Capítulo 17. Concurso

Bárbara não aguentou e tentou intervir:

— Mas, filho…

— Se a senhora quiser continuar aqui e falando comigo, é melhor controlar sua língua, também. Boa noite a todos.

Todos ficaram olhando para suas costas, saindo da casa e deixando-os estupefatos.

*

Quando estava se arrumando para sair de casa para o trabalho, no dia seguinte, Marluce recebeu um telefonema de seu advogado.

— Bom dia, Dr. Petráglia. Alguma novidade?

— Você pode passar no meu escritório, agora?

— Claro, algum problema?

— Venha e conversaremos.

Ele desligou e deixou Marluce preocupada, tanto que ela saiu e pegou um táxi, ao invés de ir em sua scooter.

Chegou ao escritório e foi introduzida, imediatamente, na presença do advogado.

— Bom dia, doutor, qual o problema?

— Bom dia, sente-se, Elizane. Primeiro, quero saber onde você está morando, fui ao apartamento, ontem a noite, estava vazio e o porteiro disse que a dias você não ia lá.

— Precisei me mudar, para o CEO não descobrir quem eu sou. Ele começou a me perseguir e não tive outra alternativa. Vou lhe dar o endereço.

Ela pegou um bloco sobre a mesa e anotou o endereço novo. Ele pegou, identificou e achou um local bom.

— Parece bom. Mas e quanto às notícias na mídia, é verdade, estão namorando?

— Sim. Ele não sabe quem sou, mas surgiu um sentimento entre nós, difícil de descrever. É como se já nos conhecêssemos e nos amássemos.

O advogado cobriu a boca com a mão, tentando impedir o riso de sair. Marluce estranhou sua reação .

— O que foi, doutor?

— Essa reação é normal, se você lembrasse do seu passado, perceberia que se davam muito bem, eram quase inseparáveis.

— Oh, não tinha pensado nisso. Aliás, tenho tido lembranças. Minhas memórias estão voltando aos poucos, como cenas de filmes, mas ainda não consigo unir os fatos.

Ernesto Petraglia sentia que havia mais coisas na história de Elizane, que não era só a amnésia. Os médicos disseram que sua memória voltaria aos poucos, que o trauma foi curado e ela lembraria tudo.

Infelizmente isso não aconteceu logo, mas agora que ela está em contato com seu passado, através de Ronald, as lembranças estão vindo. Ele desconfiava de que o problema era psicológico, algo ou alguém causou um trauma psíquico, além do trauma físico.

— O que você lembrou?

— Da minha infância com a minha mãe, de Ronald brincando comigo e caindo no rio. Mas em várias cenas, vi a mão de uma mulher, com unhas pontudas e anéis grandes. 

Ernesto franziu as sobrancelhas, parecia que estava certo, havia alguém por trás daquele acidente que quase vitimou os dois herdeiros dos sócios da empresa.

— O resultado do processo deve sair em no máximo três meses. Até lá, tente se manter segura. Cuidado com Ronald, ele é considerado um homem frio e implacável e pode surtar quando descobrir quem você é.

— Isso tem me preocupado, para dizer a verdade e não sei como será.

— Vocês ficarão frente a frente, diante do juíz, não tem como evitar.

— Eu sei, vamos ver se nossos sentimentos vão aguentar. Mais alguma coisa, doutor Petráglia?

— Me chame de Ernesto. Te chamei aqui, porque a família de seu pai, os que herdariam a sua parte, caso não a encontrássemos, descobriram sobre você e estão conversando com o inventariante. Cuidado com eles, não são bons.

— Obrigada, Dr. Ernesto, preciso ir para o trabalho.

Despediram-se e ela saiu, indo para a empresa. Tinha três meses para estar com Ronald e conquistar ele e seu lugar na empresa, antes do confronto no tribunal.

*

Com tudo resolvido na família, depois de alguns dias, as notícias sobre o casal começaram a sumir e o assunto mudou. Mais quinze dias e chegou o dia da festa de aniversário da  empresa, quando anunciariam o vencedor do concurso. O projeto seria exibido no telão, para todos verem o histórico da empresa.

Os olhares dos concorrentes sobre Marluce, continuavam fuzilando-a e embora não falassem abertamente, maldiziam ela pelas costas. Achavam injusto concorrer com a namorada do CEO. Se ela ganhasse, seria protecionismo.

Ronald conhecendo a simplicidade de sua namorada, encomendou um traje exclusivo, especial para ela. Porém, ela pensou o mesmo e como agora podia, foi pessoalmente encomendar um vestido em uma loja exclusiva, onde tudo era de estilistas de renome e caro, muito caro.

No dia do evento, ela foi ao salão, fez um tratamento completo e saiu de lá, totalmente arrumada. Trajava um vestido justo na parte de cima e com saia longa, godê. Era de renda bordada com cores prateada, azul e salmon, com pedrinhas de cristal entre o bordado, que brilhavam conforme andava.

Ela se olhou no espelho de corpo inteiro e as ajudantes exclamaram, emocionadas:

— Está tão linda!

— Parece a rainha das fadas!

Marluce continuou se admirando no espelho, sem acreditar que era ela. O vestido era mais curto na frente, deixando à mostra suas canelas e as sandálias, que mostravam seus pés delicados. 

Foi auxiliada a entrar no carro e seguiu sozinha no evento. Praticamente fugiu de Ronald. Recebeu o vestido que ele comprou para ela e não gostou. Era vermelho e muito chamativo, deixaria ela com cara de atriz de filme mafioso.

Mas quando parou na porta do salão, todos os olhos focaram nela e não a reconheceram, com os cabelos presos em um coque alto e uma maquiagem rebuscada.

“ Quem é ela? Parece uma rainha.”

“ Não conheço, é uma atriz? “

“ Que mulher linda e elegante! Será que está sozinha? “

Todos se decepcionaram ao ver Ronald Sinclair se aproximar e dar o braço a ela.

— Esperava um vestido vermelho, mas confesso que este está muito melhor. Você está excepcional!

— Obrigada, você também está muito bem de smoke.

— Então, vamos ocupar nosso lugar.

Entraram, enfrentando os flashes das câmeras, que fotografavam de todos os ângulos. Chegaram a mesa reservada para os acionistas e acompanhantes e a família estava lá. Marluce saiu de cena e quem olhou para eles, com a cabeça erguida e orgulhosa, foi Elizane, só que eles não sabiam.

Todos a encararam sem disfarçar o desgosto por vê-la ali, incluindo Núbia, que estava muito elegante, mas apática. Desviaram o olhar, a desprezando e ela também não falou nada. 

Ela deu um meio sorriso e contemplou um por um, até se deter nas mãos de uma das mulheres. Aquelas eram as mãos de suas lembranças.

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