Capítulo 8

— Se não são Onnir, são humanas e, portanto, comida. — A velha respondeu Nina e gargalhou.

— Eu não quero ficar aqui — disse uma moça de colar prateado, agitada. — Quero voltar para minha casa. Não quero ser estuprada, nem devorada, e muito menos incubadora de monstros.

— Acalme-se, Eleonor — pediu Elis e segurou o braço da moça aterrorizada.

— Eu não quero morrer! — Pranteou.

— Temos de fugir — disse Lana como se tivesse um plano.

— Impossível — a velha disse. — Ninguém sai ou entra nesse lugar sem a permissão dos Makrar.

— É uma loba também, Velha? — Sasha indagou.

— Não, sou uma Xamã Velha, meu povo tem um contrato com os Makrar e vivo aqui para cumprir a parte no trato. Estou aqui para ajudá-los a encontrar suas Onnir e cuidar de suas humanas, ensiná-las para ficarem prontas.

— É tão mulher quanto nós, por que não nos ajuda? — protestou Eleonor. — É bem possível que se quisesse nos tiraria daqui.

— É, é possível, sim. Mas, tenho um trato com eles e não com vocês. — Deu as costas para elas. — Vou à cozinha. Cama verde para Sasha, roxa para Nina e azul para Lana. Todas as outras podem escolher o lugar que quiserem entre as camas brancas.

Todas as moças se afastaram cochichando. Cibele se endireitou como se não quisesse encostar nas meninas, ao que Lana e Nina se aproximaram ainda mais de sua cama, e ficaram em pé, cada qual de um lado. As chances de morrer eram bem maiores do que ter alguma sorte, se é que pudesse chamar aquilo de sorte, de ser capaz de gerar um monstrinho para os lobos. A fuga era a única esperança.

— Precisamos fugir — Sasha arriscou e as três a encararam. — Nós morreremos se ficarmos aqui.

— Meu pai nos encontrará — afirmou Nina. — Tenho certeza. — A voz embargou e as lágrimas rolaram por seu rosto outra vez.

— É isso o que os lobos fazem — disse Lana — nos enlouquece com seus uivos e seus fantasmas. Não somos nada para esses monstros. Eles mentem, nos enganam, depois nos drogam e nos trazem para essa merda de lugar para brincar conosco como fazem os gatos com os ratos, até nos matar de exaustão.

— Por que escolheram dez mulheres? — perguntou Sasha. — Algum ritual macabro? Algum fundamento ideológico? O que sabe sobre eles, Lana?

— Nos farejam a quilômetros de distância. São capazes de ouvir mesmo quando só sussurramos, não importa se estão próximos ou longe. Já tentei me cobrir com terra e lixo para não me encontrarem, mas me acharam mesmo assim e riram de mim. Vovó dizia que alguns deles tinham poderes paranormais.

— Paranormais como?

— Eu não sei... não sei... Os fantasmas na minha casa era obra deles.

— Alucinação — murmurou Sasha.

— Não, não era coisa da minha cabeça — Lana se defendeu. — Os fantasmas eram reais. Mulheres que gritavam no sótão, no porão, no quintal, em toda parte.

— Se são capazes de sentir nossos cheiros e nos ouvir, devem saber que estamos falando sobre fugir — disse Nina.

— Não temos nada além de uma à outra, e não podemos encará-los sozinhas — declarou Sasha.

— Quer encará-los? — Havia ódio no tom de Cibele. — Vá encará-los.

— Precisamos bolar um plano para sair daqui — insistiu Sasha. Se havia uma entre elas que parecia ter força de espírito e inteligência, essa sem dúvida era Cibele e não podia desistir.

— Não há como sair daqui — Cibele afirmou. — Estamos num labirinto dentro do desfiladeiro. As saídas dão para o precipício.

— Entramos aqui, não entramos? — Sasha insistiu. — Então deve haver um modo de sair. Fraquejar e se render é um caminho de morte. O que temos a perder?

— Eu estou com medo — Cibele sacudiu a cabeça e suspirou. — Não quero bancar a heroína. Não há como fugir. Eles são monstros, somos só um saco de carne mole, não há nada que possamos fazer contra eles.

— Você lutou e fugiu. E está aqui—

— Eles vão me castigar para me usar de exemplo, moça.

Esticou a mão para tocá-la e confortá-la, mas Cibele afastou-se como um animal assustado.

— Sasha. Eu me chamo Sasha.

Cibele encarou seu colar.

— Sabe por que te deram a pedra jade?

— Não, não sei. Você sabe?

Cibele negou com a cabeça.

— Eu não vejo força nelas, Cibele — Sasha moveu a cabeça ao se referir às meninas que se espalhavam nos quartos brancos. — Não vejo a mesma coragem que vi em seus olhos quando enfrentou Adruna e depois fugiu por aquela porta.

— Sim, aquilo foi demais! — Lana bateu palmas, animada. — Eu topo qualquer coisa, não tenho nada a perder mesmo. Vou me vingar desses filhos da puta!

Sasha se debruçou na cama, ao lado de Cibele e segurou sua mão.

— Eu não te abandonarei se você não me abandonar. E não vou permitir que te levem para castigar.

Cibele a encarou.

— Não sabe o que diz.

— Serei castigada com você se não puder impedi-los, Cibele — Sasha afirmou, decidida.

— Então será castigada. Não podemos fazer nada contra eles.

— Se for com você, me ajudará a encontrar um modo de fugirmos daqui? — Não, Sasha não desejava abandonar Cibele, sabia que era a mais forte, tinha certeza de que seria capaz de lutar.

— Eu faria qualquer coisa que Pierre me pedisse — Cibele falou, tímida — só para não ser estraçalhada por aquelas garras horrendas e nem devorada. Eu não sou corajosa, Sasha, chorei e implorei por minha vida como uma covarde imbecil. Senti tanto medo de morrer que estava disposta a fazer qualquer coisa, eu trocaria a vida de qualquer uma de vocês pela minha. Não havia nada de nobre em mim. Nenhuma honra.

— Eles te estupraram?

Cibele calou-se e encarou o vazio como se estivesse perdida em suas memórias e após um curto silêncio, disse.

— Não. E... eu... eu o desejei. — Sacudiu a cabeça. Confusa? Envergonhada? — Estava apavorada e só conseguia me sentir segura com ele. — Riu feito maluca. — Segura com o monstro. Protegida por aquele que vai me devorar, me matar, me destruir. — Calou-se. — Me deixe em paz.

— Está traumatizada — suspirou Lana. — É assim mesmo no começo, ficamos apavoradas, nos sentimos pequenas, vulneráveis. Mas, depois a gente se acostuma. Como minha mãe sempre me dizia... “Lana, não há nada nesse mundo com o que não podemos nos acostumar”.

— Arthur perguntou de mim? — Nina agarrou a mão de Cibele. — Ele disse alguma coisa sobre mim?

— Não. Não nos falamos. — Cibele suspirou, enfadada. — Nina, eu sei que gosta dele, e sou sua amiga há tempo suficiente para saber o quanto é difícil para você lidar com fins de relacionamentos. Mas, precisa enfiar em sua cabeça que Arthur não é humano. Ele não é um cara normal, entende? Não é alguém que você convida para viajar com você para as Bahamas, nem para passar uma tarde num bistrô francês.

— Eu sei, Belinha. Mas, as coisas não funcionam assim. Não vou me desapaixonar dele só porque eu quero.

— Você precisa, Nina. — Cibele segurou os ombros dela e a sacudiu. — Você tem de esquecer o romance. Você é literalmente uma presa para Arthur.

— Posso ser uma Onnir — Nina se levantou, agitada e chorosa. — Posso ser uma Onnir e dar um filho para ele.

Cibele não soube o que responder e as três silenciaram enquanto Nina chorava e caminhava de um lado para o outro, para um minuto após correr e se atirar sobre a cama de colcha roxa, seu quarto.

— É assim mesmo — disse Lana, indiferente. — Os lobos seduzem. É quase impossível não se apaixonar por eles se desejam atrair uma humana.

— Como sabe tanto sobre eles? — perguntou Cibele.

— Minha vó dizia que era filha de um deles. — Lana se levantou e deu um pulinho. — É assim que é. Maldição de família. Vamos, não me olhem desse jeito. Ao contrário das pessoas lá fora, vocês não podem dizer que sou doida. Eles existem mesmo. Viram com os próprios olhos que eles existem e querem comer vocês em todos os sentidos. — Riu e as deixou.

— Eu preciso dormir — Cibele anunciou e se deitou.

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Comments

Deyse Pires

Deyse Pires

Estou gostando muito, finalmente uma história profunda, por favor, não pare. ❤️

2024-03-30

4

Regiane Pimenta

Regiane Pimenta

CREDO QUE HORROR TO TRAUMATIZADA LOBOS QUE COME GENTE

2024-04-10

0

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