Eu me lembro claramente de quando fiz aquela atividade escolar sobre profissões, ainda na época do ensino médio. A professora pediu que escrevêssemos sobre a profissão dos nossos sonhos, e, naquela época, minha resposta foi simples: eu queria ser professora. Sempre imaginei que teria uma carreira tranquila, ensinando crianças e vivendo uma vida pacata. Mas também me lembro de pensar, enquanto preenchia o papel, que isso seria apenas uma parte de um futuro ao lado de Theodor. Ele já estava ao meu lado, na época, e nossa história estava apenas começando. Eu sabia que casaria com ele, que teríamos filhos, uma casa cheia de risadas, e que seríamos felizes.
Eu ainda me lembro dessas coisas, mas, quando olho para a minha vida agora, me sinto como se tivesse ficado presa em um lugar entre as memórias da juventude e a pessoa que sou hoje, ou quem eu acho que sou. Minha mente, ao tentar buscar mais detalhes sobre os anos que vivi desde a adolescência, parece me bloquear, como se tivesse apagado a maior parte do que veio depois disso. Tudo o que eu sei é que as lembranças mais vívidas são da época em que éramos adolescentes, quando Theodor e eu namorávamos e começávamos a construir um futuro juntos. Não consigo lembrar de como me senti depois disso, quando envelheci, quando a vida adulta realmente aconteceu. Eu sei que houve mudanças, mas as memórias se desfazem antes de eu conseguir entender o que aconteceu com elas.
Naquele momento, enquanto eu observava Lunna brincar na sala com suas bonecas, sentia uma sensação estranha de confusão. A rotina da casa estava confortável, mas algo dentro de mim estava fora do lugar. A sensação de que eu deveria ser mais, de que havia algo mais esperando por mim, foi tomando conta de mim. Eu sabia que amava minha vida com Theodor e Lunna, mas uma parte de mim, uma parte que ainda não reconhecia completamente, estava pedindo por algo mais.
Theodor saiu para o trabalho, e depois do almoço resolvi sair com Lunna para o parque. Ela sempre foi a diversão, a energia que me fazia sorrir mesmo nos dias mais difíceis. “Vamos ao parque, Lunna,” disse, tentando esconder a incerteza em minha voz.
Ela correu até mim, empolgada, e saímos de casa. No caminho, algo ainda me incomodava. Como se o parque fosse um lugar onde, por algum motivo, eu pudesse encontrar respostas, mas também algo me dizia que não encontraria nada ali.
Ao chegarmos, algo chamou minha atenção: Juliana. Eu a reconheci imediatamente. Ela estava sentada na parte de fora de uma cafeteria, perto do parque, com um sorriso tranquilo no rosto, observando as crianças ao redor. Juliana sempre foi aquela amiga que parecia ter tudo planejado, sempre tão segura de si, e eu... bem, eu sentia que tinha perdido o fio da minha própria vida.
“Rosana!” Ela me chamou, e sua voz foi um alívio familiar. “Nossa, quanto tempo! Como você está?”
“Juliana, não acredito que é você!” eu disse, sorrindo um pouco aliviada por minha memória não ser um empecilho dessa vez, mas também um pouco perdida em que parte paramos. “Eu… estou bem. E você? Como tem estado?”
“Ótima! Depois que terminamos o ensino, fiz a faculdade que tanto desejava. Abri minha própria empresa, sou consultora de marketing digital agora,” ela respondeu com um brilho nos olhos. “E você? O que tem feito?”
Eu hesitei: “Bem...eu me casei com Theodor e agora temos nossa filha Lunna.” – apontei para minha filha que havia corrido para brincar no balanço.
“Ah, sim... Lembro que engravidou no final do ensino médio e teve que deixar os estudos, foi uma pena não podermos ir a faculdade que tanto desejamos ir juntas.” – ela me olhou sem jeito. “Mas ser dona de casa também é um trabalhão e tanto não é?”
“Sim.. mas comecei a pensar em algo diferente agora que Lunna está maior q. Talvez voltar a estudar ou até trabalhar.”
Juliana olhou surpresa, mas logo seu sorriso se alargou. “Isso é ótimo, Rosana! Eu sempre soube que você tinha muito potencial. O que te fez mudar de ideia?”
Eu não sabia exatamente o que me fez mudar de ideia, mas a resposta estava lá, na ponta da língua. “Eu… não sei. Eu sempre pensei que ser dona de casa era o suficiente, que estava tudo bem assim. Mas agora… sinto que algo está faltando. Eu quero fazer mais. Só não sei bem o que ainda.”
Juliana me observou com um olhar compreensivo. “Rosana, você tem muitas qualidades que podem ser usadas de outras formas. Não é tarde para seguir seus sonhos, para tentar algo novo. Eu sei que ser mãe e esposa é importante, mas você não precisa deixar seus próprios desejos para trás.”
Eu a olhei, com um nó na garganta. As palavras dela tocavam algo dentro de mim, uma parte que eu mal reconhecia. “Eu… Eu não sei se sou capaz. Não sei por onde começar.”
Juliana sorriu de forma encorajadora. “Você já deu o primeiro passo, pensando nisso. E nunca é tarde, Rosana. Eu sei que você tem muito a oferecer. Não se limite.”
Fiquei em silêncio, absorvendo suas palavras. Elas pareciam tão certas, tão óbvias para ela, mas eu me sentia tão desconectada de mim mesma, como se estivesse tentando recuperar algo que eu mesma não reconhecia. O que mudou em mim? O que fez minha mente se rebelar contra a rotina confortável que sempre aceitei? Eu sabia que minha vida com Theodor e Lunna era maravilhosa, mas havia algo além disso me chamando, algo que eu não podia mais ignorar.
Voltei para casa com Lunna, mas a minha mente estava cheia de perguntas. O que eu realmente queria? Quem eu realmente era agora? Ao entrar na cozinha, encontrei Theodor, que estava terminando de preparar o jantar. Ele me olhou com um sorriso, mas logo percebeu que havia algo diferente em mim.
“Como foi o parque?” ele perguntou, com uma curiosidade que não pude disfarçar.
“Foi bom,” respondi, tentando sorrir de volta, mas sem conseguir esconder a dúvida que ainda estava em mim: “Lunna se divertiu muito. Ah, encontrei a Juliana. Ela está super bem-sucedida agora. Tem a própria empresa.”
“Que bom para ela,” Theodor disse, com um sorriso: “E você? Como se sentiu ver alguém que estudou conosco no passado?”
Eu respirei fundo, tentando organizar meus pensamentos. “Eu fiquei surpresa. Ela parece tão realizada, e isso me fez pensar sobre a minha própria vida. Eu sempre pensei em ser dona de casa, mas agora… sinto que há algo mais para mim. Talvez eu devesse estudar, trabalhar, fazer algo só meu.”
Theodor me olhou com surpresa. “Mas você sempre disse que preferia ficar em casa, que era isso que você queria. Isso não está mudando agora, está?”
Eu sabia que ele estava confuso, e eu também estava. “Eu sei, eu posso ter dito isso, mas… algo mudou. Eu não posso mais ignorar o que sinto. Eu quero ser mais do que só a mãe ou a esposa. Eu quero encontrar algo que seja só meu.”
Ele ficou em silêncio, como se estivesse tentando entender tudo o que eu estava dizendo. “Eu só quero que você seja feliz, Rosana. Eu entendo, mas... você não acha que tudo isso é um pouco inesperado?”
Eu o olhei, tentando encontrar palavras que fizessem sentido para nós dois.
Algo dentro de mim dizia que havia mais a ser vivido, mais a ser descoberto. As palavras de Juliana, as lembranças da escola, os sonhos que eu achava que haviam sido deixados para trás, estavam agora se misturando com minha realidade. Eu não sabia o que o futuro me reservava, e isso me assustava. Mas também sentia uma sensação de alívio, como se finalmente estivesse permitindo que algo novo surgisse dentro de mim.
O silêncio na cozinha parecia denso, mas não era desconfortável. Theodor me olhava com a mesma expressão de sempre, a preocupação em seus olhos, mas havia também um toque de compreensão. Ele sabia que eu estava passando por algo, talvez até sem saber exatamente o que era.
“Eu sei que isso parece repentino,” eu disse, minha voz suavizada pela dúvida, “mas não é sobre não estar feliz com o que temos. Eu amo nossa vida, nossa casa, nossa família. Mas eu sinto que posso ser mais. E talvez... talvez seja a hora de descobrir o que mais é esse ‘algo’.”
Theodor olhou para mim por um momento, como se estivesse pesando suas palavras. Então ele deu um passo em minha direção e segurou minha mão com ternura. “Eu quero que você seja feliz, Rosana. Se isso significa seguir seus próprios sonhos, eu vou te apoiar. Só quero que saiba que, não importa o que você escolha, você não está sozinha.”
Eu sorri, sentindo o calor de suas palavras, mas ainda havia um nó em meu estômago. A mudança era inevitável, mas eu sabia que isso significaria algo para os dois. Eu só não sabia ainda o quê.
O resto da noite passou tranquila como outras noites, e quando a hora de dormir chegou, eu me deitei ao lado de Theodor, mas minha mente continuava agitada. Não conseguia parar de pensar sobre o que estava acontecendo comigo. As memórias da juventude eram claras, como se tivessem sido preservadas, mas o restante da minha vida parecia um borrão. Eu sabia que precisava encontrar uma maneira de juntar as peças do que havia perdido, de redescobrir a mulher adulta que sou agora.
Mas, por enquanto, tudo o que eu podia fazer era dar o primeiro passo, mesmo que esse passo fosse pequeno. Eu olhei para Theodor, que já havia fechado os olhos, e sussurrei para mim mesma:
Eu vou descobrir o meu caminho, não importa o quão difícil seja.
Mais uma imagem do nosso casal em estilo anime...💕
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Atualizado até capítulo 42
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