realidade passava o dia em shoppings, perdida no meio de lojas a gastar o dinheiro do meu pai. O meu pai, bem, esse era o líder de gangue da máfia que tinha tantos funcionários que nem eu os conhecia a todos: ou estava no escritório a delinear a campanha para se candidatar a prefeito, ou estava em algum armazém a espancar alguém que tivesse falhado em pagar alguma dívida. Nós, enfim: éramos os filhos do mafioso. Fomos adotados aos seis anos de idade: eu estava no mesmo orfanato que Xiang, não nos dávamos muito bem por ele ser tão tímido e não falar, e quando fomos adotados a situação não mudou, teve tendência a piorar. Não tardei muito a ganhar-lhe ódio e ele sente o mesmo por mim.
- Hoje temos um jantar com o grupo político do teu pai. - avisou-me a minha mãe enquanto eu a ajudava com o fecho do vestido que ela tinha escolhido. - Vamos ao shopping ver o que vamos usar logo á noite. Vai chamar o teu irmão Dei.
- Posso escolher por ele, é sempre a mesma roupinha de nerd que ele usa: camisa axadrezada vermelha com riscos pretos...Calça de ganga...os ténis ele pode usar o que tem…
- És sempre assim com ele, mas depois quando vais as compras comigo perdes-te a escolher camisas para ele ou calças de ganga... - ela riu enquanto se via ao espelho.
- Nada disso. - apressei-me a negar. - Apenas se eu tenho estilo ele também tem de ter, não quero envergonhar o pai.
Xiang meteu a cabeça no espaço da porta entreaberta do quarto da minha mãe.
- Vou para a escola. - ele anunciou olhando para ela, como se eu não estivesse ali. Como se eu fosse um desconhecido para ele.
- Logo temos um jantar, o Dei e eu vamos ás compras buscar algumas roupinhas novas, depois ele mete lá no teu quarto. - Xiang acenou com a cabeça e finalmente olhou para mim.
- Baixinho, não vais á escola hoje?
Deus! Como eu odeio ouvir ele chamar-me de baixinho!
- Não, vou com a mãe comprar as coisas. Também, não me faz falta lá ir...
- Tu é que sabes. - ele disse simplesmente e saiu.
- Depois eu é que começo! - resmunguei para a minha mãe e ela riu novamente.
- Se não fossem irmãos eu ia pensar que isso é apenas tensão sexual entre vocês…
- Que nojo mãe!!!- gritei ofendido. - Nunca ia gostar de um nerd assim!
- Nem sabia que gostavas de homens, mas não tenho nada contra! - disse ela entusiamada enquanto vestia um casaco de pele branco.
- Mãe, não está muito calor para esse casaco?
- Meu querido, a palavra do dia é : austentar. Apenas isso.
Revirei os olhos, mas não consegui deixar de rir.
Tal como a minha mãe me tinha dito, mal cheguei ao shopping enfiei-me dentro da primeira loja de roupa que eu sabia que fazia o género que Xiang costumava vestir. Ele podia ser o que quisesse, mas ao meu lado tinha de andar sempre bem vestido.
A empregada da loja já me conhecia, eu costumava pedir-lhe opinião sobre algumas roupas e mal me viu veio ter comigo.
- Hoje vais levar o quê? Calças?
- O conjunto todo. - pedi olhando para a secção das camisas de flanela. A empregada apressou-se a escolher algumas peças de roupa sob a minha orientação e depois de ponderar escolhi algumas dessas peças. A minha mãe estava na loja ao lado, a ser mimada pelas vendedoras que mal a viam era a mesma coisa que estarem a ver alguma divindade, por saberem que ela ia gastar rios de dinheiro nessa loja.
- Despachado? - perguntou mal me viu entrar com sacos de compras.
- Sim, é sempre o mesmo que eu compro, mas desta vez vi um casaco que acho que ele vai gostar, por isso trouxe também.
- Mimas ele demais. - observou ela, mas eu limitei-me a ignorá-la, havia coisas que ela não entendia e eu também não queria explicar.
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Atualizado até capítulo 60
Comments
Anny Lima
interessante
2024-10-21
1