RECONSTRUINDO NOSSO LAR

O sol brilhava forte sobre a fazenda, e o vento carregava o cheiro de terra úmida e grama cortada. Eu observava Theodor colocar as malas no carro enquanto tentava ignorar a tensão no ar. Era estranho, mas, de alguma forma, parecia que ninguém queria admitir que estávamos indo embora.

A mãe dele mantinha-se ocupada demais, como se eu simplesmente não estivesse ali. O avô, sentado na varanda, olhava-me de longe, sem dizer uma palavra. Já o primo de Theodor, normalmente cheio de si, evitava o meu olhar, enquanto Emily segurava o braço dele com um sorriso despreocupado.

Por um momento, perguntei-me se todos estariam aliviados quando eu saísse dali.

Então, senti um toque inesperado.

A avó de Theodor se aproximou e, antes que eu pudesse reagir, me puxou para um abraço apertado. Meu corpo ficou tenso no início, mas aos poucos relaxei no calor daquele gesto inesperado.

“Eu sei que você não lembra, mas já fizemos muitos biscoitos juntas.” — Ela murmurou perto do meu ouvido, e antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, colocou um pequeno embrulho nas minhas mãos: “Para a viagem.”

Eu engoli em seco e forcei um sorriso.

“ Obrigada…”

O primo de Theodor pigarreou, desconfortável.

“ Bom… se cuida, hein.”

Emily, por outro lado, parecia animada demais para o clima melancólico ao nosso redor.

“Nos vemos em breve!” — Ela disse, apertando mais o braço do seu novo namorado: “ Eu vou visitar vocês, com certeza!”

Theodor apenas suspirou, como se já soubesse que não teria escolha.

Olhei uma última vez para a fazenda antes de abrir a porta do carro. Eu sabia que aquele lugar tinha sido importante para mim, mas não conseguia lembrar como ou por quê. Pela primeira vez, senti que queria lembrar.

Entrei no carro, e assim que Theodor ligou o motor, deixamos aquele pedaço do passado para trás.

A viagem foi tranquila, mas, conforme nos aproximamos de casa, algo estranho me apertava o peito. Aquela casa não era só a nossa casa agora. Era a casa onde eu havia vivido com a minha mãe quando era criança. Cada canto parecia ter uma lembrança antiga presa, cada parede contava uma história que eu não conseguia lembrar totalmente. E, ainda assim, tudo parecia diferente.

Quando paramos em frente à casa, uma sensação de familiaridade me invadiu, mas também uma estranha sensação de que nada ali era realmente meu. A casa, que antes era nossa, parecia pertencer a uma versão de mim mesma que eu mal reconhecia.

Eu tinha me esquecido de tantas coisas, mas essa casa... parecia me lembrar de algo que eu estava tentando entender.

Quando saímos do carro, o ar parecia mais denso. A casa estava ali, a mesma casa em que eu havia crescido, e Theodor, como sempre, sabia exatamente o que fazer. Ele se mudara para ali assim que soubera do meu esquecimento, querendo estar perto de mim, embora eu não soubesse disso. Ele tinha feito daquele lugar o novo lar para nós, sem saber como eu me sentiria ao reencontrá-lo.

Entrei na sala e a familiaridade dos móveis me fez hesitar. O sofá de veludo, a mesa de centro, o relógio de parede... tudo parecia exatamente como eu me lembrava, mas ao mesmo tempo não parecia ser mais meu. Tudo ali fazia parte de um passado que eu não conseguia mais acessar completamente.

“Eu vou mudar isso.” — As palavras saíram da minha boca antes mesmo de eu pensar.

Theodor, que estava observando em silêncio, soltou uma risada suave.

“Você realmente vai transformar tudo, não é?”

Ele parecia não se importar. Eu sabia que ele havia feito isso por mim, mas agora parecia ser a minha vez de dar meu toque a esse lugar.

“Só algumas coisinhas.” - eu sorri.

A ideia de mudar as coisas, de dar algo novo àquele espaço, me parecia reconfortante. Afinal, se aquele lugar fosse voltar a ser meu, eu precisava fazer com que ele fosse a cara de quem eu estava me tornando.

No outro dia, quando o dia estava começando a clarear, eu já estava completamente envolvida no que parecia ser uma missão quase impossível: mudar a casa sem realmente mexer em tudo de uma vez.

Passei pela sala e, com uma caneta e um pedaço de papel, comecei a anotar algumas ideias. Não precisava de um trabalho de construção ou uma reforma gigante. O que eu queria era simples: pequenas mudanças que tornassem esse lugar mais ‘minha casa.’

Primeiro, decidi começar pelas paredes. Eu não sabia por que, mas as cores claras me faziam sentir um vazio. Precisava de algo mais acolhedor, algo que me envolvesse e me fizesse sentir mais próxima da vida que eu queria. Passei pelo corredor e entrei na sala de estar, onde o sofá de veludo ainda estava lá, olhando para mim com um ar antiquado.

Aquele sofá sempre foi um ponto de ligação com o meu passado, mas hoje ele parecia um obstáculo. Eu queria algo que refletisse quem eu era agora, uma versão mais madura, mais leve... mais viva.

Comecei a mover as almofadas, ajustando a posição, colocando algumas mais coloridas e outras mais neutras, tentando dar ao espaço uma sensação de conforto que eu não conseguia encontrar em nenhum outro lugar da casa. Cada detalhe parecia importante. Eu não queria que tudo fosse perfeito, só queria que fosse confortável para mim.

Em seguida, fui até a estante. Ali, eu sabia que poderia realmente trazer algo pessoal para o ambiente. Peguei algumas fotos nossas, algumas das quais nem me lembrava mais de quando tinham sido tiradas, e as organizei com um toque mais descontraído. Os livros estavam espalhados de maneira aleatória, mas eu queria que eles ocupassem um lugar mais... importante. Cada livro, uma história, cada história, uma parte de mim.

Foi quando ouvi o barulho de passos vindo do corredor. Theodor apareceu, com um sorriso mais animado do que eu esperava. Ele estava visivelmente curioso, como se soubesse que eu estava determinada a fazer algo que, de alguma forma, mudaria o clima da casa.

“Então... mudou de ideia sobre não fazer uma grande reforma?” — Ele perguntou, observando a sala de estar, agora com os móveis ligeiramente reorganizados.

Eu ri, mais relaxada com a presença dele.

“Não, eu só... senti que precisava fazer isso por mim.” — Olhei ao redor, orgulhosa de como a sala parecia agora.

Era simples, mas era minha.

“Acho que está começando a ficar com a minha cara.”

Ele se aproximou da estante, tocando as fotos com os dedos.

“Você tem uma boa coleção de fotos aqui.”

“Algumas eu não lembrava que tinha.” — Respondi, meio pensativa: “Eu acho que o fato de eu estar começando a me lembrar de algumas coisas me faz querer manter outras... eu não sei explicar.”

Ele sorriu e se aproximou, colocando a mão em meu ombro, com um gesto reconfortante.

“Eu entendo.” — Ele respondeu suavemente: “E acho que está ficando ótimo.”

Com o apoio dele, eu me senti mais à vontade para continuar. Passamos o resto da manhã arrumando o restante da casa, reorganizando os móveis e fazendo pequenas mudanças. Eu não sabia se esse seria o fim da transformação, mas sabia que aquele era o meu começo.

Era o meu jeito de criar um novo lar, que fosse a nossa casa, mas que também tivesse um pedacinho meu em cada canto.

Quando terminamos, o sol já estava mais alto no céu, e a casa parecia mais viva. O que antes parecia ser um simples espaço vazio, agora estava cheio de novas energias, novas cores, e, principalmente, novas memórias.

“Sabe, você fez bem em começar por aqui.” — Theodor disse, com um sorriso satisfeito: “Eu gostei de ver o quanto você se entregou à ideia. Agora sim, parece que é o nosso lugar.”

Eu me virei para ele, sorrindo: “Sim, acho que é.”

Depois de passarmos o dia rearrumando a casa, já estava na hora do jantar.

A pizza que havíamos pedido já estava em cima da mesa, e o cheiro delicioso parecia ser o toque perfeito para o dia que se arrastava lentamente. Sentamos na mesa de jantar que acoplava com a sala de estar, no novo espaço que agora já estava mais aconchegante, mais... nosso.

“Eu nunca pensei que rearrumar a casa fosse ser tão divertido.” — Theodor comentou, mordendo uma fatia de pizza.

Eu ri, pegando uma fatia também.

“É porque estávamos fazendo isso juntos. Com uma participação especial.” – desviei meu olhar para Lunna.

Que mesmo pequena tentou ajudar com jeitinho desastrado.

Ele riu, olhando também para ela que brincava na sala de estar com suas bonecas.

Eu passei o olhar pela sala, pensando em mais mudanças.

Mas, antes que eu pudesse continuar, vi algo no canto da mesa: uma pilha de fotos antigas que estavam esperando para ser penduradas na parede.

“Vamos escolher umas para pendurar.”— sugeri, curiosa para ver quais fotos ainda restavam do nosso passado.

Theodor pegou as fotos e começou a espalhá-las pela mesa, observando cada uma com atenção.

Eu, ao contrário dele, não sabia se queria ver aquelas imagens agora.

Muitas delas eram antigas demais, com pessoas que eu mal sabia do porque nos afastamos.

Mas algo me disse que deveria olhar.

No meio disso, ouvimos os passos pequenos de Lunna, nossa filha. Ela se juntou com seu jeito travesso, um sorriso tímido no rosto.

Com seus cabelos ruivos e o olhar curioso, Lunna parecia mais uma pequena exploradora a cada dia.

“Posso ajudar mamãe?” — Ela perguntou, olhando para as fotos com uma animação genuína.

Lunna, com seus 10 anos, tinha uma maneira de transformar qualquer momento em algo mais leve. Eu sorri, sabendo que sua presença tornava tudo mais divertido.

“Claro, pode escolher uma foto para pendurar também, se quiser.”

Ela sentou na mesa, pegando uma foto dela mesma quando era bebê, com um sorriso banguela enorme, brincando comigo e Theodor na grama.

Dizendo que era a foto que ela mais adorava, e eu não pude deixar de sorrir ao vê-la tão animada.

Theodor pegou outra foto, e foi então que eu me deparei com uma que me fez parar por um momento.

Era uma foto dos antigos amigos da escola, naquele dia quando todos descobriram que Theodor e eu estávamos namorando.

Eu podia sentir a risada, o clima de surpresa e a tensão no ar, como se fosse ontem. A reação deles foi tão real, tão espontânea. E eu, olhando para aquela foto agora, me perguntava onde estavam todos, principalmente Bianca, a minha melhor amiga.

Lunna, ao meu lado, olhou para a foto e puxou a minha atenção.

“Essa foto é de quando vocês estavam na escola, né? Eu adoro essa história!” — Ela falou, com o rosto iluminado de curiosidade: “Mas vocês ficaram tímidos quando o pessoal descobriu que estavam namorando, né?”

Eu ri, pegando a foto da mão dela.

“Sim, estava todo mundo espantado, inclusive nós dois.”

Theodor se aproximou, colocando a mão nos ombros de Lunna.

“Mas, mesmo com o susto, foi o começo de tudo.” — Ele disse, com um olhar carinhoso para nós duas: “E agora temos a nossa família.”

Lunna ficou pensativa por um momento, olhando para a foto antiga, depois para mim e para Theodor.

“Eu gosto de como a nossa casa está ficando mais colorida.” — Ela disse, com um sorriso tímido.

Eu olhei para ela, tocando seu cabelo com carinho. Lunna sempre soube como trazer uma perspectiva diferente.

“Sim, a nossa cara.”— Concordei: “E agora, vamos pendurar essas fotos?”

Enquanto começávamos a escolher e pendurar as fotos, a sensação de estar criando algo novo para nossa família preenchia o ar.

Lunna se distraiu colocando suas fotos favoritas no rack da sala, enquanto eu e Theodor ríamos e nos ajudávamos a decidir quais momentos mereciam ser eternizados nas paredes.

E, à medida que a noite passava, a casa ia ficando cada vez mais nossa. Eu sabia que as memórias que íamos criar aqui, com Lunna correndo de um lado para o outro, com risos e brincadeiras, seriam tão preciosas quanto qualquer foto antiga.

Era uma nova fase, cheia de transformações, mas também de novas raízes.

MAIS UMA IMAGEM DO NOSSO CASAL COM LUNNA 💕

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