MARIANA
As portas do elevador se abriram na cozinha e Marta viu a garota chorando.
- Minha filha, o que aconteceu? – perguntou, preocupada.
- Nada, Martinha. – ela falou entre soluços e tentou sorrir, embora se sentisse sem ar com aquele nó imenso na garganta – Eu... eu acho que não vai dar mais certo continuar aqui.
- Por quê, minha filha? O que ele disse? – a governanta colocou a mão na cintura, esperando ouvir mais uma besteira que o patrão falara.
Mas dessa vez ele tinha ultrapassados os limites completamente.
- Não, ele não disse nada. – ela sorriu, triste – Eu só acho que deveria ir embora. – mentiu.
Mariana sabia que estava parecendo louca, afinal acabara de vir do jardim toda sorridente e feliz depois de conversar com Luís, mas não queria repetir as coisas que Eduardo dissera, afinal Luís era filho de Marta.
Por que ele implicara com Luís?
Será que não era nítido que ela e o outro rapaz eram bons amigos?
Eles conversavam sobre as plantas, Luís entendia muito do assunto e Mariana sempre gostou de cuidar das mudinhas na casa da irmã.
- Você não vai embora. – Marta fez a moça sentar-se – Eu não vou deixar que você fique na rua, minha menina.
Mariana contara tudo a Marta, sobre a irmã e como fora acusada injustamente. A mulher sabia que ela não teria para onde ir caso saísse daquele emprego. A rua seria, literalmente, seu destino.
- Eu vou falar com ele. – a mulher mais velha foi em direção ao elevador, determinada.
- Não, Martinha, por favor! – ela implorou, segurando a mão da amiga – Não vá.
- Tudo bem, minha filha. Acalme-se. – ela foi até a geladeira e serviu um copo de água para a jovem – Beba e acalme-se.
Mariana obedeceu, pensando o que faria depois de ir embora dali.
Porque ela ia embora, não continuaria num emprego onde o patrão tinha uma imagem terrível dela.
Eduardo pensava que ela era uma qualquer que traía a própria família...
Uma mulher sem escrúpulos.
Mariana pensou que Eduardo era um homem bom, mas seu mau humor se devia à condição em que estava, preso à cadeira de rodas. Mas agora não tinha mais tanta certeza disso.
Porém, pelo visto, todos os homens que conhecia eram iguais: cafajestes.
- Vamos. – a governanta disse, levando a moça para o pequeno quarto que ocupava com o marido, nos fundos da casa – Deite-se, descanse e então pensaremos no que fazer.
- Por favor, não fale... – pediu mais uma vez.
- Não se preocupe. – a mulher deu um beijo no topo da cabeça da moça – Não falarei.
Mariana deitou-se, encolhida, em posição fetal. Deixou que as lágrimas saíssem livremente, magoada com o mundo à sua volta.
Não compreendia porquê tinha que sofrer tanto, sempre sendo caluniada.
Pensou que teria sido melhor se tivesse morrido ao invés dos pais. Ela não tinha ninguém, ninguém a amava ou respeitava. O que poderia justificar sua existência?
Foi até o pequeno banheiro que havia ali. Olhou o rosto abatido no espelho, não reconhecia mais quem era, parecia um rascunho do que fora um dia.
Suspirou. Olhou a bancada e viu uma pequena gilete. Teve uma ideia.
Acabaria com sua dor, por ser auxiliar de enfermagem sabia exatamente como fazer.
Um corte e tudo acabaria em poucos minutos.
Olhou mais uma vez para seu reflexo e suspirou, resignada.
Não estava chorando mais, porque tinha certeza que aquela era sua única saída. Deixaria aquele mundo sem remorso, sem ser mais peso para ninguém.
Pegou o objeto e, então, fez.
O sangue saía em jatos, sujando todo o chão.
Pensou em Marta e sentiu por ela, aquilo daria um trabalho enorme para limpar.
Ficou tonta, sentou-se no chão e o frio começou a tomar conta de seu corpo.
Mariana? – ouviu a voz de Marta longe, como se a amiga falasse dentro de um funil – Meu Deus, minha filha! O que você fez, minha menina?
O rosto da mulher estava pálido, aflito, ela viu que a senhora chamava alguém, mas não sabia quem.
Não importava mais.
Ela foi envolvida na frieza da escuridão e suspirou, aquietando-se logo em seguida.
#
EDUARDO
Destruiu a sala em poucos minutos.
Descarregou toda a raiva que sentia nos objetos que via pela frente.
Não aceitava que mais uma vez caíra na armadilha de se apaixonar.
Lembrou de Rafaella, do filho não-nascido e sentiu mais raiva.
Não sabia se apaixonar, sempre arruinava a vida dele e a vida da pessoa objeto do seu amor.
Foi até um pequeno armário na sala e tirou de lá uma garrafa de vodka. Não bebia há meses, aliás o médico proibira, uma vez que tomava remédios e não poderia juntar álcool e analgésicos.
Tirou a tampa da garrafa e sorveu o líquido transparente como se fosse água. A bebida desceu queimando a garganta. Ele não se importou.
Ouviu o barulho do elevador e, seu coração traiçoeiro, palpitou ao pensar que Mariana apareceria em instantes, mas Eduardo não se virou.
Não tinha coragem de encará-la sem suplicar seu perdão.
Ele era patético, pensou.
Mas não, ele não pediria desculpas...
Não deixaria mais nenhuma mulher lhe dominar.
- Eduardo, o que é isso? – o homem mais velho olhava a cena de caos e destruição ao seu redor – Meu filho, o que você fez?
- Saia. – falou, cansado, dando mais um gole na garrafa.
E decepcionado, porque queria que fosse Mariana.
Ele queria que ela voltasse e dissesse que não tinha nada com o filho de Marta.
De novo.
Bebeu mais.
- Eduardo, você não pode beber! – o pai falou – Você está tomando remédios fortes.
Ignorou o pai e bebeu mais.
- Meu Deus, você realmente está louco. – o pai disse – O que você fez com a empregada? Eu ouvi Marta e a mocinha conversando na cozinha. O que você fez com essa moça, meu filho? Ela disse que quer ir embora.
O coração de Eduardo se apertou.
Mariana decidira.
Ela ia embora.
De verdade.
Ele nunca mais a veria.
Com raiva, pegou a garrafa e a arremessou na parede, ignorando o grito do pai.
- Não fiz nada. – gritou, o remorso aumentando ao lembrar do que disse.
Lembrou das lágrimas dela e quis voltar ao tempo e calar a boca, não deveria ter falado nada.
- Essa moça está aqui há dois meses, suportando seus acessos de fúria, ouvindo gritos, cuidando de você... – o pai falou – No dia que você tentou se matar o médico disse que o que te salvou foi o torniquete que ela fez. Se ela não tivesse agido rápido...
- Então, ela deveria ter me deixado morrer! – esbravejou – Ela não está aguentando tudo isso por mim, mas por causa de Luís. – o pai pareceu confuso - Sim, ela tem um caso com o filho da Marta! – gritou, revoltado.
O pai parou o que ia falar e observou o filho com atenção.
Ele odiava quando o pai o observava assim, parecia que estava passando um raio -x na alma dele.
- E por que ela não pode? – o velho parecia confuso.
Porque ele não queria que ninguém mais tocasse nela!
Ninguém além dele!
Ele não respondeu.
- Você se apaixonou por essa moça. – o pai disse, simplesmente, enquanto estudava o rosto do filho.
- Não! – mentiu, enquanto abria o armário novamente e tirava uma garrafa de conhaque. Retirou a tampa e sorveu o líquido âmbar, sem nem sentir o gosto.
- Deus, você está com ciúmes. – o velho sorriu, o que só causou mais raiva no rapaz – É bom ver que sua humanidade não acabou com o acidente.
- Pai... – começou, mas foi ignorado.
- Isso não é ruim, meu filho. – o pai foi até ele e deu tapinhas em seu ombro, só o deixando mais envergonhado com a situação – Rafaella faleceu, você tem direito de ser feliz.
- Você não entende! – gritou – Eu morri antes do acidente! Rafaella não me amava, pai. – ele não percebeu, mas chorava – Rafaella amava meu irmão, o filho que ela esperava era dele!
Então ele despejou tudo, a briga no jardim entre ele e Edgar... a descoberta que a criança não era sua...
- Filho... – o homem disse, assustado, tentando se aproximar, mas Eduardo não queria a pena do pai.
E nem de ninguém.
- Eu não era um homem suficiente nem antes do acidente, agora sou apenas um peso morto. Um aleijado, um inválido!
O pai ouvia tudo, abismado.
Nunca tinha visto o filho tão frágil e tão sincero.
- É melhor que Mariana vá embora, se afaste de mim. Antes que eu destrua a vida dela. Eu só faço isso, destruo tudo que toco. Eu matei meu irmão, minha esposa e meu sobrinho/filho. Além disso, minha mãe me odeia. – sentiu as lágrimas escapando dos olhos – Por que eu sobrevivi, pai? Vocês estariam mais felizes com Edgar, Rafaella e o bebê deles.
O homem olhou para o filho e quis dizer algo, mas não sabia o quê. Eduardo deu as costas para o pai e foi para o quarto, queria beber em paz. Precisava afogar a mágoa e a fúria que preenchiam seu interior.
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Comments
Vera Lucia Oliveira
cadê a autora não tem mais atualização.
2023-06-05
2
Leni Rocha
aff,pelo jeito essa história não vai passar de 12 capítulos...
2023-06-04
1
Vera Lucia Oliveira
não tem mais atualização
2023-06-02
0