Quando terminei de ler a carta ela se desfez em pleno ar, dando lugar a uma tela holográfica semelhante a um rolo de pergaminho. “Bem-vindo Guardião. Escolha o nome pelo qual será conhecido”; era o que dizia na tela.
“Deveria mudar meu nome?”; o pensamento passou pela minha cabeça, enquanto eu ponderava meus próximos passos. Arthur sempre foi uma identidade muito imponente para alguém como eu, ele representava muitas coisas poderosas, coisas que eu jamais alcancei quando estive vivo.
— Não devo pensar assim! – suspirei – Esse é o meu nome e dessa vez será diferente.
Olhei para a tela e falei “Arthur, será o meu nome”. A tela mudou e passou a mostrar minhas informações de Guardião, mas infelizmente não havia muito o que ver, a não ser aqueles números ridículos. "Olha para isso, como pode uma criança ser tão fraca. Será que eu consigo levantar 10 quilos?", pensei, enquanto olhava para meus atributos.
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Força: 4
Destreza: 5
Corpo: 3
Intelecto: 12
Mente: 20
Persona: 20
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Achei muito estranho quando vi essa tela pela primeira vez. Era como estar em um desses MMORPG que joguei no passado. Era esquisito que a condição do meu corpo se desse por uma forma numérica. Aparentemente, isso era o porquê de um Guardião ser mais resistente. Dependendo de quão alto eram as estatísticas de um Guardião, levar um tiro não era nada. Eu sei o que você está pensando, nós não somos assim tão diferentes de um Monstro.
Estiquei meus dedos para frente e circulei a Mana por meu corpo, disparando uma pequena bola de energia. Felizmente, o controle que eu tinha voltou no tempo comigo e a energia estourou antes de bater na parede, mas uma pequena onda de choque correu pelo quarto. Aquilo não era realmente uma habilidade, mas um conhecimento que todo Guardião tinha no futuro. Sentir mana era algo básico, ainda que as classes mágicas se beneficiassem muito mais desse ataque, era útil em alguns momentos. Eu deveria praticar um pouco mais meu controle, assim eu talvez pudesse mover coisas à distância.
Ouvi os sons de passos aproximando-se rapidamente do quarto. Fosse quem fosse, aquela pessoa estava muito apressada. Voltei a me deitar e assim que a porta abriu com delicadeza, pude ver aquela que há muitos anos não encontrava. Uma mulher de longos cabelos castanhos e um rosto rechonchudo entrou no quarto; ela estava um pouco acima do peso, mas isso era apenas um detalhe desnecessário. Ela não era uma mulher muito alta, tinha pelo menos 1,60 m, e andava sempre muito apressada. É o mau dos adultos que tomam conta de crianças, se eles não se moverem rápido, as crianças poderiam se meter em alguma confusão. Pela dor que estava sentindo atrás da cabeça, ela se descuidou em algum momento.
- Que barulho foi esse? – a mulher perguntou apreensiva.
- Barulho? – Perguntei\, me sentando na cama – Não ouvi nada\, professora.
Aquela era uma das poucas pessoas que realmente cuidava e se importava com os órfãos, mas coitada, não tinha poder nenhum naquele lugar. Sempre achei muito estranho que uma pessoa de coração tão bom quanto a professora Marta ainda trabalhasse naquela espelunca. Não sou, de forma alguma, ingrato pela criação que recebi naquele orfanato, mas alguém como ela merecia trabalhar em um lugar menos tóxico quanto aquele. Seus olhos permearam preocupados pelo quarto, buscando o motivo daquele barulho estranho, mas tudo parecia em ordem. "Foi apenas minha imaginação?"; era o que seus olhos me diziam.
- Provavelmente não foi nada\, Sra. Marta – disse com um sorriso.
- É\, talvez não tenha sido mesmo... – ela respondeu sentando-se ao lado do meu beliche – Como está sua cabeça?
- Latejando um pouco – respondi – O que aconteceu?
- Você bateu a cabeça enquanto brincava no pátio. – ela disse.
Minhas lembranças estavam começando a clarear um pouco. Eu lembrava dessa pancada, mas não foi só porque cai, mas porque alguém me derrubou de propósito. Ótimo, eu voltei para um momento muito bom no tempo; falando ironicamente, é claro. Naquele tempo, eu costumava sofrer nas mãos de alguns garotos aqui do orfanato, mas precisava aguentar firme toda aquela humilhação. Dessa vez vai ser diferente, bem diferente.
A senhora passou a mão pelos meus cabelos e senti uma pontada quando passou no que deveria ser um galo. Fiz uma careta enquanto tentava suportar a dor, esse tipo de coisa não me incomodaria antes de retornar, mas agora aquilo era bem incomodo para falar a verdade. Lembrar que teria que subir de nível novamente me enchia de uma profunda tristeza, e isso deve ter transparecido no meu rosto, porque senti umas tapinhas no topo da cabeça.
- Essas brincadeiras de Guardiões são bem perigosas! – ela falou com um sorriso forçado – Você deveria se concentrar em seus estudos. A vida de um Guardião é bem perigosa\, sabia?
"Sei mais que qualquer um!", era o que eu queria dizer, mas fiquei calado. Apenas balancei a cabeça, baixando os olhos e minha professora suspirou. Espere, ela falou Guardiões, não falou? A essa altura ninguém deveria saber o que é um Guardião. Em 2014 era claramente quando a Segunda Onda viria, perto do fim do ano, mas os Guardiões só apareceriam no início do ano que vem.
- Guardiões? – perguntei – O que é isso?
- Você esqueceu? – ela ergueu uma sobrancelha perguntando – Talvez seja melhor assim.
- Os outros garotos não irão me falar? – perguntei com um sorriso – Não é mais seguro um adulto me falar sobre?
- Vocês crianças são muito espertas pra essas coisas\, hein? – ela respondeu com um suspiro.
Ela me explicou muito por cima, parecendo querer evitar que eu me empolgasse muito com esse assunto. Estava muito surpreso, os Guardiões não deveriam ter surgido ainda, e a destruição foi muito menor dessa fez, os Monstros estavam menos ativos do que antes. O meu "antes", é claro. Aquele era realmente um trabalho bem perigoso, não me admirava que a Sra. Marta estivesse tão preocupada com o futuro, se eu realmente quisesse trabalhar com isso. Pelas memórias nubladas desse corpo infantil, vira e mexe era possível ver alguma notícia de Guardiões mortos em combate, ou sendo hospitalizados com ferimentos graves.
Era estranho para mim, ver essas notícias pipocarem em minha mente enquanto a senhora falava. Apesar de os Guardiões serem mais resistentes que pessoas comuns, pelas minha memórias eles pareciam mais fracos que antes. Talvez porque os Djins que criavam poções ainda não foram encontrados. 2014 era muito cedo para os Guardiões; eles ainda eram fracos. Sem essas poções eles não seriam muito melhores que pessoas comuns ao longo prazo.
A sra. Marta falou que aquelas pessoas surgiram a pelo menos meio ano, quando seus feitos começaram a aparecer na mídia e em vídeos espalhados pelo Facebook e Youtube. Mais tarde, eu deveria procurar alguns vídeos quando eu pudesse usar os computadores do orfanato.
- Vou deixar você descansar – a mulher deu dois tapinhas em minha perna antes de levantar-se – Não esqueça que você precisa ir para a escola mais tarde.
- Está bem – falei\, enquanto via ela sair pela porta.
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Atualizado até capítulo 27
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