Capítulo 9

Neto

Eu quase não dormi naquela noite, ainda podia sentir o calor do corpo dela junto ao meu. Era pequena, frágil e seu corpo se encaixava perfeitamente no meu, como um quebra cabeça. Eu nunca fora um homem romântico ou me detia a pensamentos assim,mas havia algo naquela mulher que despertara em mim um sentimento que não via a muito tempo.

Eu queria te-la em meus braços novamente, queria provar o gosto de seus lábios mais uma vez, queria faze-la minha... Não! Isso era um erro.. Que tipo de homem eu era?

Eu devia apenas tirar aqueles pensamentos da minha cabeça e me desculpar com Sarah. estava na cozinha, cortando legumes. Me aproximei. Sentindo a minha presença, ela se virou..

- Sarah, não sei exatamente como dizer, mas tentarei ser direto. Por favor, esqueça o que aconteceu ontem. Sinto-me um canalha por ter me aproveitado da situação. - Esperei qualquer reação dela, que não veio. Então continuei: - Gostaria que fôssemos bons amigos, apenas isso.

- Não se preocupe, tudo bem, eu entendo- ela disse voltando-se para a o balcão novamente.

- Digamos que é o que deve ser feito.

Sarah nada respondeu. Teria ela entendido minhas palavras? Então por que não reagia? Seu silêncio me deixava nervoso.

- Posso não ser o melhor homem do mundo - continuei. - Mas tenho caráter suficiente para saber que não devo brincar com os sentimentos de alguém. - O rosto dela permanecia impassível. -Sarah, está me escutando? O que quero dizer é que...

-Eu entendi... - ela se voltou para mim- Não se preocupe.

Sarah

Fiquei sozinha com meus pensamentos quando enfim Neto saiu para o trabalho. Eu não sabia onde estava com a cabeça quando permitira que aquele beijo acontecesse. Mas, estar nos braços daquele homem me fizera sentir uma mulher novamente. Aquele beijo havia despertado em mim sensações que havia muito não sentia. O prazer de ser tocada, o sentimento perfeito do calor dos braços masculinos...Mas como ele dissera naquela manhã, aquilo não passara de um erro.

Eu devia apenas tentar manter o foco, já havia tido experiencias trágicas demais na minha vida para me entregar assim tão facilmente ao sonho do relacionamento perfeito.

Duas semanas depois- Sarah

Os habitantes de Esplendor estavam todos reunidos no centro da cidade para a festa de comemoração aos 80 anos do município. Muitas barracas se espalhavam aqui e acolá. Bandeiras tremulavam e as pessoas se aglomeravam para acompanhar o desfile.

Ana iria desfilar com seus colegas de escola, estava tão empolgada que quase não esperara o carro estacionar diante do bar de Laura e já havia corrido para se juntar aos amiguinhos.

- Não vá muito longe, Ana!- gritei em alerta. Ela acenou e sumiu no meio do aglomerado de pessoas.

- Sarah?- era impressão minha ou todas as vezes em que Neto falava meu nome meu coração parecia parar de bater por um breve segundo. Eu esquecera completamente de sua presença, oque de alguma forma era bom, afinal, desde aquela noite em que nos beijamos ele havia ocupado minha mente uma boa parte do tempo. Sim, havíamos concordado em esquecer o acontecido, mas todas as vezes em que eu fechava meus olhos aquela cena se repetia.

- Sim?- respondi tentando não fita-lo diretamente.

- Tenho algo pra resolver antes do desfile, por favor, fique de olho na Ana por mim...

- Tudo bem, não se preocupe.

- ' brigado!- ele fez um aceno de cabeça e então se afastou. Fiquei a observa-lo por alguns instantes. Estava ainda mais bonito naquele dia ou era impressão minha? - Apreciando a vista?- me virei sobressaltada e dei de cara com uma Laura sorridente a me encarar.

- Oque?- me fiz de des entendida. Ela piscou e agarrou meu braço.

- Não precisa esconder nada de mim Sarah, tenho sentido o clima entre vocês dois a dias.. Fomos andando em direção ao bar e nos acomodamos a uma das mesas que estavam na calçada.

- Clima? Não existe clima algum Laura...

- Ah, por favor Sarah, uma mulher sabe muito bem quando a outra esta me mentindo e você está.

Nossa, Laura conseguia ser tão perspicaz na maioria das vezes.

- Sarah..somos amigas..- ela segurou minha mão.

Olhei bem dentro daqueles enormes olhos verdes e percebi que não tinha escolha:

- Nos beijamos...- confessei, sentindo um doce alivio tomar conta do meu ser.

- Ai meu Deus!- ela exclamou radiante.- Um beijo de verdade?

- Laura!

- E como foi?!

Eu não sabia ao certo oque ela queria saber mas tentei ser o mais sincera possível.

- Muito bom...

- Que maravilha!

- Não se empolgue tanto, foi só um beijo...E alem do mais concordamos que foi um erro e não vai se repetir.

- Como assim?!- Laura parecia desapontada.

- Eu não estou aqui a procura de romance Laura e Neto também não, ele ainda ama a esposa...

- Que esta morta...

- Laura!

- Oque foi? É a verdade Sarah, eu amava Esther ela foi uma das melhores pessoas que já conheci e tenho certeza que não era desejo dela que Neto ficasse sozinho pra sempre. Ele precisa de alguém e desde que você chegou aquela casa não é mais a mesma..Ana não é mais a mesma...

- Laura..

- Esta na hora desse homem seguir em frente...

- Laura..Isso não depende apenas do Neto...Também não estou preparada pra isso.. Logo irei embora e...

- Ah, ai estão vocês- Kit se aproximou de nós e eu dei graças a Deus por ele me salvar daquela conversa. - O desfile vai começar.

- Não pense que vai fugir de mim mocinha, continuamos nossa conversa depois.- disse Laura e eu não pude deixar de rir de seu jeito espevitado.

Uma multidão de pessoas já havia se aglomerado no local do desfile procuramos um bom lugar e nos juntamos a eles. Olhei ao redor a procura de Neto mas não o vi. Ao invés dele o jovem Beto sorriu e acenou pra mim do outro lado da rua. Correspondi cordialmente.

Minutos mais tarde lá estava Ana com seu macacão azul e e o rostinho pintado desfilando juntos com o grupo de coleguinhas. 

-Papai!- ela gritou acenando feliz. 

Segui seu olhar e me deparei com a figura de Neto parada atras de mim. Quando percebeu que estava sendo observado, tentou disfarçar passando a mão pelos cabelos. 

O desfile chegou ao fim e todos se reuniram no patio da igreja para o famoso churrasco do dia de Esplendor do Sul. O cheiro de churrasco parecia se espalhar por toda cidade. Kit e Laura comiam com prazer.  Durante a quermesse, o prefeito, o delegado e outros tantos discursaram como em uma tradicional cidade pequena.E eu me sentia num daqueles filmes antigos. Era a primeira vez que participava de uma comemoração assim.

Ao anoitecer, uma das ruas mais largas foi utilizada como pista de dança. Um palco improvisado foi montado e a banda começou a tocar músicas tipicas. Observei os casais que se aglomeravam e dançavam animados.

 — Quer dançar moça? — o jovem Beto se aproximou de mim com seu sorriso brilhante.

O jovem era tão charmoso que muitas das meninas ali presentes trocaram olhares de reprovação quando ele me convidou para dançar.  Oque me deu vontade de rir, afinal, eu não tinha nenhum interesse em Alberto Salles.

-E então? — ele insistiu.

Seu olhar era tão doce que não tive como negar-lhe a companhia, apesar de eu não saber nem por onde começar a dançar uma musica daquelas.

- Já aviso, vou pisar nos seus pés- eu ri. No meio da dança avistei Neto encostado em uma árvore conversando com Francis. Lançou um olhar de esguelha e coçou a cabeleira como sempre fazia, quando algo parecia perturba-lo.

— Obrigada, Alberto— agradeci quando a música chegou ao fim. Mas o rapaz parecia não ouvir. Estava completamente hipnotizado pela professora Jude que dividia a mesa com Laura e Kit.- Vá chama-la para dançar.- incentivei.

Ele sorriu meio envergonhado. Fiquei observando enquanto o rapaz se dirigia em direção a professora, ela sorriu surpresa e estendeu-lhe aceitando seu convite.

— Concede-me o prazer de uma dança? — Francis perguntou se aproximando, eu ja havia voltado a me sentar e observava os casais que dançavam alegremente. Entre eles a pequena Ana e um mulatinho lindo chamado Arthur.

—Eu adoraria, mas se não se importa, prefiro ficar aqui . Deve ter percebido que não danço muito bem.- me desculpei educadamente. 

 — Gurias jovens ebonitas como tu precisam se divertir de vez em quando — Francis argumentou .  

 — Está bem- cedi. 

Dançamos por alguns instantes e tenho que confessar, o velho Francis era um excelente pé de valsa. 

— Oh, que pontada no meu joelho! — Francis reclamou, massageando o joelho esquerdo.— Não aguento, tenho de sentar. - Virou-se e exclamou. - Hey, Neto, venha cá...Termine a dança comela.

— Frank, está tudo bem — intervi, sabendo que nada havia com o joelho de Francis.

— Não, Sarah, você está com vontade de dançar — O velho falou, ignorando minhas palavras. — Neto, não vai convidá-la?

Me senti ridícula, eu não sabia onde Francis queria chegar com aquela ideia absurda, a unica coisa que tinha certeza era de que não queria que Neto se sentisse obrigado a dançar comigo. Já ia me retirar da pista de dança quando ele se manifestou.

— Quer dançar?

Ele não parecia muito animado. Mas eu gostava de dançar, apesar de não ser uma boa dançarina, que não pude resistir à própria vontade. Além do mais, queria dançar com alguém que não fosse tão novo como Beto, nem tão velho como Frank. Aliás, o velho matreiro já se afastava, simulando uma dor que não existia, antes mesmo de saber se Neto dançaria ou não.

— Sim, gostaria — sussurrei, apesar de tudo.

Em seus braços, deixei-me levar pelas emoções. A proximidade dele fez crescer o sentimento de que o conhecia havia muito tempo, como se eu tivesse feito parte de seu passado. Algo místico, pensei. Neto me  trouxe para mais perto dele.

— Desculpe-me, mas não sou bom dançarino — ele disse, misturando-se entre os pares que dançavam ao som de uma música sertaneja.

— Oh, não se incomode, pois acontece o mesmo comigo. — sorri.

Quem se importava com aquilo? Eu flutuava nos braços dele como se estivesse nas nuvens. Ninguém mais existia na face da Terra além de nós dois. Quando a banda encerrou aquela seleção de músicas, suspirei satisfeita, nunca dançara com tanto prazer na vida.Enquanto muitoscasais deixavam a pista, permanecíamos abraçados, dançando como se umamúsica imaginária tocasse apenas para nós.  

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