Cap-16

Maverick

Depois de quase duas horas conversando com a Kim, resolvemos desligar. Desabafamos, sobre os nossos medos e pesares... me ajudou um pouco. Saí do meu escritório e fui direto para o meu quarto, tentei dormir, mas não consegui. Estava exausto, fazia pelo menos, mais de 46 horas que não dormia decentemente, mas ainda assim, nada do sono vir...

Suspirei na cama, sabia o que era essa insônia... Enquanto não conversasse com a Holly sobre o dia, não ficaria em paz. Levantei da cama e mesmo cansado, com a cabeça a ponto de explodir, bati na porta da Holly. Foi só por educação, sabia que ela não me atenderia, então abri a maçaneta, e para minha surpresa, estava aberta.

Holly estava deitada na cama com o celular na mão, estava assistindo um vídeo familiar, reconheci a voz da Lize. Os olhos verdes, como os da mãe, estavam inchados, o nariz vermelho e ela fungava, ela não me deu atenção, e eu fiquei parado em frente a cama, observando a minha garotinha... meu coração se partiu... quando foi que ficamos tão distantes?

Uma retrospectiva da vida dela passou na minha cabeça, me lembrei da Lize me dando um presente, uma camiseta com os dizeres: "Futuro Papai". A notícia da gravidez foi tão maravilhosa quanto fazer o parto da Holly... Suspirei e me sentei ao lado dela na cama, os cabelos castanhos estavam bagunçados no rosto, prendi alguns fios atrás de sua orelha, encarei os olhos que estavam divagando.

— Holly, eu preciso que converse comigo. Me conte o que está acontecendo... como tem sido os seus dias?— iniciei.

Ela não desviou o olhar do celular, e agora passava fotos. As lágrimas brotavam nos olhos dela sem parar, enxuguei algumas com o dorso da minha mão.

— Vem cá, filha.— falei a puxando para mim.

Ela se sentou na cama, largou o celular e me abraçou, chorou por um longo tempo, eu alisava as costas dela, tentando consola-la. Quando minha camiseta estava encharcada, ela se afastou e tentava limpar o rosto com as mãos.

— Querida, porque não me contou que estava namorando?— perguntei, ela deu com os ombros— Filha, eu não quero ser um pai chato e ciumento, eu só quero protege-la. Eu não sei o que conversou com sua mãe, mas garotos dessa idade as vezes usam as meninas como objeto, e depois as largam com o coração partido e ferido...

— Mas o Steven não é assim...— ela murmurou.

— Me entenda querida, não estou aqui para julgar. Não me importo de querer namorar... mas não acha que estou no direito de conhecer o garoto e dar alguns conselhos?

Ela me olhou e voltou a chorar.

— Eu queria que a mamãe estivesse aqui!— ela protestou— Se ela estivesse aqui, seria tudo muito mais fácil! Ela me entenderia!— vociferou em meios aos soluços.

A abracei novamente, ela quis se desvencilhar, mas a segurei com firmeza.

— Também queria sua mãe aqui... mas não dá...— balbuciei com os olhos lacrimejados.

— O senhor vive naquele maldito hospital! Salva todo mundo, mas não foi capaz de salvar a mamãe!— ela bradou.

Foi um choque, não sabia o que responder, se não bastasse a culpa que eu carregava, Holly também me culpava.

Ela se afastou enquanto eu paralisei chocado. Olhei para ela e procurei as palavras certas, algo que pudesse dar uma explicação... mas nada veio... Holly voltou a deitar de bruços, com o rosto enterrado no travesseiro.

— Eu não sou Deus, Holly... para decidir quem morre e quem vive...— murmurei cabisbaixo.— Não sou sua mãe, eu sei disso, mas pode falar comigo. E se realmente quer proceder com esse namoro, eu quero conhecer o garoto e a família dele.

Ela continuou paralisada, sem se mover. Me levantei e deixei um beijo na nuca dela.

— Boa noite, Holly!

Quando me virei em direção á porta, avistei a Hope, nos olhando e chorando em silêncio. Me aproximei e a abracei, ela não se conteve e soluçou nos meus braços.

Eu havia perdido a esposa, e elas a mãe, não saberia medir o tamanho do sofrimento de cada um de nós... Peguei Hope no colo e a levei para o quarto dela, a coloquei na cama.

— Quando as pessaos dizem que vai melhorar, elas mentem... a cada dia fica mais difícil! Estou com muita saudades da mamãe...— Hope desabafou fungando.

— As pessoas só querem ajudar, querida... mas nunca será fácil... vamos nos acostumar com a dor, mas ela nunca vai desaparecer...

— Posso dormir na sua cama?— ela perguntou.

Em meio os lamentos do meu coração, acabei esboçando um sorriso, Hope sempre deu trabalho para dormir no seu quarto, eu e Lize tivemos muito trabalho para faze-la se acostumar em seu quarto. E com certeza ela está se aproveitando do momento, como sempre faz, para não dormir sozinha.

— Só hoje.— respondi com a sobrancelha arqueada.

Ela saltou da cama, pegou seu travesseiro e um ursinho, e me acompanhou até o quarto.

Nos deitamos, fiquei de lado olhando a Hope, as coisas eram mais fáceis com ela, pelo menos até hoje, talvez por ainda ser uma criança.

— Como foi seu dia?— perguntei.

Ela se virou e me encarou.

— Foi bom. A semana que vêm vai ter o terceiro jogo do meu time na escola. Será que vai poder ir?— falou suplicante.

— Me fala o dia e horário e vou deixar anotado na minha agenda. Tenho que me planejar com antecedência.— afirmei pegando o celular.

— Quarta-feira que vêm, às 15h.

— Certo. Anotado.— bocejei.

Larguei o celular, e o cansaço veio com tudo, tantas horas sem dormir...

— Boa noite, papai!— Hope falou se virando.

— Boa noite, querida!— falei acariciando os cabelos dela.

Apaguei as luzes, e adormeci. Um pouco mais tarde acabei acordando com um murmurinho e um balanço na cama.

— Vai mais pra lá!— sussurrou Holly.

— É o máximo que posso ir!— replicou Hope.

Sorri e dei mais espaço para as duas, fingindo não ter acordado. As duas se aquietaram e logo adormeci novamente.

⏰Flashback-on

Estava na emergência, Lize acabara de ter uma parada cardíaca, Henry estava com o desfibrilador nas mãos, e já havia dado inúmeros choques elétricos no coração da minha esposa, e Lize não respondia aos estímulos.

— Outro!— ordenei suplicante.— Lize, por favor meu amor... volte pra mim...— levantei os olhos e Henry tinha uma expressão de pesar— Continua!— vociferei.

Henry meneou a cabeça em negação e olhou o relógio.

— Não ouse!— bradei— Não se atreva a declarar!— esbravejei.

— Hora da morte, 20:37h.— Henry declarou e logo veio me abraçar.

— Nãoooooo!

⏰Flashback-off

Acordei ofegante, o coração acelerado no peito. Levantei, fui até cozinha e tomei um copo de água. Voltei e lavei o rosto e me olhei no espelho do banheiro, fechei os olhos entristecido... Fui para o quarto, e lá estava minhas meninas, dormindo tranquilimente. As cobri com o edredom, e foi aí que observei Holly agarrada com o vestido azul com estampas de rosas vermelhas da Lize, suspirei e voltei a deitar.

Precisava dar um jeito de ficar mais com minhas filhas, nem que pra isso, tivesse que sacrificar um pouco do meu trabalho...

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