Capítulo 18

Era fácil esquecer qualquer coisa enquanto observava Amanda sentada no chão à minha frente abrindo uma caixa de pizza — o motivo de nossa conversa ter sido interrompida. Ela é tão hipnotizante, tão espontânea, parecendo uma menina enquanto olhava a fatia em sua frente e contava sobre a primeira vez que um entregador esteve alí e deparou-se com todas as modelos que quase o atacaram devido a fome e sua demora. Ela estava visivelmente tentando mudar de assunto, talvez tivesse se arrependido do que disse antes, mas eu sabia que apesar de não conseguir voltar a falar naquele momento, depois seria inevitável.

— Está com fome ou já comeu? — perguntou.

— Já comi.

— Mas duvido que tenha sido essa pizza. — Observei ela retirar pedaço e esticar o braço me oferecendo. — Vem, come um pedacinho comigo.

Levantei indo sentar no chão enquanto pegava a pizza. Amanda abriu o refrigerante de tamanho médio e tomou um gole na boca da garrafa mesmo.

— Por que me propôs ir para Los Angeles? — perguntei após alguns segundos de silêncio.

—  Estou com medo que Josh complique sua vida.

— Não posso sair fugindo apenas porque terminei meu noivado. — Coloquei o resto da pizza na caixa. — Preferia que você estivesse dizendo isso porque queria ficar comigo.

— Louise, eu só... quero que fique bem. Sei que está tentando ser forte, mas não é fácil terminar um relacionamento depois de anos e ter que lidar com o ex sendo um completo idiota.

Ficamos em silêncio enquanto eu admitia o quanto estava abalada, como era difícil parar e pensar como tudo o que planejei havia perdido o sentido em tão pouco tempo e a pessoa que pensei conhecer tão bem tornou-se um estranho. Era realmente difícil temer encontrar Josh e ouvir as bobagens que ele diria, mas ao mesmo tempo me fazia ter certeza de que tinha feito a coisa certa e certeza do que desejava dali pra frente.

— Você realmente está pronta para seguir em frente? — perguntou Amanda me tirando de meus devaneios.

— Que tipo de pergunta é essa? Nessa altura do campeonato ainda está com medo de que eu volte atrás? — Ela abriu a boca para falar, mas me antecipei. — Ou é você quem não está preparada para seguir em frente?

— Se eu disser que são as duas coisas? — Levantei do chão pegando minha bolsa que estava encima o sofá. — Louise, espera! — Amanda colocou-se a minha frente segurando em meus braços. — Não é exatamente como você está pensando.

— O que estamos fazendo, afinal? Eu não gosto de jogos, não quero uma aventura. Sei que é cedo demais, que tudo acabou de acontecer, mas também sei o que quero e pensei que...

— De forma alguma vejo o que temos como um jogo ou aventura, não pense tal absurdo! Eu não estaria me envolvendo se não gostasse verdadeiramente de você.

— É a Sabrina, não é? — Ela negou. — Tudo bem, você não me deve nenhum tipo de explicação.

— Por favor, para — pediu segurando meu rosto entre as mãos. — Não tem a ver como meus sentimentos por outra pessoa, mas sim a minha vida, a sua, quem eu sou e quem você é. Eu queria muito apenas fechar os olhos e ir sem medo, mas não consigo ignorar o fato de que um dia voltarei para casa. Nós somos de lugares e mundos diferentes... — Retirei suas mãos de meu rosto.

— Estou aqui completamente livre e entregue, enquanto você está tentando evitar se envolver demais, determinando um limite entre nós.

— Louise... — Amanda ficou na ponta dos pés e encostou a testa na minha. — Eu te gosto tanto — murmurou, em seguida selou nossos lábios me trazendo a calma que precisava naquele momento. — Me perdoa por ser assim tão complicada.  — Segurei a cintura dela trazendo para mais junto a mim, unindo novamente nossas bocas em um rápido beijo que terminou em outros vários selinhos.

— Tudo está acontecendo tão rápido aqui dentro — murmurei ainda com a testa junto a dela.

— Acho que precisamos pensar um pouco. — Aquilo era a última coisa que eu precisava ouvir naquele momento. Afastei-me olhando em seus olhos e sem nada dizer apenas confirmei com a cabeça, saindo logo em seguida.

Por que eu tinha que estar sendo tão intensa? Não lembrava de ser assim antes. Nem sabia que era possível me apaixonar daquela forma, então não havia como saber lidar com tal situação. Sentia um nó na garganta que parecia prestes a me sufocar. Minha cabeça gritava enquanto eu pedia silêncio, pois não devia ser possível estar sofrendo por uma mulher quando acabei de terminar um noivado.

Por que Amanda tinha que ser tão cheia de muros e defesas? Fui me apaixonar justo por uma mulher que não estava completamente aberta ao amor. Pior, ao meu!

Amor, Louise? Bufei batendo a mão no volante, tentando espantar todos aqueles pensamentos que estavam ficando cada vez mais confusos.

Quando cheguei em casa inicialmente não encontrei ninguém, mas o som de água vindo da piscina chamou minha atenção. Observei através da porta Sabrina saindo da piscina usando apenas calcinha e sutiã, ela me viu e pareceu prestes a dizer alguma coisa, mas saí antes e segui para meu quarto.

Aquele dia ruim precisava ter um fim e eu sabia que minha cabeça não permitiria então depois de tomar um banho e me preparar para dormir, sorrateiramente fui até o quarto de minha mãe que já dormia e avistei na mesa de cabeceira um frasco de comprimidos, exatamente o que precisava. Peguei o que queria e observei mamãe por alguns minutos, desejando poder conversar, ouvir sobre o que ela sentia e dizer como também me sentia naquele momento.

...***...

— Há uma linda garota te esperando na sala — disse Sabrina enquanto eu saía do quarto pela manhã. Ela subia a escada usando seu robe azul escuro, exatamente como no dia anterior.

— Garota? — Fiquei estranhamente ansiosa, como se fosse possível ser Amanda a minha procura.

— Sinto-me um pouco mal por estar dividida entre a sua beleza e a dela — brincou.

— Como consegue tal humor logo pela manhã? — Ela sorriu e apressei os passos para ver logo sobre quem estava falando.

Não havia ninguém na sala então segui até a outra onde encontrei Milena sentada à mesa conversando alegremente com minha tia e prima, enquanto mamãe parecia fingir prestar atenção na conversa. Ao me ver ela logo sorriu de orelha a orelha anunciando que precisava ir e levantou-se da mesa rapidamente se despedindo de todas. Desejei bom dia e saí ao lado de minha amiga que mudou o semblante assim que ficamos sozinhas.

— Caiu da cama? — perguntei abrindo a porta da frente. — Por que veio até aqui ao invés de me esperar no lugar de sempre?

— Eu não conseguiria ficar sentada esperando nem mais um minuto. Está vendo isso aqui? — Apontou para o próprio rosto. — Não preguei o olho durante a noite inteira.

— Você fez um ótimo trabalho com a maquiagem, pois não dá para perceber nada. — Abri a porta do carro e joguei minha bolsa no banco de trás. — O que aconteceu? — Virei-me para ela que estava encostada no veículo, fitando o chão.

— É tão... Vergonhoso.

— Ei, você não é disso. — Olhei o relógio em meu pulso verificando se ainda tinha tempo. — É sobre o Jason? — Ela confirmou. — Então fala logo mulher!

— Descobri que ele... — Milena pareceu travar, as palavras não saíram, mas ela parecia preste a vomitá-las. — Me trocou por um cara.

— Como descobriu isso?

— Por que você não está surpresa? — Gaguejei e ela me olhou desconfiada. — Louise, não me diga que eu era a única idiota que não sabia sobre isso?

— Não diria a única, quero dizer, é que... Bem, eu ouvi sem querer, mas preferi não dizer porque pensei que ele diria.

— Ele nunca me diria. Sabe como fiquei sabendo? Olhei as mensagens dele e lá estava uma conversa recente e estranha com Simon, logo depois a conversa com Amanda desabafando sobre o fato de estar novamente... escute bem, novamente dividido. Oh Deus, o que fiz para merecer isso? Como pode ser que das únicas vezes que pensei estar dando certo com esse homem, vem outro e o rouba de mim?

— Amiga, me desculpe dizer, mas isso não tem nada a ver com roubo. Esse cara não é pra você, desista! Ele pode até gostar, mas não o suficiente para assumir um relacionamento. Nem tem a ver com a sexualidade, ele deve amar mesmo esse Simon porque já faz um tempão e se agora estão preste a voltar é porque...

— Lou, você não está me ajudando em nada.

— Me desculpa por ser realista, mas se espera que eu diga palavras de incentivo para que siga nessa ilusão, sinto muito.

— Nossa, o que deu em você? Por que está assim tão radical?

— Fui uma grande iludida, fiquei me enganando achando que poderia ser algo além de algumas transas para Amanda, mas ela me deixou ciente de que somos de mundos diferentes e que em breve voltará para o dela, por isso não se abriu para mim. Acredito que não esteve nem perto de estar cem por cento comigo, seu pensamento sempre foi que nós teríamos um lance e por isso não iria me contar demais, me incluir demais e nem gostar demais. — Bufei.

— Ei, calma Lou, você conhece essa mulher faz um mês no máximo e até semana passada estava noiva. Não acha que está indo rápido demais?

— Você é inacreditável, estava outro dia perguntando se não íamos assumir namoro.

— Meu amor você tomou decisões tão rápidas que cheguei a pensar que estava a ponto de pegar suas coisas e ir viver com ela, por isso incentivei, mas pelo que vejo foi só da sua parte...

— Não é que ela tenha me iludido, eu quem fiz o trabalho sozinha. — Olhei novamente o relógio. — Ah, quer saber? E daí que conheci ela há um mês ou uma semana? Eu gosto dela independente do tempo. Quero ela em minha vida e quero mergulhar nesses sentimentos sem medo.

— Ok amiga, mas você não acha que o fato do Jason gostar de mim é suficiente para que eu tente conquistar também a parte dele que está gostando do Simon? — Ficamos nos encarando por alguns segundos até que ambas sorrimos negando com a cabeça. — Vamos embora?

A manhã passou rápida, almocei sozinha porque Milena estava focada no trabalho e durante a tarde tive uma reunião.

Cheguei em casa ainda cedo, encontrei minha mãe e tia rodeadas de vestidos na sala, tudo para um tal bazar que estavam planejando e fui barrada por elas para ser informada de que seria uma das madrinhas de casamento da prima que eu não via há anos, porque uma das escolhidas não poderia comparecer. Tentei recusar, pedi que encontrassem um outro jeito, mas não teve jeito, no final das contas eu teria que usar um vestido lilás cheio de babados.

Liguei o celular apenas quando entrei em meu quarto e me deparei com uma mensagem de Amanda pedindo para me encontrar naquela noite, junto a alguns emojis tristes que me fizeram suspirar pensando nela e em nossas últimas conversas, mas uma batida na porta me trouxe de volta. Era Sabrina que colocou apenas a cabeça para dentro.

— Incomodo? — Neguei e ela entrou no quarto, descalça usando um moletom grande, os cabelos eram aquela cascata linda de cachos e o rosto sem numa maquiagem. Ela puxou a cadeira de minha escrivaninha e sentou diante de mim cruzando as pernas, me deixando ciente de que não usava nada além de uma calcinha branca. — Tudo bem? Você parece preocupada. — Afirmei que estava bem. — Sua mãe está praticamente desistindo do divórcio.

— Como assim praticamente desistindo?

— No fundo ela já desistiu, mas está pedindo um tempo para pensar melhor, o que significa que deve estar planejando encontrar seu pai e tentar reatar. — Suspirei um tanto cansada.  — Converse com ela, ok? — Sabrina levantou rapidamente. — Bom, provavelmente vou embora daqui a alguns dias. — Ela seguiu para a porta e me coloquei de pé também.

— De qualquer forma obrigada. Vou conversar com ela e tentar colocar algum juízo naquela cabecinha — falei acompanhando Sabrina até a porta onde ela parou se encostando na parede, ficando de frente para mim.

— Fui convidada para o casamento de sua prima, mas não sei se devo realmente ir já que é algo de família...

— Por favor vá, você seria uma boa companhia, pois acredite apesar de ser família sinto que estarei em meio a estranhos. — Sabrina sorriu dando um passo a frente, ficando perto demais.

— Não sou uma estranha para você? — Eu estava tentando disfarçar o quanto sua aproximação era desconcertante. — Bem, se é para te fazer companhia, então vou — falou baixinho enquanto tocava meu queixo com o indicador e o polegar, seus olhos fixaram-se em meus lábios e engoli em seco percebendo o quanto ela mexia comigo.

Naquele instante decidi que já estava mais que na hora de admitir para mim mesma que as chances de existir duas Sabrina's em nossas vidas naquele momento não eram tão grandes assim. Desde o princípio gostei de sua personalidade o suficiente para me recusar a acreditar que fosse a mesma pessoa com quem Amanda teve uma relação, mas não havia como permanecer na dúvida.

— Se deseja dizer alguma coisa sugiro que diga agora, pois estou prestes a fazer algo que provavelmente considere uma bobagem. — Arqueei as sobrancelhas ao ser trazida de volta a realidade ouvindo suas palavras e me afastei o suficiente para sair daquela névoa de sedução que ela conseguiu formar em tão pouco tempo.

Fugi do cheiro e o olhar provocante que estavam me deixando confusa, caminhando pelo quarto enquanto reunia coragem para perguntar.

—Tem algo que desejo saber.

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