Capítulo 5

Choro e lamento reverberavam nas paredes rochosas da câmara, confusa e sonolenta, estirada sobre uma esteira, Cibele ergueu a cabeça. Nunca esteve em nenhum lugar como aquele antes, vários túneis de tamanhos irregulares se estendiam para todas as direções, como se o salão oval fosse o centro de um labirinto. Uma mesa comprida, esculpida no calcário da caverna, mantinha de ambos os lados bancos também modelados desde a rocha.

Indiferente à histeria das mulheres, uma velha cozinhava numa enorme panela de barro, num buraco no chão onde estava o carvão em brasa. Rodeada por cestos cheios de legumes e hortaliças, picava o alimento dentro de outra panela de barro. O cabelo grisalho caía numa trança grossa sobre as costas e um xale marrom cobria os ombros encurvados.

Cibele se levantou e apalpou a coleira que apertava o pescoço e ameaçou cair quando Nina se lançou em seus braços. O cabelo dourado grudava no rosto umedecido pelas lágrimas enquanto se lamentava. Acariciou a amiga, quentinha e trêmula, Nina balbuciava, o cheiro dela desatou o choro que Cibele se esforçava em conter. Como era bom tocar e abraçar alguém, sentir o aroma e calor de outra pessoa! Apertou Nina ainda mais forte contra si, deleitando-se nas sensações. Carente e vulnerável, Cibele parecia precisar mais de um abraço do que de comida.

Nina também mantinha uma coleira no pescoço, uma joia linda. Ametistas translúcidas, brilhantes e oblongas se uniam numa trama finíssima e delicada de prata de onde um pequeno relicário ovalado de mesmo metal pendia no centro do colo. A julgar pelas formas do próprio colar que tornou a acariciar, convenceu-se de que o dela era semelhante.

— Nós ficaremos bem, Nina — disse ao tentar acalmar a amiga.

Curiosa, enquanto acariciava o cabelo de Nina que enterrara o rosto no peito de Cibele, observou as outras mulheres e todas mantinham uma coleira similar. Apenas duas mulheres tinham pedras preciosas em seus colares. De uma era de safira e da outra, jade. As outras mantinham coleiras com placas retangulares de prata, sem qualquer relicário ou pedraria.

— Há pedras no meu colar? — perguntou ao forçar Nina a erguer a cabeça.

— Quê? — a amiga replicou, confusa.

— O colar! — Cibele apontou para a coleira, impaciente. — Que pedra há no meu colar?

— Rubi — respondeu à velha sem encará-la. — Rubi e ouro.

— O que isso significa? — perguntou ao se voltar para a velha.

— Significa que o Alfa as categorizou como pessoas importantes para o clã. — A velha a encarou, os olhos amendoados eram vibrantes e negros, e Cibele tonteou, como se uma força invisível a tivesse atravessado.

— Alfa? Você está dizendo que isso é um covil de lobos? — Cibele esforçava-se em se controlar, mas estava quase gritando.

— Lobos? — a voz de Nina soou fraca, falava consigo mesma.

— Oh não, não! — Era Lana, Cibele a reconheceu pela voz. — Pierre prometeu! Pierre disse que afastaria os lobisomens!

Assim como todas as outras, Lana vestia uma camisola estilo vitoriana, descalça, caminhou de um lado para o outro, esticando uma mecha do cabelo longo e perolado entre as mãos. Seu colar tinha safiras. Observou a outra moça com o colar de jade. O cabelo castanho ganhava calor e nuances avermelhadas sob a luminosidade das tochas espalhadas pelo recinto e os olhos grandes e perspicazes tinham o mesmo tom terroso.

Cibele tentava, através da fisionomia, detectar o que as quatro tinham em comum, e embora Nina e Lana tivessem uma beleza angelical, não se assemelhava com nenhuma delas. O cabelo de Cibele era tão negro quanto uma obsidiana, o que intensificava a lividez de sua pele, os olhos avelãs nada tinham de surpreendentes, era a mais alta das quatro, ainda que nenhuma delas pudesse se vangloriar da altura. Ajoelhou-se ao lado da velha e tocou o ombro com delicadeza.

— Eu sou—

— Eu sei quem você é — disse a velha, rabugenta. — Conheço cada uma de vocês.

— Por que estamos aqui? — Cibele insistiu.

— Vocês são mulheres capazes de ganhar as marcas da Supremacia Lupina.

— O que quer dizer por marcas?

— Acasalamento — respondeu Adruna ao irromper no ambiente.

Cibele se levantou, enérgica. Sabia que aquela vadia estava envolvida! Nina repetiu o nome de Adruna ao correr em seu encontro, aliviada, o que fez Cibele parar e observar. Adruna mantinha um chicote na mão e ameaçou acertar antes que a pobrezinha pudesse abraçá-la.

— Adruna? — suspirou Nina, incrédula, dando outro salto para trás a fim de evitar ser chicoteada.

A mulher caminhou em direção à Cibele e enfiou o dedo por debaixo da coleira. Havia ódio em seu olhar, e mordeu o lábio inferior ao erguer o chicote e acertar o braço de Cibele. Por que a bateu? Indignada, avançou sobre Adruna e a esbofeteou. A velha gargalhou. E Cibele se encolheu quando golpe após golpe Adruna a chicoteou. Dona de uma fúria selvagem, Adruna arremessou-se contra Cibele e bateu as costas com tanta violência contra a parede que pensou ter quebrado alguns ossos.

Adruna apertou o pescoço dela e a ergueu do chão. Cibele enfiava os dedos entre a mão firme que a sufocava enquanto tossia, perplexa com a força da ruiva. Adruna a girou ainda a segurando pelo pescoço e a arremessou contra uma coluna. Cibele caiu de bruços no chão. Gemeu e se lamentou por não se alimentar por tanto tempo. O corpo sacolejava, fraco e dolorido. Não viu onde Adruna pegou a vara de bambu. Bateria nela com aquilo, e debilitada como se encontrava, não suportaria a surra.

— Eu sou sua superiora, sua vagabunda — bradou Adruna ao caminhar em sua direção. — E não tolerarei esse tipo de comportamento. Ajoelhe-se e beije meus pés. Porque é isso o que você é, uma escrava.

A velha se sacudia em risos, ora as observava, ora dava atenção aos legumes. Aterrorizadas, as mulheres se empoleiraram umas sobre as outras. Nina choramingava abraçada a mulher do colar de jade. E Cibele soube que estava sozinha. Ninguém a defenderia.

— O vermelho do rubi incitou sua fúria, Adruna? — a velha debochou.

— Cale a boca, velha maldita! — rosnou Adruna. — Sabe que isso não é permanente, esses colares podem não significar nada em poucos dias. E eu sou uma Makrar autêntica, rara e preciosa, não preciso de malditas joias para provar meu valor.

Não queria nem acreditar no que ouvia e tampouco ser surrada por Adruna. A ruiva ainda cuspia seus títulos que nada diziam à Cibele quando notou a pilha de bambus de onde a mulher provavelmente retirou a que segurava, contudo, Adruna se mantinha no caminho até as varas, enquanto um túnel estava a alguns passos à direita de Cibele e fugir parecia mais sensato do que lutar contra a moça. Aproveitou-se do nervosismo e discussão das duas mulheres e se lançou pelo corredor.

O túnel era baixo e apertado, sem iluminação, Cibele confiou no tato para guiá-la adiante, temerosa de pisar em animais peçonhentos como escorpiões, serpentes e aranhas, úmido e escuro, o lugar se apresentava um ótimo habitat para os bichos mais medonhos. E o coração gelou e Cibele parou de se mover ao ouvir a respiração profunda que se misturava ao som semelhante a um rosnado baixo. Lobos. Lobisomens. Licantropos. Não, aquilo só poderia ser loucura, queria deixá-las loucas, lobisomens não existiam.

Contudo, algo adiante na escuridão arfava, ressonava, como um cachorro raivoso e desconfiado, arrastava-se, produzindo um ruído tal qual um animal imenso a se mover de um lado para o outro. Esperava no final do corredor, e Cibele estava com medo. Lobisomem ou não, o lugar se assemelhava a uma cidade submersa como aquelas na Capadócia da Turquia, e não fazia a menor ideia de onde estava e tampouco para onde iria, e nem os possíveis animais que poderia viver em lugares cavernosos como aquele. Urso talvez? Pois era grande e pesado, e rosnava, ainda que baixo.

Outro som aterrador, logo atrás, e feito um animal faminto e feroz vinha ao seu encontro. Não tinha qualquer opção, ou seria devorada pelo monstro que a perseguia, ou pelo que a esperava no final do corredor. E a proximidade do que quer que fosse que estivesse atrás dela a desesperou o suficiente para forçá-la a se mover adiante. Correu, sem olhar para trás, assustada demais para fingir uma força de espírito a qual faltava. Permitiu que as lágrimas do desespero escorressem frias pelo rosto ruborizado pelo esforço.

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Comments

Fatima Silva

Fatima Silva

nossa que horror 😲

2024-05-04

0

Regiane Pimenta

Regiane Pimenta

credo que horror sequestrou ela para estrupar

2024-04-10

3

Deyse Pires

Deyse Pires

pensei que era um vampiros e só depois os lobisomens apareceriam.

2024-03-30

2

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