10 - Desconstruindo a mulher perfeita

            Catherine saltou em sua poltrona, discou o número do hacker:

- É a Cat!

- Onde você estava? Te mandei um e-mail há quase duas horas.

- Achei que soubesse\, sai com Iasmin\, nós fomos ao shopping.

- Não sabia\, vocês não trocaram mensagens.

- Não\, combinamos por telefone.

- Estranho porque você é a principal suspeita do sumiço da irmã para ela.

- Vai ter o evento da Clarice\, mas isso você já sabe.

- É.

- Bem\, ela me convidou\, mas isso não importa\, o que importa é que Clarice tinha brigado com André a ponto dela pedir a chave e entregar para Iasmin\, quando ele entrou no apartamento\, ele tinha uma chave.

- Agora faz sentido... O porteiro do prédio de Clarice pediu uma cópia nova do apartamento\, acho que André deve ter alegado que perdeu ou algo assim\, ele disse que foi um pedido da família.

- Espere\, você é chaveiro?

- Não\, claro que não! Eu tenho ouvidos em muitos lugares.

- Eles brigaram\, ela pediu a chave e ele tinha comportamentos machistas\, ele não se torna o principal suspeito?

- Talvez para você\, mas André não consegue pescar com dó de peixe\, imagine fazer mal para aquilo

que mais ama.

- Humanos são imprevisíveis robô.

- Sem piadas\, é muita informação\, eu te mandei um monte de fotos\, alguém espiava Clarice no apartamento\, tem muitas fotos dela se trocando e em uma delas pega o reflexo da pessoa no vidro\, mas não consigo identificar ou algo assim\, vamos ter que trabalhar nisso juntos\, ok?

- Sim...

- Eu preciso fazer uma coisa\, vá cuidando disso.

- Certo.

            Catherine focou seu final da tarde e à noite nos arquivos, até que depois de ter passado a foto em vários programas de códigos pode ver que foto era de uma pessoa era ruiva, o cabelo parecia ser de mulher, mas estava sem camisa e o peito parecia de homem. Ela mandou o que conseguiu deixar mais nítido para o hacker e adormeceu.

            A semana passou rápido e foi mais tranquila do que esperava, o hacker tinha a dito que sabia quem tinha tirado aquelas fotos, mas que ele cuidaria daquilo, ficaram sem se falar, ela conseguia mais alguns arquivos e mandava para ele, um pouco no automático, mas ele já não respondeu há dias.

            Na sexta-feira, Tom a deixou trocar de turno, era perto do anoitecer quando ela chegou na casa para a cerimônia de Clarice, no portão encontrou com Iasmin, ela estava bonita de vermelho, realmente dava para o ver o quanto era magra, Catherine se aproximou e a chamou:

- Iasmin...

- Uau – disse Iasmin olhando Catherine dos pés à cabeça\, ela usava saia branca rodada\, meia calça e camisa vermelha de tons parecidos\, usava uma bota de cano baixo branca\, parecia o jeito que Clarice se vestia na escola\, entretanto\, mais empoderado.

- Estou bem?

- Está fantástica\, vamos entrar – ela a convidou percebendo que os portões foram abertos para elas.

            Elas entraram, Iasmin andou um pouco a frente ficou acenando para as pessoas, Catherine andava um pouco atrás reparando ao redor, um homem ao fundo lhe chamou atenção por não estar de preto, mas sim de cinza escuro, parou de o encarar rapidamente quando encontro o grupo de amigos de Clarice. Louise foi a primeira a falar da roupa delas:

- Por que estão vestidas assim? Isso não é uma festa!

- E também não é um velório para estar de preto Louise! – retrucou Iasmin a encarando dos pés à cabeça.

- As roupas não são importantes – disse Peterson que parecia ser o mais compreensivo – Mas por algum motivo escolheram essas roupas.

- Foi uma escolha de última hora – revelou Iasmin tentando disfarçar o clima tenso do grupo – Catherine me fez abrir os olhos\, não estamos velando minha irmã\, usar preto não seria o certo\, não quero confirmar que acho que ela está morta\, escolhi essa cor para mostrar que ela pode estar viva\, uma forma de protesto para que ninguém desista de a encontrar.

- Eu queria ter participado desse protesto – avisou Louise um pouco chateada.

- Independente da roupa\, como Peterson disse\, você está aqui e isso já é uma forma de protesto e manter Clarice viva – disse Catherine tocando em seu ombro.

- Como Clara fazia – disse Roberta colocando a mão na frente.

            André foi o primeiro a colocar sobre a mão dela, depois os outros, Catherine se afastou um pouco até que Iasmin disse:

- Você faz parte do grupo agora Catherine tem que colocar sua mão.

            Tímida ela colocou, eles balançaram as mãos na contagem de três e depois levantaram ouvindo Roberta dizer:

- Estamos juntos nessa pela Clara.

            Depois de algumas conversas, Catherine teve um momento que se distanciou para olhar ao redor, André levou uma bebida para ela e a elogiou:

- Você está linda.

- Obrigada... – ela agradeceu pegando a taça um pouco tímida.

- Lari ia gostar do jeito que ajudou de Iasmin\, ela parece mais confiante e trouxe um olhar de esperança para nós... Antes ela estava tão grosseira com todos.

- Eu só fiz o que achei certo.

- Acho que Lari nos mandou até você para que não ficássemos sozinhos na ausência dela – ele comentou confuso\, ainda buscava explicações pela última mensagem.

- Impossível ela não me conhecia de fato.

- Vamos ver discurso de Louise – ele a convidou estendendo a mão.

            Catherine segurou sua mão e logo a soltou, se aproximou dos outros na frente do palco e ouviu Louise enquanto várias fotos de Clarice era passada no telão:

- Como todos sabem Clarice é uma pessoa extraordinária... Eu a conheço desde o jardim de infância\, eu estava sendo zoada por alguns idiotas por ser negra\, ela chegou com seu jeito todo empoderado desde cedo e perguntou “vocês possuem inveja por ela ter uma cor diferente das de vocês?”\, os garotos saíram correndo e ela me perguntou “quer ser minha melhor amiga?”. E como eu poderia recusar? Ela foi como meu anjo da guarda naquele dia... E confesso para vocês que não foi só naquele dia\, passou a ser no dia-a-dia\, nós fizemos muitas festas de pijamas\, conheci a adorável família dela e ela a minha\, crescendo ao seu lado\, de melhores amigas\, estávamos mais ligadas como irmãs\, sempre juntas e sempre com os nossos amigos que são minha família e a família dela também – uma lagrima escorreu enquanto ela olhava para o grupo – Então não vamos deixar que a polícia simplesmente diga “ainda não sabemos de nada”\, vamos nós também a procurar! Porque do mesmo jeito que ela fez a minha vida melhor\, sei que fez a vida melhor de cada um que está presente... Eu te amo Clarice e sempre vou estar com você.

            Iasmin subiu no palco, Louise ficou surpresa e entregou o microfone, as duas se abraçaram, Louise desceu e Iasmin falou:

- Agradeço a presença de todos\, em nome da minha família e principalmente em nome de Clarice. Não sou boa com palavras\, mas vou contar para vocês a canção que sempre foi minha e de Clarice.

            No piano ela tocou Um Dia Após o Outro – Anavitória, emocionou muitas pessoas, principalmente André que se lembrava bem de quando estavam as duas cantando, era para a cerimonia ser encerrada ali, mas as luzes abaixaram assim que Iasmin desceu do palco, no telão começou a aparecer depoimentos estranhos sobre Clarice:

“Aquela vaca roubou meu namorado”

“Eu disse que gostava do André e ela roubou ele”

“Ela cortou meu cabelo em uma brincadeira”

“Clarice me bateu”

“Ela não é fiel”

“Ela não é amiga de verdade, fala mal de todos os amigos”

“Clarice não tem a vida perfeita, ela odeia os pais”

“Ela fez com que ninguém fosse para a minha festa de aniversário, aquele foi meu pior dia”

“Ainda bem que ela sumiu, assim posso ficar em paz”

“Ela roubou o meu colar”

            No final do vídeo de bilhetes e post anônimos tinha a frase escrita “Desconstruindo a mulher perfeita”, a palavra era agressiva como se fosse escrita com sangue e depois teve um corte final para uma reportagem ao vivo, há três ruas dali um corpo de uma mulher jovem foi encontrado e a reportagem foi cortada junto à luz do lugar.

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