Capítulo 10 Narrado pela Ísis

Eu quero que a Ayla confie em mim, quero que ela se sinta confortável para conversar comigo. Sendo assim, nada mais justo do que eu também mostrar confiança nela.

— Uma troca de informações? Me parece muito interessante e não vou negar que a ideia de saber alguns segredos seus me deixa fascinada. A Ayla falou brincando, e eu gostei de saber que estava conseguindo distraí-la.

— Em primeiro lugar, gostaria de deixar claro que vou te contar um segredo que ainda não contei para ninguém. Então, esse segredo será uma exclusividade nossa, e você não poderá me julgar nem contar isso para ninguém. Estamos entendidas? Eu perguntei em um tom sério, e a Ayla sorriu.

— Sim, senhora... Ops, quer dizer, entendi, Ísis. Ela se corrigiu depois de ter lançado um olhar sério.

— Depois daquele sábado, eu voltei todos os dias naquela boate para tentar te ver novamente. Mas, por favor, não pense que eu criei alguma obsessão por você. Na verdade, eu só fiquei curiosa. Mas olha como o destino é caprichoso, você tentou fugir de mim e ele acabou te trazendo de volta.

— Pois é, mas eu fico contente por isso, porque é no toque sutil do destino que nascem as melhores histórias. E mesmo que o que aconteceu aquela noite entre a gente não volte a se repetir, mesmo assim eu fico feliz, porque aquela foi uma das melhores coisas que me aconteceu há muito tempo. A Ayla ficou um tempinho em silêncio, como se estivesse refletindo.

— Sabe, desde que entrei no primeiro ano do ensino médio, eu já tinha decidido que queria estudar artes plásticas. Eu já tinha planejado tudo. Só que tinha um probleminha: desde sempre, meus pais acreditaram que eu ia ser uma advogada e que seguiria o legado deles, trabalhando com eles. Mas em nenhum momento eles me questionaram se era isso que eu queria. Quando terminei o ensino médio, resolvi expor meus planos e compartilhar com eles meu sonho, mas essa, sem dúvida, foi a pior decisão que tomei. De tudo que meu pai disse, a coisa que mais marcou foi ele falar que eles precisavam de uma advogada e não de uma artista plástica. No primeiro momento, insisti muito pelos meus sonhos, mas ele me boicotou várias vezes. Ele disse que não pagaria o curso, então tentei uma bolsa e, apesar de saber que tinha capacidade para conseguir passar, o resultado era sempre negativo. A Ayla me contava e eu não conseguia assimilar isso. Dava para ver em seus olhos o quanto isso a magoou.

— Tudo o que eu fazia havia se tornado motivo para discussão, as brigas se tornaram parte da rotina. Para evitar os conflitos, eu passava mais tempo fora de casa e comecei a frequentar todos os tipos de festas, onde meus amigos me chamavam, eu ia. E isso começou a gerar uma discussão entre meus pais e eu me tornei pivô da briga deles. Então, para tentar ter um pouco de paz, decidi que ia estudar e ser uma das melhores da sala, e a única coisa que pedi em troca é que me deixassem aproveitar ao máximo as minhas férias e que não me proibissem de ir às festas, e eles concordaram com isso. Só que desde então, meu pai está ainda pior e as brigas entre meus pais não pararam, e eu sei que ele tem outra mulher na vida dele, e o que me deixa com muita raiva é que ele é egoísta, ele quer ficar com as duas, e isso está destruindo minha mãe, que diz que ama ele, mas eu não acho que isso é amor, porque se isso for amor, eu não quero experimentar isso nunca na minha vida.

— Eu sinto muito por isso, Ayla, não sei como é passar por uma situação assim. A única coisa que eu sei é que nem conheço seu pai, mas já não gosto dele. O que é estranho, porque dizem que a gente não costuma simpatizar muito com a sogra. Eu falei, tentando amenizar um pouco aquele clima ruim.

— Espero que isso não te faça desistir de mim, mas apesar de seus sogros serem péssimos, você vai ter uma cunhada bem legal. A Ayla falou, entrando na brincadeira, e eu gostei muito dessa ideia.

— Nada disso que aconteceu é culpa sua. Temos o direito de escolher o que queremos fazer da nossa vida, e nós é que temos que decidir a melhor forma de viver. Nossos pais têm que nos instruir na direção certa e ensinar o certo e o errado. O que seu pai fez foi impor a vontade dele, ele te manipulou, e você não deve se sentir mal pelo seu pai não ter caráter. E quanto à sua mãe, ela precisa entender que, a partir do momento em que algo nos faz mal, é preciso deixar ir. Não dá para viver segurando cacos de vidro, mas isso é algo que ela tem que descobrir sozinha. Às vezes, é necessário deixar as pessoas saírem das nossas vidas. E quanto ao "amor", ele não tem culpa de nada, e você não deveria fugir dele. O amor é um sentimento nobre e puro, e ele não machuca ninguém. O amor não faz mal, quem faz mal são as pessoas que não sabem amar.

— Você já sofreu por amor, Ísis? - Ela me questionou, como se estivesse me desafiando.

— Não, eu sofri por não entender o verdadeiro significado dessa palavra. Eu não tinha maturidade suficiente para entender as minhas próprias emoções e lidar com elas. Graças a isso, acabei criando expectativas totalmente exageradas em cima de algo que era apenas fruto da minha imaginação. Chegou um momento em que os castelos de areia vieram ao chão e me mostraram que eu estava me enganando, e isso não era justo comigo nem com a outra pessoa. Eu falei, e Ayla prestava bastante atenção em tudo que eu estava dizendo.

— Se eu não fosse sua aluna e se a gente se encontrasse em outro momento, o que você faria? - Ayla me perguntou.

— Eu não sei, não quero pensar em como as coisas poderiam ser diferentes. Eu gosto de como as coisas estão acontecendo entre a gente, você mesmo disse que é no toque sutil do destino que nascem as melhores histórias, quem sabe o destino não esteja escrevendo o melhor roteiro de todos os tempos. Eu falei e ela sorriu.