Capítulo 19

Era mais um dia movimentado no hospital, e Lorenzo finalmente retornara ao trabalho após semanas de recuperação. Ele estava escalado para liderar uma cirurgia delicada na cabeça – a remoção de um tumor cerebral localizado próximo ao lobo temporal esquerdo. Zoe foi convocada para assisti-lo, enquanto alguns internos acompanhavam o procedimento de uma sala adjacente, ansiosos para aprender com um dos melhores cirurgiões do hospital.

Na sala cirúrgica, Lorenzo assumiu o comando, com sua habitual confiança e precisão.

— Certo, equipe, vamos revisar o plano. — Ele começou, apontando para o monitor com a ressonância magnética do paciente. — O tumor está localizado próximo ao hipocampo, o que significa que precisamos ser extremamente cuidadosos para preservar as funções de memória e linguagem.

Os internos assistiam atentos, e Lorenzo aproveitou para testar os conhecimentos deles.

— Alguém pode me dizer qual é o principal risco dessa cirurgia?

Uma interna hesitou antes de responder:

— Danos às estruturas adjacentes, como o córtex temporal?

— Correto. — Lorenzo assentiu. — O risco de déficits neurológicos é alto se não formos precisos. E qual é a nossa principal ferramenta para evitar isso, doutora Becker?

Zoe, ao lado dele, ajustando os instrumentos, respondeu com firmeza:

— A monitorização neurofisiológica intraoperatória. Ela nos ajuda a detectar alterações nas funções motoras e sensoriais em tempo real.

Lorenzo sorriu por trás da máscara, visivelmente satisfeito.

— Excelente resposta. Agora, vamos começar com a craniotomia.

Ele iniciou o procedimento com movimentos seguros, enquanto explicava cada etapa em detalhes.

— Primeiro, removemos parte do osso craniano para acessar o cérebro. Observem como expomos a dura-máter sem causar danos.

Zoe e os internos estavam atentos. Lorenzo virou-se para Zoe, desafiando-a:

— Doutora Kaylie, o que você faria agora?

Sem hesitar, a interna respondeu:

— Iria mapear o córtex motor para identificar áreas críticas antes de começar a ressecar o tumor.

— Exato. — Lorenzo disse, orgulhoso. — Vamos fazer isso agora.

Enquanto ele avançava na cirurgia, Zoe ajudava com precisão, seguindo as orientações dele. Em determinado momento, Lorenzo fez uma pausa e olhou para ela.

— Quer assumir daqui, doutora Zoe?

Ela arregalou os olhos por um instante, mas logo respirou fundo e respondeu:

— Sim.

Com calma e concentração, Zoe começou a ressecar o tumor, enquanto Lorenzo a guiava.

— Lembre-se de seguir os planos anatômicos e não forçar os tecidos. Está indo bem.

Os internos observavam, impressionados com a habilidade de Zoe e com a forma como Lorenzo a apoiava.

— Muito bem, doutora. — Lorenzo disse, quando ela terminou de remover o tumor. — Agora, feche a dura-máter com suturas delicadas.

Ao final da cirurgia, Lorenzo voltou-se para os internos na sala adjacente, falando pelo microfone:

— Isso, senhores, é uma aula prática de precisão e trabalho em equipe. Espero que tenham aproveitado.

Os internos aplaudiram discretamente antes de deixarem o espaço. Zoe e Lorenzo permaneceram sozinhos na sala cirúrgica, terminando os últimos detalhes.

— Você foi incrível, Zoe. — Lorenzo disse, com admiração genuína.

— Obrigada. — Ela respondeu, com um leve sorriso. — Mas eu só segui as suas orientações.

Lorenzo inclinou a cabeça, brincando:

— Talvez eu devesse perguntar aos internos se eles concordam.

Zoe riu, sentindo-se mais leve.

— Acho que estavam mais ocupados tentando entender metade do que você disse.

— Ou tentando entender como eu tenho tanta sorte de trabalhar com você.

Zoe o olhou, surpresa, mas antes que pudesse responder, uma enfermeira entrou para buscar os relatórios. O momento se dissipou, mas o olhar que trocaram dizia mais do que palavras poderiam expressar.

Enquanto caminhavam juntos para fora da sala, Zoe sentiu um calor inesperado no peito. Trabalhar ao lado de Lorenzo era desafiador, mas também a parte mais gratificante do dia.

...[...]...

Mais tarde, Zoe estava no refeitório, aproveitando um breve intervalo para almoçar, quando ouviu, sem querer, um murmúrio vindo da mesa ao lado. Não deu muita importância no início, até que uma frase chamou sua atenção:

— É óbvio que a Zoe só conseguiu essa chance na cirurgia porque está dormindo com o Lorenzo. — disse uma das enfermeiras, com um tom venenoso.

— É, todo mundo já percebeu como ele a trata. Sempre dando privilégios. — respondeu outra, rindo baixo.

O garfo de Zoe parou a meio caminho da boca. A conversa a fez engolir em seco. Ela respirou fundo, tentando controlar a raiva que começava a crescer dentro dela. Não era do feitio dela se meter em fofocas, mas ouvir algo tão absurdo e injusto sobre si mesma a deixou profundamente incomodada.

Decidiu agir com calma. Levantou-se e caminhou até a mesa das enfermeiras, mantendo a postura firme, mas educada.

— Boa tarde. — Zoe começou, chamando a atenção delas, que congelaram ao vê-la. — Eu não pude deixar de ouvir o que vocês estavam dizendo.

As duas enfermeiras trocaram olhares desconfortáveis, tentando fingir que não entendiam do que Zoe estava falando.

— Acho que há um mal-entendido aqui. — Zoe continuou, mantendo o tom calmo, mas firme. — A única razão pela qual o doutor Lorenzo me dá oportunidades é porque eu me esforço e estudo para merecê-las. Não vou permitir que insinuem algo diferente.

— Nós não quisemos dizer... — começou uma delas, visivelmente constrangida.

— Vocês disseram exatamente o que queriam. — Zoe interrompeu. — Mas da próxima vez, sugiro que pensem duas vezes antes de espalhar boatos sobre alguém. Vocês podem não valorizar o trabalho que faço, mas eu valorizo.

Sem esperar por uma resposta, Zoe virou-se e saiu do refeitório, com a cabeça erguida. No entanto, por dentro, sentia-se magoada e irritada. Comentários como aqueles não apenas desrespeitavam seu profissionalismo, mas também diminuíam o esforço que sempre colocou em sua carreira.

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