Capítulo 6

Ao sair do túnel, algo colossal acertou o braço direito de Cibele e se arrastou pela câmara a alguns metros. Imenso e bípede, a pelagem branca escorria desde a cabeça bestial até metade das costas recurvas que se mesclava na forma de homem e lobo, a calda era curta e tão branca quanto a pelagem abundante da cabeça enorme. Cibele gritou em puro horror. Temia o momento em que aquela coisa se voltasse para ela e a devorasse.

Arrastando as nádegas no chão, afastou-se com dificuldade, pois desesperada, enroscava-se na saia comprida da camisola. E a rasgou, ao se agitar e acelerar os movimentos para afastar-se mais rápido, assim que outro lobisomem de pelagem marrom saltou do túnel de onde viera e avançou sobre ela.

O lobo branco saltou na frente de Cibele e rugiu para a besta invasora. O lobisomem marrom parou por um momento e ameaçou investir contra Cibele outra vez. Todos os pelos do corpo eriçaram quando o lobo branco rugiu novamente, ainda mais alto e reverberante, e rosnou, mostrando os dentes compridos e afiados umedecidos pela saliva gosmenta.

O marrom insistiu e rosnou com a mesma selvageria que seu oponente monstruoso. Cibele observou os vários túneis que se estendiam em muitas direções, embora parecesse que o lobo branco estava a protegendo do marrom, pequena e vulnerável em comparação as bestas que competiam com rosnados e uivos, terminou de rasgar a saia, transformando a camisola longa num vestido curto e arremessou-se corredor adentro.

Tremia, chorava, voltava-se para trás de tempos em tempos para conferir se não estavam em seu encalço. O túnel mais largo e alto do que o primeiro dava uma liberdade maior para a corrida. E quando alcançou o fim, parou, abrupta, e se equilibrou para não despencar milhares de metros no penhasco. A lua estava alta e clara e iluminava o desfiladeiro. A cidade não era submersa, estava encravada nas montanhas e Cibele não tinha para onde ir.

A vertigem a tomou ao olhar para baixo. Chutou uma pedrinha e esperou. O som da pedra batendo contra o chão não veio. Alto, impossível de escalar. Tinha duas opções, esperar pelos lobisomens para devorarem-na ou se suicidar. As portas marchetadas na parede colossal e rochosa adiante cintilavam com a luminosidade rubra desde o interior, separada do lado onde estava por um estreito caminho que de tão profundo era impossível enxergar, como um formigueiro de tamanho colossal e buraquinhos brilhantes.

Cibele sequer notou de onde saltou, quando deu por si, estava nos braços do lobo branco, as garras arranhavam a carne, ainda que o cuidado com o qual a mantinha presa em seus braços fosse evidente. O hálito quente lufava contra o rosto dela, os olhos eram tão dourados quanto ouro líquido e o focinho branco tinha um tom rosado. Não se moveu, petrificada e anestesiada pelo medo, não notou o caminho ao longo do túnel quando a levou de volta para dentro da cidade submersa.

Seguiu por incontáveis túneis, um labirinto esculpido nas próprias rochas do desfiladeiro. Ainda estava em seu país? Onde estava? Como fugir? Ou devia considerar implorar por sua vida? Pedir para que não a devorasse? E do exato modo em que a colocou sobre uma mesa esculpida no calcário ficou, estarrecida.

Outros quatro híbridos devoravam o que parecia ser um cadáver humano no canto do recinto, rosnavam uns para os outros como se competissem pelos melhores pedaços de carne. Seis homens nus a encaravam, reconheceu dois de imediato, Arthur e Yan. O lobo marrom avançou por uma das várias portas. O lobo branco rosnou e o marrom encolheu, expôs o pescoço peludo e afastou-se alguns passos.

Imenso e robusto como um urso em forma de lobo, deslizou a garra cortante sobre a camisola e a arrancou do corpo de Cibele como se tivesse rasgado um trapo podre. Os lábios rosados da fera cortinavam os dentes afiados e tremiam com as lufadas quentes de sua respiração. A garra escorregou, ameaçadora, entre os seios firmes. Um dos homens nus se aproximou e o lobisomem branco rosnou, furioso. Entendendo o comando, o outro parou a meio caminho. A criatura tornou a focá-la. Cibele não conseguia se mover, chorava e murmurava.

— Por favor, não me machuque... não me machuque... — repetia, insistente.

A devoraria? Sequer se importava com a nudez, Cibele tremia, aterrorizada.

A besta afastou alguns passos e o som de ossos se quebrando a atormentou. O lobisomem encolhia a sua frente e Cibele berrou, de horror, de incredulidade, de desespero, quando tomou a forma de homem.

Pierre, tão lindo quanto da primeira vez que o viu, ainda que estivesse nu, de pênis ereto, um monstro segundos antes, parecia inofensivo, um homem de pouco mais de trinta anos, atraente, sem qualquer indício de monstruosidade, como uma pessoa qualquer. Confusa, Cibele não conseguia confiar nos próprios sentidos, a besta não era tão medonha em forma humana, na verdade, era sedutor como o diabo.

Não se opôs quando Pierre acariciou seu rosto e notou por primeira vez uma mecha branca próxima à nuca na cabeleira castanho-escuro. Lambeu o rastro úmido deixado pelas lágrimas de Cibele e resvalou o polegar nos lábios ressecados antes de lambê-los também. O som de ossos se quebrando produziu comichão em Cibele, o lobo marrom deixava sua forma bestial e Adruna avançou, nua, e impetuosa, acertou um tapa na bochecha de Cibele.

— Vadia!

— Já disse que esse não é o momento, Adruna — Pierre a focou. — Se retire.

Catatônica, Cibele não reagiu nem ao tapa da loba idiota e tampouco ao abraço terno no qual Pierre a envolveu. Resvalou o nariz no pescoço dela e inspirou profundamente, deleitando-se no cheiro do cabelo de Cibele, e recostou os lábios na orelha ao sussurrar.

— Não precisa ter medo de mim.

As pupilas cresciam e diminuíam expandindo e contraindo o dourado, os lábios eram quentes como brasas ao encostarem na boca de Cibele. Focou-se na respiração, sentia falta de ar. Os pulmões não respondiam. Os lábios de Cibele tremeram com o sopro enervado que liberou e, sem que se desse conta, as pontas dos dedos deslizaram hesitantes sobre o rosto de Pierre. Era real? Aquele homem... aquele monstro... existia mesmo?

— Mas, não pode fugir — Pierre sussurrou e continuou a farejar como um animal. — Não pode me desobedecer. Eu não queria. — Lambeu os lábios dela. — Não queria, mas terei que te castigar, para servir como exemplo para as outras. Entendeu?

— Vai me machucar? — perguntou, trêmula.

— Nunca — havia urgência em seu tom. — Nunca — murmurou e beijou os lábios dela. Carinhoso, colocou uma mecha do cabelo de Cibele atrás da orelha, acariciando a têmpora enquanto derramava o dourado sobre a face dela como um devoto a encarar uma divindade. — Porém, preciso que seja forte, pois pode ser doloroso, muito doloroso.

— Não me machuque — implorou, chorosa. — Eu não fugirei mais. Prometo que não tentarei fugir mais.

— Não chore... não chore. — Pierre beijou a testa dela e fez sinal com a cabeça para os outros.

Cibele agarrou-se no pescoço de Pierre assim que Yan e outro homem a segurou pelos braços. Chorava, pedia, implorava para que não permitisse que a levassem, entretanto, Pierre não moveu sequer um dedo para auxiliá-la. Gritava o nome dele com tanto ímpeto que a garganta ardia a medida em que era arrastada pela ampla câmara, os calcanhares queimavam ao tentar prender-se contra o chão, até que cansado da luta débil de Cibele, Yan a pegou no colo e jogou sobre o ombro como se fosse um saco de cimento.

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Comments

Nanci APARECIDA RODRIGUES

Nanci APARECIDA RODRIGUES

acho que vou parar de ler, essa história não é pra mim, no começo tava legal o mistério, mas as pessoas são sequestradas, drogadas, ninguém da nenhuma informação e não podem reagir senão são punidas e tem que conformar com tudo aff

2024-10-16

0

Regiane Pimenta

Regiane Pimenta

QUE ODIO PQ NÃO DEIXOU ELA SE MATAR ENTÃO ela só fugiu pq foi maltratada e agredida

2024-04-10

4

Regiane Pimenta

Regiane Pimenta

AI MEU DEUS QUE HORROR

2024-04-10

0

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