capítulo 8: mais nada a perde

No escritório de Theo, o ambiente era pesado, carregado de um silêncio tenso. Sara, ainda nervosa, seguiu Marta até a sala, onde Theo estava sentado atrás de sua enorme mesa de mogno. Ele olhou para ela com um semblante sério, mas não hostil. Quando Marta entrou e se posicionou ao lado de Sara, Theo fez um gesto com a mão, indicando que ela deveria se sentar.

— Pode se sentar. — Theo falou com sua voz grave e imponente, e Sara não hesitou em obedecer, mesmo com o medo ainda rondando seus pensamentos.

Marta deu um leve sorriso para Sara antes de sair da sala e fechar a porta com um clique suave. O silêncio que se seguiu fez o coração de Sara disparar. Ela sabia que não estava diante de qualquer homem, mas sim de alguém com um poder imenso. Theo, no entanto, permaneceu calado por alguns momentos, observando-a com um olhar penetrante. Quando finalmente se pronunciou, sua voz era firme e sem rodeios.

— Vamos fazer assim. Eu vou te dar um emprego aqui na mansão, para que você tenha uma vida digna. Mas, para isso, preciso saber sua história. — Ele falou, com um tom neutro, mas Sara sentiu que ele queria entender cada detalhe de sua vida.

Sara hesitou por um momento. Não sabia se deveria contar tudo ou omitir partes da verdade, mas a sensação de estar sendo tratada com certa dignidade a fez decidir-se a falar. Ela respirou fundo antes de começar.

— Cinco dias atrás, meu pai morreu. — Sara falou, com a voz embargada, lembrando-se do funeral recente, da dor e da sensação de abandono. — Fui informada pelo advogado de que ele me deixou tudo. Quando fiquei sabendo disso, minha madrasta e minha meia-irmã... elas... — Ela fez uma pausa, as palavras se engasgando em sua garganta. — Elas me venderam, Theo. Elas me venderam para o tráfico. Eu fui... leiloada.

Theo escutava em silêncio, seus olhos fixos nela, mas o ódio e a raiva cresciam em seu peito. Ele sabia que muitas coisas sombrias aconteciam nos negócios em que estava envolvido, mas nunca aceitara que alguém fosse tão cruel a ponto de fazer isso com uma jovem inocente. O homem que ele era, imerso na escuridão da máfia, nunca aceitou esse tipo de atitude.

Sara continuou, suas palavras agora mais firmes, como se estivesse se libertando de um peso que carregava desde o momento em que foi arrancada de sua vida.

— Eu... eu sou filha única. Minha mãe morreu quando eu era pequena. Meu pai, mesmo sendo rico, sempre foi muito ausente. A madrasta e a filha dela sempre me trataram mal, mas eu nunca imaginei que chegariam a esse ponto... — Ela olhou para Theo, seu olhar cheio de dor. — Agora, estou aqui. Sem saber o que fazer da minha vida.

Theo ficou em silêncio, ouvindo tudo atentamente. Ele não se mexeu, mas seu rosto demonstrava a revolta que ele sentia, especialmente quando ela mencionou a traição de sua madrasta e o leilão que ela foi forçada a participar.

Mas então, Sara continuou a revelar mais.

— Eu... eu sou a única herdeira do Grupo Álvares. — A última frase saiu como um suspiro. Ao falar isso, ela sentiu o peso das palavras, como se sua vida nunca mais fosse a mesma. — Meu pai deixou tudo para mim. Tudo. Mas ninguém sabia disso, nem mesmo minha madrasta.

Theo ficou em silêncio por alguns segundos, seu olhar agora mais intenso e surpreso. Ele se recostou na cadeira e, pela primeira vez desde o início da conversa, mostrou uma reação. A surpresa era visível em seus olhos.

— Você... é a herdeira do Grupo Álvares? — Ele repetiu, como se não acreditasse no que estava ouvindo. — Então você é a única dona da fortuna deles.

Sara assentiu lentamente, surpresa pela reação de Theo. Não sabia que isso teria qualquer importância para ele, mas, ao vê-lo visivelmente surpreso, se deu conta do peso da informação.

Theo finalmente se levantou e começou a caminhar pelo escritório, pensativo. Ele estava processando tudo o que acabara de ouvir. As peças estavam se encaixando, e agora ele entendia melhor a situação. Ela não era apenas uma vítima em uma história de abuso e traição, ela era a chave para algo muito maior.

— Isso muda tudo... — Theo murmurou, mais para si mesmo do que para Sara. Ele então se virou para ela. — Vamos fazer o seguinte, Sara. Eu vou garantir sua segurança e vou cuidar de você. Não vou te enviar para o bordel, e você vai trabalhar aqui na mansão. Você tem muito potencial, e acredito que, com o tempo, vai poder assumir o controle de tudo o que é seu.

Sara olhou para ele, desconcertada e ainda em choque. Não sabia o que esperar dessa proposta, mas o olhar de Theo, sério e determinado, fez com que ela sentisse um mínimo de esperança, algo que não sentia há dias. Ela sabia que sua vida nunca mais seria a mesma, mas talvez, só talvez, ela pudesse encontrar alguma forma de paz ali.

Theo se levantou da cadeira e começou a andar pelo escritório, suas mãos entrelaçadas atrás das costas. Ele estava calculando suas palavras com precisão, sabendo que estava prestes a fazer uma proposta que mudaria completamente o curso da vida de ambos. Quando se virou novamente para encarar Sara, seu olhar era firme, mas ao mesmo tempo, havia uma suavidade inesperada.

— Eu tenho uma proposta para você, Sara. — Sua voz era calma, mas havia uma firmeza inegável nela. — Eu posso te proteger. Posso garantir que você tenha tudo o que é seu por direito e que sua vida se estabilize. No entanto, para isso, você precisará se casar comigo.

Sara, que estava até então tentando processar todas as informações, ficou paralisada por um instante. Casar-se com ele? Isso parecia um absurdo, uma ideia tão distante de tudo o que ela havia imaginado para sua vida. Mas o olhar de Theo não mostrava nenhuma malícia, nenhum interesse pessoal além do que ele acabara de sugerir. Ele parecia estar oferecendo uma saída, não uma armadilha.

— Casar... com você? — A palavra escapou da boca de Sara quase como um sussurro, cheia de incredulidade. Ela não conseguia imaginar uma razão para isso, mas algo na postura dele a fez ouvir com mais atenção.

Theo percebeu o choque dela e, antes que ela pudesse argumentar, continuou.

— Eu sei que soa absurdo. Mas ouça-me. Não seria um casamento de verdade, Sara. Seria apenas no papel. Você não teria que fazer nada que não queira. Eu... — Ele hesitou um momento, antes de acrescentar, — Eu entendo que você está em uma posição difícil. E, se aceitar, a única coisa que ganhamos é uma formalidade legal, um vínculo que me permite protegê-la legalmente e garantir que você possa reivindicar tudo o que é seu. Eu cuidaria da parte empresarial, e você ficaria com o que tem direito. Nenhum envolvimento emocional, nenhum tipo de obrigação pessoal entre nós. Viveríamos juntos, sim, mas cada um com sua vida.

Sara o olhou com uma mistura de dúvida e desconfiança. O que ele estava oferecendo parecia seguro, mas também parecia uma prisão disfarçada de oportunidade. Ela estava acostumada a ser tratada como objeto, como mercadoria. O que a garantia de Theo não seria também mais uma manipulação? Mas ele continuou, parecendo saber exatamente o que ela estava pensando.

— Eu não sou um monstro, Sara. Eu sei que você passou por algo horrível. Você não vai ser obrigada a nada. O que eu estou oferecendo é uma chance de viver a sua vida sem mais traumas. E, com esse casamento, você poderá tomar o controle do que é seu, sem mais interferências.

O silêncio caiu entre eles. Sara olhou para baixo, pensando nas palavras de Theo. Ela estava em um ponto em que não tinha mais nada a perder. Tudo o que ela conhecia tinha se despedaçado nos últimos dias. Suas opções eram limitadas, e a proposta, embora incomum, era a única que parecia oferecer alguma saída.

Ela levantou os olhos e olhou diretamente para Theo, com uma determinação recém-descoberta.

— Aceito. — A palavra saiu de sua boca como um suspiro de rendição, mas também de resolução. Ela sabia que era uma jogada arriscada, mas sentia que, com isso, teria uma chance. — Não tenho mais nada a perder.

Theo assentiu com um sorriso quase imperceptível nos lábios. Ele sabia que essa era a única maneira de garantir que Sara fosse protegida e que, ao mesmo tempo, ele pudesse aproveitar as vantagens de ser o "marido" dela no papel. Não seria um casamento convencional, mas era o que eles precisavam.

— Então, estamos combinados. — Ele disse, com um tom de conclusão. — Vamos fazer isso de maneira rápida e sem complicação. Depois de assinado, você será legalmente a herdeira do Grupo Álvares. E terá todo o controle que merece.

Sara não podia deixar de se sentir desconfortável com a situação. Mas, por um momento, ela sentiu uma leveza, uma possibilidade de retomar o que era seu. No fundo, sabia que esse acordo mudaria a vida de ambos de formas que nem ela nem Theo podiam prever. Mas, ao menos, ela teria uma chance de seguir em frente, mesmo que fosse ao lado de alguém que era, para ela, um completo estranho.

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