08

EDUARDO

Voltou de mais uma consulta com o ortopedista.

O homem insistia em fazer uma nova cirurgia, ele dizia que dessa vez tinham mais chances.

Mas Eduardo não queria

E ninguém conseguiria obrigá-lo, afinal era um homem de 35 anos e, apesar de aleijado, estava bem das faculdades mentais.

Quando o elevador se abriu no terceiro andar, foi até a cozinha em busca de Mariana.

Estava acostumado a tê-la por perto, ela não o tratava como doente, não demonstrava pena, conversavam sobre o tempo e, às vezes, sobre livros.

A jovem tinha uma vasta bagagem literária e era muito bom ouvi-la falando sobre os livros que lera. Ela se expressava tão bem e com tanta paixão pelos livros que, mesmo que ele não gostasse de romances, o rapaz adorava ouvi-la.

Ela tinha uma voz suave e um sorriso tão bonito que ele sentia que seu dia ficava mais iluminado só pela simples presença dela.

Não encontrou Mariana na cozinha, então procurou a moça em todos os lugares.

Ela não estava.

Foi até o quarto que ela ocupava e o encontrou vazio, mas no ar ainda estava seu perfume que tinha cheiro floral.

Entrou no cômodo e olhou tudo, mas não havia nada que desse pistas do paradeiro dela.

Viu um porta-retratos na cabeceira da cama e o pegou. Eram duas crianças, um menino e uma menininha.

Então ela tinha filhos?

Será que ela era casada?

Eles nunca conversaram sobre isso.

Ignorou a pontada no peito ao pensar nisso.

E o que interessava a ele?

Ele não se importava com o estado civil daquela jovem! Eles eram apenas patrão e empregada, a vida pessoal de cada um era problema individual deles.

- Menino. – ele ouviu a voz de Marta chamando.

Saiu rapidamente do quarto e foi até a governanta que parecia aflita.

- Marta, a mocinha sumiu. – Ele sabia o nome dela, mas não a chamava pelo nome e ignorou a pontada no peito ao tratá-la assim – Hoje era a folga dela?

No tempo em que estava lá, Mariana nunca tirara folgas, por isso estava achando tudo muito estranho

- Menino, aconteceu algo diferente. Estou um pouco preocupada. – suspirou – Mariana pediu para dar uma saída enquanto você estava no médico. Ela está aqui há quase dois meses, mas nunca quis folga. Então eu disse que ela poderia ir, sem problema.

- Certo... e? – perguntou, impacientemente.

- Ela saiu há horas, eu já estava ficando preocupada... então Luís a viu.

Luís era o filho de Marta e Pedro, que às vezes trabalhava na Mansão ajudando no cuidado do jardim ou em outra coisa que fosse necessária.

- Ela vinha a pé, descendo a rua... os pés descalços, a roupa rasgada e... muito machucada.

Eduardo não sabia a razão de sentir o coração apertado ao imaginar como ela estava e também não parou para refletir. Direcionou a cadeira até o elevador e apertou o botão do térreo, nem mesmo esperando Marta.

Quando as portas se abriram no andar inferior, ele saiu e encontrou Mariana sentada em uma das cadeiras da cozinha, as costas curvadas, os cabelos assanhados, os olhos vidrados no chão, enquanto Luís segurava suas mãos.

Ela tinha os cabelos desgrenhados, como se tivessem puxado as mechas, o vestido estava rasgado na barra e em uma das alças, deixando um ombro e um pouco do sutiã totalmente à mostra.

- Ela não quer chá. – Luís avisou quando o viu – Ela não fala.

Eduardo quis afastar o rapaz dali, não era necessário que ele a ajudasse.

Quem ficava oferecendo chá para uma pessoa ferida?

- Mariana. – Eduardo disse o nome dela pela primeira vez em voz alta. Ela não reagiu – Mariana. – ele sacudiu a moça pelos ombros, o que arrancou um protesto de Marta.

A jovem olhou para o homem como se tivesse tomado um dos calmantes que o médico lhe receitara, ela parecia dopada. Os olhos castanhos que sempre brilhavam, estavam opacos, sem vida.

- O que fizeram com você? – perguntou, preocupado.

- Menino... – Marta quis intervir, mas ele a calou com um gesto de mão..

- Mariana, você quer falar? – ele perguntou e ela acenou negativamente – Então, vamos. Vamos subir.

A moça levantou com certa dificuldade e então ele a puxou para seu colo, assustando-a.

- Calma. Eu vou te levar para cima. Nada mais.

Ela assentiu e então entraram no elevador. Enquanto subiam, o homem a observou. Ela tinha vários hematomas no rosto e marcas de unha pelo colo. Um dos ombros tinha um hematoma como se fosse uma mordida, os pés estavam sujos e descalços pareciam machucados também. O patrão percebeu que os olhos da moça estavam marejados, mas as lágrimas não escorriam pelo rosto dela.

Mariana mantinha os olhos no colo, o olhar perdido nas mãos.

Quando chegaram ao terceiro andar, Eduardo foi até o quarto dela e esperou que a moça entrasse.

- Tome banho e troque de roupa. Você quer ajuda da Marta?

A moça acenou negativamente.

- Certo. Tome banho, troque de roupa. – repetiu – Eu voltarei daqui a pouco.

Ele saiu e foi para a cozinha.

Abriu a geladeira e pegou suco, algumas frutas que ela já havia cortado e frios para fazer um sanduíche.

A verdade é que ele não sabia como agir.

Desde o acidente pensara que toda sua humanidade tinha sido tirada dele, mas aquela moça tinha recuperado uma parte disso...

Uma parte bem pequena, é verdade, mas ainda uma parte considerável. Ele queria cuidar dela, vê-la tão indefesa causava desconforto em seu peito.

Arrumou tudo numa bandeja e esperou.

Pegou a caixinha de primeiros socorros que estava ali no balcão e também ajeitou na bandeja.

Com dificuldade, conseguiu ir até o quarto dela. Bateu à porta.

- Pronto? – perguntou.

- Sim, pode entrar.

Ele entrou e a encontrou sentada na cama, os cabelos estavam molhados e agora ela vestia calças de moletom e uma camisa de mangas curtas branca. O rosto dela estava muito pálido contrastando com os hematomas que pareciam ficar mais escuros a cada minuto que passava.

- Senhor Eduardo, não precisava fazer isso por mim. – a voz dela estava rouca, ela pegou a bandeja que ele trazia e colocou em cima da cama – Perdão por isso, eu estou bem. Eu vou preparar seu jantar.

Ele não disse nada, apenas observou a moça.

Por experiência própria sabia que ela não estava bem.

Em silêncio, abriu a caixinha de primeiros-socorros e tirou algodão e antisséptico, empapou o tufo e o aplicou nos ferimentos que via.

No mesmo instante, Mariana começou a chorar. Ela colocou as mãos no rosto e chorou profusamente.

Ele nunca tinha sido bom com pessoas chorando, não sabia o que fazer, por isso deu tapinhas em sua perna, para confortá-la.

- Desculpe, desculpe, senhor. – Mariana repetia sem parar.

- Pare! – ele disse ríspido – Pare de se desculpar o tempo inteiro! – esbravejou e se virou para sair do quarto, mas ouviu a moça chorar novamente.

Deus, era um animal.

Como conseguia machucar mais ainda aquela pobre jovem?

Virou-se.

- Mariana, você não tem que se desculpar. – ele retirou as mãos dela que cobriam o próprio rosto – Me perdoe, por favor. Eu sou um bruto.

Ela o olhou soluçando, os olhos castanhos brilhantes e então fez a coisa mais inesperada.

Se jogou nos braços dele.

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Comments

Marcia 🌻

Marcia 🌻

Ah Mariana vai ajudar o Eduardo a ser bom de novo e ver o mundo colorido 🥰🥰 sinto cheiro de Amor no ar 😊🥰🥰

2023-12-20

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